Resposta à Consulta nº 23204 DE 05/07/2021

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 06 jul 2021

ICMS – Saídas internas de ovos descascados (“ovos líquidos não pasteurizados”) de produtor rural paulista, destinados à industrialização em estabelecimento paulista – Tratamento tributário. I. As saídas internas de “ovos líquidos não pasteurizados” com destino a estabelecimento industrial não podem se beneficiar da isenção prevista no artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000, pois os ovos são submetidos a processo de descascamento, perdendo, portanto, o seu estado natural. II. Aplica-se o diferimento do lançamento do imposto nas saídas internas promovidas por produtor rural com destino a estabelecimento industrial. III. Na Nota Fiscal de entrada emitida pelo industrial, adquirente da mercadoria, deve ser destacado o valor total do imposto a ser pago pelo destinatário deste Estado. IV. Nos termos da Decisão Normativa CAT 1/2019, para a determinação do valor da base de cálculo do ICMS a ser destacado na Nota Fiscal de entrada, deve ser considerado também o montante do próprio imposto. V. O crédito desse insumo poderá ser aproveitado, desde que a saída dos produtos resultantes da sua industrialização seja tributada ou, se isenta, exista previsão expressa de manutenção do crédito.

ICMS – Saídas internas de ovos descascados (“ovos líquidos não pasteurizados”) de produtor rural paulista, destinados à industrialização em estabelecimento paulista – Tratamento tributário.

I. As saídas internas de “ovos líquidos não pasteurizados” com destino a estabelecimento industrial não podem se beneficiar da isenção prevista no artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000, pois os ovos são submetidos a processo de descascamento, perdendo, portanto, o seu estado natural.

II. Aplica-se o diferimento do lançamento do imposto nas saídas internas promovidas por produtor rural com destino a estabelecimento industrial.

III. Na Nota Fiscal de entrada emitida pelo industrial, adquirente da mercadoria, deve ser destacado o valor total do imposto a ser pago pelo destinatário deste Estado.

IV. Nos termos da Decisão Normativa CAT 1/2019, para a determinação do valor da base de cálculo do ICMS a ser destacado na Nota Fiscal de entrada, deve ser considerado também o montante do próprio imposto.

V. O crédito desse insumo poderá ser aproveitado, desde que a saída dos produtos resultantes da sua industrialização seja tributada ou, se isenta, exista previsão expressa de manutenção do crédito.

Relato

1. A Consulente, segundo consulta ao CADESP, exerce como atividade principal a “fabricação de fermentos e leveduras” (CNAE: 10.99-6/03), além de atividades secundárias, como a “fabricação de pós alimentícios” (CNAE: 10.99-6/02) e a “fabricação de outros produtos alimentícios não especificados anteriormente (CNAE: 10.99-6/99), dentre outras.

2. Em sua consulta, relata que procede à industrialização de ovos e que suas principais matérias-primas são ovo “in natura” e “ovo líquido não pasteurizado”, classificados no código 0408.99.00 da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), os quais são adquiridos de produtor rural granjeiro em operação interna.

3. Informa que, conforme “Relatório de Solicitação de Registro de Produto” protocolizado pelo produtor rural granjeiro (fornecedor) junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), “Ovo Líquido não pasteurizado” é um produto resultante da quebra/retirada das cascas de ovos trincados/quebrados, que são simplesmente acondicionados em embalagens de transporte (sacos de polietileno e esses em box de aço inox) e levados/mantidos em câmara fria até que ocorra a retirada/embarque do produto para o estabelecimento industrial adquirente, no caso em questão, a Consulente.

4. Relata que seu fornecedor entende que a operação com ovos líquidos não pasteurizados é isenta de ICMS, nos termos do artigo 104 do Anexo I do Regulamento do ICMS - RICMS/2000, considerando que: (i) o produto não passa por nenhum processo de industrialização previsto no inciso I do artigo 4º do RICMS/2000, (ii) por ser produtor rural/granjeiro – pessoa física, sequer lhe é permitido proceder a processos de industrialização, conforme regulamentação do MAPA, e (iii) o produto “ovo líquido não pasteurizado” não perde seu “estado natural”, vez que constituído tão somente de clara e gema, apresentando-se apenas desprovido das cascas.

5. Por sua vez, a Consulente entende que, uma vez retirada a casca do ovo, ele perde seu estado “in natura”. Portanto, o produto “ovo líquido não pasteurizado” não atenderia ao disposto no inciso III do artigo 4º do RICMS/2000 (que traz o conceito de “estado natural”), nem à Decisão Normativa CAT 16/2009.

6. Diante do exposto, relativamente ao produto “ovo líquido não pasteurizado”, indaga:

6.1. se sua aquisição de produtor rural é isenta, nos termos do artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000;

6.2. em caso negativo, se essa aquisição sujeita-se à alíquota de 18%, nos termos do inciso I do artigo 52 do RICMS/2000;

6.3. se o fornecedor/produtor rural deve emitir Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) incluindo no valor da mercadoria o correspondente ICMS, bem como, nos campos próprios da NF-e, consignar a base de cálculo do ICMS e proceder ao destaque do valor do ICMS;

6.4. se nessa aquisição é aplicável o diferimento previsto no artigo 260 do RICMS/2000;

6.5. caso seja aplicável o diferimento, como deve ser interpretada a expressão “quando devidamente indicado na documentação correspondente”, expressa no artigo 260 do RICMS/2000;

6.6. caso o imposto não seja indicado pelo remetente da mercadoria, se prevalece a obrigação de recolhimento por parte do destinatário;

6.7. considerando positiva a resposta à indagação anterior, deve a Consulente identificar a base de cálculo do ICMS a recolher, considerando o disposto no artigo 49 do RICMS/2000;

6.8. considerando-se o disposto no artigo 260, mais especificamente o trecho: “o imposto será arrecadado e pago pelo destinatário deste Estado”, se está correto o procedimento da Consulente de deduzir do valor a ser pago ao fornecedor o valor do correspondente ICMS;

6.9. se na NF-e de entrada que deve ser emitida pela Consulente na aquisição desse produto deve ser destacado o valor do ICMS em campo próprio da NF-e;

6.10. se o crédito do imposto a que tem direito nessa aquisição deve ser computado pelo registro da NF-e de entrada emitida pela Consulente ou deve ser computado pelo registro da NF-e emitida pelo fornecedor;

6.11. se na NF-e emitida na entrada da mercadoria em seu estabelecimento, a Consulente deve considerar como valor da mercadoria o valor destacado na NF-e do fornecedor produtor rural acrescido do ICMS, ficando, portanto, o valor total da NF-e de entrada superior ao valor total da NF-e emitida pelo fornecedor.

Interpretação

7. Inicialmente, é importante transcrever o artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000:

“Artigo 104 - (HORTIFRUTIGRANJEIROS PARA INDUSTRIALIZAÇÃO) - A saída interna dos produtos hortifrutigranjeiros em estado natural relacionados no artigo 36 com destino a estabelecimento industrial localizado neste Estado (Lei 6.374/89, art. 112): (Artigo acrescentado pelo Decreto 48.114, de 26-09-2003; DOE 27-09-2003; efeitos a partir de 27-09-2003)

§ 1º - Não se exigirá o estorno do crédito do imposto relativo às mercadorias beneficiadas com a isenção prevista neste artigo. (Parágrafo único passou a denominar-se § 1º pelo Decreto 65.255, de 15-10-2020, DOE 16-10-2020)”.

8. Por sua vez, o artigo 36 do Anexo I do RICMS/2000 dispõe:

“Artigo 36 (HORTIFRUTIGRANJEIROS) - Operações com os seguintes produtos em estado natural, exceto quando destinados à industrialização (Convênio ICM-44/75, com alteração dos Convênios ICM-20/76, ICM-7/80, cláusula primeira, ICM-24/85, ICM-30/87, ICMS-68/90 e ICMS-17/93, e Convênio ICMS-124/93, cláusula primeira, V, 2): (Redação dada ao "caput" do artigo, mantidos os seus incisos, pelo Decreto 52.836, de 26-03-2008; DOE 27-03-2008)

(...)

IX - ovos;

(...)

§ 4º - Nas operações com os produtos relacionados nos incisos I a VIII e X a XIII, aplica-se a isenção ainda que tenham sido ralados, exceto coco seco, cortados, picados, fatiados, torneados, descascados, desfolhados, lavados, higienizados, embalados ou resfriados, desde que não cozidos e não haja adição de quaisquer outros produtos que não os relacionados, mesmo que simplesmente para conservação, observado o disposto no § 5º (Convênio ICMS 21/15) (Redação dada ao parágrafo pelo Decreto 64.684 de 17-12-2019; DOE 18-12-2019)

(...)”.

9. Também transcrevemos, por oportuno, o artigo 4º do RICMS/2000:

“Artigo 4º - Para efeito de aplicação da legislação do imposto, considera-se (Convênio SINIEF-6/89, art. 17, § 6º, na redação do Convênio ICMS-125/89, cláusula primeira, I, e Convênio AE-17/72, cláusula primeira, parágrafo único):

(...)

III - em estado natural, o produto tal como se encontra na natureza, que não tenha sido submetido a nenhum processo de industrialização referido no inciso I, não perdendo essa condição o que apenas tiver sido submetido a resfriamento, congelamento, secagem natural, acondicionamento rudimentar ou que, para ser comercializado, dependa necessariamente de beneficiamento ou acondicionamento;”

10. Observa-se que, para usufruir do benefício da isenção nas saídas internas previsto no artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000, os produtos hortifrutigranjeiros devem: (i) estar em estado natural; (ii) ser destinados à industrialização e (iii) constar da lista descrita no referido artigo 36 do Anexo I do RICMS/2000.

11. Note-se que o § 4º do artigo 36 do Anexo I do RICMS/2000 permite que certos produtos, relacionados nos incisos I a VIII e X a XIII, possam ter seu estado alterado (ralado, cortado, picado, fatiado, torneado, descascado, desfolhados, lavado, higienizado, embalado ou resfriado) sem a perda da isenção. Entretanto, entre tais produtos não se encontram os ovos, indicados no inciso IX do artigo em comento.

12. Assim, como os ovos são submetidos a processo de descascamento, eles perdem o seu estado natural, logo, suas saídas não podem se beneficiar da isenção prevista no artigo 104 do Anexo I do RICMS/2000.

13. Posto isso, transcrevemos parcialmente os artigos 116, 136 e o artigo 260 do RICMS/2000:

“Artigo 116 - Quando estiver atribuída ao destinatário da mercadoria ou ao tomador do serviço a obrigação de pagar o imposto relativo à mercadoria entrada, real ou simbolicamente, em seu estabelecimento ou ao serviço tomado, o contribuinte deverá, no período de ocorrência do evento, observar as seguintes normas (Lei 6.374/89, art. 59):

I - o imposto será escriturado no livro Registro de Apuração do ICMS, no quadro "Débito do Imposto - Outros Débitos", com a expressão "Entradas com Imposto a Pagar" ou "Utilização de Serviços com Imposto a Pagar", conforme o caso;

II - o imposto será computado, quando for o caso, como crédito no livro Registro de Entradas, no mesmo período em que o serviço tiver sido tomado ou a mercadoria tiver entrado no estabelecimento.

(...)”

“Artigo 136 - O contribuinte, excetuado o produtor, emitirá Nota Fiscal (Lei 6.374/89, art. 67, § 1°, e Convênio de 15-12-70 - SINIEF, arts. 54 e 56, na redação do Ajuste SINlEF-3/94, cláusula primeira, XII):

I - no momento em que entrar no estabelecimento, real ou simbolicamente, mercadoria ou bem:

a) novo ou usado, remetido a qualquer título por produtor ou por pessoa natural ou jurídica não obrigada à emissão de documentos fiscais;

(...)”.

“Artigo 260 - Salvo disposição em contrário, na saída promovida por produtor situado em território paulista com destino a comerciante, industrial, cooperativa ou qualquer outro contribuinte, exceto produtor, o imposto será arrecadado e pago pelo destinatário deste Estado, quando devidamente indicado na documentação correspondente, no período em que a mercadoria entrar no estabelecimento, observado o disposto no artigo 116.”

14. Observa-se da leitura atenta que as saídas promovidas por produtor rural situado neste Estado com destino a comerciante, industrial, cooperativa ou qualquer outro contribuinte estão amparadas pelo diferimento do lançamento do imposto.

15. Nessa hipótese:

15.1 a Consulente deve emitir Nota Fiscal na entrada da mercadoria em seu estabelecimento, destacando o valor do imposto;

15.2 escriturar em seu livro Registro de Entradas somente o documento fiscal que emitir por ocasião da entrada da mercadoria, na forma do artigo 116 do RICMS/2000, cabendo ressaltar que os dados da Nota Fiscal emitida pelo produtor devem constar na Nota Fiscal emitida pela Consulente no campo "Informações de Documentos Fiscais Referenciados”;

15.3 a apuração da base de cálculo desse imposto deve ser considerar o previsto no Comunicado CAT-1/2019 (“integra a base de cálculo do ICMS o montante do próprio imposto incidente na entrada de mercadoria com diferimento do lançamento no estabelecimento do contribuinte substituto, devendo este realizar a apuração e o pagamento do imposto no livro Registro de Apuração do ICMS ou por guia de recolhimentos especiais.”);

15.4 a alíquota aplicável é a prevista no artigo 52, inciso I, do RICMS/2000, de 18%;

15.5 a expressão “quando devidamente indicado na documentação correspondente”, constante no artigo 260 do RICMS/2000, refere-se ao destinatário devidamente indicado, não ao imposto indicado.

16. Quanto ao crédito, pode-se afirmar que a Consulente poderá apropriar-se do ICMS relativo à aquisição do “ovo líquido não pasteurizado” adquirido de produtor rural, desde que a saída dos produtos que a Consulente fabricar a partir desse insumo seja tributada, ou, quando isenta, exista previsão expressa da manutenção do crédito (artigo 60 do RICMS/2000). Sugere-se, nesse sentido, a leitura da Decisão Normativa CAT 01/2001, especialmente o seu subitem 3.1.

17. Por fim, ressalte-se que aspectos comerciais entre as partes envolvidas na operação não podem desvirtuar seus aspectos tributários. Dessa forma, a Consulente deverá observar o cumprimento das obrigações principal e acesssórias relacionadas à situação fática em tela nos termos desta resposta.

18. Com essas explicações, julgamos respondidas as questões formuladas.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.