Resposta à Consulta nº 22273 DE 27/11/2020

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 28 nov 2020

ICMS – Entidade de assistência social – Imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição Federal de 1988 – Incidência. I. A imunidade constitucional estabelecida pelo artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal é prevista apenas para as hipóteses em que os impostos recaem diretamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços das instituições sem fins lucrativos. II. O ICMS, afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre patrimônio, renda e serviços. III. Para fins de enquadramento como contribuinte do ICMS, a caracterização do intuito comercial depende da habitualidade ou do volume de operações relativas à circulação de mercadorias, e não do caráter assistencial ou educacional previsto para a pessoa que praticar as operações. IV. Ao pretender praticar operações relativas à circulação de mercadorias, a instituição, mesmo que não tenha fins lucrativos, se enquadrará na condição de contribuinte do ICMS, estando obrigada à prévia inscrição no cadastro de contribuintes deste Estado e ao cumprimento das obrigações principal e acessórias previstas na legislação do imposto estadual. V. O fornecimento de refeição e a venda de “marmitex” configuram operações distintas, cada qual com tributação e regras próprias.

ICMS – Entidade de assistência social – Imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição Federal de 1988 – Incidência.

I. A imunidade constitucional estabelecida pelo artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal é prevista apenas para as hipóteses em que os impostos recaem diretamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços das instituições sem fins lucrativos.

II. O ICMS, afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre patrimônio, renda e serviços.

III. Para fins de enquadramento como contribuinte do ICMS, a caracterização do intuito comercial depende da habitualidade ou do volume de operações relativas à circulação de mercadorias, e não do caráter assistencial ou educacional previsto para a pessoa que praticar as operações.

IV. Ao pretender praticar operações relativas à circulação de mercadorias, a instituição, mesmo que não tenha fins lucrativos, se enquadrará na condição de contribuinte do ICMS, estando obrigada à prévia inscrição no cadastro de contribuintes deste Estado e ao cumprimento das obrigações principal e acessórias previstas na legislação do imposto estadual.

V. O fornecimento de refeição e a venda de “marmitex” configuram operações distintas, cada qual com tributação e regras próprias.

Relato

1. A Consulente, associação sem fins lucrativos, apresenta questionamento acerca da tributação incidente sobre a venda de “marmitex” e de refeições para terceiros.

2. Informa que pretende iniciar a atividade de fornecimento de alimentação, realizando vendas de “marmitex”, destinados à entrega, e refeições para consumo no local do seu estabelecimento. Acrescenta que o lucro obtido com tais atividades será revertido integralmente para sua manutenção.

3. Diante disso, com base no artigo 150, VI, "c", e § 4º, da Constituição Federal de 1988 – CF/1988, questiona se a imunidade nele estabelecido alcança as vendas de refeições em seu estabelecimento e de “marmitex” por meio de sistema de entregas.

Interpretação

4. Preliminarmente, cabe esclarecer que este órgão consultivo tem entendido, em análise aos critérios estabelecidos pelo artigo 150, inciso VI, alínea "c", e § 4º, da Constituição Federal, que esse dispositivo constitucional proíbe, tão somente, a cobrança de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços das entidades ali especificadas.

4.1. A imunidade constitucional referida é prevista apenas para as hipóteses que gravam diretamente o patrimônio, a renda e os serviços dessas entidades, como acontece com o Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), que recaem sobre o patrimônio, ou com o Imposto de Renda – Pessoa Jurídica (IRPJ), que grava a renda auferida em determinado período. Ressalte-se que, nesses casos, a imunidade será aplicada quando o objeto da obrigação tributária a ser afastada estiver necessariamente relacionado com as finalidades essenciais da entidade.

4.2. O ICMS, afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços. Dessa maneira, o ICMS não se encontra sob o abrigo da imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição Federal de 1988, conforme expressa disposição do § 4º desse artigo (“as vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”).

5. Essa interpretação encontra respaldo nas reflexões do Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho, em sua obra: "Comentários à Constituição de 1988 – Sistema Tributário", 6ª edição, página 349:

"A imunidade das instituições de educação e assistência social as protege da incidência do IR, dos impostos sobre o patrimônio e dos impostos sobre serviços, não de outros, quer sejam as instituições contribuintes ‘de jure ou ‘de facto. Destes outros só se livrarão mediante isenção expressa, uma questão diversa".

6. Isso posto, cumpre salientar que o caráter assistencial/educacional da Consulente está diretamente relacionado com seu objetivo principal. Todavia, para fins de caracterização como contribuinte do ICMS, a deflagração do intuito comercial depende da habitualidade ou do volume de operações relativas à circulação de mercadorias, e não resvala na finalidade assistencial prevista para a entidade. Nesse sentido, dispõe o artigo 9º e 19 do Regulamento do ICMS – RICMS/2000, aprovado pelo Decreto nº 45.490/2000:

“Artigo 9º - Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que de modo habitual ou em volume que caracterize intuito comercial, realize operações relativas à circulação de mercadorias ou preste serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação (Lei 6.374/89, art. 7º, na redação da Lei 9.399/96, art. 1°, III)”.

[...]

Artigo 19 - Desde que pretendam praticar com habitualidade operações relativas à circulação de mercadoria ou prestações de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação, deverão inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes do início de suas atividades:

[...]

XII – os partidos políticos e suas fundações, os templos de qualquer culto, as entidades sindicais de trabalhadores, as instituições de educação ou de assistência social, sem fins lucrativos;

[...]”.

7. Diante do exposto, ainda que se caracterize como instituição de assistência social sem fins lucrativos e mesmo revertendo sua renda para obras sociais/educacionais, a entidade pode revestir-se da condição de contribuinte do imposto, nos termos do artigo 9º transcrito, na medida em que comercializar mercadorias de forma habitual.

7.1. Dessa forma, o estabelecimento que praticar as referidas operações deve realizar sua inscrição no cadastro de contribuintes deste Estado e submeter-se a todas as demais regras do RICMS/2000, inclusive quanto às respectivas obrigações principais e acessórias estabelecidas nesse regulamento, como a emissão de Nota Fiscal com o respectivo destaque do imposto devido (artigo 498 do RICMS/2000).

8. Assim, conclui-se que a Consulente, ao produzir e comercializar, com habitualidade, refeições para consumo no local e “marmitex” para entregas, efetua a circulação de mercadorias enquadrando-se, portanto, como contribuinte do ICMS.

9. Em relação à alíquota aplicável às operações realizadas pela Consulente (venda de “marmitex” e fornecimento de refeição), cumpre esclarecer que cada qual apresenta uma tributação distinta. Caracteriza-se como fornecimento de refeição a atividade de venda a varejo de produtos alimentícios que sejam consumidos no próprio estabelecimento em que foram adquiridos (conforme entendimento já consolidado por este órgão consultivo, exposto nas Respostas à Consulta nºs 21443/2020, 19523/2019, 17718/2018 e 11641/2016, publicadas no portal oficial da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo - https://www.portal.fazenda.sp.gov.br, módulos "legislação"/"tributária"/"pesquisa), utilizando-se a alíquota de 12% (artigo 54, inciso XII, do RICMS/2000), podendo ser aplicada a redução da base de cálculo prevista no artigo 17 do Anexo II do RICMS/2000.

9.1. Por sua vez, a venda de “marmitex” que não é consumido no próprio estabelecimento da Consulente (destinado somente para entregas), não é considerada fornecimento de alimentação (refeição), não cabendo a redução de base de cálculo prevista no artigo 17 do Anexo II do RICMS/2000, sujeitando-se à alíquota de 18%.

9.2. Oportuno observar, contudo, que o § 5º do artigo 54 do RICMS/2000, acrescentado pelo Decreto nº 65.253/2020, com efeitos a partir de 15/01/2021, estabeleceu que a aplicação da alíquota de 12% no fornecimento de alimentação, estabelecida pelo próprio artigo 54, independe do local onde ocorrerá o seu consumo.

10. Observa-se, também, que o Decreto nº 65.254/2020 alterou o artigo 17 do Anexo II do RICMS/2000, modificando o valor da base de cálculo do imposto incidente na saída de refeição promovida por empresas preparadoras de refeição coletivas para 76,2%, ressaltando que essa alteração entrará em vigor a partir de 01 de janeiro de 2021.

11. Por fim, não obstante todo o exposto, cumpre ressaltar que o artigo 31 do Anexo I do RICMS/2000 prevê a possibilidade de isenção sobre a saída de mercadoria de produção própria promovida por instituição de assistência social ou de educação, desde que o pedido da interessada seja reconhecido por esta Secretaria da Fazenda. Desse modo, preenchendo os requisitos do referido artigo, a Consulente poderá aplicar tal isenção às saídas que realizar. Recorda-se, todavia, que eventual dispensa da obrigação principal não exime o cumprimento das obrigações acessórias do imposto.

12. Com esses esclarecimentos, consideram-se dirimidas as dúvidas apresentadas na consulta.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.