Resposta à Consulta nº 21437 DE 02/04/2020
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 03 abr 2020
ICMS – Transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. I. Há incidência de imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular (artigo 1º, inciso I, RICMS/2000). II. O fato gerador ocorre na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (artigo 2º, inciso I, RICMS/2000). III. A base de cálculo a ser considerada, na transferência interestadual de mercadorias industrializadas pelo remetente, será o custo da mercadoria produzida (artigo 39 do RICMS/2000).
Ementa
ICMS – Transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.
I. Há incidência de imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular (artigo 1º, inciso I, RICMS/2000).
II. O fato gerador ocorre na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (artigo 2º, inciso I, RICMS/2000).
III. A base de cálculo a ser considerada, na transferência interestadual de mercadorias industrializadas pelo remetente, será o custo da mercadoria produzida (artigo 39 do RICMS/2000).
Relato
1. A Consulente, que tem como atividade principal o “comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios” (Código 47.81-4/00 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE), relata que adquire e industrializa (através de terceiros) mercadorias em seu estabelecimento filial situado no Estado de São Paulo e, posteriormente, as transfere para estabelecimento matriz localizado em outra Unidade da Federação. Diante disso, afirma que o fisco paulista exige o recolhimento do ICMS relativo a essas transferências, citando o artigo 2º, I, do RICMS/2000.
2. Contudo, entende que a mera saída física da mercadoria de um estabelecimento para outro de mesma titularidade, sem operação de mercancia/financeira, não constitui “circulação” da mercadoria, para efeito de incidência do ICMS, que, a seu entender, pressupõe a transferência da propriedade ou posse dos bens, ou seja, mudança de titularidade por força de uma operação jurídica. Adiciona, ainda, que a simples remessa de mercadoria de um estabelecimento para outro, de uma mesma empresa, caracterizar-se-ia como mero transporte, sem preço (operação financeira) e, assim, não seria tributável por meio do ICMS.
3. Cita que esse mesmo entendimento é partilhado pelos tribunais pátrios e exposto na Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça. Assim, indaga se o simples deslocamento de mercadorias de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte (matriz e filial) constitui fato gerador do ICMS.
Interpretação
4. Primeiramente, registra-se que o princípio da autonomia dos estabelecimentos está consagrado no artigo 15, § 2º, do RICMS/2000:
“Artigo 15, §2º - Para efeito de cumprimento de obrigação tributária, entende-se autônomo cada estabelecimento do mesmo titular, ainda que simples depósito”.
5. Ademais, é de se notar que a transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular está no campo de incidência do ICMS, conforme disposto no artigo 1º, inciso I, do RICMS/2000, reproduzido a seguir:
“Artigo 1º - O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) incide sobre:
I - operação relativa à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias em qualquer estabelecimento;
(...)”
6. Portanto, o fato gerador, nesse caso, ocorre na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, conforme expressa menção do artigo 2º, inciso I, do RICMS/2000, respaldado pelo artigo 12, inciso I, da Lei Complementar 87/96:
“Artigo 2º do RICMS/2000 - Ocorre o fato gerador do imposto:
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;”
“Art. 12 da Lei Complementar 87/1996. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;”
7. Sendo assim, como visto, a legislação tributária relativa ao ICMS é clara no sentido de que ocorre fato gerador do imposto na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, a despeito de eventual entendimento jurisprudencial em sentido contrário.
8. Nesse contexto, reitera-se que precedentes jurisprudenciais se referem a acórdãos de casos individuais e concretos, nos quais a decisão teve efeito apenas para a parte demandante (em que não figurava a Consulente), não produzindo efeitos para terceiros (ainda que tenham sido objeto da Súmula 166 do STJ). Ademais, as súmulas orientam julgamentos judiciais, não sendo obrigatoriamente aplicadas no âmbito do julgamento administrativo. Dessa forma, como as normas acima transcritas (artigo 12, I, da Lei Complementar 87/1996 e artigo 2º, I, do RICMS/2000) não foram afastadas do ordenamento jurídico, elas permanecem vigentes e válidas, diante da presunção de legitimidade dos atos normativos.
9. Feitas essas considerações acerca da legalidade, observa-se, ainda, que a incidência do imposto, na saída de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo titular (transferência), possibilita que o estabelecimento destinatário se aproprie de crédito, o qual, por sua vez, servirá para ser abatido do débito relativo à posterior saída de mercadorias (princípio da não cumulatividade).
10. Assim, ante o exposto, afastar a incidência do ICMS sobre as operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular é contrariar a lógica estrutural do imposto, ferindo os princípios da autonomia do estabelecimento, da não cumulatividade e, até, nos casos de transferência interestadual, do federalismo.
11. Isso posto, conclui-se, então, que ocorre o fato gerador do ICMS na situação fática apresentada na presente consulta, de modo que a Consulente deve apurar e recolher o ICMS devido nas operações de transferência que realiza, de acordo com a legislação vigente.
12. Recorda-se, também, que a ausência de preço estipulado entre as partes não fulmina a tributação do ICMS, sendo que na transferência de mercadorias da filial estabelecida no Estado de São Paulo para sua matriz em outra Unidade da Federação, deve ser seguido o disposto no artigo 39 do RICMS/2000 (c/c artigo 13, § 4º da Lei Complementar 87/1996), que trata, especificamente, das saídas interestaduais para estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular:
“Artigo 39 - Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo é (Lei 6.374/89, art. 26, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, XV, e Convênio ICMS-3/95):
(...)
II - o custo da mercadoria produzida, assim entendido a soma do custo da matéria-prima, do material secundário, da mão-de-obra e do acondicionamento, atualizado monetariamente na data da ocorrência do fato gerador;
(...)”
12.1. Desse modo, nas referidas transferências de mercadorias industrializadas pelo remetente, o valor da operação (base de cálculo para o ICMS) deverá ser o custo da mercadoria produzida.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.