Resposta à Consulta nº 21143 DE 06/08/2020

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 07 ago 2020

ITCMD – Doação de imóvel por casal a duas filhas, no momento da partilha em separação judicial – Fatos geradores. I. No caso de doação realizada por ocasião da partilha dos bens de casal na separação judicial, há que se considerar, neste momento, a ocorrência dos fatos geradores do imposto. II. Como os fatos geradores ocorreram na vigência da Lei 9.591/1966, e, por falta de previsão legal, não cabe o benefício da isenção do imposto.

ITCMD – Doação de imóvel por casal a duas filhas, no momento da partilha em separação judicial – Fatos geradores.

I. No caso de doação realizada por ocasião da partilha dos bens de casal na separação judicial, há que se considerar, neste momento, a ocorrência dos fatos geradores do imposto.

II. Como os fatos geradores ocorreram na vigência da Lei 9.591/1966, e, por falta de previsão legal, não cabe o benefício da isenção do imposto.

Relato

1. O Consulente, pessoa natural, apresenta consulta sobre isenção do ITCMD em doação de imóvel.

2. Para tanto, apresenta o seguinte relato:

2.1. Em 08/01/1991, o Consulente e sua esposa, então casados pelo regime da comunhão parcial de bens, adquiriram um imóvel juntamente com uma terceira pessoa, cabendo 50% ao casal e a outra metade a essa pessoa.

2.2. Em 06/06/1997, o casal se separou consensualmente, com trânsito em julgado em 24/06/1997 da sentença que julgou a partilha. Na sentença foi homologado que: “a fração de 50% do imóvel pertencente ao casal, de comum acordo, será doada às filhas, ficando o separando com usufruto do referido imóvel até que as filhas alcancem a maioridade”.

2.3. A filha mais velha do casal atingiu a maioridade em 2006 e a mais nova em 2010.

2.4. Em 04/09/2018, a ex-esposa do Consulente veio a óbito.

2.5. Em 03/03/2019, o formal de partilha foi levado ao Oficial de Registro de Imóveis, a fim de se registrar a doação do casal. O Consulente afirma, citando jurisprudência, que "tal doação é possível uma vez que o acordo feito em separação ou divórcio tem validade de escritura pública no que tange à partilha de bens imóveis." No entanto, foi solicitada a Guia do ITCMD devidamente recolhido, ou que seja reconhecida a isenção do imposto pela Secretaria da Fazenda e Planejamento.

3. Cita os artigos 1245 a 1247 do Código Civil, para dizer que, no seu entender, o imposto sobre a transmissão não incide no momento da confecção do título (homologação da sentença de separação), mas sim, no momento do registro do imóvel.

4. Pelo exposto, questiona:

4.1. qual a data efetiva a ser considerada para efeitos da doação (data da homologação da sentença de separação do casal, da maioridade das filhas, ou do momento em que está sendo registrado o imóvel);

4.2. se a doação do referido imóvel tem o benefício da isenção de ITCMD.

5. Registre-se que o Consulente anexa, eletronicamente, cópias: (i) do formal de partilha; (ii) da certidão de casamento; (iii) da certidão de nascimento das filhas; (iv) da escritura de venda e compra do imóvel; (v) do registro do imóvel; e (vi) do pedido de carta de sentença para averbação da escritura de imóvel.

Interpretação

6. De início, observamos que a doação do bem imóvel em questão se inicia simultaneamente à dissolução da sociedade conjugal, se concretizando em um momento posterior.

7. Dessa forma, na análise de incidência do imposto, há que se considerar, no momento do fato gerador, cada um dos consortes, isoladamente tomados, como doadores. Assim, estamos diante de quatro fatos geradores do imposto, considerando-se que houve duas doações (uma para cada filha) por cada um dos ex-cônjuges.

8. Registre-se que é entendimento antigo e reiterado deste órgão que, em relação à doação de bem imóvel, ocorre o fato gerador do ITCMD no momento da celebração do ato ou contrato da doação. Isso não quer dizer, todavia, que o registro de imóveis seja irrelevante para que a transmissão não onerosa de bem imóvel por ato inter vivos se aperfeiçoe e, assim, seja definitivamente devido o ITCMD a ele relativo.

9. Com efeito, é cediço que, nos termos do artigo 1.245 do Código Civil, a transferência entre vivos do direito de propriedade de bens imóveis se dá mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. No entanto, para que essa transferência se concretize ela é necessariamente precedida de diversos atos solenes cujas ocorrências se dão em momentos distintos.

10. Portanto, ainda que a transmissão da propriedade do bem imóvel apenas se efetive com o registro do título translativo no Registro de Imóveis, e a partir desse ato seja oponível a terceiros, o direito subjetivo à transferência do imóvel surge em momento anterior a ela. Isso é, ainda que a transferência se concretize com o registro, esse é precedido de uma relação obrigacional já vinculante entre as partes. Tanto assim que o que se registra é justamente o título translativo. Logo, é em momento anterior ao registro que nasce o direito subjetivo à transação, ainda que esse não seja oponível a terceiros; ao registro cabe efetivar a transferência da propriedade, dando publicidade ao ato, transmutando-se, assim, o direito subjetivo em direito real com efeitos erga omnes.

11. Sendo assim, a doação de bens imóveis é um negócio jurídico, composto por diversos atos, que se inicia com a formalização jurídica do contrato de doação e termina com a transmissão da propriedade do bem imóvel quando do registro.

12. Consequentemente, o signo presuntivo de riqueza passível de tributação pelo imposto relativo à doação de bem imóvel começa a tomar forma com a formalização jurídica do ato ou contrato da doação e se condensa posteriormente com o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

13. É nesse contexto que se constata o fundamento do legislador tributário paulista para eleger o ato ou contrato como o momento de ocorrência do fato gerador do ITCMD relativo à doação, mas o condicionando à efetivação daquele ato ou contrato que lhe deu causa.

14. No caso em lume, a celebração do ato de doação se realiza em conjunto com a dissolução do casamento, concretizada através da sentença de homologação da separação judicial, na qual ocorre também a partilha dos bens do casal. Destaca-se que, conforme inclusive afirmou o Consulente em seu relato,a jurisprudência tem entendido que a sentença homologatória de acordo celebrado por ex-casal, com a doação de imóvel aos filhos comuns, possui idêntica eficácia da escritura pública. Assim, conclui-se que, com o trânsito em julgado da sentença de homologação da separação judicial, origina-se o fato gerador do ITCMD.

15. Considerando que o trânsito em julgado da sentença de homologação do divórcio ocorreu em 1997, o fato gerador do imposto foi anterior à publicação da Lei 10.705/2000, que instituiu o ITCMD no Estado de São Paulo.

16. O Sistema Tributário anterior à Constituição Federal de 1988, por força da Emenda Constitucional 18/1965, estabelecia que o ITBI – Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis era de competência dos Estados. A Constituição Federal de 1988, entretanto, separou as espécies de transmissões, passando as transmissões "inter vivos" para a competência dos municípios (artigo 156, II, CF), e mantendo para os Estados apenas as transmissões "causa mortis" e doação.

17. A Lei paulista nº 9.591/1966, com suas alterações, foi recepcionada pelo novo Sistema Tributário (artigo 34, §5º, das Disposições Transitórias da CF) naquilo que não conflitasse com as novas disposições até que o Estado viesse a disciplinar o Imposto sobre Transmissão "Causa Mortis" e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 2001 (Lei 10.705/2000 e Decretos 45.837/2001 e 46.655/2002).

18. Dessa forma, como o fato gerador ocorreu após a promulgação da Constituição de 1988 e anterior à Lei 10.705/2000, o imposto era regido pela Lei 9.591/1966. E, assim, por falta de previsão nessa Lei, não cabe o benefício da isenção do imposto questionado pelo Consulente.

19. Pelo exposto, consideramos respondidos os questionamentos do Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.