Resposta à Consulta nº 21142 DE 15/04/2020
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 16 abr 2020
ICMS – Operação interna de industrialização por encomenda – Predominância dos insumos e materiais empregados – Diferimento previsto no artigo 350, inciso VII, do RICMS/2000. I. Não é aplicável a disciplina da industrialização por conta e ordem de terceiro às operações em que o estabelecimento industrializador contratado utiliza matéria-prima predominantemente própria. II. Em não sendo aplicáveis as regras de industrialização por conta e ordem de terceiro relativamente a operações entre o industrializador e o encomendante, as remessas de insumos do encomendante para o industrializador serão regularmente tributadas, sem a suspensão do ICMS, devendo constar na Nota Fiscal de saída dos insumos o destaque do ICMS, o CFOP 5.949 (“outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificada”), bem como a informação de que se trata de “remessa de insumos para utilização em estabelecimento de terceiros”. III. No retorno dos produtos prontos para o encomendante, o industrializador deverá tributá-los regularmente e emitir Nota Fiscal com CFOP referente à venda de produção do estabelecimento, devendo o valor da operação corresponder ao total do produto, incluindo o valor dos insumos remetidos pelo autor da encomenda. IV. Encerra-se o diferimento na saída de produto resultante da industrialização de mercadoria enquadrada, por sua descrição e NCM, no inciso VII do artigo 350 do RICMS/2000, devendo o imposto ser lançado nesse momento, sem direito a crédito.
Ementa
ICMS – Operação interna de industrialização por encomenda – Predominância dos insumos e materiais empregados – Diferimento previsto no artigo 350, inciso VII, do RICMS/2000.
I. Não é aplicável a disciplina da industrialização por conta e ordem de terceiro às operações em que o estabelecimento industrializador contratado utiliza matéria-prima predominantemente própria.
II. Em não sendo aplicáveis as regras de industrialização por conta e ordem de terceiro relativamente a operações entre o industrializador e o encomendante, as remessas de insumos do encomendante para o industrializador serão regularmente tributadas, sem a suspensão do ICMS, devendo constar na Nota Fiscal de saída dos insumos o destaque do ICMS, o CFOP 5.949 (“outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificada”), bem como a informação de que se trata de “remessa de insumos para utilização em estabelecimento de terceiros”.
III. No retorno dos produtos prontos para o encomendante, o industrializador deverá tributá-los regularmente e emitir Nota Fiscal com CFOP referente à venda de produção do estabelecimento, devendo o valor da operação corresponder ao total do produto, incluindo o valor dos insumos remetidos pelo autor da encomenda.
IV. Encerra-se o diferimento na saída de produto resultante da industrialização de mercadoria enquadrada, por sua descrição e NCM, no inciso VII do artigo 350 do RICMS/2000, devendo o imposto ser lançado nesse momento, sem direito a crédito.
Relato
1. A Consulente, segundo consulta ao Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado de São Paulo (CADESP), exerce, como atividade principal, o comércio atacadista de resíduos e sucatas não-metálicos, exceto de papel e papelão (CNAE:46.87-7/02) e, dentre outras, exerce a seguinte atividade secundária: produção e distribuição de vapor, água quente e ar condicionado (CNAE: 35.30-1/00).
2. Declara que a presente consulta se refere a operação interna de fornecimento de energia térmica renovável a partir de biomassa, produto classificado no pelo código 27505.00.00 da Nomenclatura Comum do Mercosul-NCM (gás de hulha, gás de água, gás pobre (gás de ar) e gases semelhantes, exceto gases de petróleo e outros hidrocarbonetos gasosos).
3. Também informa que é contratada para gerar energia térmica (vapor de água) para máquinas e equipamentos de seu cliente, diretamente dentro da empresa desse, onde a Consulente instala seus equipamentos e caldeira.
4. Para realizar a referida atividade (geração de energia térmica), afirma utilizar como matéria-prima principal "cavacos de madeira", produtos classificados no código 4401.39.00 da NCM (lenha em qualquer forma; madeira em estilhas ou em partículas; serragem (serradura), desperdícios e resíduos, de madeira, mesmo aglomerados em toras (toros), briquetes, pellets ou em formas semelhantes), acrescentando que outro produto necessário para processo é a água, produto este fornecido por seu cliente, acobertado com Nota Fiscal de “Remessa de Industrialização ”.
5. Desta forma, utilizando os dois produtos descritos (água e cavaco de madeira), é realizado o trabalho de industrialização/transformação e obtido o produto “energia biomassa”.
6. Afirma que, após finalizar o referido processo de industrialização/transformação, realiza o retorno simbólico do produto água, por meio de emissão de Nota Fiscal, consignando o CFOP 5.902 (Retorno de Industrialização).
7. Adicionalmente, informa que, mediante emissão de documento fiscal com o CFOP 5.124 (Industrialização efetuada para outra empresa), realiza a cobrança de sua industrialização, consignando na Nota Fiscal a tributação do ICMS referente aos materiais próprios aplicados no processo, que representam 96,95% do valor cobrado, e a aplicação do diferimento do ICMS incidente sobre o valor referente à mão de obra empregada no processo, que representa 3,05% do valor cobrado.
8. Afirma que a operação em comento é registrada em conformidade com os procedimentos do artigo 402 e seguintes do RICMS/2000, bem como da Portaria CAT 22/2007.
9. Ademais, ressalta que adquire os cavacos de madeira com diferimento, conforme disposto no inciso VII do artigo 350 do RICMS/2000.
10. Diante do exposto, questiona qual é a forma correta para se apropriar do crédito do imposto referente às aquisições do cavaco de madeira, realizadas ao abrigo do diferimento, tendo em vista que debita o ICMS nas saídas dos materiais próprios aplicados no processo industrial, no momento da saída do produto industrializado.
Interpretação
11. Primeiramente, ressalte-se que, nos termos do artigo 19 do RICMS/2000, devem se inscrever no CADESP aqueles que pretendam praticar com habitualidade operações e/ou prestações sujeitas ao ICMS, cabendo ressaltar que, nos termos do §2º do artigo 19 do RICMS/2000, qualquer pessoa mencionada no referido artigo, que mantiver mais de um estabelecimento, seja filial, sucursal, agência, depósito, fábrica ou outro, inclusive escritório meramente administrativo, fará a inscrição em relação a cada um deles.
12. Considerando que a Consulente informou que gera energia térmica para máquinas e equipamentos de seu cliente, diretamente dentro da empresa deste, onde instala seus equipamentos e caldeira, deve providenciar a inscrição no CADESP desse seu estabelecimento, localizado no endereço de seu cliente, caso ainda não possua, conforme determinam os artigos 14 e 19 do RICMS/2000.
12.1. Isso porque, conforme descrição do processo apresentada pela própria Consulente, a atividade por ela realizada representa uma típica etapa do processo de industrialização realizada por seu cliente, inserida no campo de incidência do ICMS, fato sobre o qual não resta dúvida tanto pela condição de contribuinte do imposto da Consulente como pelo detalhamento da documentação fiscal envolvida no processo.
12.2. Por oportuno, esclarecemos que, em tese, não há óbice à obtenção de inscrição estadual por estabelecimento situado em local onde já há outro estabelecimento devidamente inscrito, mas desde que seja possível a identificação de cada um individualmente considerado. No entanto, compete ao Posto Fiscal de vinculação do contribuinte averiguar, in loco se necessário, se não há impedimento para a constituição de estabelecimentos diversos dentro de um mesmo espaço físico, verificando a referida condição de independência entre eles para que, só então, seja ou não aprovada a situação pretendida (artigo 43 do Decreto 60.812/2014, combinado com artigo 20, inciso I, do RICMS/2000).
13. Registre-se, em prosseguimento, que considerando o relato da Consulente, especialmente a informação de que adquire parcela substancial dos insumos (cavacos de madeira) empregados na industrialização por ela realizada, esta resposta adotará a premissa de que a operação objeto da consulta enquadra-se como operação de industrialização por encomenda, uma vez que o encomendante envia à Consulente apenas uma pequena parcela (água) dos insumos utilizados no processo.
13.1. Isso porque, conforme entendimento já apresentado em diversos precedentes deste órgão consultivo, não é toda industrialização por encomenda que pode ser classificada como uma industrialização por conta de terceiro, sendo esta uma espécie daquele gênero. Desse modo, tendo o instituto da industrialização por conta de terceiro uma abrangência mais restrita, não é toda e qualquer industrialização por encomenda que pode se valer da disciplina legal dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
13.2. Com efeito, na acepção clássica do instituto da industrialização por conta de terceiro, visualizou-se a situação de o autor da encomenda fornecer todas — ou, senão, ao menos, as principais — matérias-primas empregadas na industrialização, enquanto ao industrializador cabe o fornecimento essencialmente da mão de obra, apenas com eventual acréscimo de alguma matéria-prima secundária. E essa é a hipótese normatizada pelos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
13.3. Diferentemente, nos casos de industrialização por encomenda, em que o industrializador adquire por conta própria as matérias-primas substanciais a serem aplicadas na industrialização, sem intermédio do autor da encomenda, não há que se falar na sistemática dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, recaindo-se nas regras ordinárias do ICMS. É relevante frisar, nesse ponto, que no caso em análise o encomendante envia para a Consulente a água utilizada no processo.
13.4. Ademais, ressalte-se mais uma vez que a preponderância dos insumos enviados pelo encomendante, em relação ao custo, é imprescindível para que fique de fato caracterizada a industrialização por conta e ordem de terceiros. Nesse sentido, é importante anotar que a presente resposta é dada com base nas informações relatadas pela Consulente, de que adquire o principal insumo utilizado no processo (cavacos de madeira), recebendo do encomendante apenas uma parcela ínfima dos materiais empregados na geração da energia (água).
13.5. O disposto no subitem anterior é de fundamental relevância, uma vez que o escopo da consulta tributária limita-se à solução de dúvidas quanto à interpretação e aplicação da legislação tributária, nos termos apresentados pela Consulente, não servindo como meio hábil para a comprovação de que o relatado corresponde à realidade e, por consequência, como uma certificação de sua validade. Ou seja, a presente resposta será fornecida em tese e somente terá validade caso a operação em análise caracterize-se, de fato, como uma industrialização por encomenda.
13.6. Traduzindo para o caso concreto: a presente resposta não serve como certificação de que os materiais fornecidos pela Consulente (cavacos de madeira) são preponderantes, quanto ao custo, em relação aos materiais enviados pelo encomendante (água) para o processo de produção de energia. Caberá à Consulente, portanto, fornecer os meios necessários à comprovação da ocorrência da situação fática relatada – de que fornece a parcela substancial dos insumos - por meio dos instrumentos contábeis apropriados, caso seja chamada à fiscalização.
13.7. Estabelecidas tais condições e premissas, não são aplicáveis as regras previstas nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, c/c a Portaria CAT 22/2007 e a Decisão Normativa CAT 02/2003; no entanto, caso tais pressupostos não se confirmem, poderá a Consulente formular nova consulta, informando mais detalhes sobre o caso concreto.
14. Nesse passo, partindo do pressuposto que o industrializador utiliza matéria-prima predominantemente própria, o encomendante é mero adquirente e não fabricante do vapor.
15. Não sendo aplicáveis as regras de industrialização por conta de terceiro relativamente às operações entre a Consulente e o autor da encomenda, as saídas de insumos promovidas pelo encomendante serão regularmente tributadas, podendo os agentes envolvidos aproveitar eventual crédito do imposto, desde que respeitadas as regras estabelecidas nos artigos 61 e seguintes do RICMS/2000.
16. Portanto, para a remessa de insumos do encomendante para o industrializador, regularmente tributada, sem a suspensão do ICMS, deve ser emitida Nota Fiscal consignando o CFOP 5.949 (“outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificada”), cabendo, ainda, informar no documento fiscal tratar-se de “remessa de insumos para utilização em estabelecimento de terceiros” e efetuar o destaque do imposto.
17. A remessa dos produtos prontos do estabelecimento industrializador (Consulente) para o encomendante deverá ser regularmente tributada, utilizando CFOP referente à venda de produção do estabelecimento e o valor da operação deve corresponder ao total do produto, incluindo o valor dos insumos remetidos pelo autor da encomenda.
18. Em prosseguimento, entendemos oportuna a transcrição do artigo 350, inciso VII, do RICMS/2000:
“Artigo 350 - O lançamento do imposto incidente nas sucessivas saídas dos produtos a seguir indicados, com exceção das operações previstas no artigo 351-A, fica diferido para o momento em que ocorrer:
(...)
VII - madeira de pinus, de araucária ou de eucalipto, em tora, torete, cavacos ou resíduos de madeira, exceto quando destinados à indústria de aglomerado ou de compensado:
a) sua saída para outro Estado;
b) sua saída para o exterior;
c) a saída dos produtos resultantes de sua industrialização, ainda que decorrente de simples desbaste ou serragem; ”
19. Da leitura do artigo acima, bem como da Decisão Normativa CAT 06/2016, conclui-se que, como o cavaco de madeira, conforme mencionado pela Consulente, enquadra-se, por sua descrição e classificação na NCM, como mercadoria de que trata o inciso VII do artigo 350 do RICMS/2000, encerrar-se-á o diferimento no momento em que ocorrer a saída do produto resultante de sua industrialização (“energia biomassa”), devendo o imposto diferido ser recolhido na saída dos produtos resultantes da industrialização.
20. Quanto ao direito ao crédito, é importante destacar que o imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação ou prestação com o anteriormente cobrado por este ou outro Estado, relativamente à mercadoria entrada ou à prestação de serviço recebida, nos termos do artigo 59 do RICMS/2000. Portanto, o direito ao crédito restringe-se, em regra, ao valor do imposto cobrado nas operações anteriores. No caso em análise, considerando que a aquisição do cavaco de madeira ocorreu sob o abrigo do diferimento, sem destaque do imposto, não há que se falar em direito a crédito sobre imposto anteriormente cobrado.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.