Resposta à Consulta nº 20346 DE 24/03/2020
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 25 mar 2020
ICMS – Incidência – Comércio eletrônico – Estabelecimento que recebe e envia mercadorias realizando atividade fundamental para a conclusão do negócio. I. A atividade econômica que envolve a realização de atividades fundamentais para a conclusão do negócio, assumindo a responsabilidade pelas condições das mercadorias comercializadas e com movimentação física através de estabelecimento constituído (recebimento do proprietário original e envio ao consumidor final) caracteriza-se como circulação de mercadoria e se sujeita à incidência do ICMS. II. Aquele que receber e remeter mercadorias nessas condições é considerado contribuinte do imposto.
Ementa
ICMS – Incidência – Comércio eletrônico – Estabelecimento que recebe e envia mercadorias realizando atividade fundamental para a conclusão do negócio.
I. A atividade econômica que envolve a realização de atividades fundamentais para a conclusão do negócio, assumindo a responsabilidade pelas condições das mercadorias comercializadas e com movimentação física através de estabelecimento constituído (recebimento do proprietário original e envio ao consumidor final) caracteriza-se como circulação de mercadoria e se sujeita à incidência do ICMS.
II. Aquele que receber e remeter mercadorias nessas condições é considerado contribuinte do imposto.
Relato
1. A Consulente, segundo consulta ao Cadastro de Contribuintes de ICMS do Estado de São Paulo (CADESP), tem como atividade principal a “intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral, exceto imobiliários” de código 74.90-1/04 na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), e como atividades secundárias o comércio varejista de artigos esportivos (CNAE 47.63-6/02), de artigos do vestuário e acessórios (CNAE 47.81-4/00), de calçados (CNAE 47.82-2/01), e de outros artigos usados (CNAE 47.85-7/99).
2. Informa ser responsável por aplicativo de celular no qual pessoas físicas podem anunciar produtos para venda.
3. Relata que o consumidor final consulta e adquire esses produtos pelo aplicativo da Consulente. Do total pago pelo adquirente, o aplicativo retém um percentual de comissão para a Consulente, e repassa o restante para o vendedor.
4. Informa que existe uma particularidade nos negócios realizados pela Consulente, que é a de avaliar e garantir, ao consumidor final, que os produtos são originais e estão em perfeitas condições de uso. Para tanto, assim que confirmadas as vendas, recebe as mercadorias dos proprietários, e, após análises, se aprovadas, são remetidas para o adquirente.
5. Em caso de devoluções de mercadorias pelos adquirentes, elas retornam para a Consulente, para garantir a autenticidade e condições dos produtos, que, após análises, se aprovados, são remetidos de volta para seus proprietários originais.
6. Diante do exposto, questiona se a movimentação de produtos mencionada caracteriza a Consulente como contribuinte do ICMS, ou se pode considerar-se apenas como prestadora de serviços de intermediação de negócios.
Interpretação
7. Inicialmente, tendo em vista que a Consulente não informou se os vendedores “pessoas físicas”, por habitualidade e volume, enquadram-se como contribuintes do ICMS, tampouco quais mercadorias são negociadas pelo seu aplicativo, não iremos analisar as movimentações de remessa para o seu estabelecimento ou a tributação aplicável aos produtos negociados. Assim, consideraremos, como premissa, tratar-se de dúvida sobre o enquadramento da Consulente enquanto contribuinte do ICMS, diante das operações descritas.
8. A Consulente informa que, por meio do seu aplicativo, oferece ao público mercadorias de terceiros, permitindo ao potencial consumidor conhecer as mercadorias e adquiri-las. As propostas feitas pelo consumidor incluem, com a compra, a garantia de origem e condições de uso e a entrega. O consumidor, portanto, não tem autonomia para desvincular a compra do serviço oferecido pela Consulente.
9. Para execução dos seus serviços, após finalizada a negociação de compra e venda, a Consulente recebe os produtos no seu estabelecimento remetidos pelos proprietários, faz a análise necessária e, caso aprovados, envia para os consumidores.
10. Cabe-nos, nesse ponto, efetuar esclarecimentos acerca da operação de intermediação. Para tanto, transcrevemos o conceito de intermediação, detalhado pelo jurista Bernardo Ribeiro de Moraes, na obra “Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços” (1ª edição, Editora RT, pgs. 306 e 307):
“Intermediação é palavra indicativa do modo de operar da pessoa. Intermediário é quem exerce a aproximação entre duas ou mais pessoas que desejam negociar. É também conhecida como corretagem, contrato pelo qual uma pessoa se obriga, mediante remuneração, aproximar as partes para a conclusão de um negócio. O intermediário ou corretor não aplica capital próprio para a realização do negócio. É simples intermediário entre as partes contratantes. (...)
A intermediação ou mediação tem certas características, visto a natureza sui generis da atividade, que devem ser lembradas, a fim de melhor a entendermos e a diferenciarmos dos demais contratos. Já dissemos:
a) Na mediação, o objeto do contrato é o resultado útil do serviço prestado, o evento conseguido com o trabalho do mediador. Ao comitente, interessa o resultado da tarefa, ou melhor, que o mediador consiga o terceiro que preencha as condições da opção;
b) Na mediação, há o caráter incerto da remuneração de quem presta o serviço. (...)
c) Na mediação, o mediador não se acha preso ao comitente por vínculo de subordinação. (...)
d) Na mediação, o mediador não age em nome do comitente, não o representa e nem o substitui. Atua o intermediário em nome próprio, uma vez que a opção não se identifica com a procuração. (...)
e) Na mediação, o mediador não é parte no negócio. Não contrata e nada conclui. Simples intermediário, limita-se ele a aproximar as partes e provocar o seu ajuste, conduzindo-as ao fechamento do negócio.” (grifos nossos)
11. Denota-se claramente que o intermediário, por agir em nome próprio e sem subordinação ao comitente, não toma parte no negócio, não figura no contrato de compra e venda firmado entre as partes contratantes e não assume responsabilidade pelo bem comercializado, servindo apenas para aproximar as partes interessadas em negociar.
12. Presentes esses requisitos, restará caracterizada a intermediação, serviço previsto no item 10 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 e sujeito, portanto, ao ISS (Imposto sobre Serviços), de competência municipal.
13. Porém, as atividades exercidas pela Consulente parecem extrapolar o serviço citado acima, de modo que a sua intervenção no negócio jurídico não se restringe à aproximação entre o vendedor e o comprador, sendo, ao contrário, determinante para que este último opte por adquirir a mercadoria. Nesse sentido, é relevante anotar que:
13.1. A Consulente recebe as mercadorias em seu estabelecimento e as remete (ao que tudo indica, por sua própria conta) ao consumidor final após as análises pertinentes quanto às suas condições e originalidade (aspecto fundamental para a conclusão do negócio), havendo, portanto, uma efetiva circulação da mercadoria promovida pela Consulente;
13.2. O pagamento realizado pelo consumidor não é feito diretamente ao proprietário original da mercadoria comercializada, mas através da plataforma eletrônica criada e gerida pela Consulente.
14. Dessa forma, entendemos que a atividade exercida pela Consulente não se limita à intermediação ou mediação entre as partes contratantes. Ao contrário, ela age em nome próprio e realiza atividades fundamentais para a conclusão do negócio, assumindo inclusive a responsabilidade pelas condições das mercadorias comercializadas, movimentando-as através de seu estabelecimento constituído, em recebimento do proprietário original e no envio ao consumidor final, o que a caracteriza como contribuinte do ICMS e sujeita suas operações à incidência do imposto estadual.
15. Nesse ponto, reproduzimos o artigo 2º e seu inciso I, o artigo 9º, e o caput do artigo 19 e seu inciso XVI, todos do RICMS/2000:
“Artigo 2º - Ocorre o fato gerador do imposto (Lei 6.374/89, art. 2º, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, II, e Lei Complementar federal 87/96, art. 12, XII, na redação da Lei Complementar 102/00, art. 1º):
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
(...)
Artigo 9º - Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que de modo habitual ou em volume que caracterize intuito comercial, realize operações relativas à circulação de mercadorias ou preste serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação (Lei 6.374/89, art. 7º, na redação da Lei 9.399/96, art. 1°, III).
(...)
Artigo 19 - Desde que pretendam praticar com habitualidade operações relativas à circulação de mercadoria ou prestações de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação, deverão inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes do início de suas atividades (Lei 6.374/89, art. 16, na redação da Lei 12.294/06, art. 1º, IV):
(...)
XVI - as demais pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou privado que praticarem, habitualmente, em nome próprio ou de terceiro, operações relativas à circulação de mercadoria ou prestações de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação.” (grifos nossos)
16. Dessa forma, por promover a circulação de mercadorias (artigo 9º do RICMS/2000), a Consulente é contribuinte do ICMS, ocorrendo o fato gerador do imposto nas saídas dos produtos do seu estabelecimento (artigo 2º, inciso I, do RICMS/2000), e deve cumprir com as obrigações principais e acessórias previstas no Regulamento do ICMS.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.