Resposta à Consulta nº 18715 DE 27/02/2019
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 21 mar 2019
ICMS – Industrialização por conta de terceiro – Fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros – Hipóteses de incidência do ICMS e ISSQN. I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, caracteriza-se como industrialização por conta de terceiro e se sujeita à incidência somente do imposto estadual. II. A fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros, para a realização de análises e adequação de projetos, sem que ocorra comercialização ou industrialização posterior, constitui hipótese de não incidência do ICMS, conforme previsão do inciso VIII do artigo 7º do RICMS/2000.
Ementa
ICMS – Industrialização por conta de terceiro – Fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros – Hipóteses de incidência do ICMS e ISSQN.
I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, caracteriza-se como industrialização por conta de terceiro e se sujeita à incidência somente do imposto estadual.
II. A fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros, para a realização de análises e adequação de projetos, sem que ocorra comercialização ou industrialização posterior, constitui hipótese de não incidência do ICMS, conforme previsão do inciso VIII do artigo 7º do RICMS/2000.
Relato
1. A Consulente, que exerce a atividade principal de “fabricação de outros produtos de metal não especificados anteriormente” (CNAE 25.99-3/99), informa que é contratada por terceiros para efetuar fabricação por encomenda e que os produtos por ela desenvolvidos são, em sua maioria, incorporados a um outro bem, este, por sua vez, fabricado por sua contratante.
2. Informa ainda que também fabrica protótipos de peças e de veículos para terceiros (indústria automobilística) com o objetivo de realização de análises e adequação de projetos. Menciona que “as maquetes, além de orientar a equipe de projetos na correção de eventuais erros de design, também são utilizadas pela contratante (montadora) em eventos, tais como “Salão de Automóveis”, para expor os futuros lançamentos da empresa”.
3. Menciona que os produtos por ela fabricados se destinam ao processo produtivo de indústrias, seja para serem incorporados ao produto final posto à venda ao consumidor, seja para utilização na avaliação técnica sobre a viabilidade do projeto desenvolvido pelo seu contratante.
4. Expõe seu entendimento de que as operações citadas devem ser consideradas como industrialização por conta de terceiro, conforme disposto no artigo 402 do RICMS/2000 e Portaria CAT 22/2007 (transcritos na consulta), sujeitas à tributação pelo ICMS, alegando que em tais operações a empresa contratante envia o insumo (placa de aço, de alumínio ou de isopor) e a Consulente fabrica algo novo que irá retornar à contratante para uso no processo industrial. Cita que nessas operações a contratante envia os insumos com o CFOP 5901 (remessa para industrialização por encomenda) e a Consulente retorna o produto fabricado com CFOP 5124 (industrialização efetuada para outra empresa).
5. Relata que o fisco da cidade de localização do estabelecimento está exigindo o recolhimento do ISSQN sobre as referidas operações por entender que se trata de beneficiamento de qualquer objeto enquadradas no item 14.05 da Lei Complementar 116/2003 (“14.05 – Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos quaisquer”).
6. Diante do exposto, questiona se as aludidas operações devem ser consideradas como industrialização por conta de terceiro, aplicando-se a elas o disposto no artigo 402 do RICMS/2000 e Portaria CAT 22/2007 e, dessa forma, sujeitas à tributação pelo ICMS.
Interpretação
7. Primeiramente, com base nas informações fornecidas na consulta, cabe esclarecer que, em nosso entendimento, o questionamento da Consulente se refere a duas operações distintas:
7.1. industrialização por conta de terceiro de mercadoria que será posteriormente revendida ou incorporada a outro bem para posterior comercialização, em que o autor da encomenda envia os insumos predominantemente utilizados no processo produtivo;
7.2. fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros para a realização de análises e adequação de projetos.
8. Feita essa consideração, passamos a analisar o primeiro tipo de operação (industrialização por conta de terceiro). Salienta-se que essa matéria já foi analisada por esta Consultoria Tributária em diversas ocasiões, como nas Respostas às Consultas 16431/2017, 15435/2017, 11894/2016, 11759/2016, 6190/2015, 4778/2015, 2467/2013, 238/2012, 204/2012, 189/2012, 177/2012 e 705/2009, todas publicadas no sítio desta Secretaria da Fazenda (www.portal.fazenda.sp.gov.br), através do caminho “Acesso à informação/Tributos-Legislação, Benefícios e Indicadores/Legislação Tributária/Respostas de Consultas”.
9. Nesse sentido, reitera-se o posicionamento desta Consultoria de que a industrialização executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização, é a industrialização prevista no artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000, sendo, nesse caso, industrialização por conta de terceiro. E, em sendo industrialização por conta de terceiro, o ICMS incide sobre essa atividade na medida em que essa industrialização está inserida no ciclo de produção e comercialização da mercadoria. Ou seja, a atividade é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização pelo autor da encomenda e não prestação de serviço a consumidor usuário final.
10. Com efeito, é notório que a Constituição Federal, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).
11. Nesse contexto, especificamente no que tange ao ICMS, ele incide sobre as “operações relativas à circulação de mercadorias”, que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Tais operações implicam a obrigação de dar (a mercadoria), mas, no entanto, em algum momento da cadeia produtiva, pode surgir, concomitantemente ou não, uma “obrigação de fazer”, sem que isso altere a natureza da operação.
12. Diante disso, a mesma atividade realizada - com ou sem emprego de materiais - pode constituir-se uma operação de industrialização voltada à mercancia (ICMS) ou uma prestação de serviço (ISSQN). Com efeito, o fato de determinada atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 como prestação de serviço sujeita ao ISSQN, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (art. 2º, inciso III, alínea “a”, do RICMS/2000).
13. Negar essa constatação e querer tributar por ISSQN o fornecimento de uma atividade, ainda que imaterial, envolta no ciclo produtivo, é ofender a não cumulatividade. Isso porque o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando-o, sem a possibilidade de compensação, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.
14. Além disso, não é razoável, ante as complexidades técnicas encontradas no ciclo produtivo, querer-se entender que a simples preponderância da atividade imaterial/intelectual, ou mesmo a produção personalíssima sob encomenda, seja um critério finito e único para a conceituação e definição de serviço para fins de incidência do ISSQN.
15. Sendo assim, a destinação da mercadoria sobre a qual é executada a atividade é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente.
16. Essa mesma linha de entendimento é atualmente seguida pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões sobre o tema de industrialização por encomenda, como pode ser observado das seguintes decisões: (i) ADI nº 4.389/DF-MC; (ii) AI nº 803.296/SP-AgR; e (iii) RE nº 606.960/ES-AgR – essas duas últimas de ementas bastante elucidativas, motivo pelo qual seguem excertos abaixo:
“1. Em precedente da Corte consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, restou definida a incidência de ICMS “sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria.
2. A verificação da incidência nas hipóteses de industrialização por encomenda deve obedecer dois critérios básicos: (i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos de industrialização.
(...)
4. À luz dos critérios propostos, só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar.” (AI nº 803.296/SP-AgR).
(...)
“3. Na industrialização por encomenda, se o bem retorna à circulação, tal processo industrial representa apenas uma fase do ciclo produtivo da encomendante, não estando essa atividade, portanto, sujeita ao ISSQN, como é o caso dos presentes autos.” (RE nº 606.960/ES-AgR)
17. Com efeito, na industrialização por conta de terceiro, sequer é necessário analisar a preponderância entre o dar e o fazer, já que a industrialização por conta de terceiro é uma etapa do processo produtivo em que terceiro executa atividade em mercadoria alheia que posteriormente será comercializada ou se submeterá a outro processo de industrialização. Dessa feita, a industrialização por conta de terceiro se configura como etapa do processo de circulação de mercadoria e deve ser tributada pelo ICMS.
18. Com relação ao tipo de operação do subitem 7.2 (fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros), com base no relato da Consulente, a presente resposta partirá dos seguintes pressupostos: a) de que a Consulente é também empresa prestadora de serviços; b) de que a Consulente não exerce a atividade de comercialização dos bens fabricados a título de protótipos, na medida em que sua obrigação jurídica contratual se perfaz com a elaboração de alguns protótipos (que na verdade são a ideia/concepção de um novo produto, não havendo escala industrial em sua produção; c) de que na aquisição dos materiais a serem utilizados na prestação dos serviços e confecção dos protótipos a Consulente recebeu estes materiais com a tributação do ICMS, e que estas aquisições destes materiais foram acompanhadas de documento fiscal; d) de que os protótipos produzidos são apenas concepções de um novo produto (mas não a comercialização do produto final em si; e) de que se estes produtos passarem a ser produzidos em caráter comercial, seja pela Consulente ou por outra empresa, haverá a tributação desses produtos pelo imposto estadual, já que não haverá propriamente a prestação de um serviço.
19. Com base nisso, e considerando o disposto nos itens 8 a 17 dessa resposta, observamos que a confecção de protótipos para a realização de análises e adequação de projetos, em oficina própria, a partir de projeto encomendado por cliente específico e desenvolvido pela Consulente, sem caráter de produção em escala, está compreendida entre os serviços executados por prestador de serviços (sujeitos ao ISSQN).
20. Logo, as operações de saída do estabelecimento da Consulente dos protótipos, desenvolvidos a partir do projeto contratado para a realização de análises e adequação de projetos, não se sujeita à exigência do imposto estadual, por se tratar de saída de estabelecimento prestador de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como de competência tributária do município, de mercadoria a ser utilizada na prestação de tal serviço, conforme previsão do inciso VIII do artigo 7º do RICMS/2000, cabendo ao município de localização do estabelecimento o enquadramento de tal serviço em algum dos subitens da lista de serviços anexa à Lei Complementar 116/2003.
20.1. Adicionalmente, nos termos do § 2o do artigo 1o da Lei Complementar 116/2003, ressalvadas as exceções expressas na lista de serviços anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias; o que é o caso da situação fática.
21. Diante do exposto, em resposta ao questionamento, é possível concluir que a Consulente:
21.1. quando contratada para executar a atividade de industrialização, a pedido do encomendante, contribuinte do ICMS, em mercadoria que será revendida ou submetida a outro processo de industrialização e, posteriormente, comercializada, estará executando uma etapa do respectivo processo produtivo, ou seja, uma forma de industrialização por conta de terceiro (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), de modo que tais serviços sujeitam-se à incidência do ICMS. Nessa situação, em que o autor da encomenda envia os insumos predominantemente utilizados no processo produtivo, deverão ser observadas as disposições dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000 e Portaria CAT 22/2007, quando aplicável; e
21.2. quando contratada para fabricação de protótipos de peças e de veículos para terceiros, para a realização de análises e adequação de projetos, sem que ocorra a comercialização ou industrialização posterior do protótipo produzido pela Consulente, estará desenvolvendo uma atividade não sujeita à incidência do ICMS, conforme previsão do inciso VIII do artigo 7º do RICMS/2000. E, caso tal atividade esteja compreendida em algum dos itens do Anexo Único da Lei Complementar nº 116/2003, estará sujeita à incidência do ISSQN.
22. Por fim, caso já tenham sido efetuadas operações em desacordo com a presente resposta, a Consulente deverá buscar orientação junto ao Posto Fiscal a que se vinculam suas atividades quanto aos procedimentos necessários para a regularização da situação, podendo se valer do instituto da denúncia espontânea do artigo 529 do RICMS/2000.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.