Resposta à Consulta nº 15652 DE 18/08/2017

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 25 ago 2017

ICMS – Operação de circulação de mercadoria – Fornecimento de mercadoria precedida de atividade imaterial – Incidência – Base de cálculo. I. As operações relativas à circulação de mercadorias (e, portanto, sob a égide do ICMS) são fundamentalmente aquelas que, circunscritas num contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. II. Tais operações implicam, via de regra, em uma obrigação de dar (a mercadoria), concomitantemente ou não, com uma “obrigação de fazer”, sem que isso altere a natureza da operação. III. Uma atividade essencialmente comercial, ainda que precedida de uma atividade imaterial, não pode ser considerada como uma prestação de serviço. IV. Não há como cindir a base de cálculo do ICMS, subdividindo o valor da operação em valor de revenda da mercadoria e eventual valor de uma atividade imaterial praticada em função dessa revenda. V. O fato gerador do ICMS ocorre tanto na “saída de mercadoria, a qualquer título”, como na “na transmissão de propriedade de mercadoria ou de título que a represente, quando esta não transitar pelo estabelecimento do transmitente” (artigo 2º, inciso II e VIII, do RICMS/2000), e, em ambos os casos, a base de cálculo é o valor da operação (artigo 37, inciso I do RICMS/2000) sendo que “demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas” incluem-se na base de cálculo do ICMS (artigo 37, § 1º, item 1, do RICMS/2000).

ICMS – Operação de circulação de mercadoria – Fornecimento de mercadoria precedida de atividade imaterial – Incidência – Base de cálculo.

I. As operações relativas à circulação de mercadorias (e, portanto, sob a égide do ICMS) são fundamentalmente aquelas que, circunscritas num contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final.

II. Tais operações implicam, via de regra, em uma obrigação de dar (a mercadoria), concomitantemente ou não, com uma “obrigação de fazer”, sem que isso altere a natureza da operação.

III. Uma atividade essencialmente comercial, ainda que precedida de uma atividade imaterial, não pode ser considerada como uma prestação de serviço.

IV. Não há como cindir a base de cálculo do ICMS, subdividindo o valor da operação em valor de revenda da mercadoria e eventual valor de uma atividade imaterial praticada em função dessa revenda.

V. O fato gerador do ICMS ocorre tanto na “saída de mercadoria, a qualquer título”, como na “na transmissão de propriedade de mercadoria ou de título que a represente, quando esta não transitar pelo estabelecimento do transmitente” (artigo 2º, inciso II e VIII, do RICMS/2000), e, em ambos os casos, a base de cálculo é o valor da operação (artigo 37, inciso I do RICMS/2000) sendo que “demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas” incluem-se na base de cálculo do ICMS (artigo 37, § 1º, item 1, do RICMS/2000).

Relato

1. A Consulente, por sua CNAE (46.93-1/00), comerciante atacadista de mercadorias, ingressa com sucinta consulta questionando, em suma, se a falta de margem de lucro na operação de revenda, envolta num contexto maior de atividade de gerenciamento de estoque, poder-se-ia configurar conduta anticompetitiva e se existiria preço mínimo de revenda.

2. Nesse contexto, a Consulente informa que, atualmente, presta serviços na área de representação comercial e gestão de estoque, sendo que o primeiro consiste em atividades relacionadas ao levantamento da necessidade de aquisição de mercadorias de uso e consumo, orçamentos de valores de mercado e negociações diretamente com os fornecedores e o segundo, em atividades relacionadas ao recebimento, conferência de mercadorias, organização e disposição física dos materiais de uso ou consumo, dentro das instalações do cliente. Ambos os serviços estão sendo tributados pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS.

3. Ocorre que, em uma reestruturação da operação, pretende a Consulente passar a adquirir em seu próprio nome os materiais que são atualmente negociados e adquiridos em nome do cliente e repassá-los para o cliente ao mesmo preço da aquisição, ou seja, sem a inclusão de margem de lucro (mark-up). Pretende efetuar esse repasse por meio de notas fiscais de revenda de mercadoria, valendo-se dos CFOPs 5.102 e 5.405.

4. Relata que tal modelo negocial reestruturado tem a finalidade de eliminar a complexidade da gestão dos processos internos do cliente e passará a ser uma etapa da prestação de serviço de representação comercial, onde já estão inclusos os custos operacionais e o mark-up da Consulente. E, sendo assim, ressalta que a nota fiscal de serviços de representação comercial continuará sendo tributada pelo ISS, ao passo que a nota de revenda de mercadorias será tributada pelo ICMS.

5. Portanto, entende que a operação não tem objetivo de lucro sobre a revenda, visando apenas realizar uma solução operacional por meio da prestação de serviço de representação comercial e gestão de estoque, operações sob as quais considera que não há incidência de ICMS.

6. Sob essa ótica questiona se a revenda das mercadorias pelo mesmo valor da aquisição poderia caracterizar conduta anticompetitiva perante a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo e se existe mark-up mínimo para composição do preço final de revenda?

Interpretação

7. Preliminarmente, tendo em vista que a Consulente embasou a apresentação da consulta sobre os dispositivos legais atinentes ao fato gerador do ICMS e sua correspondente base de cálculo, bem como considerando que não é competência dessa Consultoria avaliar condutas anticoncorrenciais, parte-se da premissa de que o real intuito da presente consulta é saber se a operação de revenda que a Consulente pretende praticar, no seio do seu negócio de representação comercial e gerenciamento de estoque, está abrangida pela incidência de ICMS e é sobre essa ótica que será respondida.

8. Ressalta-se, contudo, que, ante as parcas informações acerca do atual modelo negocial da Consulente, a presente análise está adstrita apenas à análise do modelo proposto.

9. Feitas essas considerações preliminares, registra-se o entendimento desta Consultoria Tributária no sentido de que a operação praticada pela Consulente situa-se no campo de incidência do ICMS.

10. Com efeito, primeiramente, diga-se que, independentemente da operação ser ou não de venda ou revenda, o ICMS incide sobre todas as “operações relativas à circulação de mercadorias”.

11. Nesse sentido, salienta-se que este órgão consultivo tem expedido o entendimento de que, sob a repartição constitucional da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que se encontra (industrial – União; comercial – Estados; e prestação de serviços – Municípios), as operações relativas à circulação de mercadorias (e, portanto, sob a égide do ICMS) são fundamentalmente aquelas que, circunscritas num contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final.

12. Tais operações implicam, via de regra, em uma obrigação de dar (a mercadoria), concomitantemente ou não, com uma “obrigação de fazer”, sem que isso altere a natureza da operação (havendo, inclusive a possibilidade de incidência de ICMS sobre o fornecimento isolado de uma atividade imaterial, desde que envolta em alguma etapa da cadeia do ciclo de produção e comercialização da mercadoria, ressalta-se).

13. Dessa feita, o fato de a atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03, como prestação de serviço sujeita ao ISS, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (art. 2º, inciso III, “a”, do RICMS/2000).

14. Negar essa constatação e tributar pelo ISS o fornecimento de uma atividade envolta no ciclo produtivo, mesmo que imaterial, é ofender a não cumulatividade, já que o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando a operação, sem a possibilidade de compensação e, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.

15. Ademais, como mencionado acima, a Constituição Federal dispôs que compete aos Estados a tributação sobre as operações relativas à circulação de mercadorias (artigo 155, inciso II) e aos Municípios, a tributação sobre os serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, e definidos em lei complementar (artigo 156, inciso III). Logo, dois requisitos mínimos são exigidos para que se considere determinada prestação de serviço abrangida pela competência municipal: (i) o serviço não pode estar compreendido no campo de incidência do imposto estadual; e (ii) o serviço deve estar previsto em lei complementar.

16. Sendo assim, a lista anexa à Lei Complementar deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, uma vez que, por óbvio, a legislação infraconstitucional não pode contrariar as disposições constitucionais. Desse modo, uma atividade essencialmente comercial, ainda que precedida de uma atividade imaterial, não pode ser considerada como uma prestação de serviço (ISS). Considerar uma atividade econômica essencialmente comercial como inserida no campo de competência municipal representaria um desvirtuamento do próprio texto constitucional, que expressamente insere a circulação de mercadoria no campo de competência estadual (ICMS).

17. Feitas essas explanações teóricas, observa-se que a atividade pretendida pela Consulente, circunscritas num contexto empresarial, não só se insere em uma etapa dentro do ciclo de comercialização da mercadoria (ICMS), auxiliando a impulsioná-la da fonte produtora ao consumidor final, como também agrega valor a ela, fornecendo, em conjunto, uma atividade imaterial (adequada logística de aquisição e distribuição das mercadorias).

18. Com efeito, em seu novo modelo negocial, ao passar a adquirir as mercadorias em nome próprio e repassá-las aos seus clientes, a Consulente acaba por praticar, senão a circulação física de mercadorias, a jurídica. Ou seja, em outras palavras, no bojo do seu novo modelo negocial, no intuito de fornecer uma melhor atividade de representação comercial e gerenciamento de estoque, a Consulente encampa a atividade de revenda, inserindo-se, assim, por completo no ciclo de comercialização da mercadoria e, consequentemente, acaba por atrair a integral tributação de sua atividade pelo ICMS.

19. Desse modo, ao contrário do que alega a Consulente, não há uma revenda cujo valor da operação seria igual ao de aquisição acrescida de uma prestação de serviço dela desconexa. Do oposto, há uma revenda com agregação de valor à mercadoria. E, sendo assim, não há como cindir a base de cálculo, subdividindo o valor da operação em valor de revenda da mercadoria e eventual valor de uma atividade imaterial praticada em função dessa revenda.

20. É nesse contexto que o fato gerador do ICMS ocorre tanto na “saída de mercadoria, a qualquer título”, como na “na transmissão de propriedade de mercadoria ou de título que a represente, quando esta não transitar pelo estabelecimento do transmitente” (artigo 2º, inciso II e VIII, do RICMS/2000), e, em ambos os casos, a base de cálculo é o valor da operação (artigo 37, inciso I do RICMS/2000). E, tornando claro que quaisquer importâncias pagas, recebidas ou debitadas integram o valor da operação, o RICMS traz expressamente que se inclui na base de cálculo os “seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas” (artigo 37, § 1º, item 1, do RICMS/2000).

21. Por fim, resta ainda esclarecer que, mesmo que para fins privados as partes tenham total liberdade para fixar os termos contratuais que lhes convier, esses termos não se repercutem necessária e automaticamente na esfera tributária. Dessa feita, ainda que as partes tenham acordado de modo diverso (ex.: revenda cumulada com prestação de serviços), os tributos não incidem, ipsis litteris, sobre o contrato tal como acordado (mera qualificação jurídica dada pelas partes), mas sim, sobre a materialidade do fato econômico subjacente ao contrato e  efetivamente praticado. E o ICMS, como visto, incide sobre a operação de circulação de mercadoria, tendo o legislador eleito como critério quantitativo da incidência do tributo o valor da operação. Portanto, tendo praticado uma operação de circulação de mercadoria, não pode o particular, por mera convenção entre as partes, alterar os critérios de tributação.

22. Sendo assim, ante todo o exposto, conclui-se que há a incidência do ICMS sobre a operação de revenda pretendida e as demais importâncias cobradas a título de representação e gerenciamento devem integrar a base de cálculo do imposto estadual.

23. Com isso, dá-se por respondidos os questionamentos efetuados pela Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.