Resolução de Consulta DLO nº 21 DE 30/04/2022
Norma Estadual - Pernambuco - Publicado no DOE em 30 abr 2022
ICMS. Construção civil (CNAE: 41.20-4-00). Incorporação direta. Obra própria. Transferências de materiais e bens próprios entre empreendimentos próprios (canteiro fixo e canteiro de obra). Requisitos de admissibilidade não preenchidos.
RESOLUÇÃO DE CONSULTA N° 21/2022. PROCESSO N° 1500000085.000165/2022-15. CONSULENTE: TENDA NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS S.A.. CNPJ: 09.625.762/0001-58. ADVS: HUGO FUNARO, OAB/SP Nº 169.029, CAMILA CORREIA DE ARAÚJO BARBOSA, OAB/SP Nº 343.647.
EMENTA: ICMS. Construção civil (CNAE: 41.20-4-00). Incorporação direta. Obra própria. Transferências de materiais e bens próprios entre empreendimentos próprios (canteiro fixo e canteiro de obra). Requisitos de admissibilidade não preenchidos.
A Diretoria de Legislação e Orientação Tributárias - DLO, no exame do processo acima identificado, resolve não acolher a consulta, nos termos do caput do artigo 56, do caput do artigo 57 e dos incisos I e VIII do § 3° do artigo 60 da Lei n° 10.654, de 27 de novembro de 1991, c/c arts. 2º, 6º e 119 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, nos seguintes fundamentos, respectivamente:
1. A Consulente não é contribuinte do imposto. Vedação expressa fixada na legislação tributária acerca de concessão de inscrição no Cadastro de Contribuintes do Estado de Pernambuco - Cacepe à empresa de construção civil.
2. A Consulente demonstra e comprova ter pleno conhecimento da legislação tributária estadual incidente sobre a situação e os fatos relatados, especialmente quanto a não incidência do ICMS, a não obrigatoriedade de emissão de documentos fiscais próprios e à vedação de inscrição no Cacepe.
3. Não cabe à Administração Tributária do Estado de Pernambuco se pronunciar acerca de procedimentos firmados no âmbito de competência legislativa e administrativa tributárias de outra UF. Não acolhimento.
RELATÓRIO
1. Nos termos do estatuto social e conforme afirma, a Consulente é uma sociedade empresária, não inscrita no Cadastro de Contribuintes do Estado de Pernambuco – Cacepe[1], com sede na cidade de São Paulo, cuja descrição da principal atividade econômica é de “construção de edifícios” do código “41.20-4-00” da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE, e com filial em PE[2].
2. A Consulente informa que desempenha atividade econômica “no setor da construção civil, na qualidade de incorporadora que realiza obras próprias, em terrenos de sua propriedade, bem como
atividades conexas e correlatas ou subsidiárias que, direta ou indiretamente, se relacionam ao seu objeto social”, e repisa que “os empreendimentos construídos são de titularidade da própria Consulente”, que “não realiza atividades em favor de terceiros”, e que assume “todos os riscos do negócio (...), cujo objetivo final é a venda de unidades residenciais populares”.
3. A fim de racionalizar as atividades relacionadas à construção dos seus empreendimentos, em suas palavras, “a Consulente optou por concentrar os materiais necessários à execução de seus diversos empreendimentos em um local específico no Estado de São Paulo, onde se situa o seu estabelecimento matriz. Dessa maneira, em vez de ocupar espaço nos canteiros de obras de cada empreendimento em curso, os itens são recebidos e armazenados em um único estabelecimento, denominado ‘canteiro fixo’. Nesse imóvel (‘canteiro fixo’), os materiais são separados de modo a permitir a sua posterior utilização na obra específica a que se destinam, conforme a necessidade, o que facilita a logística de compras e propicia economia de espaço nos locais das obras em andamento”.
4. Conforme expõe, “quando há a necessidade de utilização em uma das obras, os materiais necessários serão separados, embalados em um ‘kit’ específico e retirados do estabelecimento, de acordo com a ordem emitida pelo setor responsável pelo empreendimento em questão”, e que “a organização dos ‘kits’ em questão não resulta em produto novo, destinando-se apenas à separação dos materiais a serem empregados na edificação de cada obra”.
4.1 A Consulente afirma que não comercializa os materiais organizados em “kits”, destinando-se apenas para serem empregados na edificação de cada obra, e que “Assim, não há ato mercantil quando da sua remessa para as obras próprias. Além de os citados itens não se qualificarem como “mercadoria” – dado que o escopo da atividade da empresa é a construção de imóveis – é a própria construtora (Consulente) quem compra, recebe e consome os materiais na sua atividade de construção de empreendimentos em imóveis próprios, sem a figura da empreitada ou semelhantes”.
5. Expõe que, no contexto da petição, apresentou consulta formal e obteve respostas das Secretarias da Fazenda do Estado de São Paulo, do Rio de Janeiro e do Paraná.
6. A Consulente reitera que “é empresa de construção civil que (i) não realiza circulação de mercadorias, (ii) não presta serviços a terceiros (já que atua apenas na construção de empreendimentos próprios), (iii) nem tampouco produz mercadorias para emprego em obras de terceiros, o seu entendimento é de que não se reveste da qualidade de contribuinte do ICMS”.
7. Na petição, a Consulente indica e transcreve trechos de dispositivos da legislação tributária do Estado de Pernambuco que dispõem sobre a vedação de concessão de inscrição no Cacepe à empresa de construção civil, nos termos do § 3º do art. 109 do Decreto nº 44.650, de 30 de junho de 2017, do Decreto 38.460, de 30 de julho de 2012, e da Lei nº 14.697, de 11 de junho de 2012.
7.1. No entendimento exposto, afirma que a principal atividade econômica que desenvolve está classificada no item 4120-4/00 (Construção de edifícios) da CNAE, e que, em face ao disposto no Decreto nº 38.460, de 2012, não está obrigada à inscrição no cadastro de contribuintes, seja por sua filial paulista, seja por suas obras (filiais) situadas em território do Estado de Pernambuco.
8. Quanto à emissão de documentos fiscais, conclui a Consulente que, por não ser contribuinte do ICMS e nem efetuar a transferência de titularidade de mercadorias em suas atividades, não se submete à norma estabelecida no art. 122 do Decreto nº 44.650, de 2017, se observado o art. 20 do Convênio Sinief s/no, de 15 de dezembro de 1970, que alude hipóteses que envolvem a transferência da titularidade de mercadorias, e o Convênio Sinief nº 006, de 21 de fevereiro de 1989, cujas regras da obrigatoriedade da emissão de documento fiscal relativo à operação ou à prestação são aplicáveis aos contribuintes do ICMS que as promover.
8.1. As movimentações (transferências) de materiais próprios da construção civil entre o canteiro fixo e as obras, que são empreendimentos próprios, no termos em que expõe, a Consulente também entende que não estão enquadradas nas hipóteses normativas prescritas no art. 123 do Decreto nº 44.650, de 2017.
9. Reitera a Consulente que “não atua por empreitada, subempreitada ou administração, pois apenas constrói empreendimentos próprios, cujas unidades imobiliárias a própria Consulente aliena
posteriormente. Portanto, quando adquire materiais de forma centralizada em seu canteiro fixo (SP), a Consulente o faz na qualidade de consumidora final. Daí porque, não havendo intuito mercantil nas transferências que faz para emprego dos materiais em suas obras ao redor do País, não há que se falar em circulação de mercadorias, mas em mera movimentação de bens sem valor comercial”.
10. No item 3 da petição da consulta, por não atuar como prestadora de serviços, a Consulente expõe os motivos pelos quais entende que não há fato gerador do ICMS nas movimentações de materiais próprios, para consumo próprio, entre os empreendimentos próprios, e que assim também entende afastar a deflagração do recolhimento do imposto e ficar dispensada da inscrição estadual das obras das filiais envolvidas.
10.1. Reitera que “No modelo em exame, as remessas de materiais do ́canteiro fixo ́ da Consulente para as obras em curso não caracterizam operações mercantis e/ou circulação jurídica de mercadorias, apta a deflagrar a incidência do ICMS. A circulação de bens é meramente física, o que descaracteriza o fato gerador do imposto estadual mesmo em transações interestaduais, conforme orientação pacífica do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça:”.
10.2. Coleciona trechos de decisões do STF (Plenário – ARE 1255885 RG – Rel. Min. Dias Toffoli – J: 14/08/2020) e do STJ (1a Seção – REsp 1.125.133/SP – Rel. Min. Luiz Fux – DJe: 10/09/2010), e afirma que as referidas decisões foram reforçadas com o entendimento consubstanciado na Ação Declaratória de Constitucionalidade no 49 - Rio Grande do Norte.
10.3. Com base nos referidos posicionamentos jurisprudenciais, a Consulente faz a seguinte afirmação:
“Assim, ainda que as operações da Consulente envolvessem mercadorias – o que não é o caso – não haveria que se falar na incidência do imposto mercantil na situação em exame”.
10.4. A Consulente reassenta que, “no caso concreto, além de não haver operação de circulação (mas sim a mera movimentação de bens entre unidades do mesmo titular), não há sequer mercadoria, assim entendido o bem adquirido com a finalidade de revenda5. De fato, como mencionado, a Consulente adquire bens destinados ao emprego em suas obras de construção civil, na qualidade de consumidora final. Tal aquisição encerra o ciclo de tributação do ICMS, pois, ao ser destinado a consumo próprio, o bem perde a qualidade de mercadoria. Em decorrência, as movimentações posteriores desses bens, entre as filiais ou obras da Consulente, estão fora do campo de incidência do ICMS”.
10.5. Em entendimento colhido de orientação do STJ (EREsp 149.946/MS, Rel. Min. Ari Pargendler, Rel. p/ Acórdão Min. José Delgado, J: 06/12/1999), a Consulente afirma que, pelo fato de desenvolver obras próprias em imóveis de sua propriedade e por não atuar como prestadora de serviços, não fica submetida à aplicação da “ressalva da parte final do item 7.025 da lista de serviços anexa à Lei Complementar 116/2003, que permite a incidência do ICMS sobre ‘o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços’”.
11. Por fim, para dirimir “dúvidas quanto ao tratamento aplicável às remessas de materiais de construção do estabelecimento paulista da Consulente (canteiro fixo) para as suas obras próprias no Estado de Pernambuco”, a Consulente formula as seguintes perguntas:
“a. Está correta a interpretação de que as remessas de materiais de construção civil do canteiro fixo de obras (filial da Consulente que os armazena), situado no Estado de São Paulo, para as obras próprias da Consulente no Estado de Pernambuco, a fim de serem nelas empregados, estão fora do âmbito de incidência do ICMS?”
“b. Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, está correta a interpretação de que os estabelecimentos da Consulente (localizados nos Estados de São Paulo e Pernambuco) estão dispensados de se inscrever no CACEPE?”
“c. Os materiais adquiridos pela Consulente e armazenados/estocados no canteiro fixo poderão ser movimentados entre os seus estabelecimentos mediante a emissão de nota fiscal de simples remessa, sem destaque do ICMS e em nome da própria Consulente, conforme entendimento veiculado pela SEFAZ/SP?”
É o relatório.
MÉRITO
12. A consulta não será acolhida pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
13. Compete à Diretoria de Legislação e Orientação Tributárias responder às consultas[3].
14. A consulta está instruída com a “Ata de Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária”, realizada em 30 de abril de 2018, a consolidação do Estatuto Social da Consulente, lavrado na mesma data, e com o instrumento particular da procuração, de 03 de dezembro de 2021.
14.1. Preliminarmente, para fins de simples registro e sem prejuízo da Consulta (adoção de formalismo moderado, razões materiais objetivas e celeridade processual), quanto ao endereço da sede do estabelecimento da matriz da Consulente, observa- se que há divergência entre as informações prestadas na petição da consulta e as registradas na consolidação do Estatuto Social[4].
15. Cumpridos os requisitos, a forma e as condições estabelecidos na Lei nº 10.654, de 1991, fica assegurado ao sujeito passivo da obrigação tributária o direito de peticionar para dirimir dúvida sobre a interpretação e a aplicação da legislação relativa aos tributos estaduais[5], nos limites da capacidade tributária deste Órgão fixada por Lei[6] e da competência deste Estado estabelecida na Constituição Federal.
16. A Consulente, no exercício de sua atividade econômica principal de construção de edifícios (CNAE: 41.20-4-00), descrita no Estatuto Social[7], e nos termos dos fatos e da situação expostos na consulta, não é contribuinte do imposto (ICMS) instituído pelo Estado de Pernambuco.
17. O referido código “41.20-4-00” (“construção de edifícios”) da principal atividade econômica declarado pela Consulente, constante no “Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral” da Receita Federal do Brasil, não é de interesse para fins da obrigatoriedade de inscrição, na qualidade de contribuinte do imposto ou de responsável tributário, no Cadastro de Contribuintes do Estado de Pernambuco[8].
18. Para fins de precisão e síntese do objeto da Consulta, nos termos das precisas informações apresentadas pela Consulente, devem ser obrigatoriamente consideradas as seguintes afirmações:
a) os materiais e bens devem ser adquiridos regularmente por documentos fiscais idôneos,
b) os materiais e bens não serão posteriormente postos à circulação jurídica como hipótese de incidência do imposto,
c) não se trata de operações de fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços para fins de execução de obras da construção civil, contratadas nos regimes de administração, empreitada ou subempreitada[9],
d) as obras devem ser próprias em imóveis da propriedade da Consulente,
e) as transferências dos materiais e dos bens devem ser realizadas entre os empreendimentos de titularidade da própria Consulente, e, por fim,
f) não se trata de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto, localizado neste Estado[10].
19. A Consulente não apresentou ter dúvida razoável sobre a interpretação e a aplicação da legislação relativa ao ICMS. No caso em apreço, em sentido oposto, demonstrou, fundamentou e comprovou ter pleno conhecimento da legislação tributária aplicável aos fatos e situação expostos, em conformidade com as informações prestadas na petição da consulta e os termos descritos no relatório desta Resolução.
20. No rol das competências constitucionais e legais, a DLO não tem atribuição para dirimir dúvidas e ratificar entendimentos referentes a obrigações tributárias do ICMS de competência privativa de outra UF[11], especialmente quanto ao tratamento tributário posto pela Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo[12] relativo ao não destaque do imposto e à emissão de documento fiscal.
20.1. A DLO, nas resoluções de consulta, também não tem como finalidade peculiar observar entendimentos de decisões judiciais consolidadas, mas sim a interpretação, em tese, de enunciado
normativo pertinente à legislação tributária vigente no Estado de Pernambuco.
21. Os seguintes Precedentes, consubstanciados em Acórdãos do Tribunal Pleno do Tate, são firmes em não acolher a consulta quando formulada em desacordo com as normas estabelecidas na Lei nº 10.654, de 1991, especialmente quanto a não sujeição passiva, não demonstração de dúvida razoável e não competência:
Acórdão Pleno nº 019/2019(13), Acórdão Pleno no 194/2019(05), Acórdão Pleno nº 0075/2021(08), Acórdão Pleno nº 0091/2021(13), Acórdão Pleno nº 0133/2021(02).
22. O não conhecimento da consulta não impede a Consulente, se assim entender, solicitar orientação procedimental por canais de atendimento do “Telesefaz” (serviços e telefones disponibilizados pela Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco em suas páginas na internet).
RESPOSTA
23. Que se responda à Consulente, nos termos abaixo:
23.1. A Diretoria de Legislação e Orientação Tributárias - DLO, no exame do processo acima identificado, resolve não acolher a consulta, nos termos do caput do artigo 56, do caput do artigo 57 e dos incisos I e VIII do § 3° do artigo 60 da Lei n° 10.654, de 27 de novembro de 1991, c/c arts. 2º, 6º e 119 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, nos seguintes fundamentos, respectivamente:
1. A Consulente não é contribuinte do imposto. Vedação expressa fixada na legislação tributária acerca de concessão de inscrição no Cadastro de Contribuintes do Estado de Pernambuco - Cacepe à empresa de construção civil.
2. A Consulente demonstra e comprova ter pleno conhecimento da legislação tributária estadual incidente sobre a situação e os fatos relatados, especialmente quanto a não incidência do ICMS, a não obrigatoriedade de emissão de documentos fiscais próprios e à vedação de inscrição no Cacepe. 3. A Administração Tributária do Estado de Pernambuco não tem autorização de Lei para se pronunciar acerca de procedimentos firmados no âmbito de competência legislativa e administrativa tributárias de outra UF.
Recife (GEOT/DLO), 13 de abril de 2022.
GERALDO GIMINO MARTINS JÚNIOR
AFTE II Mat. 187.808-5
DE ACORDO
LAERCIO VALADÃO PERDIGÃO
Chefe da Unidade de Processo
DE ACORDO
MARCOS AUTO FAEIRSTEIN
Diretor da DLO, em exercício