Recomendação MP nº 1 de 18/10/2010

Norma Estadual - Acre - Publicado no DOE em 04 nov 2010

Recomenda ações necessárias no combate à dengue e outras doenças, no município de Rio Branco.

O Ministério Público do Estado do Acre, por meio das Promotorias de Justiça de Saúde Pública e Cidadania, Meio Ambiente, de Habitação e Urbanismo e da Promotoria de Justiça que oficia junto aos Juizados Especiais Criminais, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, em especial, as constantes no art. 129, incisos I, II e III, da Constituição Federal, no art. 117, da Constituição do Estado do Acre, na Lei Complementar Estadual nº 08/1983, nas Leis nº 7.347/1985 e nº 8625/1993; e,

Considerando que a dengue tem se alastrado, de forma assustadora nesta Cidade e está associada ao acondicionamento indevido de materiais nos interiores de residências, casas, empresas, firmas, enfim, propriedades privadas, com o aumento significativo do risco de contração da doença, em razão da falta de controle dos focos, encravados em tais locais, muitas vezes inacessíveis ao pessoal encarregado pelo Poder Público de retirar referidos materiais.

Considerando as notícias no sentido de que proprietários de imóveis estariam se omitindo, obstruindo, ou mesmo impedindo o acesso às propriedades privadas, da Defesa Civil e da Vigilância Sanitária, nas ações de combate ao mosquito da dengue;

Considerando que a dengue já é considerada uma pandemia e constitui grave problema de saúde pública no Brasil, exigindo gastos públicos consideráveis com o tratamento das doenças decorrentes;

Considerando que a dengue deve ser combatida em todas as suas frentes e usando todos os meios necessários para garantir a saúde pública;

Considerando, ainda, que a responsabilidade compartilhada entre a sociedade, setor produtivo e setor público é o caminho para a construção de modos de vida que tenham como objetivo central a promoção da saúde e a prevenção de doenças;

Considerando, neste sentido, que cabe ao Ministério Público zelar pelos direitos metaindividuais, pela defesa dos interesses sociais e indisponíveis da sociedade, sendo função institucional "zelar pelo efetivo respeito aos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos constitucionalmente assegurados" (art. 129, inciso II, da Constituição Federal).

Considerando que a Constituição Federal elencou como princípios fundamentais o direito à cidadania e à dignidade da pessoa humana e que esta mesma Carta Constitucional fez compreender a saúde como direito social de todo cidadão;

Considerando que o art. 196, da Constituição Federal, dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitários às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação;

Considerando que são diretrizes do Sistema Único de Saúde a descentralização, a integralidade e a participação da comunidade, e que, nos termos do art. 2º, da Lei nº 8080/1990, a saúde é direito fundamental do ser humano, devendo o Estado promover as condições indispensáveis a seu pleno exercício;

Considerando, ainda, que a mencionada Lei, em seu art. 5º, estabelece como objetivos do Sistema Único de Saúde - SUS a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social, a observância do dever do Estado de garantir a saúde, consistente na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação;

Considerando, noutro viso, o disposto no art. 225, da Constituição Federal, que reza: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações";

Considerando que a Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, define, em seu art. 3º, inciso III, alínea a, poluição como "a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população";

Considerando que a Lei nº 9.605/1998, no Capítulo V "Dos Crimes Contra o Meio Ambiente", Seção III "Da Poluição e Outros Crimes Ambientais", tipifica como crime no art. 54 "Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora";

Considerando, também, que, segundo o art. 144, caput, da Constituição Federal, "a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio...";

Considerando, a nível local, o preceituado na Lei Municipal nº 1.623/2006, que estabelece o Código Sanitário do Município de Rio Branco, notadamente, os arts. 25 a 31, insertos no Capítulo IV, Seção IV, a qual trata "Das Edificações e Higiene dos Prédios Residenciais e Não-Residenciais", impondo aos proprietários ou ocupantes a qualquer título, dentre outros deveres, a responsabilidade pela limpeza e conservação do imóvel, com destaque para os aparelhos sanitários, esgotos, canalização, depósitos de água e de lixo, dentro da área do imóvel;

Considerando, nesta mesma linha, o que estabelece o Código de Posturas do Município de Rio Branco, no art. 245, "III": "Art. 245 - Os proprietários ou possuidores de imóveis são obrigados as penas constantes da legislação tributária, a: III - conservá-los em perfeitas condições evitando-se o crescimento do mato ou o acúmulo de materiais ou detritos de qualquer espécie.";

Considerando, em complementação, o determinado no art. 246, do mesmo Código, in verbis: "Art. 246 - Quando conveniente, e a juízo da Prefeitura, poderá esta executar a construção do passeio e do muro de fecho ou efetuar a limpeza dos terrenos não murados se após a intimação do proprietário com prazo de noventa dias, aquele não a cumprir, cobrando-se-lhes as despesas com os trabalhos, acrescidos de 20% (vinte por cento) a título de administração";

Considerando que, o último Informe Epidemiológico da Dengue expedido recentemente pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, registrou "227.109 casos notificados de dengue até a semana 9 de 2010", sendo que "Os Estados com maior incidência da doença durante o período foram Acre (1.732,4 casos por 100 mil habitantes), Mato Grosso do Sul (1.334,9 casos por 100 mil habitantes), Rondônia (1.248,5 casos por 100 mil habitantes), Goiás (849 casos por 100 mil habitantes) e Mato Grosso (778,8 casos por 100 mil habitantes)", justificando a adoção de medidas emergenciais para contenção e erradicação da doença;

Considerando que, em virtude dos números alarmantes acima descritos, foi editado, no ano pretérito, o Decreto nº 272, de 04.03.2009, da lavra do Prefeito do Município de Rio Branco, bem como a Portaria nº 15, de 11.03.2009, do Secretário Municipal de Saúde, nos quais, após reconhecer a existência de epidemia de dengue nesta Capital e a gravidade da doença, que apresenta elevados índices de morbidade e letalidade, mormente, devido à capacidade de adaptação e facilidade de multiplicação do mosquito transmissor da doença no período intenso de chuvas, foram estabelecidos procedimentos a serem tomados para adoção de medidas de vigilância sanitária e epidemiológica, voltadas ao controle de doenças ou agravos à saúde, com potencial de crescimento ou de disseminação que representem risco ou ameaça à saúde pública;

Considerando, como já referido, que os agentes públicos de controle de endemias e agentes comunitários de saúde encontram dificuldades de adentrar em imóveis particulares e/ou abandonados, seja pela recusa do proprietário, possuidor, morador, ou, pelo fato dos imóveis estarem fechados no momento das visitas, o que, à obviedade, compromete o êxito dos programas de prevenção e controle da dengue;

Considerando, por fim, que, como visto, para que os programas de controle da dengue tenham sucesso, se faz necessária a utilização de instrumentos legais que facilitem o trabalho do poder público na eliminação de criadouros em imóveis fechados, estabelecimentos comerciais, quando existe resistência por parte do morador, bem como em casas abandonadas, dentre outras hipóteses;

RESOLVE RECOMENDAR:

1. AO MUNICÍPIO DE RIO BRANCO E AO ESTADO DO ACRE, por meio do Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal Raimundo Angelim e do Excelentíssimo Senhor Governador do Estado Arnóbio Marques, dentro das esferas de responsabilidades que é inerente a cada um, que promovam, o mais rápido possível, todas as ações necessárias no combate à dengue e outras doenças, objetivando reverter o quadro atual, de modo a garantir a saúde pública de todos os habitantes desta Capital, conforme indicado pelas normas técnicas vigentes.

2. ÀS COORDENADORIAS DE VIGILÂNCIA DO ESTADO, DO MUNICÍPIO E À COORDENADORIA DE DEFESA CIVIL DO ESTADO, que assumam e prossigam com seus agentes responsáveis e com capacidade técnica e profissional às ações imediatas e permanentes de combate à dengue e outras doenças, utilizando o Poder de Polícia inerente a cada Órgão, objetivando garantir a saúde pública, adentrando em todos os imóveis privados, com a anuência do seu proprietário, no intuito de efetivar o combate ao mosquito da dengue, observado o período de descanso noturno - horário das 18:00 às 06:00 da manhã do dia seguinte, afim de evitar uma calamidade pública.

3. ÀS SECRETARIAS MUNICIPAIS DE MEIO AMBIENTE E DE SERVIÇOS URBANOS, que realizem, em conjunto, vistorias e limpezas nas áreas verdes e demais áreas de domínio público da cidade de Rio Branco.

4. À SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS URBANOS, para que, a partir da demanda de moradores que demonstrem estar organizados no sentido de combater a DENGUE, especialmente no que respeita ao recolhimento de lixo, entulhos e demais resíduos sólidos decorrentes da limpeza de terrenos, quintais e demais áreas, providencie de imediato tal medida.

5. A TODOS OS PROPRIETÁRIOS, LOTEADORES, IMOBILIÁRIAS, POSSEIROS, MORADORES ou DETENTORES PRECÁRIOS de imóveis urbanos, situados no Município de Rio Branco:

5.1. Para que dêem estrito e rigoroso cumprimento às determinações constantes dos arts. 25 a 31, da Lei Municipal nº 1.623/2006 (Código Sanitário), bem como do art. 245, inciso III, do Código de Posturas do Município de Rio Branco, no sentido de manter os seus imóveis limpos e asseados, como é sua obrigação legal, como medida necessária à proteção do meio ambiente e à prevenção e combate à dengue, alertando que a saúde pública, como interesse de toda coletividade, deve prevalecer sobre o interesse particular;

5.2. Para que permitam o ingresso dos agentes públicos devidamente credenciados e identificados em seus imóveis, inclusive, no interior das casas, estabelecimentos industriais, comerciais, escritórios, etc., onde possam executar a borrifação e outras ações necessárias de combate à dengue e outras doenças.

ADVERTE-SE, outrossim, que a contrariedade ao recomendado nos itens 5.1 e 5.2 por parte dos proprietários, Loteadores, Imobiliárias, posseiros, moradores ou detentores precários de imóveis urbanos localizados neste Município de Rio Branco, poderá ensejar a prática dos crimes previstos no art. 132, do Código Penal, que criminaliza a conduta de expor a perigo a vida e a saúde de outrem, com pena de 03 (três) meses a 01 (um) ano; no art. 268, do mesmo Códex, que trata da "Infração de Medida Sanitária Preventiva", com pena de 01 (um) mês a 01 (um) ano de detenção e multa; e, no art. 330, do mesmo Diploma Legal Repressivo, que trata do "Crime de Desobediência", com pena de 15 (quinze) dias a 06 (seis) meses de detenção e multa, cabendo, até mesmo, a prisão e encaminhamento ao Juizado Especial Criminal; sem prejuízo, evidentemente, da responsabilidade administrativa e do ajuizamento da competente ação civil pública.

6. AO MUNICÍPIO DE RIO BRANCO - Que informe ao Ministério Público, com a máxima brevidade possível:

6.1. Com relação aos imóveis em situação de abandono, os terrenos baldios transformados em matagais e depósitos de lixo, aqueles nos quais tenha sido detectada a existência de focos do mosquito Aedes Aegypti, em virtude da omissão por parte dos moradores e responsáveis das medidas preventivas tendentes ao seu extermínio, com a devida identificação dos responsáveis, através do encaminhamento dos Autos de Infração Administrativa;

6.2. Nos casos de impedimento por parte do morador de ingresso ao interior do imóvel de agentes municipais de combate a endemias, no estrito cumprimento do seu dever, que seja certificado esses obstáculos, identificando os endereços e tipos de empecilho, encaminhando ditas certificações ao Ministério Público para que sejam tomadas as providências tendentes à responsabilização criminal dos infratores;

6.3. Que remeta ao Ministério Público, periódica e regularmente, os Boletins Informativos sobre a Dengue.

7. À POLÍCIA MILITAR E POLÍCIA CIVIL, AO CORPO DE BOMBEIROS, Á SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE, À SECRETARIA MUNICIPAL DE SERVIÇOS URBANOS, - SEMSUR, À SECRETARIA MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO URBANO E OBRAS PÚBLICAS - SEDUOP, À SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE - SEMEIA e À EMPRESA MUNICIPAL DE URBANIZAÇÃO - EMURB, para dar o necessário apoio se solicitado pelos órgãos competentes.

8. Seja apresentado ao Ministério Público por todas as Secretarias e Órgãos anteriormente indicados, no prazo de 10 (dez) dias, relatório das providências adotadas.

9. Seja o Ministério Público informado, ademais, a cada 15 (quinze) dias, pelos ora recomendados, sobre todas as medidas que venham a ser adotadas relativamente às questões abordadas na presente Recomendação.

Por fim, ADVERTE a todos os Órgãos Públicos e Secretarias anteriormente indicados que o não cumprimento da presente RECOMENDAÇÃO, com a tomada das devidas providências, implicará, sem prejuízo da responsabilidade administrativa, no ajuizamento da competente ação civil pública, inclusive, por improbidade administrativa, no que se refere aos agentes públicos, conforme prevê o art. 11, inciso II, da Lei nº 8.429/1992.

Encaminhe-se cópia da presente Recomendação especialmente para: 1 - o Excelentíssimo Governador do Estado do Acre; 2 - o Excelentíssimo Prefeito do Município de Rio Branco; 3 - o Excelentíssimo Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Estado do Acre; 4 - o Excelentíssimo Senhor Corregedor-Geral do Ministério Público; 5 - a Secretaria Estadual de Saúde; 6 - ao Coordenador de Vigilância Sanitária do Estado do Acre; 7 - o Presidente da Assembléia Legislativa do Estado; 8 - o Presidente do Tribunal de Justiça; 9 - a Corregedoria do Tribunal de Justiça; 10 - todos os Juízes de Direito do Poder Judiciário; 11 - a Secretaria de Estado de Segurança Pública; 12 - o Coordenador da Defesa Civil do Estado; 13 - o Comandante Geral da Polícia Militar; 14 - o Comandante do Corpo de Bombeiro Militar; 15 - o Delegado Geral de Polícia Civil; 16 - o Corregedor Geral de Polícia Civil; 17 - o Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Rio Branco; 18 - a Secretária Municipal de Saúde; 19 - o Coordenador da Divisão de Vigilância Sanitária do Município de Rio Branco; 20 - a Secretaria Municipal de Serviços Urbanos; 21 - a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas; 22 - a Secretaria Municipal de Meio Ambiente; 23 - a Empresa Municipal de Urbanização - EMURB; 24 o Presidente da União Municipal das Associações de Moradores de Rio Branco - UMAMRB; 25 - a Associação Comercial do Estado do Acre; 26 - as Imobiliárias; 27 - o Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Acre - CRECI/AC; 28 - a Assessoria de Comunicação do Ministério Público do Estado do Acre.

Publique-se no Diário Oficial, nos Jornais locais, na página eletrônica do Ministério Público, na sede deste Parquet, bem como seja dada a mais ampla divulgação possível nos demais meios de comunicação.

Rio Branco, 18 de outubro de 2010.

SAMMY BARBOSA LOPES

Procurador-Geral de Justiça

ROGÉRIO VOLTOLINI MUÑOZ

Promotor de Justiça

Promotoria Especializada de Defesa da Saúde

RITA DE CÁSSIA NOGUEIRA LIMA

Promotora de Justiça

Promotoria Especializada de Habitação e Urbanismo

MERI CRISTINA AMARAL GONÇALVES

Promotora de Justiça

Promotoria Especializada de Defesa do Meio Ambiente

GETÚLIO BARBOSA DE ANDRADE

romotor de Justiça

Juizado Especial Criminal