Portaria SAS nº 272 de 15/06/2011

Norma Federal - Publicado no DO em 16 jun 2011

Altera o parâmetro populacional definido na Portaria SAS/MS nº 210, de 15 de junho de 2004, e dá outras providências.

O Secretário de Atenção à Saúde, no uso de suas atribuições;

Considerando a Portaria nº 1.169/GM/MS, de 15 de junho de 2004, que institui a Política Nacional de Atenção Cardiovascular de Alta Complexidade;

Considerando a Portaria SAS/MS nº 210, de 15 de junho de 2004, que define as Unidades de Assistência em Alta Complexidade Cardiovascular e os Centros de Referência em Alta Complexidade Cardiovascular e suas aptidões e qualidades;

Considerando a Portaria SAS/MS nº 123, de 28 de fevereiro de 2005, que atualiza, a partir da proposta da Câmara Técnica da Assistência Cardiovascular, em novembro de 2004, as normas para organização das redes de atenção em alta complexidade cardiovascular;

Considerando a Portaria nº 2.867/GM/MS, de 27 de novembro de 2008 que transferiu, do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação - FAEC para o Teto Financeiro de Média e Alta Complexidade dos Estados, Distrito Federal e Municípios os procedimentos endovasculares extracardíacos, sendo mantidos no FAEC apenas os procedimentos relativos à aorta; e

Considerando que a doença arterial periférica, incluindo-se a da aorta e dos outros grandes vasos, é relevante causa de morbidade e mortalidade,

Resolve:

Art. 1º Alterar o parâmetro populacional definido no Anexo IV da Portaria SAS/MS nº 210, de 15 de junho de 2004.

Serviço  Parâmetro populacional  
Serviço de Assistência de Alta Complexidade emProcedimentos Endovasculares Extracardíacos  1: 2.000.000  

Art. 2º Estabelecer, na forma do Anexo a esta Portaria, as "Diretrizes para intervenção endovascular na doença arterial periférica, no aneurisma da aorta abdominal e na doença cérebro-vascular extracraniana".

Parágrafo único. as diretrizes constantes do anexo desta Portaria poderão ser utilizadas pelo gestor para auxílio na indicação, avaliação e controle dos procedimentos endovasculares.

Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

HELVÉCIO MIRANDA MAGALHÃES JÚNIOR

ANEXO
DIRETRIZES PARA INTERVENÇÃO ENDOVASCULAR NA DOENÇA ARTERIAL PERIFÉRICA, NO ANEURISMA DA AORTA ABDOMINAL E NA DOENÇA CÉREBRO-VASCULAR EXTRACRANIANA

Nas recomendações descritas abaixo, adotou-se a seguinte nomenclatura quanto às classes de recomendações:

CLASSE I: Há consenso quanto à indicação da intervenção. O consenso é resultado de estudos randomizados ou de opinião majoritária de especialistas.

CLASSE II: Há controvérsia quanto à indicação da intervenção.

CLASSE III: Há consenso quanto à falta de indicação ou contra-indicação da intervenção.

1. DOENÇA ARTERIAL PERIFÉRICA

O documento base por as recomendações propostas abaixo é o TASC II - Inter-Society Consensus for the Management of Peripheral Arterial Disease (Norgren et al. J Vasc Surg 2007;45 Suppl:S5-S67), consenso elaborado por 15 Sociedades Médicas de todos o mundo.

DOENÇA ARTERIAL PERIFÉRICA (DAP) é a estenose ou obstrução de artérias nos seguintes segmentos (não mutuamente excludentes):

a) Aorto-ilíaco

b) Fêmoro-poplíteo

c) Infrapoplíteo

Quando apresenta sintomas, o quadro clínico se caracteriza por:

a) Isquemia crítica: Manifestação da doença arterial que leva a dor em repouso e/ou lesões tróficas de pele (úlceras e gangrena). Implica em cronicidade de sintomas (acima de 2 semanas). O diagnóstico deve necessariamente ser confirmado por medidas objetivas: medida da pressão arterial no tornozelo com o Doppler ultrassom de ondas contínuas e o índice tornozelo braço, medida da pressão de artelho ou tensão transcutânea de oxigênio Geralmente a pressão de tornozelo é menor que 50-70 mmHg e a pressão de artelho menor que 30-50 mmHg. Acompanha-se de altas taxas de mortalidade (25%) e perda de membro (25-40%) em um ano.

b) Claudicação intermitente: Presença de desconforto muscular reproduzível com a atividade física, que acarreta redução do desempenho ao exercício e da capacidade de andar, reduz qualidade de vida e estado físico geral. A taxa de amputação em 5 anos é menor que 2%. Ocorre em cerca de um terço dos pacientes com doença arterial.

O tratamento da DAP pode ser assim resumido:

a) Na isquemia crítica, o tratamento de escolha é a revascularização.

b) Na claudicação intermitente, o tratamento inicial deve ser direcionado para as atividades físicas, preferencialmente supervisionadas, porque aumentam a distância de caminhada, melhoram a função endotelial e promovem adaptações metabólicas do músculo esquelético. O objetivo é a melhora da qualidade de vida em casos de limitação funcional. Não se indica intervenção para se reduzir o risco de amputação. Considera-se a revascularização quando há falência do tratamento clínico, por:

- Resposta insatisfatória aos exercícios físicos ou não aderência do paciente aos exercícios recomendados.

- Contra-indicação aos exercícios físicos, por doença cardíaca ou pulmonar grave ou, imitações músculo-esqueléticas ou neurológicas;

- Intolerância ao medicamento ou falta de resposta ao tratamento farmacológico.

A indicação da revascularização se baseia no quadro clínico, enquanto a escolha do método de intervenção, seja por cirurgia convencional ou tratamento endovascular, depende da localização e da morfologia das lesões.

1.1. SEGMENTO AORTO-ILÍACO

As lesões do segmento aorto-ilíaco são classificados pelo TASC em quatro grupos, de A a D (quadro 1). Enquanto as lesões de tipos A e B são mais favoráveis para o tratamento endovascular, as de tipo C favorecem tratamento cirúrgico aberto, mas o tratamento endovascular é aceitável em muitos casos, enquanto nas de tipo D o tratamento de escolha é cirurgia aberta (tabela 1). Independente se oclusão ou estenose, o uso do stent leva a maior taxa de sucesso e reduz a taxa de oclusão precoce. As co-morbidades, a preferência do paciente e as taxas de sucesso de longo prazo do cirurgião devem ser consideradas na recomendação do tratamento, em especial para as lesões tipos B e C.

Quadro 1. Tipos de lesão do segmento aorto-ilíaco pelo TASC e sua descrição

TASC  Descrição  
A  1. Estenose unilateral ou bilateral da artéria ilíaca comum (AIC) 2. Estenose pequena (= 8 mm  = 8 mm  
Angulação  Máxima de 120º  > 120º ou loops  > 120º**  
Calcificação  Pouca ou sem calcificação Acentuada  Moderada  

* Se endovascular, com dispositivo de fixação supra-renal e/ou ganchos.

** Se endovascular, com dispositivos flexíveis.

Quadro 6. Estimativa do risco operatório no paciente com aneurisma de aorta abdominal

RISCO OPERATÓRIO  BOM  MODERADO  ALTO  
IDADE  < 70 anos  70-80 anos  > 80 anos  
ATIVIDADE FÍSICA  Ativo  Ativo  Inativo  
DOENÇA CARDÍACA  Sem evidência clínica de cardiopatia  Doença coronária estável, IAM antigo, FE> 35%  Doença coronária significativa, IAM recente, Angina freqüente, IC, FE < 25%  
FUNÇÃO PULMONAR  Sem doença pulmonar  DPOC leve  DPOC limitante, dispnéia de repouso, Dependência O2.  
FUNÇÃO RENAL  Creatinina normal  Creatinina 2-3 mg/dl  Creatinina> 3 mg/dl  
ANATOMIA/OUTROS  Sem fatores anatômicos adversos  Anatomia adversa  Doença hepática (albumina < 2)  
MORTALIDADE PREVISTA  1%-3%  3%-7%  Mínima 5%-10%. Cada condição acrescenta 3%-5%  

IAM: Infarto agudo do Miocárdio; DPOC: Doença pulmonar obstrutiva crônica; FE: Fração de ejeção.

APÓS INDICAÇÃO CLÍNICA DE CIRURGIA, QUAL MÉTODO: CIRURGIA ABERTA OU ENDOVASCULAR?

Não há nível de evidência definitivo sobre qual conduta tomar. Preconizava-se que a abordagem endovascular seria melhor para os pacientes de alto risco, porém o estudo EVAR 2 não mostrou esta superioridade. Paradoxalmente os estudos DREAM e EVAR 1 demonstraram que os pacientes de risco baixo e moderado se beneficiaram do tratamento endovascular devido a redução de mortalidade operatória. Deve-se levar em conta o risco operatório (bom a moderado ou alto) e a anatomia vascular (favorável ou não). As classes de recomendação para tipo de tratamento (endovascular ou cirurgia aberta) de aneurisma de aorta abdominal estão descritas na tabela 4.

Tabela 4- Classes de recomendação para tipo de tratamento (endovascular ou cirurgia aberta) de aneurisma de aorta abdominal

CRITÉRIOS CLÍNICOS E ANATÔMIOS  Tratamento Endovascular  Cirurgia Aberta  
Bom a moderado risco operatório com anatomia vascular favorável II  II  
Bom a moderado risco operatório com anatomia vascular desfavorável III  I  
Alto risco operatório com anatomia vascular favorável II  II  
Alto risco operatório com anatomia vascular desfavorável III  II  

3. DOENÇA CÉREBRO-VASCULAR EXTRACRANIANA DEFINIÇÃO DE PACIENTE SINTOMÁTICO: Paciente com sintomas hemisféricos (ataque isquêmico transitório ou acidente vascular cerebral) ou amaurose fugaz monocular.

HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA SINTOMÁTICA com estenose significativa de artéria carótida interna. Chance de isquemia cerebral em 1 ano é de cerca de 25%.

HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA ASSINTOMÁTICA com estenose significativa de artéria carótida interna. Chance de isquemia cerebral em 1 ano é de cerca de 2% a 3%.

RECOMENDAÇÕES PARA ENDARTERECTOMIA CAROTÍDEA:

CLASSE I:

1. Paciente sintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 70%.

2. Paciente assintomático, com idade menor que 75 anos, do sexo masculino, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 80% em serviço com resultado documentado de morbimortalidade menor que 3%.

CLASSE II:

1. Paciente sintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna entre 50 e 69% em serviço com resultado documentado com morbimortalidade menor que 6%.

2. Paciente assintomático, com idade menor que 75 anos, do sexo feminino, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 80% em serviço com resultado documentado de morbimortalidade menor que 3%.

CLASSE III:

1. Paciente sintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna menor que 50%.

2. Paciente assintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna menor que 60%.

3. Paciente assintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 60% e idade maior que 75 anos.

RECOMENDAÇÕES PARA CIRURGIA ENDOVASCULAR CAROTÍDEA:

CLASSE I:

1. Paciente sintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 70% com alto risco operatório:

a) Cardiopatia clinicamente significativa:

- Insuficiência cardíaca congestiva

- teste de stress alterado

- isquemia miocárdica ativa (infarto recente, angina)

b) Doença Pulmonar grave

2. Paciente sintomático, com grau de estenose na artéria carótida interna maior que 70% com alto risco anatômico:

a) Bifurcação carotídea alta em relação ao ângulo da mandíbula

b. Estenose significativa da artéria carótida comum abaixo da clavícula

c. Oclusão de artéria carótida contralateral

d. Paralisia do nervo laríngeo recorrente contralateral

e. Cirurgia radical prévia ou radioterapia no pescoço

f. Traqueostomia

g. Estenose recorrente pós endarterectomia

CLASSE II:

1. Sintomáticos com estenose maior que 70% e bom risco cirúrgico, com idade menor que 75 anos

CLASSE III:

1. Pacientes assintomáticos com qualquer grau de estenose carotídea.

TABELA 5. Recomendação para revascularização de carótida

Categoria  Endovascular*  Cirurgia Aberta*  
Sintomático com bom-moderado risco cirúrgico/anatômico II  I  
Sintomático com alto risco cirúrgico/anatômico  I  II  
Assintomático com bom risco cirúrgico/anatômico III  II  
Assintomático com alto risco cirúrgico/anatômico III  II  

* A morbimortalidade deve ser menor que 6% para pacientes sintomáticos e menor que 3% para assintomáticos

4. REFERÊNCIAS:

Brewster DC, Cronenwett JL, Hallett JW Jr, Johnston KW, Krupski WC, Matsumura JS; Joint Council of the American Association for Vascular Surgery and Society for Vascular Surgery. Guidelines for the treatment of abdominal aortic aneurysms. Report of a subcommittee of the Joint Council of the American Association for Vascular Surgery and Society for Vascular Surgery. J Vasc Surg. 2003 May;37 (5):1106-17.

Brott TG, Hobson RW 2nd, Howard G, Roubin GS, Clark WM, Brooks W, Mackey A, Hill MD, Leimgruber PP, Sheffet AJ, Howard VJ, Moore WS, Voeks JH, Hopkins LN, Cutlip DE, Cohen DJ, Popma JJ, Ferguson RD, Cohen SN, Blackshear JL, Silver FL, Mohr JP, Lal BK, Meschia JF; CREST Investigators. Stenting versus endarterectomy for treatment of carotid-artery stenosis. N Engl J Med. 2010 Jul 1;363 (1):11-23.

Chaikof EL, Brewster DC, Dalman RL, Makaroun MS, Illig KA, Sicard GA, Timaran CH, Upchurch GR Jr, Veith FJ. SVS practice guidelines for the care of patients with an abdominal aortic aneurysm: executive summary. J Vasc Surg. 2009 Oct;50 (4):880-96.

Cronenwett JL, Birkmeyer JD, Nackman GB, Fillinger MF, Bech FR, Zwolak RM, Walsh DB. Cost-effectiveness of carotid endarterectomy in asymptomatic patients. J Vasc Surg. 1997 Feb;25 (2):298-309.

EVAR trial participants. Endovascular aneurysm repair and outcome in patients unfit for open repair of abdominal aortic aneurysm (EVAR trial 2): randomised controlled trial. Lancet. 2005 Jun 25-Jul 1;365 (9478):2187-92.

Ferguson GG, Eliasziw M, Barr HW, Clagett GP, Barnes RW, Wallace MC, Taylor DW, Haynes RB, Finan JW, Hachinski VC, Barnett HJ. The North American Symptomatic Carotid Endarterectomy Trial: surgical results in 1415 patients. Stroke. 1999 Sep;30 (9):1751-8.

Fine-Edelstein JS, Wolf PA, O'Leary DH, Poehlman H, Belanger AJ, Kase CS, D'Agostino RB. Precursors of extracranial carotid atherosclerosis in the Framingham Study. Neurology. 1994 Jun;44 (6):1046-50.

Greenhalgh RM, Brown LC, Kwong GP, Powell JT, Thompson SG; EVAR trial participants. Comparison of endovascular aneurysm repair with open repair in patients with abdominal aortic aneurysm (EVAR trial 1), 30-day operative mortality results: randomised controlled trial. Lancet. 2004 Sep 4-10;364 (9437):843-8.

Hobson RW 2nd, Mackey WC, Ascher E, Murad MH, Calligaro KD, Comerota AJ, Montori VM, Eskandari MK, Massop DW, Bush RL, Lal BK, Perler BA; Society for Vascular Surgery. Management of atherosclerotic carotid artery disease: clinical practice guidelines of the Society for Vascular Surgery. J Vasc Surg. 2008 Aug;48 (2):480-6.

Mozes G, Sullivan TM, Torres-Russotto DR, Bower TC, Hoskin TL, Sampaio SM, Gloviczki P, Panneton JM, Noel AA, Cherry KJ Jr. Carotid endarterectomy in SAPPHIRE-eligible high-risk patients: implications for selecting patients for carotid angioplasty and stenting. J Vasc Surg. 2004 May;39 (5):958-65.

Norgren L, Hiatt WR, Dormandy JA, Nehler MR, Harris KA, Fowkes FG; TASC II Working Group. Inter-Society Consensus for the Management of Peripheral Arterial Disease (TASC II). J Vasc Surg. 2007 Jan;45 Suppl S:S5-67.

Prinssen M, Verhoeven EL, Buth J, Cuypers PW, van Sambeek MR, Balm R, Buskens E, Grobbee DE, Blankensteijn JD; Dutch Randomized Endovascular Aneurysm Management (DREAM) Trial Group. A randomized trial comparing conventional and endovascular repair of abdominal aortic aneurysms. N Engl J Med. 2004 Oct 14;351 (16):1607-18.

Sacco RL, Adams R, Albers G, Alberts MJ, Benavente O, Furie K, Goldstein LB, Gorelick P, Halperin J, Harbaugh R, Johnston SC, Katzan I, Kelly-Hayes M, Kenton EJ, Marks M, Schwamm LH, Tomsick T; American Heart Association; American Stroke Association Council on Stroke; Council on Cardiovascular Radiology and Intervention; American Academy of Neurology. Guidelines for prevention of stroke in patients with ischemic stroke or transient ischemic attack: a statement for healthcare professionals from the American Heart Association/American Stroke Association Council on Stroke: co-sponsored by the Council on Cardiovascular Radiology and Intervention: the American Academy of Neurology affirms the value of this guideline. Stroke. 2006 Feb;37 (2):577-617.

The European Carotid Surgery Trialists Collaborative Group: Risk of stroke in the distribution of an asymptomatic carotid artery. Lancet 345:209-212, 1995.

United Kingdom EVAR Trial Investigators, Greenhalgh RM, Brown LC, Powell JT, Thompson SG, Epstein D. Endovascular repair of aortic aneurysm in patients physically ineligible for open repair. N Engl J Med. 2010 May 20;362 (20):1872-80.