Parecer Técnico nº 16 DE 27/02/2015

Norma Estadual - Pará - Publicado no DOE em 27 fev 2015

ASSUNTO: ICMS. PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE PARCELA DE IMPOSTO PAGO. ÁLCOOL ANIDRO CARBURANTE.

PEDIDO

O expediente refere-se a pedido de ressarcimento do imposto ICMS, no valor de R$ 281.295,11 (duzentos e oitenta e um mil, duzentos e noventa e cinco reais e onze centavos), referente a Nota Fiscal (NF) n.º211761, tudo com supedâneo no Decreto Estadual n.º 1.588/2005, que concedeu tratamento tributário especial à empresa Pará Pastoril e Agrícola S/A - PAGRISA.

A requerente, no mês de março de 2006, adquiriu da PAGRISA o produto Álcool Anidro Carburante, fazendo jus, a princípio, ao ressarcimento da parcela do ICMS pago aquela empresa, ex vi do art. 6º e seguintes do Decreto n.º 1.588/2005. Para instruir o pedido, a solicitante juntou Notas Fiscais Fatura, Modelo 1, Série 1, às ff. 03/16.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei n.º 6.898, de 10 de novembro de 1999, que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal;

Lei n.º 6.489, de 25 de setembro de 2002, que dispõe sobre a Política de Incentivos ao Desenvolvimento Sócio - Econômico do Estado do Pará;

Decreto n.º 1.588, de 13 de abril de 2005, que concedeu tratamento tributário que especifica as operações realizadas pela empresa PAGRISA - PARÁ PASTORIL E AGRÍCOLA S/A;

Decreto n.º 2.740, de 28 de dezembro de 2006, que concede tratamento tributário às operações que especifica, realizadas pela empresa PAGRISA - PARÁ PASTORIL E AGRÍCOLA S/A.

FATOS

Em 30.09.2002, foi publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) a Lei n.º 6.489/2002, que implantou em território paraense a Política de Incentivos, visando à "consolidação, no Estado do Pará, de processo de desenvolvimento econômico moderno e competitivo, socialmente mais justo e ecologicamente sustentável, com maior internalização e melhor distribuição de seus benefícios" (art. 2º).

A lei em comento disciplinou, em seu art. 5º, os instrumento a serem utilizados para sua efetiva aplicação, in verbis:

"Art. 5º São instrumentos de aplicação desta Lei:

I - incentivos fiscais, a serem concedidos aos empreendimentos previstos no art. 3º, nas seguintes modalidades:

a) isenção;

b) redução da base de cálculo;

c) diferimento;

d) crédito presumido;

e) suspensão;

II - incentivos financeiros, sob a forma de empréstimo, em valor correspondente a até 75% (setenta e cinco por cento) do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Tr ansporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) gerado pela atividade operacional do empreendimento ou outra empresa do mesmo grupo empresarial já instalada no Estado do Pará e efetivamente recolhido ao Tesouro Estadual, a partir da operação do projeto aprovado;

III - incentivos de caráter infra - estrutural, para instalação ou relocalização de empreendimentos em pólos de desenvolvimento do Estado;

IV - compensação de investimentos privados na realização de obras de infra - estrutura pública, mediante expressa anuência do Poder Público e condições previamente definidas." (negritamos)

Em 14.04.2005, foi publicado no DOE o Decreto n.º 1.588/2005, que concedeu, conforme art. 2º, I e II do mencionado dispositivo, crédito presumindo de 75% (setenta e cinco por cento) sobre o ICMS apurado, correspondente aos produtos fabricados nesta Estado pela PAGRISA nos seguintes casos:

I - nas saídas internas do produto álcool etílico anidro combustível, com destino à distribuidora localizada no Estado do Pará;

II - nas saídas internas e interestaduais dos produtos álcool hidratado e açúcar.

Para que o benefício fosse viabilizado, uma vez que as operações se encontravam ao abrigo do regime da substituição tributária, na forma disposta na cláusula primeira do Convênio ICMS 03/99, o Decreto n.º 1.588/2005, no art. 6º e ss., autorizou que o valor, em reais, correspondente ao ICMS que integra o preço do produto, pago pelo destinatário à PAGRISA, fosse integralmente ressarcido ao estabelecimento distribuidor de combustíveis que adquiriu o álcool anidro da PAGRISA. Para melhor entendimento, vejamos os preceptivos:

"Art. 6º O estabelecimento distribuidor de combustíveis destinatário que adquirir álcool etílico anidro combustível da empresa PAGRISA - PARÁ PASTORIL E AGRÍCOLA S/A deverá elaborar relação mensal contendo as indicações abaixo, encaminhando - a, no momento da saída da gasolina, ao sujeito passivo por substituição tributária que tiver originalmente retido o ICMS incidente sobre o produto, conforme o § 1º do art. 689 do RICMS - PA:

I - série, número e data da nota fiscal do fornecedor;

II - quantidade e descrição da mercadoria;

III - valor da operação;

IV - valor do imposto destacado.

Art. 7º O sujeito passivo por substituição tributária, de posse da relação prevista no artigo anterior, fará o ressarcimento, à distribuidora de combustível, da parcela referente ao ICMS do álcool etílico anidro combustível por ela paga a PAGRISA - PARÁ PASTORIL E AGRÍCOLA S/A, deduzindo - a do valor a ser repassado à unidade federada de destino.

Art. 8º O ressarcimento do imposto destacado nas Notas Fiscais de compra do produto será efetuado mediante emissão de Nota Fiscal exclusiva para esse fim, até o 5º (quinto) dia útil, em nome do estabelecimento fornecedor da gasolina que tenha retido originalmente o imposto.

Art. 9º A Nota Fiscal emitida para o fim descrito no artigo anterior deverá ser visada pela SEFA/DESUT, acompanhada da relação de que trata o art. 6º.

Art. 10. O sujeito passivo por substituição tributária ressarcirá a distribuidora até o 15º (décimo quinto) dia útil do mês subseqüente ao da operação." (negritamos)

Contudo, em 30.06.2004, o Procurador - Geral da República ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 3.246 -1, que atacou a redação do art. 5º da Lei n.º 6.489/2002, ação a qual resultou, em 19.04.2006, na procedência do pedido, conforme fragmento do decisão abaixo transcrita, cujo Acórdão foi publicado no Diário de Justiça em 01.09.2006, ipsis litteris:

"O Tribunal, à unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do inciso 00I do artigo 005º da Lei nº 6489, de 27 de setembro de 2002, do Estado do Pará, para aplicar - lhe interpretação conforme à Constituição Federal, no sentido de que sejam excluídos do âmbito da sua aplicação os créditos relativos ao ICMS que não tenham sido objeto de convênio entre os Estados da Federação, tudo nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie, Vice - Presidente no exercício da Presidência. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello.
Falou pelo requerido, Governador do Estado do Pará, o Dr. José Aloysio Campos, Procurador - Geral do Estado."

Após a declaração de inconstitucionalidade do dispositivo ora atacado pela Corte Suprema, foi publicado, em 29.12.2006, o Decreto n.º 2.740/2006, que também concedeu tratamento especial à PAGRISA, porém, não com fulcro no art. 5º, I da Lei n.º 6.489/2002, mas sim com suporte no art. 24 da Lei então aludida, estando o caput do art. 2º daquele edito com a redação abaixo transcrita:

"Art. 2º Fica concedido crédito presumido de 75% (setenta e cinco por cento), calculado sobre o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS apurado, correspondente às saídas internas e interestaduais dos produtos álcool hidratado e açúcar fabricados neste Estado pela empresa PAGRISA - PARÁ PASTORIL E AGRÍCOLA S/A, inscrita no cadastro de contribuintes do ICMS sob o nº 15.075.430 -2:"

Nesse interregno, entre a publicação do Decreto n.º 1.588/2005 e o ajuizamento da ADI n.º 3.246 -1, melhor dizendo, 28.04.2006, a requerente protocolizou o presente expediente na CEEAT Substituição Tributária para pedir o ressarcimento dos valores pagos a título de ICMS, com base na Nota Fiscal n.º211761.

Com efeito, foi exarado às fls. 17 despacho de encaminhamento, datado de 02.05.2006, ao AFRE, Dário Sérgio, para análise da solicitação de ressarcimento de ICMS, momento em que foi anexada às fls. 18 cópia do documento fiscal mencionado no parágrafo anterior com a informação "indeferido".

Continuando, em 23.01.2015, o feito foi remetido ao AFRE Dário Sérgio para explicar o porquê do indeferimento, tendo a autoridade fiscal respondido em 05.02.2015, no despacho de fls. 21, que não foi dado por esta SEFA o visto autorizativo e que o "indeferimento foi determinado pela chefia de fiscalização da época devido a decisão do STF, que declarou inconstitucionalidade do inciso I do art. 5º da Lei nº 6.489/2002".

Após o retorno do expediente à CEEAT Substituição Tributária, o Coordenador daquela Unidade Fazendária encaminhou o feito a esta DTR, em 09.02.2015, para análise e manifestação acerca da

"regularidade ou não do deferimento do ressarcimento do ICMS incidente sobre as operações com AEAC realizado pela empresa PAGRISA S/A às distribuidoras de combustíveis".

Por fim, fazendo um adendo, foi firmado o Convênio ICMS n.º 02/2010, que autorizou a não cobrança, pelo Estado do Pará, de débitos fiscais decorrentes da utilização de incentivos e benefícios fiscais,
concedidos com fulcro no art. 5, I da Lei n.º 6.489/2002, assim como foi acordado que não se dariam mais favores fiscais a empresas, tendo por base a regra tela antes mencionada.

Inicialmente, para o melhor entendimento da situação em que se encontra o pedido sob exame, impende trazermos à baila alguns apontamento sobre a ação direta de inconstitucionalidade (ADI). Pois senão, vejamos o que nos diz o glossário jurídico do STF:

"A ADI tem por finalidade declarar que uma lei ou parte dela é inconstitucional, ou seja, contraria a Constituição Federal, sendo um dos instrumentos daquilo que os juristas chamam de "controle concentrado de constitucionalidade das leis".

[...]

A decisão que declara a inconstitucionalidade de uma lei tem eficácia genérica, válida contra todos e obrigatória. Outrossim, o parágrafo único do art. 28 da Lei n.º 9.868/1999 diz que se gera o efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal, que não podem contrariar a decisão. Ocorrem ainda efeitos retroativos, ou seja, quando a lei é declarada inconstitucional, perde o efeito desde o início de sua vigência.

A decisão do Supremo Tribunal Federal passa a surtir efeitos imediatamente, salvo disposição em contrário do próprio tribunal. Quando a segurança jurídica ou excepcional interesse social estiverem em jogo, o STF poderá restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ou decidir que ela só tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou um outro momento a ser fixado. Essa decisão depende da aprovação de dois terços do ministros."

Passados os esclarecimentos iniciais, e após a análise dos documentos e das legislações trazida a exame, pugnaremos pelo indeferimento do pleito pelos motivos abaixo expostos:

1) A declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, I da Lei n.º 6.489/2002 fez com que esse dispositivo perdesse eficácia e, por conseqüência, toda norma criada com supedâneo nessa regra, dentre elas o Decreto n.º 1.588/2005, deixou de ter validade, pela simples observância do princípio de que o acessório segue o principal, não podendo, portanto, a solicitante requerer o ressarcimento do imposto ICMS com base no regulamento em tela;

2) O Acórdão que declarou a não conformidade do dispositivo em comento com a Lei Maior tem efeitos retroativos (ex tunc), vez que a decisão colegiada não modulou os efeitos para um momento futuro; logo, a declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, I da Lei n.º 6.489/2002 fez com que esse excerto perdesse seus efeitos desde o início da publicação da norma, que se deu em 2002;

3) As Notas Fiscais de venda endereçadas à requerente bem como a Nota Fiscal para ressarcimento são, respectivamente, de março e abril de 2006, ou seja, estariam dentro do período de vigência do Decreto n.º 1.588/2005, caso este edito não tivesse perdido os efeitos em face da declaração de inconstitucionalidade da Lei em que o dispositivo se baseou;

4) O Decreto n.º 2.740/2006, que concedeu novo benefício fiscal à PAGRISA, agora com base no art. 24 da Lei n.º 6.489/2002, passou a viger em 29.12.2006, isto é, após o período cujo ressarcimento está sendo pleiteado. Esse fato fez com que as operações realizadas no mês objeto do pedido, qual seja, março de 2006, não estivessem na verdade sob o manto do regime especial em comento, por força da perda de eficácia do Decreto n.º 1.588/2005 pelos motivos antes explicitados no item 1);

5) Os eventos narrados no item supra, ao contrário da pretensão da solicitante, acabaram por gerar débitos de ICMS da empresa para com este Fisco, o que acarretou na celebração de Convênio Autorizativo no âmbito do CONFAZ, o qual facultou ao Estado do Pará não exigir qualquer débito tributário oriundo da declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, I da Lei n.º 6.489/2002;

6) A decisão que declarou a inconstitucionalidade, como dito, gera efeitos vinculantes à Administração e deve ser observada por todos os agentes e servidores públicos, inclusive desta SEFA. Porquanto, a Autoridade Administrativa, ao não visar o documento fiscal de fls. 18, culminando pelo indeferimento do pedido na CEEAT Substituição Tributária, o fez por estrito cumprimento da decisão do STF;

7) Por fim, não cabe a esta SEFA entrar no mérito da questão sobre o exercício da função legislativa, quando da edição da norma, nem na prerrogativa conferida ao Poder Judiciário para proceder ao controle, tanto concentrado quanto incidental, da constitucionalidade das leis, tudo em obediência ao Princípio da Separação dos Poderes, restando aos agentes administrativos tão somente darem fiel cumprimento ao que prescrevem as legislações, assim como obedecerem aos mandamentos judiciais.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, em razão de toda a legislação invocada e dos motivos trazidos em relevo, opinamos pelo indeferimento do pleito.

Belém (PA), 27 de fevereiro de 2015.

ANDRÉ CARVALHO SILVA, Auditor Fiscal de Receitas Estaduais;

UZELINDA MARTINS MOREIRA, Coordenadora da Célula de Consulta e Orientação Tributária;

ROSELI DE ASSUNÇÃO NAVES, Diretora de Tributação.

Indefiro o pleito com base no parecer da Diretoria de Tributação. Dê - se ciência da decisão.

JOSÉ BARROSO TOSTES NETO, Secretário de Estado da Fazenda