Parecer Normativo SER nº 1 de 04/11/2005

Norma Estadual - Rio de Janeiro - Publicado no DOE em 21 nov 2005

Fixa entendimento sobre a não incidência do ICMS no fornecimento de material utilizado na prestação de serviço de limpeza e conservação de imóveis.

Senhor Superintendente,

Cuida o presente parecer de dirimir dúvidas freqüentemente apresentadas pelos contribuintes sobre:

(a) a não incidência do ICMS no fornecimento de material utilizado na prestação de serviço de limpeza e conservação de imóveis;

(b) a obrigatoriedade das empresas que executam este tipo de serviço estarem inscritas no Cadastro de Pessoa Jurídica do Estado do Rio de Janeiro - CADERJ.

¯ ITEM (a) ¯

a não incidência do ICMS no fornecimento de material utilizado na prestação de serviço de limpeza e conservação de imóveis;"

Em termos gerais, o critério inicial para distinguir entre a característica peculiar da incidência de ICMS ou de ISS consiste na tradicional diferença entre a "obrigação de dar" e a "obrigação de fazer". Dessa forma, a prestação de serviço traduz-se numa obrigação cujo objetivo é um "fazer", ao passo que a obrigação mercantil concretiza-se num "dar". Assim sendo: se a natureza da obrigação é de "fazer", incide o ISS; se a natureza da obrigação é de "dar", incide o ICMS.

Evidentemente, diante de conceitos tão fluidos e imprecisos sobre o que vem a ser, na prática, a obrigação de dar ou a de fazer, a aplicação do critério mencionado não é tão simples assim. Isto porque, não raro, determinadas atividades econômicas apresentam-se em áreas cinzentas, onde, ocorrendo os dois tipos de obrigação, fica difícil delimitar qual exatamente a abrangência de cada uma delas: a de fazer e a de dar. A rigor, não existe um "exclusivo fazer" ou um "exclusivo dar".

Por via de regra, uma prestação de serviços requer o emprego de equipamentos, exige a utilização de instrumental e de máquinas, e emprega materiais. Isto não muda a natureza da obrigação (de "fazer").

A prestação de serviços em análise é daquelas que não podem prescindir da utilização de equipamentos/instrumental ou emprego de materiais. Muito pelo contrário; para a execução desse serviço, costuma ser necessário, em alguns casos, por exemplo, o emprego de água sanitária, desinfetante, detergente, esponja de aço, lustra-móveis, pano de chão, papel sanitário, papel toalha, sabão, vassouras etc. A atividade econômica de que estamos tratando é daquelas que já foram outrora consideradas como atividades de caráter "misto", nos termos do parágrafo 2º do art. 71 (antes de este artigo ter sido revogado pelo Decreto-lei 406/68) do Decreto-lei nº 5.172, 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.

Atualmente, o aspecto fundamental a ser analisado neste caso é a maneira como a legislação tentou clarificar a questão das hipóteses em que, nessas situações limítrofes, ocorre a incidência de ICMS ou a de ISS.

Da Carta Magna, temos definida a competência para instituir o imposto sobre serviços de qualquer natureza, em seu art. 156:

"Art. 156 - Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (redação do inciso III dada pela Emenda Constitucional 3/93, com efeitos a partir de 18.03.93)." (grifos nossos)

Como pode observar-se, a própria Lei Suprema determina que os "serviços de qualquer natureza" - sobre os quais incide o ISS - estão sujeitos a duas restrições:

(1) não podem estar entre os compreendidos no art. 155, II, da Constituição Federal;

(2) têm de estar definidos em lei complementar.

Sobre a competência dos Estados e do Distrito Federal para instituir impostos, a Lei Maior preceitua:

"Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;" (grifos nossos)

Desse modo, as prestações de serviços mencionadas no inciso II do art. 155 da Constituição Federal são sujeitas ao ICMS

Vejamos agora o papel das leis complementares, conforme prescrito pela Carta Suprema em seu art. 146:

"Art. 146 - Cabe à lei complementar:

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;" (grifos nossos)

Conforme o disposto na alínea a do inciso II do art. 146 da Constituição da República, cabe a lei complementar estabelecer as normas gerais para definição dos fatos geradores dos tributos. Em razão disto, nosso próximo passo então será procurar o que dizem as leis complementares sobre o assunto. Preliminarmente, vejamos a lei complementar que dispõe sobre os serviços sujeitos ao ISS. Trata-se da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, a qual, em seu art. 1º, determina:

"Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

§ 2º Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias." (grifos nossos)

Conquanto se trate de norma geral, o comando do § 2º do art. 1º da Lei Complementar nº 116/03, menciona a expressão "ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias", a qual, infelizmente, costuma dar origem a dúvidas. Como sabemos, nem sempre as expressões utilizadas na legislação são claras e precisas. É o que acontece com essa expressão. A rigor, "fornecer mercadoria" passa a idéia de objeto que está sendo comercializado e que se vincula a uma obrigação de dar. Essa expressão pode fazer supor que se está referindo a uma espécie de prestação de serviço na qual, além do esforço despendido para sua execução, também são "fornecidas" - ao contratante do serviço - algumas mercadorias, consistindo assim numa espécie de atividade econômica de caráter híbrido ou misto (como vimos), mas que seria sujeita apenas à incidência do ISS. Entretanto, conforme veremos adiante, não é essa a melhor interpretação a ser seguida.

Na verdade, não existe prestação de serviço que realmente envolva "fornecimento de mercadoria". É certo que na espécie de prestação de serviço mencionada não incide o ICMS, uma vez que tal "fornecimento" não compreende uma etapa de circulação de mercadorias (que, se existisse, daria origem à incidência de ICMS). O que de fato existe, conforme vimos, é a prestação de serviço que envolve a utilização de "material e/ou instrumental" (água sanitária, detergente, vassouras, esfregão etc.), como necessidade imprescindível para a execução do serviço. Por exemplo, no caso de uma empresa de limpeza de imóveis, os materiais por ela própria utilizados na execução do serviço não caracterizam verdadeiramente fornecimento de mercadorias (no sentido estrito). Tais materiais perdem a caracterização de mercadoria no momento em que são utilizados por um consumidor final (o prestador do serviço). Não há etapa de circulação de mercadorias após a aquisição desses materiais pela empresa de limpeza, se ela simplesmente os emprega na execução do serviço.

Esse entendimento tem sustentação ainda mais forte quando consideramos que a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, ao dispor sobre normas gerais para o ICMS, estabelece em seu art. 3º:

"Art. 3º. O imposto não incide sobre:

V - operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída, de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei complementar;" (grifos nossos)

Como pode notar-se, a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, esclarece-nos que, em se tratando de mercadorias utilizadas pelo próprio autor da saída do serviço, não há incidência de ICMS. E nem poderia ser de outra maneira, uma vez que as "mercadorias" utilizadas na prestação do serviço, efetivamente, não são "mercadorias", mas sim materiais empregados pelo próprio prestador (consumidor final) na execução do serviço.

Por sua vez, em relação ao ICMS, o art. 40 da Lei estadual nº 2.657, de 26 de dezembro de 1996, ao dispor sobre as hipóteses de não incidência do ICMS, estabelece:

"Art. 40 - O imposto não incide sobre prestação de serviço intermunicipal de transporte rodoviário de passageiros e o transporte fornecido pelo empregador com ou sem ônus para funcionários e/ou empregados e, ainda, sobre operação e prestação:

XVIII - de fornecimento, pelo estabelecimento prestador dos serviços compreendidos na competência tributária municipal, de mercadoria a ser ou que tenha sido utilizada na prestação de tais serviços, ressalvados os casos de incidência do imposto estadual definidos em lei complementar;" (grifos nossos)

Portanto, mesmo com redação ligeiramente diferente da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, a Lei nº 2.657, de 26 de dezembro de 1996, embora, talvez, de forma não tão clara, exclui da incidência do ICMS o material/instrumental que seja empregado na prestação dos serviços.

Por outro lado, se quem utiliza a mercadoria não é o prestador de serviço contratado, mas, em seu lugar, o contratante, então há incidência de ICMS, porque, neste caso, houve mais uma etapa de circulação de mercadoria, uma vez que o consumidor final da mercadoria foi o contratante (não o contratado). O prestador de serviços, efetivamente, forneceu mercadoria para o contratante.

No que tange ao caso em exame, observamos que o serviço de limpeza e conservação de imóveis consta do subitem 7.10 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar nº 116/2003, de 31 de julho de 2003:

"7.10 - Limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres." (grifos nossos)'

Cabe assinalar o enlace lógico das expressões "prestação de serviço" e "execução do serviço" na legislação. Isto pode ser facilmente percebido pela forma como o legislador se expressa na Lei Complementar nº 116/03, em seu art. 3º, inciso VII:

"Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:

VII - da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa;" (grifo nosso)

Não há "prestação" de serviço desvinculada de sua "execução". Não há como desfazer-se o enlace lógico entre essas duas expressões. Portanto, serviço que não é executado pelo contratado, não é serviço prestado.

Destarte, não deve confundir-se o disposto nas cláusulas particulares de um "contrato de prestação de serviços" com a efetiva "execução do serviço". É importante considerar que o legislador, no inciso VII do art. 3º da Lei Complementar nº 116/2003, utilizou a expressão "execução da limpeza...". O uso dessa expressão nesse comando da lei nos auxilia a distinguir entre a utilização de material (na execução do serviço) e o fornecimento de mercadorias (pelo contratado) para uso do contratante.

Com efeito, o contratado não está executando serviço (nem prestando serviço) quando fornece ao contratante "material de consumo" - por exemplo: sabonete, toalhas de papel, papel sanitário etc. Ainda que faça parte do "contrato de prestação de serviço", a operação de fornecimento desses "materiais" ao contratante será gravada pelo ICMS. Isto porque fica caracterizada mais uma etapa de circulação de mercadorias (o consumidor final é o contratante). Trata-se, na realidade, de fornecimento de mercadoria (no sentido estrito), o que é fato gerador de ICMS.

Em suma, pouco importa se fornecimento de mercadoria ao contratante consta (ou não) do "contrato de prestação de serviços". O que vai determinar a incidência de um imposto ou outro (ISS ou ICMS) é a ocorrência (ou não) do fato gerador (conforme definido na legislação) relativo ao respectivo tributo.

¯ CONCLUSÃO sobre o ITEM (a) ¯

- fornecimento de materiais pela empresa prestadora do serviço para serem por ela própria utilizados na execução do serviço:? NÃO incide o ICMS;

- fornecimento de mercadorias pela empresa prestadora do serviço para serem utilizadas pelo contratante:? incide o ICMS.

¯ ITEM (b) ¯

"a obrigatoriedade das empresas que executam este tipo de serviço estarem inscritas no Cadastro de Pessoa Jurídica do Estado do Rio de Janeiro - CADERJ."

A obrigatoriedade das empresas que executam serviços de limpeza e conservação de imóveis estar inscritas no CADERJ está diretamente vinculada à possibilidade de tais empresas virem a efetuar operações que sejam gravadas pelo ICMS.

Desse modo, temos três hipóteses a considerar:

(I) a empresa prestadora de serviços contratada fornece tão-somente a mão-de-obra para a limpeza e conservação de imóveis, ficando a cargo do contratante o fornecimento de todo o material de consumo, máquinas, instrumental e equipamentos que serão empregados pela contratada na execução do serviço;

(II) a empresa prestadora de serviços contratada, além de fornecer a mão-de-obra para a limpeza e conservação de imóveis, encarrega-se do fornecimento de todo o material de consumo, máquinas, instrumental e equipamentos que serão por ela própria empregados na execução do serviço;

(III) a empresa prestadora de serviços de limpeza e conservação de imóveis contratada fornece material de consumo, máquinas, instrumental e equipamentos para serem utilizados pelo contratante do serviço.

Do ponto de vista da legislação referente à inscrição no CADERJ, a Resolução SEF nº 2.861, de 24 de outubro de 1997, estipula:

"Art. 31 - Estão obrigados à inscrição no Cadastro de Pessoa Jurídica, antes do início de suas atividades:

XXXVIII - quaisquer outros não mencionados nos incisos anteriores que pratiquem, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações relativas à circulação de mercadorias, ou a elas equiparadas, e as que prestem, simultaneamente ou não, serviços na área de competência tributária estadual." (grifos nossos)

¯ CONCLUSÃO sobre o ITEM (b) ¯

Quanto à obrigatoriedade de inscrição no CADERJ, se a empresa prestadora de serviços de limpeza e conservação de imóveis está enquadrada:

- na hipótese (III):- inscrição OBRIGATÓRIA;

- nas hipóteses (I) ou (II): - inscrição NÃO OBRIGATÓRIA.

É o parecer que submetemos à consideração de V. Sª para as providências que julgar cabíveis.

ST, em 03 de novembro de 2005

Severino Pompilho do Rego Fiscal de Rendas - Matrícula nº 294.680-4

Senhor Secretário, Manifesto-me de acordo com o parecer supra.

Impõe-se que às respostas de consultas já expedidas em sentido contrário ao disposto neste parecer seja aplicado o estabelecido no art. 146, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (CTN).

À consideração de Vossa Excelência.

ST, em 04 de novembro de 2005

ALBERTO DA SILVA LOPES

Superintendente de Tributação.

De acordo. Publique-se.

Rio de Janeiro, 10 de novembro de 2005

LUIZ FERNANDO VICTOR

Secretário de Estado da Receita