Parecer GEOT nº 36 DE 14/04/2021
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 14 abr 2021
ICMS. Dúvida quanto ao aproveitamento de crédito relativo à aquisição de materiais intermediários e de embalagens empregados no processo industrial.
I - RELATÓRIO
(...) vem formular a presente consulta acerca de aproveitamento de créditos sobre matérias intermediários e de embalagens aplicados na fabricação de peças de metais, cujo processo produtivo segue as etapas assim descritas:
1 - Fundição: a matéria prima é levada à condição líquida dentro de um forno a aproximadamente 700ºC. Este metal líquido é submetido a uma análise de composição; após eventual correção é feito um tratamento, para remover impurezas e, em seguida, o metal é envazado dentro de um molde metálico. O molde é desmontado após o metal solidificar dento dele, a peça bruta é retirada e, em seguida, o molde é montado para a confecção da próxima peça;
2 – Usinagem e Acabamento: a peça bruta é trabalhada em máquinas operatrizes (torno, furadeira, chaveteira, lixadeira, centro de usinagem, etc.) nos quais ela adquire as dimensões exatas especificadas no projeto, através da remoção do excesso de material por ferramentas de corte. Em seguida as peças passam por acabamento para que atendam aos requisitos estáticos;
3 – Embalagem – os produtos prontos são acondicionados de forma a proteger suas superfícies durante o transporte e facilitar a movimentação pela transportadora e a identificação pelos clientes.
Informa que nas etapas do processo produtivo, utiliza os seguintes critérios: tipos de materiais intermediários e de embalagem, NCM, vida útil aproximada, bem como a forma com que são consumidos para conclusão do processo industrial das peças acabadas para venda.
Anexa demonstrativo no qual discrimina as etapas do processo de industrialização, o material utilizado, a aplicação, forma de consumo e a vida útil:
Aplicação |
Material |
NCM |
Forma de Consumo |
Vida útil aproximado |
Cadinho |
69031012 |
Recipiente no qual fica contido o metal líquido |
6 meses |
|
Tintas desmoldantes |
38012090 |
Aplicadas às paredes do molde para facilitar a desmontagem das peças |
10 minutos |
|
Buchas térmicas |
69039099 |
Insertos removíveis montados nos moldes que ajudam eliminar defeitos de fabricação |
5 dias |
|
Fundição |
Sais escorificantes |
38241000 |
Adicionados ao alumínio líquido para possibilitar a remoção de escórias |
Instantâneo |
Gases inertes |
28042100 |
Injetados no alumínio líquido para possibilitar a remoção de gases e impurezas retidas |
Instantâneo |
|
Consumíveis do Desgaseificador Mega |
69031090 |
Peças do equipamento de injeção dos gases inertes que entram em contato direto alumínio líquido |
2-4 meses |
|
Pastilhas de corte |
82090011 |
Insertos intercambiais que removem o material das peças no processo de torneamento em alta rotação, sofrendo desgaste acelerado |
1 dia |
|
Serras |
82022000 |
Lâminas que cortam os canais de enchimento das peças fundidas |
1 mês |
|
Brocas |
82075011 |
Ferramentas utilizadas para usinar furos nas peças |
6 dias |
|
Usinagem e Acabamento |
Fluídos de corte |
34039000 |
Óleo solúvel em água que é jateado sobre as peças durante o processo de torneamento. Sofre perda por evaporação, arraste e contaminação |
Instantâneo |
Desengraxante |
27101932 |
Produto utilizado para remover (por imersão) o óleo solúvel aderido às peças |
Instantâneo |
|
Lixa |
68051000 |
Utilizada para reduzir a rugosidade na superfície das peças |
1 hora |
|
Tinta spray |
32089010 |
Utilizada para cobrir pequenos defeitos estéticos da peça |
Instantâneo |
|
Caixa de papelão |
48191000 |
Embalagem primária ou secundária |
||
Tabuleiro |
48191000 |
Embalagem primária |
||
Sacos plásticos |
39232990 |
Embalagem primária |
||
Etiquetas |
48219000 |
Embalagem primária |
||
Paletes |
39231090 |
Embalagem primária, secundária ou terciária |
||
Filme stretch |
93199000 |
Embalagem terciária |
||
Ribbon |
84439199 |
Para impressão das etiquetas |
||
Embalagem |
Tubo isolante |
39173290 |
Embalagem primária |
|
Grampo Barret |
83052000 |
Para montagem das caixas de papelão |
||
Plástico bolha |
39234000 |
Embalagem primária |
||
Fita de arquear |
39232190 |
Embalagem terciária |
Argumenta que todos os produtos são consumidos no processo industrial, em razão do contato direto com o produto objeto da industrialização.
Após descrever o processo industrial e seu entendimento quanto à classificação dos produtos como materiais secundários e os materiais de embalagem, apresenta as seguintes indagações:
1. No cenário apresentado, é possível a consulente aproveitar crédito de ICMS sobre a aquisição dos materiais citados na tabela constante dos autos, nos termos do artigo 3º da IN 990/2010-GSF, alterada pela IN 1.368/2018-GSF?
2. Sendo possível, a consulente poderá aproveitar de forma retroativa os créditos que não vinha aproveitando quando da aquisição dos referidos materiais?
É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO
A Constituição Federal ao autorizar a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal a instituir os tributos nela relacionados, estabeleceu, relativamente ao ICMS, a não-cumulatividade, conforme disposto no inciso I do § 2º do art. 155. Mais adiante, no mesmo artigo, a Lei Maior, no inciso XII, previu Lei Complementar tratando de normas gerais aplicáveis ao imposto.
A Lei Complementar nº 87/1996 confirmou a não-cumulatividade do ICMS (art. 19) e assegurou ao sujeito passivo o direito de creditar-se do ICMS anteriormente cobrado na operação de aquisição de mercadoria pelo estabelecimento para compensação com o valor do imposto por ele devido (art. 20), vedando, entretanto, o crédito relativo a mercadoria adquirida para integração ou consumo em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior. (§ 3º do art. 20).
“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.
Para Leandro Paulsen, Curso de Direito Tributário – Completo, 9a.ed., “A não cumulatividade é mecanismo que evita a tributação em cascata, ou seja, impede que a tributação de operações sucessivas, com a incidência repetida do mesmo tributo, acabe por agravar diversas vezes a mesma riqueza. Para evitar isso, a Constituição optou pela não cumulatividade baseada num sistema de creditamentos. Quando um contribuinte adquire mercadorias para revenda, credita-se do ICMS que onerou a compra, sendo que poderá deduzir tais valores do ICMS que terá de pagar nas operações posteriores em que ele próprio promover a venda de mercadorias”.
No inciso XII, do mesmo artigo, a CF determina que as normas gerais aplicáveis ao imposto serão dispostas por meio de Lei Complementar, que nos leva a edição da LC nº 87/1996 (Lei Kandir), que assegurou ao contribuinte o direito ao crédito do imposto cobrado em operação anterior, conforme artigo 19 e 20, a seguir:
"Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.
Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.
(...)
§ 3º É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I - para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior”.
A Legislação do Estado de Goiás adotou essas determinações tanto no Código Tributário do Estado de Goiás – CTE, artigos 58 a 60, quanto no Regulamento do Código Tributário do Estado de Goiás – RCTE, artigos 44 a 54, destacando, todavia, no artigo 522, que somente dará direito a crédito a mercadoria destinada ao uso ou consumo do estabelecimento, nele entrada a partir de 1º de janeiro de 2033.
Fica evidente que o ponto crucial na presente consulta é a determinação se as mercadorias mencionadas na inicial devem ser classificadas como matéria-prima ou produto intermediário.
Matéria-prima é toda “substância bruta principal e essencial com que é fabricada alguma coisa”, segundo o dicionário Aurélio, é também o entendimento da Receita Federal, conforme Parecer Normativo COSIT nº 4, de 25 de março de 2014.
Considera-se produto intermediário a mercadoria integrada ou consumida no processo industrial.
A Instrução Normativa nº 990/10-GSF esclarece a interpretação para o termo “produto intermediário”, no artigo 3º, da forma a seguir:
“Art. 3º Considera-se produto intermediário a mercadoria integrada ou consumida no processo industrial.
§ 1º Considera-se integrada ao produto em fabricação a mercadoria adquirida para emprego em processo industrial que venha a se incorporar ao produto final por meio de combinação química ou por adjunção física.
§ 2º Considera-se consumido no processo de industrialização o produto individualizado que, embora não se integre ao produto em fabricação, seja consumido de forma direta e integral no referido processo, observado o seguinte:
I - é produto individualizado aquele que goza de autonomia, atua de forma específica no processo produtivo e não faz parte de uma estrutura maior, estável e duradoura, não se constituindo, dessa forma, parte, peça, componente ou acessório de máquina, ferramenta ou equipamento;
II - é consumido de forma direta no processo de industrialização o produto individualizado cuja participação no referido processo dê-se por meio de contato físico direto com o produto em fabricação em qualquer ponto da linha de produção da mercadoria;
III - é consumido de forma integral no processo de industrialização o produto individualizado que sofra esgotamento instantâneo em decorrência de sua utilização no referido processo”.
Seu artigo 5º assim dispõe:
“Art. 5º Considera-se material de embalagem a mercadoria destinada a acondicionar o produto fabricado para fins de transporte ou apresentação.
Parágrafo único. Incluem-se entre o material de embalagem os:
I - recipientes, envoltórios, cápsulas e outros produtos usados no acondicionamento do produto fabricado;
II - rótulos, rolhas, tampas e outros mecanismos para fechar recipientes, cápsulas e outros produtos usados no acondicionamento do produto;”
Analisaremos a aplicação e a forma de consumo dos materiais citados pelo consulente, a fim de verificar se durante as etapas do processo de industrialização (fundição, usinagem e acabamento), se enquadram ou não como produtos intermediários, e definir se será legalmente possível o aproveitamento do crédito pela entrada destes produtos, levando-se em consideração a forma de consumo descrita pelo consulente e se atendem as condições de consumo, previstas na IN 990/2010-GSF, ou seja, se foram integrados ou consumidos (de forma direta e integral) no processo industrial, como explicado abaixo:
1. Na Fundição
• Cadinho – Uso e consumo – embora seja um produto individualizado, não goza de autonomia, pois faz parte de uma estrutura maior, não atuando de forma direta sobre o produto e nem sofre esgotamento instantâneo em decorrência da sua utilização no processo de industrialização (artigo 3º, § 2º incisos II e III);
• Tintas desmoldantes Uso e consumo – não integra o produto final e não é consumida de forma direta, pois é aplicada nos moldes e não nos produtos em produção;
• Buchas térmicas – Uso e consumo – são partes e peças de outros equipamento;
• Sais escorificantes – segundo a IN nº 990/2010-GSF é produto intermediário porque é individualizado, tem autonomia e embora não integre o produto final é consumido de forma direta e integral durante o processo de industrialização;
• Gases inertes – segundo a IN nº 990/2010-GSF é produto intermediário porque é individualizado, tem autonomia e embora não integre o produto final, é consumido de forma direta e integral durante o processo de industrialização;
• Consumíveis do Degaseificador Mega – Uso e consumo – são peças de reposição do ativo imobilizado.
2. Na Usinagem e Acabamento
• Pastilhas de corte – Material de uso e consumo – não sofre esgotamento instantâneo em decorrência de sua utilização no processo de industrialização (artigo 3º, §, inc. III);
• Serras – embora seja um produto individualizado, não goza de autonomia, pois faz parte de uma estrutura maior, e não sofre esgotamento instantâneo em decorrência da sua utilização no processo de industrialização (artigo 3º, § 2º incisos I e III);
• Brocas - embora seja um produto individualizado, não goza de autonomia, pois faz parte de uma estrutura maior, e não sofre esgotamento instantâneo em decorrência da sua utilização no processo de industrialização (artigo 3º, § 2º incisos I e III);
• Fluidos de corte - segundo a IN nº 990/2010-GSF é produto intermediário porque é individualizado, tem autonomia e embora não integre o produto final, é consumido de forma direta e integral durante o processo de industrialização;
• Desengraxante - segundo a IN nº 990/2010-GSF, tomando em consideração a utilização descrita na peça de consulta, é classificado como produto intermediário, porque é individualizado, tem autonomia e embora não integre o produto final, é consumido de forma direta e integral durante o processo de industrialização;
• Lixa - embora seja um produto individualizado, não goza de autonomia, pois faz parte de uma estrutura maior (necessita ser acoplado a uma ferramenta) e não sofre esgotamento instantâneo em decorrência da sua utilização no processo de industrialização (artigo 3º, § 2º incisos I e III);
• Tinta spray – Produto intermediário – trata-se aqui de um produto intermediário, tanto sob a análise da IN nº 990/2010-GSF, quanto na jurisprudência dominante do STF, pois, nos termos do artigo 3º, § 1º, este produto intermediário integra ao produto em fabricação por meio da adjunção física e por integrar o produto final está de acordo com as decisões do STF.
III – CONCLUSÃO
Com base na legislação tributária acima trascrita, pode-se concluir que:
1 - A consulente poderá aproveitar o crédito pela entrada dos seguintes produtos secundários, no seu processo de industrialização (fundição, usinagem e acabamento), nos termos do artigo 3º, § 2º, incisos II e III da IN nº 990/2010-GSF:
• Sais escorificantes (NCM 38241000);
• Gases inertes (NCM 28042100);
• Fruídos de corte (NCM 34039000);
• Desengraxante (NCM 27101932) e
• Tinta spray (NCM 32089010).
2 – Em relação aos materiais de embalagens, o nosso entendimento é o de que com exceção de paletes (NCM 39231090) – que são bens do ativo imobilizado, a consulente poderá utilizar o crédito referente a aquisição de todos os outros itens, nos termos do artigo 5º, parágrafo único, incisos I e II da IN nº 990/2010/GSF, os quais são:
• Caixa de papelão (NCM 48191000);
• Tabuleiro (NCM 48191000);
• Sacos plásticos (NCM 39232990);
• Etiquetas (NCM 48219000);
• Filme stretch (NCM 93199000);
• Ribbon (NCM 84439199);
• Tubo isolante (NCM 39173290);
• Grampo Barret (NCM 83052000);
• Plástico bolha (NCM 39234000) e
• Fita de arquear (NCM 39232190).
Quanto ao outro questionamento da consulente (item 2 da página 3), em sendo possível o aproveitamento dos materiais citados, poderia aproveitar de forma retroativa os créditos que não vinha sendo aproveitados quando da aquisição dos referidos materiais, ou seja aproveitamento extemporâneo de créditos, há previsão legal na legislação tributária nesse sentido, nos termos prescritos no art. 52 do RCTE, e desde que cumpridas as condições impostas, tais como as descritas no artigo 58, § 3º, incisos I e II e § 4º do CTE e outras, ou seja, idoneidade da documentação fiscal, escrituração no prazo e nas condições exigidas e a limitação do prazo para aproveitamento, isto é, cinco anos contados da data de emissão do documento fiscal.
É o parecer.
GERÊNCIA DE ORIENTAÇÃO TRIBUTÁRIA DA SECRETARIA DE ESTADO DA ECONOMIA, aos 14 dias do mês de abril de 2021.
Documento assinado eletronicamente por JOSE FERREIRA DE SOUSA, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 14/04/2021, às 16:36, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.
Documento assinado eletronicamente por DENILSON ALVES EVANGELISTA, Gerente, em 14/04/2021, às 16:49, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.