Parecer CJ nº 2.522 de 09/08/2001

Norma Federal - Publicado no DO em 16 ago 2001

Enquadramento legal dos trabalhadores rurais que trabalham em empresas agroindustriais

ASSUNTO: Enquadramento legal dos trabalhadores rurais que trabalham em empresas agroindustriais. EMENTA: Direito Previdenciário. Enquadramento de Segurados como Trabalhadores Rurais tendo em vista a natureza da atividade do empregado e não das empresas. Os empregados que exercem atividades tipicamente rurais em agroindústrias, especificamente em usinas de cana-de-açúcar, são tidos, para fins de concessão de aposentadoria por idade, como trabalhadores rurais e não urbanos. Necessidade de adequação das normas regulamentares e da rotina do Instituto Nacional do Seguro Social a este entendimento. Art. 201, § 7º, inciso II da Constituição Federal e dispositivos da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

1. Trata-se de requerimento do Gabinete do Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social para que esta Consultoria Jurídica analise o questionamento da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais, sobre o enquadramento dos trabalhadores que exercem atividades tipicamente rurais junto às empresas agroindustriais, especificamente junto às usinas de destilação de álcool, para fins previdenciários.

2. Alega a Federação acima mencionada que diversos segurados do Instituto Nacional do Seguro Social tiveram os seus benefícios cassados, através de comissão de revisão, tendo em vista o fato de que eles trabalhavam em usinas de destilação de álcool, e que estas atividades não os autorizavam a receber benefícios rurais. Fundamenta a sua alegação em precedentes do Tribunal Superior do Trabalho, no art. 4º da Lei Complementar nº 16, de 1973 e no art. 19 do Decreto-lei nº 6.969, de 19 de outubro de 1994.

3. A questão a ser resolvida, nesta oportunidade, restringe-se ao enquadramento que se deve fazer em relação aos trabalhadores que desempenham serviços tipicamente rurais, mas que prestam serviços às empresas agroindustriais, ou seja, que têm por finalidade não só atividades rurais, mas também industriais. Ou melhor, se os segurados da previdência social são enquadrados, para fins de concessão de benefícios, tendo em vista a sua atividade ou a atividade da empresa empregadora.

É o relatório.

4. O Direito Previdenciário é ramo do direito público distinto do Direito do Trabalho e do Direito Tributário, contendo, portanto, princípios próprios, objeto específico e autonomia no campo da dogmática jurídica, que devem ser considerados como ponto de partida para uma distinção constitucionalmente adequada para a solução do presente caso.

5. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu distinções entre o trabalhador urbano e o rural para fins previdenciários, diminuindo a idade necessária destes últimos em 5 (cinco) anos como requisito para a obtenção do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do seu inciso II do § 7º do art. 2001.

6. A conceituação do que seja trabalhador urbano ou rural, no entanto, não figurou no texto constitucional, ficando, portanto, a cargo da legislação infraconstitucional fixar, conforme o campo de análise, os critérios ou princípios que melhor concretizem a vontade constitucional.

7. Para fins de obtenção de benefícios previdenciários, tem-se que o princípio adotado pela Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, foi o da efetiva atividade do segurado e não o da natureza da atividade do empregador, senão vejamos:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

I - como empregado:

a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado.

8. Este dispositivo menciona que empregado é aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural. Não se falou aqui da natureza econômica do empregador, ou seja, se este exerce atividade urbana ou rural, contentando-se em afirmar que será trabalhador rural aquele empregado que presta serviço de natureza rural, independentemente de quem seja o seu empregador.

9. Da mesma forma em relação aos contribuintes individuais, como a pessoa física que explora atividade agropecuária e no caso do trabalhador avulso, tem-se que:

Art. 11.

V - como contribuinte individual: (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999)

a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua; (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.1999) (grifo nosso)

VI - como trabalhador avulso: quem presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviço de natureza urbana ou rural definidos no Regulamento; (grifos nossos)

10. Todos estes segurados obrigatórios da Previdência Social são enquadrados pela natureza da sua atividade e não da empresa em que trabalham, seja como empregado, contribuinte individual - pessoa física -, ou trabalhador avulso.

11. Da mesma forma, o segurado especial, que também é enquadrado pela natureza da sua atividade, senão vejamos:

Art. 11.

VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. (O garimpeiro está excluído por força da Lei nº 8.398, de 07.01.1992, que alterou a redação do inciso VII do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24.07.1991)

12. Em diversos outros dispositivos da Lei nº 8.213, de 1991, encontramos também o critério da atividade do segurado, senão vejamos:

Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou

II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social.

Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.861, de 25.03.1994)

13. Assim, entendemos que a Lei nº 8.213, de 1991, optou claramente pelo critério da atividade do trabalhador e não o da natureza econômica do empregador para fins de conferir aos trabalhadores rurais o benefício contido no art. 201, § 7º, inciso II da Constituição Federal de 1988.

14. O direito de aposentação em tempo inferior aos demais trabalhadores será conferido àqueles trabalhadores que provarem o efetivo exercício de atividade rural, independentemente da natureza econômica do empregador. Assim, os trabalhadores rurais das agroindústrias são tidos, em relação aos benefícios previdenciários, como trabalhadores rurais e não como urbanos.

15. Não nos parece concretizar o dispositivo constitucional a adoção do critério da natureza da atividade do empregador para fins de caracterização da atividade rural para a obtenção de benefícios previdenciários. Não nos parece lógico que um trabalhador safrista, ou mais comumente chamado de bóia-fria, que trabalhe na extração da cana-de-açúcar, seja tido por trabalhador urbano, para fins previdenciários, tendo em vista a natureza agroindustrial do empregador - a usina de cana-de-açúcar -, impedindo este trabalhador, que exerce atividade tipicamente rural, de se aposentar aos 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinqüenta e cinco) se mulher.

16. Por outro lado, não nos parece lógico que contadores, escriturários, cozinheiros, motoristas etc., sejam tidos como trabalhadores rurais pelo tão-só motivo da natureza da atividade rural do seu empregador. Efetivamente, estes segurados não são trabalhadores rurais, mas sim urbanos.

17. A distinção constitucional entre trabalhadores rurais e urbanos, para fins previdenciários, não nos parece acobertar esta situação. Há motivos históricos e sociais a fundamentar esta distinção, considerando-se a natureza da atividade desempenhada por estes segurados e não pela natureza econômica da atividade de seu empregador, o que se confirma pela legislação infraconstitucional específica, qual seja, a Lei nº 8.213, de 1991.

18. Assim, temos que os trabalhadores que comprovadamente desempenham atividades rurais, independentemente da natureza da atividade do empregador, têm direito ao prazo reduzido, previsto no art. 201, § 7º, inciso II da Constituição Federal, para fins de concessão de aposentadoria por idade.

À consideração superior.

Brasília, 9 de agosto de 2001.

CARLOS AUGUSTO VALENZA DINIZ

3º Coordenador de Consultoria Jurídica

Aprovo.

À consideração do Senhor Consultor Jurídico

Brasília, 9 de agosto de 2001.

INDIRA ERNESTO SILVA QUARESMA

Coordenadora-Geral de Direito Previdenciário

Aprovo.

À consideração do Senhor Ministro.

Brasília, 9 de agosto de 2001.

ANTÔNIO GLAUCIUS DE MORAIS

Consultor Jurídico