Parecer nº 192 DE 30/06/2022

Norma Estadual - Rondônia - Publicado no DOE em 30 jun 2022

Consulta. Aproveitamento de crédito de ICMS decorrente da entrada de mercadoria escriturada no ativo imobilizado. Necessidade de cumprimento dos seguintes requisitos: (I) ser mercadoria; (II) estar regularmente escriturado em conta contábil do ativo imobilizado; e (III) ser empregado nas atividades fins do estabelecimento. Art. 30, c/c art. 31, §§ 1º e 2º da Lei n. 688/1996. Art. 44, II e § 1º do RICMS/RO-1998.

1. Relatório

Trata-se de consulta formulada pela 2º Delegacia Regional da Receita Estadual - Ji-Paraná (2º DRRE) pretendendo obter a correta interpretação do art. 30, c/c art. 31, §1º, da Lei n. 688, de 30 de dezembro de 1996, ante a divergência entre o entendimento dos Auditores Fiscais de Tributos Estaduais - AFTEs lotados na 2º DRRE e o entendimento de Supermercado Manar LTDA, contribuinte submetido a monitoramento. Para aclarar, transcrevemos:

Solicito interpretação da legislação tributária tendo em vista que surgiu divergência de interpretação quanto à apropriação de créditos fiscais do ativo imobilizado entre a interpretação dada pela Auditoria Fiscal (baseado no parecer n. 163/03 da GETRI, disponível em: https://www.sefin.ro.gov.br/portalsefin/anexos/166.80366232122978P03- 163.PDF) e a interpretação do Contribuinte quanto ao crédito do ativo imobilizado.

No caso específico, o contribuinte apropriou-se de créditos do ativo imobilizado - centrais de ar do mercado, carrinhos de limpeza e outros, alegando estar vinculado a sua atividade fim, entretanto, tratam-se de bens arrolados como instalações climatização, ou vinculados a limpeza do ambiente, que não se refere, no entender desta auditoria, a atividade principal da empresa (ramo de supermercados).

Assim, solicito a correta interpretação da legislação por meio de parecer.

É, em breve síntese, o relatório.

2. Análise e Legislação Aplicável

O Parecer n. 163/2003/GETRI/CRE/SEFIN, aludido pela consulente, se presta a expor a correta interpretação do art. 30 c/c art. 31, §1º, da Lei Estadual n. 688/96, tomando como parâmetro caso concreto submetido à esta Gerência de Tributação em procedimento de consulta.

Com suporte neste ato administrativo, a auditoria fiscal da 2 º DRRE identificou aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens escriturados no ativo imobilizado que entendeu terem sido empregados em atividades alheias aos fins do estabelecimento monitorado. Por conseguinte, notificou o contribuinte (notificação eletrônica n. 13142773) para promover a autorregularização, indicando os créditos que teriam sido aproveitados indevidamente.

O contribuinte, por sua vez, argumenta que determinados bens do ativo imobilizado que ensejaram o aproveitamento de crédito entendido pelo fisco como irregular são, de fato, empregados nas atividades fins do estabelecimento, solicitando, por conseguinte, a revisão dos valores a serem estornados. 

A notificação n. 13142773 e seus anexos, assim como o pedido de revisão formulado pelo contribuinte, estão acostados em Id 0029054436.

Desta forma, temos que o objeto da consulta é a correta interpretação da legislação tributária do Estado de Rondônia que delimita a apropriação de créditos fiscais do ativo imobilizado.

Inicialmente, destacamos que o art. 19 c/c art. 20, §§ 1º e 2º, da Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), cumprindo o mister imposto pelo art. 146, III, b, c/c art. 155, § 2º, XII, c, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CF/88, autoriza o aproveitamento de créditos do imposto cobrado anteriormente em operações de que tenha resultado entrada de mercadorias destinadas ao ativo permanente, para compensação com o imposto que for devido posteriormente pelas saídas de mercadorias ou serviços. Não obstante, vedam expressamente o aproveitamento do crédito nas hipóteses em que o bem do ativo permanente seja empregado em finalidade alheia às atividades do estabelecimento, conforme se extrai:

Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.

§ 2º Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.

(...)

As normas gerais estabelecidas pela Lei Kandir, acima transcritas, foram incorporadas ao art. 30, c/c art. 31, § 1º e 2º, da Lei Estadual n. 688/96, nos seguintes termos:

Art. 30. O imposto é não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outra unidade da Federação.

Art. 31. Para a compensação a que se refere o artigo 30, é assegurado ao sujeito passivo o direito de se creditar do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo imobilizado, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, observado o disposto no artigo 33.

Nota: Nova Redação Lei nº 3583, de 9/7/15 – efeitos a partir de 01/07/15

§ 1º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento.

§ 2º Salvo prova em contrário, presumem-se alheios a atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal.

(...)

Especialmente com relação à vedação ao aproveitamento de crédito decorrente da entrada  de mercadoria integrada ao ativo imobilizado empregada em finalidade alheia à atividade do estabelecimento, o RICMS/RO-2018, aprovado pelo Decreto Estadual n. 22.721, de 05 de abril de 2018, dispõe no seguinte sentido:

Art. 44. É vedado ao contribuinte creditar-se do imposto relativo à entrada de bens ou mercadorias, inclusive se destinados ao uso, consumo ou ativo imobilizado do estabelecimento, ou a utilização 
dos serviços, nos seguintes casos:

(...)

II - que se refiram a bens, mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento;

(...)

§ 1º. Para fins do disposto no inciso II deste artigo, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento, exceto quando diretamente vinculados aos seus objetivos sociais:

I - os veículos de transporte pessoal e as mercadorias ou serviços utilizados na sua manutenção;

II - as mercadorias ou serviços destinados a benefícios sociais de funcionários e seus dependentes, inclusive transporte e alimentação;

III - obras de arte;

IV - artigos de lazer, decoração e embelezamento.

Posto isso, temos que, no âmbito do Estado de Rondônia, para dar lastro ao aproveitamento de crédito nos termos do art. 30, c/c art. 31, §§ 1º e 2º da Lei n. 688/96, o bem do ativo imobilizado deverá preencher os seguintes requisitos: (I) ser mercadoria; (II) estar regularmente escriturado em conta contábil do ativo imobilizado; e (III) ser empregado nas atividades fins do estabelecimento.

O primeiro requisito é que o bem seja mercadoria, afeta ao campo de incidência do ICMS.

Nesse sentido, não dão direito a crédito do ICMS os bens que, embora sejam regularmente classificados em conta contábil do ativo imobilizado, não sejam considerados mercadoria para fins de incidência do imposto estadual, tal como ocorre com os imóveis.

Em seguida, o bem deve estar escriturado em conta contábil do ativo imobilizado segundo as normas de contabilidade vigentes no país. Especialmente, para obter esta classificação contábil, deverá se tratar de um bem mantido para uso na produção ou no fornecimento de mercadoria ou serviço, para aluguel a outros ou para fins administrativos, e deve ter expectativa de utilização superior a um período, a teor do art. 179, IV, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, c/c Pronunciamento Técnico n. 27, do Comitê de Pronunciamentos Contábeis.

Nesse ponto, ressaltamos que a legislação tributária do Estado de Rondônia não exige qualquer outra subclassificação dentro do ativo imobilizado para fins de aproveitamento de crédito de ICMS. Assim, a subclassificação doutrinária em “obras civis”, “instalações” e “investimentos”, deduzida no Parecer n. 163/2003/GETRI/CRE/SEFIN, conquanto seja um norte para a identificação dos bens empregados nas atividades fins do estabelecimento, não precisa ser exatamente observada para que o contribuinte aproveite créditos de ICMS de bens do ativo imobilizado.

Por último, a mercadoria regularmente escriturada no ativo imobilizado deverá ser empregada na atividade fim do estabelecimento, isto é, na dinâmica de entrada, manutenção ou modificação e de saída de outros produtos ou mercadorias ou de prestação de serviços tributados com o imposto estadual. Por outro lado, não dão direito ao crédito as mercadorias regularmente escrituradas no ativo imobilizado que sejam empregadas em atividades que, embora também sejam importantes para a consecução dos fins do estabelecimento, desenvolvam funções acessórias.

O cumprimento destes requisitos, por conseguinte, somente podem ser aferidos por intermédio da análise do caso concreto, com as ferramentas de que dispõe esta Secretaria de Estado de Finanças do Estado de Rondônia na execução das funções de auditoria e de fiscalização.

Feitas essas considerações, com finalidade meramente exemplificativa, realizaremos uma análise a priori da existência ou não do direito do contribuinte ao creditamento do ICMS pretendido em Ids 0029054424 e 0029054436, fls. 17/18, o que não vincula a decisão da autoridade competente para tanto, uma vez que a constatação da existência ou não do direito ao crédito depende da análise pormenorizada do caso concreto.

Para tanto, em razão da ausência de informação em sentido contrário deduzidas após o pedido de revisão formulado pelo contribuinte, partiremos do pressuposto de que as mercadorias cujo aproveitamento de crédito é pretendido estão regularmente inscritas no ativo imobilizado, ressaltando que o cumprimento destes requisitos deverá ser averiguado pela autoridade competente durante a análise da situação de fato.

Conforme se depreende dos dados do contribuinte constantes da notificação de I d 0029054436 e do CADICMS/RO acostado em Id 0030073441, o sujeito passivo se trata de supermercado e desenvolve atividades de comércio de mercadorias, padaria, confeitaria, restaurante, lanchonete, casa de chá e de sucos, bem como presta serviços de transporte rodoviário de cargas.

Desta forma, os bens do ativo imobilizado empregados na limpeza do estabelecimento não estão incluídos diretamente na dinâmica de entrada, manutenção ou transformação e saída de produto ou mercadoria ou de prestação de serviço sujeito ao imposto estadual, mas em atividade acessória, motivo pelo qual entendemos que não dão direito ao aproveitamento de crédito de ICMS.

Os bens descritos como “967 – SERVIDOR RACK DELL POWEREDGE R740”, “561 – GERTEC TC506 WIFI TERMINAL PERPDE CONSU”, “970 – MIT PLAYER W SERIE 12517124”, “990 – ESTAÇÃO BASE E3 C/ FONTE DE ALIMENTAÇÃO” e “992 – ANTENA INFRAVERMELHO 50 (C3-6102)”, pelas justificativas do contribuinte, a nosso ver, estão empregados diretamente na manutenção das mercadorias em estoque e na venda ao consumidor, um dos fins do estabelecimento.

Assim, em tese, dão direito ao aproveitamento de crédito de ICMS.

Por fim, no que diz respeito aos bens do ativo imobilizado destinados à climatização, o contribuinte justifica o aproveitamento de crédito nos seguintes termos: sistema de ar condicionado central, para manter a temperatura uniforme e adequada para melhor conservação dos produtos, além de proporcionar conforto térmico aos clientes. O cliente é o foco principal da loja.

Conforme acima exposto, o mesmo bem do ativo imobilizado pode ensejar ou não o aproveitamento de crédito, a depender de sua utilização no estabelecimento. Assim, um mesmo aparelho destinado à climatização poderá ensejar o creditamento, caso seja utilizado de uma forma que se torne indispensável, por exemplo, para a conservação de mercadoria em estoque. Não obstante, se esse mesmo aparelho for utilizado com finalidade acessória à dinâmica de entrada, manutenção ou transformação e saída de produto ou mercadoria ou de serviço tributado pelo imposto estadual, não dará lastro ao aproveitamento de crédito. Como exemplo, citamos a utilização do aparelho em local destinado ao apoio administrativo, em local destinado à espera pelo cliente ou, ainda que em ambiente de comercialização, com função precípua de prestar conforto térmico ao consumidor.

Das justificativas apresentadas pelo sujeito passivo, não depreendemos que os bens destinados à climatização se prestem precipuamente a evitar o perecimento de mercadorias, mas ao conforto térmico de clientes. Além disso, a consulente sustenta que esses bens estão arrolados como “instalações climatização”, o que, embora não se coloque, por si, como obstáculo ao aproveitamento de crédito, indica que o contribuinte utiliza tais instalações de climatização com finalidades acessórias às atividades principais do estabelecimento.

Assim, parece-nos que os aparelhos destinados à climatização indicados em Id 0029054436, fls. 17/18, não dão lastro ao aproveitamento de crédito de ICMS pelo contribuinte.

3. Conclusão

Com base na legislação relacionada e no raciocínio jurídico acima exposto, conclui-se que:

a) no âmbito do Estado de Rondônia, para dar lastro ao aproveitamento de crédito nos termos do art. 30, c/c art. 31, §§ 1º e 2º da Lei n. 688/96, o bem do ativo imobilizado deverá preencher os seguintes requisitos: (I) ser mercadoria; (II) estar regularmente escriturado em conta contábil do ativo imobilizado; e (III) ser empregado nas atividades fins do estabelecimento;

b) o cumprimento destes requisitos, por conseguinte, somente podem ser aferidos por intermédio da análise do caso concreto, com as ferramentas de que dispõe esta Secretaria de Estado de Finanças do Estado de Rondônia na execução das funções de auditoria e de fiscalização.

É o parecer.

À consideração superior.

Porto Velho, 30 de junho de 2022.

Diego Souza Meneguitti

Auditor Fiscal de Tributos Estaduais

Matrícula n. 300168996

Heleno Meira da Silva

Auditor Fiscal de Tributos Estaduais

Matrícula n. 300160787