Parecer GEOT nº 17 DE 01/03/2021
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 01 mar 2021
Dúvida quanto à possibilidade de utilização de crédito, recebido em transferência, para extinção de débito de ITCD.
I - RELATÓRIO
Trata-se de consulta incidental nos autos do processo em que o sujeito passivo (...) solicita a utilização de crédito acumulado objetivando a compensação no PAT 3035342197087.
Os autos foram encaminhados ao Auditor-Fiscal da Receita Estadual – (...), para fins de realização da auditoria de verificação do crédito transferido pela empresa (...).
Em resposta, o Auditor detalhou a metodologia do trabalho realizado, afirmando que atestou a regularidade do registro fiscal da NF-e n.º 001.192 na escrita fiscal eletrônica (EFD) do emitente e que a remetente do crédito possuía em 30/06/2017, um saldo credor acumulado suficiente para a emissão e transferência dos créditos nos termos da Lei n.º 19.738/20017.
A manifestação do Auditor foi ratificada pela Gerência de Auditoria de Indústria e Atacado, corroborando que a cedente em questão pode transferir para a interessada, o ICMS no valor pleiteado na inicial de R$ 274.035,19 (duzentos e setenta e quatro mil e trinta e cinco reais e dezenove centavos), nos moldes da Lei nº 19.738/2017 e da Instrução Normativa nº 1.348/17-GSF.
Por sua vez, a Superintendência de Recuperação de Créditos, nos termos do artigo 18 da IN nº 1.348/17 – GSF, mediante o Despacho n.º 1960/2019 – SRC - 15954 homologou os créditos constantes no pedido inicial, promovendo a extinção total do crédito tributário referente ao Processo Administrativo Tributário (PAT) n° 3035342197087.
Na sequência, a Superintendência de Recuperação de Créditos exarou o Despacho n.º 675/2020 - SRC- 15954, revogando os despachos n.ºs 1960 e 1708, sob o argumento de que não haveria possibilidade de se compensar crédito acumulado de ICMS com ITCD, e determinou a adoção das seguintes providências:
a) A manutenção do sistema Grande Porte no sentido de reverter todas as modificações processadas em decorrência dos despachos revogados.
b) A ciência do contribuinte e a notificação do mesmo para que realize o pagamento do valor remanescente do PAT 3035342197087 com os benefícios da Lei 19.738/17, que podem ser aproveitados em crédito tributário de ITCD, no prazo de 10 (dez) dias, nos termos do art. 166-A do CTE.
Devidamente notificada, a interessada apresentou resposta à notificação, defendendo que não poderia a Administração, depois de ter reconhecido seu direito de aderir aos benefícios advindos da Lei 19.738/17 (PRONEFI) e ao final, o direito em efetuar o pagamento de seu débito tributário com créditos tributários de terceiros em agosto de 2019, conforme preconiza a legislação que rege a matéria, voltar atrás, sete meses depois, em verdadeiro prejuízo à validade do ato administrativo, à segurança jurídica, e ao ato perfeito, sob pena de afronta ao efeito jurídico produzido pelo ato, desrespeitando o direito adquirido naquele momento da prolação da homologação.
Na sequência, a Coordenação de Parcelamento, Pagamento e Baixa encaminha os autos a esta Gerência de Orientação Tributária, mediante o Memorando n.º 3/2020 - GCOB/CPPB- 15801, formulando as seguintes indagações:
1) a Lei n.º 19.738/17 autoriza a transferência de crédito acumulado de sociedade empresária para pessoa física?
2) em caso negativo, qual seriam os efeitos da revisão de despachos neste sentido? Como ficariam as cobranças de penalidades? Quais procedimentos devem ser tomados?
II - FUNDAMENTAÇÃO
Cuida-se de consulta incidental endereçada a esta Gerência de Orientação Tributária formulada pela Coordenação de Parcelamento, Pagamento e Baixa, indagando se a Lei n.º 19.738/17 autoriza a transferência de crédito acumulado de sociedade empresária para pessoa física para fins de quitação de débitos relacionados ao Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD.
A resposta à consulta passa pela análise dos dispositivos da Lei n.º 19.738/17 e da Instrução Normativa n.º 1.348/17, a seguir transcritos:
Lei n.º 19.738//17
Art. 1º Ficam instituídas as medidas facilitadoras para a quitação de débitos para com a Fazenda Pública Estadual, relacionados com o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação –ICMS - e com o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos - ITCD.
[...]
Art. 3º As medidas facilitadoras para quitação de débitos compreendem:
[...]
IV - permissão para pagamento do débito por meio de crédito acumulado na escrita do sujeito passivo ou recebido em transferência para este fim, nos limites previstos nesta Lei.
[...]
Art. 9º O crédito tributário favorecido somente é liquidado com pagamento em moeda corrente ou em cheque, nos termos da legislação tributária estadual, ou por meio da utilização de crédito acumulado na escrita do sujeito passivo ou recebido em transferência.
§ 1º A liquidação por meio da utilização de crédito acumulado ou recebido em transferência fica sujeita:
I - ao pagamento de, pelo menos, 40% (quarenta por cento) do valor do crédito tributário favorecido em moeda e à vista;
II - à ulterior verificação pelo fisco, no prazo definido em ato do Secretário de Estado da Fazenda.
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Instrução Normativa n.º 1.348/17
Art. 1º A implementação das medidas facilitadoras para quitação de débitos para com a fazenda pública estadual, relacionadas com o ICMS e com o ITCD, instituídas pela Lei nº 19.738/17, deve ser realizada de acordo com o disposto nesta Instrução.
[...]
Art. 3º As seguintes medidas facilitadoras para quitação de débitos compreendem:
[...]
VII - permissão para pagamento do débito por meio de crédito acumulado na escrita do sujeito passivo ou recebido em transferência, nos limites previstos nesta instrução.
[...]
Art. 14. O contribuinte que pretender utilizar crédito acumulado na liquidação total ou parcial do crédito tributário favorecido deve pagar à vista, em moeda, pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor do crédito favorecido até a data de 10 de dezembro de 2018, observado o seguinte:
[...]
IV - o crédito acumulado deve referir-se ao valor constante na Escrituração Fiscal Digital - EFD - referente ao período de apuração de outubro de 2018;
V - o crédito recebido em transferência para os fins do Programa, somente pode ser utilizado para extinção de débito, sob pena de nulidade da transferência e sem prejuízo da aplicação das penalidades correspondentes à utilização indevida de crédito.
VI - a utilização de crédito de ICMS para liquidação total ou parcial do crédito tributário favorecido somente pode ser efetivada uma única vez;
§ 1º A liquidação por meio da utilização de crédito de ICMS aplica-se, inclusive, ao sujeito passivo não inscrito no CCE ou ao contribuinte que estiver com sua inscrição no CCE suspensa, paralisada, cassada ou baixada ou que não apure o ICMS pelo regime normal, hipóteses em que pode haver utilização:
I - de crédito de ICMS acumulado por terceiros, em se tratando de sujeito passivo não inscrito no CCE ou ao contribuinte que estiver com sua inscrição no CCE suspensa, paralisada, cassada ou baixada;
II - de crédito de ICMS acumulado por terceiros ou crédito próprio, em se tratando de contribuinte que não apure o ICMS pelo regime normal, que estiver com sua inscrição no CCE ativa.
§ 2º Para transferir crédito de ICMS, o contribuinte deve estar com sua inscrição ativa na data de publicação da Lei nº 19.738/17 e permanecer ativa até a data de transferência do crédito de ICMS.
Da leitura atenta dos textos normativos supratranscritos, percebe-se que a Lei n.º 19.738/2017, em seu artigo 9º, prevê três modalidades de liquidação do crédito tributário favorecido, a saber: a) pagamento em moeda corrente ou em cheque, b) por meio da utilização de crédito acumulado na escrita do sujeito passivo, ou c) crédito recebido em transferência.
Cuidaremos aqui de abordar somente o crédito recebido em transferência, que é que interessa ao caso.
Nos termos do disposto no art. 9º, §2º, da Instrução Normativa n.º 1.348/17, não pairam dúvidas de que o cedente do crédito, em caso de transferência, deve se qualificar como contribuinte do ICMS, com inscrição estadual ativa.
No que tange ao cessionário, o art. 14, § 1º e inc. I, da Instrução Normativa n.º 1.348/17, ao prescrever que a utilização de crédito de ICMS para liquidação do crédito tributário favorecido aplica-se, inclusive, ao sujeito passivo não inscrito no CCE, também não enseja qualquer dificuldade de compreensão no sentido de que a pessoa física pode ser beneficiária de crédito de ICMS acumulado por terceiros, recebido em transferência.
Passemos à análise da dúvida quanto à possibilidade de utilização de crédito, recebido em transferência, para extinção de débito de ITCD.
Cediço que o conceito da compensação é fornecido pelo Direito Civil. Para este a compensação é uma das formas de extinção das obrigações em geral. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.
O Código Tributário Nacional acolheu o instituto, com algumas particularidades, dispondo no seguinte sentido: a lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública (art. 170).
Por outro lado, incumbe advertir que o Código Tributário Nacional não estabelece a compensação como forma de extinção do crédito tributário, mas apenas prescreve que a lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.
Pois bem. No âmbito da legislação tributária goiana, a Lei n.º 19.738/17 - que institui medidas facilitadoras para a quitação de débitos para com a Fazenda Pública Estadual, relacionados com o ICMS e com o ITCD – ao permitir a utilização de créditos recebidos em transferência para fins de compensação, em seus artigos 3º, inc. IV e 9º utiliza as expressões “pagamento do débito” e “crédito tributário favorecido”, sem estabelecer restrição alguma a que a compensação somente se opere quando se tratar de débitos atinentes ao ICMS.
Não se tem notícia, é certo, de precedentes na legislação tributária goiana autorizando a operacionalização de compensação entre impostos de naturezas distintas, como ocorre com o ICMS e o ITCD.
Lado outro, não se pode perder de mira que estando o direito à compensação autorizado mediante lei ordinária, é prerrogativa do legislador autorizar a compensação sob certos critérios, condições e forma, e não tendo a Lei n.º 19.738/17, repise-se, estabelecido qualquer tipo de restrição a que os créditos recebidos em transferência somente sejam utilizados na liquidação de débitos de ICMS, entendemos que onde a lei não distingue não pode o intérprete distinguir.
Cumpre enfatizar que o art. 14, § 1º e inc. I, da Instrução Normativa n.º 1.348/17 permite a utilização de crédito de ICMS para liquidação do crédito tributário favorecido pertencente a sujeito passivo não inscrito no CCE, o que beneficia qualquer pessoa física, que como se sabe pode se qualificar como contribuinte tanto do ICMS quanto do ITCD.
Em reforço a esta assertiva, calha trazer à transcrição a disciplina contida no art. 175-A, §1º, do Código Tributário Estadual:
Art. 175-A. A Secretaria da Fazenda, antes de proceder à restituição do imposto, deve verificar se o contribuinte tem débito inscrito em dívida ativa, caso em que o valor da restituição deve ser, de ofício, compensado, total ou parcialmente, com o valor do débito.
§ 1º A pedido do contribuinte, pode ser efetuada a compensação do valor a ser restituído com débitos do sujeito passivo com a Fazenda Pública Estadual, ainda não inscritos em dívida ativa, inclusive com crédito tributário não contencioso. (g. n.)
Desse modo, percebe-se que nem a Lei n.º 19.738/17 nem a Instrução Normativa n.º 1.348/17 estabelecem qualquer óbice à utilização de créditos recebidos em transferência, por pessoa física, para liquidação de débitos concernentes ao ITCD.
III – CONCLUSÃO
Com amparo nos preceitos da legislação tributária acima assinalados e à vista do exposto, conclui-se que:
Considerando que a Lei n.º 19.738/17, art. 3º, inc. IV, permite a quitação de débito mediante a utilização de crédito recebido em transferência, bem como o art. 14, § 1º e inc. I, da Instrução Normativa n.º 1.348/17 prevê expressamente a utilização de crédito de ICMS recebido em transferência para liquidação de crédito tributário favorecido pertencente a sujeito passivo não inscrito no CCE, sem estabelecer qualquer óbice a que o débito liquidando seja especificamente relacionado ao ICMS, a resposta à indagação esposada no “item 01” é no sentido de que a Lei n.º 19.738/17 autoriza a transferência de crédito acumulado de sociedade empresária para pessoa física, o que abarca a possibilidade de quitação de débitos alusivos ao ITCD.
A resposta à indagação expendida do “item 02” resta prejudicada.
É o parecer.
Gerência de Orientação Tributária da SECRETARIA DE ESTADO DA ECONOMIA, aos 01 dias do mês de março de 2021.
Documento assinado eletronicamente por DENILSON ALVES EVANGELISTA, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 01/03/2021, às 18:10, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.
Documento assinado eletronicamente por ELIZABETH DA SILVA FERNANDES FARIAS, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 10/03/2021, às 18:40, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.