Parecer GEOT nº 16 DE 25/02/2021

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 25 fev 2021

Dúvida quanto à possibilidade de lavratura de auto de infração visando à constituição de crédito tributário concernente ao ITCD, não objeto de ação fiscal, com vistas a possibilitar o contribuinte usufruir do benefício do parcelamento previsto na Lei n.º 20.966/2021.    

Nestes autos, a Gerência do imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos – ITCD solicita manifestação quanto à possibilidade de lavratura de auto de infração visando à constituição de crédito tributário concernente ao ITCD, não objeto de ação fiscal, com vistas a possibilitar o contribuinte usufruir do benefício do parcelamento previsto na Lei n.º 20.966/2021.

Explica que as normas que disciplinam o ITCD, contidas no Código Tributário Estadual, preveem que o ITCD espontâneo deve ser pago em única parcela, e que somente o ITCD oriundo de ação fiscal pode ser parcelado, conforme disposto nos parágrafos 2º e 3º do art. 84.

Expõe que a Lei n.º 20.966/2021, que institui o Programa Facilita, com medidas facilitadoras para que o contribuinte negocie seus débitos com a Fazenda Pública Estadual, em seu art. 2º, inc. III, estabelece a abrangência e o alcance dos benefícios, e inclui o "crédito tributário não constituído, desde que venha a ser confessado espontaneamente".

Externa o entendimento de que a interpretação conjunta do art. 84 do CTE com o art. 2º da Lei n.º 20.966/2021 permite o desenvolvimento de raciocínio no sentido de que a confissão espontânea não pode conduzir à possibilidade de parcelamento, posto que, na forma espontânea o pagamento do ITCD deve ser feito em única parcela. Desse modo, o contribuinte com o ITCD vencido e ainda não autuado (omisso), que almeja adesão ao Programa Facilita tem direito ao desconto na multa e nos juros de mora, mas não ao parcelamento, que somente é possível em caso de pagamento de crédito tributário de ITCD oriundo de ação fiscal, nos termos do art. 84, §3º, do CTE.

Após breve relato dos fatos, indaga:

a) é possível a denúncia espontânea do ITCD já declarado, vencido e não pago (omisso), cujo fato gerador já é de conhecimento da Fazenda Pública e para o qual já houve um procedimento administrativo, mesmo que não fiscalizatório?

b) existe a possibilidade de se proceder à lavratura de auto de infração espontâneo do ITCD para que seja feito parcelamento e, se sim, se o omisso do ITCD se enquadra nessa possibilidade?

II - FUNDAMENTAÇÃO

Cuida-se de pedido de manifestação endereçado a esta Gerência de Orientação Tributária formulado pela Gerência do imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos – ITCD, solicitando orientação quanto à possibilidade de lavratura de auto de infração visando à constituição de crédito tributário concernente ao ITCD, não objeto de ação fiscal, com vistas a possibilitar o contribuinte usufruir do benefício do parcelamento previsto na Lei n.º Lei 20.966/2021.

A Lei n.º 20.966/2021, que institui o Programa Facilita, com medidas facilitadoras para que o contribuinte negocie seus débitos com a Fazenda Pública Estadual, preceitua que:

Art. 1º Ficam instituídas as medidas facilitadoras para a quitação de débitos com a Fazenda Pública Estadual relacionados ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA e ao Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD.

[...]

Art. 2º As medidas facilitadoras abrangem o crédito tributário correspondente a fato gerador ou à prática da infração, com ocorrência até 31 de dezembro de 2020 e alcançam, inclusive, o crédito:

[...]

III – não constituído, desde que venha a ser confessado espontaneamente;

[...]

Art. 3º As medidas facilitadoras para a quitação de débitos compreendem:

[...]

II – o pagamento à vista ou parcelado do crédito tributário favorecido, por meio da:

a) permissão para que seja pago em até 60 (sessenta) parcelas mensais e sucessivas;

[...]

Art. 4º Para usufruir dos benefícios desta Lei, o sujeito passivo deve fazer sua adesão em até 60 (sessenta) dias, contados do início da produção dos efeitos dela.

A seu turno, o Código Tributário Estadual prescreve que o pagamento do ITCD, não submetido a ação fiscal (espontâneo), deve ser efetuado em uma única parcela, permitindo que somente o ITCD decorrente de ação fiscal possa ser objeto de parcelamento, nestes termos:

Art. 84. O local, o prazo e a forma de pagamento do ITCD devem ser estabelecidos em regulamento, atendido o disposto neste artigo.

[...]

§ 2º O ITCD deve ser pago em parcela única antes:

I - de proferida a sentença:

a) no processo de inventário;

b) na dissolução de sociedade conjugal ou união estável;

II - de protocolizar a petição inicial de inventário, na partilha amigável, nos termos previstos nos arts. 1.031 a 1.034 do Código de Processo Civil;

III - da lavratura da escritura pública ou do cancelamento da averbação no cartório, nas hipóteses de instituição e de substituição de fideicomisso;

IV - da lavratura da escritura pública de inventário, partilha, dissolução consensual de sociedade conjugal ou união estável;

V - da lavratura da escritura pública ou escrito particular, na transmissão por doação;

VI - da alienação, por meio de alvará judicial, de bem, direito ou levantamento de valores.

[...]

§ 3º O pagamento do crédito tributário de ITCD oriundo de ação fiscal pode ser dividido em até 48 (quarenta e oito) parcelas mensais e sucessivas, conforme dispuser o regulamento.

A dúvida esposada na consulta formulada pela Gerência do ITCD parte da premissa de que as redações dos artigos 84 do CTE e 2º da Lei n.º 20.966/2021 revelam a existência de um conflito de normas, dando margem à interpretação de que a confissão espontânea não pode resultar em possibilidade de parcelamento, já que, nos termos expressos no art. 84, § 2º, do CTE, o pagamento do ITCD não autuado deve ser feito em parcela única.

Da leitura atenta dos textos normativos supratranscritos, percebe-se que a Lei n.º 20.966/2021, que institui medidas facilitadoras para a quitação de débitos com a Fazenda Pública Estadual relacionados ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA e ao Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD, estabelece em seu artigo 4º que para usufruir dos benefícios ali disciplinados, o sujeito passivo deve fazer sua adesão no prazo de até 60 (sessenta) dias, contados do início da produção dos seus efeitos.

Trata-se, à toda evidência, de norma editada com vistas a regular situação específica e com vigência temporária.

Desse modo, percebe-se que, enquanto norma excepcional, especial e temporária, a Lei n.º 20.966/2021 trouxe regramento específico visando facilitar a negociação de débitos do contribuinte para com a Fazenda Pública do Estado de Goiás, dispondo, excepcional e temporariamente, de modo distinto da legislação tributária estadual acerca do parcelamento, sem que isso configure conflito de normas.

Repise-se que a Lei n.º 20.966/2021 é norma especial e temporária, circunscrita, pois, a um lapso temporal restrito de aplicação: implementação de medidas facilitadoras para a quitação de débitos com a Fazenda Pública Estadual relacionados ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA e ao Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD, beneficiando somente os contribuintes cuja adesão seja implementada no interregno de 60 (sessenta) dias, contados de sua eficácia.

Outrossim, a menção feita, na peça de consulta, ao parágrafo único do artigo 138 do Código Tributário Nacional soa inapropriada ao caso sob análise, posto que o próprio relatório da consulta noticia que não houve procedimento fiscalizatório em face dos contribuintes com débito de ITCD, na situação submetida à consulta.

A propósito, na esteira do disposto no art. 138, § único, do Código Tributário Nacional, os arts. 169 do CTE e 7º, inc. I, da Lei n.º 16.469/2009 orientam no seguinte sentido:

CTE

Art. 169. Antes de qualquer procedimento fiscal, os contribuintes e demais pessoas sujeitas ao cumprimento de obrigações tributárias poderão procurar a repartição fazendária competente para, espontaneamente:

I - sanar irregularidades verificadas em seus livros ou documentos fiscais, sem sujeição à penalidade aplicável, observado o disposto no inciso seguinte, quando da irregularidade não tenha decorrido falta de pagamento de tributo;

II - pagar, fora do prazo legal, o tributo devido, acrescido de multa apenas de caráter moratório equivalente a 3% (três por cento) ao mês, pro rata die, até o limite de 12% (doze por cento);

.......................................................................................................

Lei n.º 16.469/09

Art. 7º O procedimento fiscal tem início com:

I - o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificando o sujeito passivo ou seu preposto de qualquer exigência;

[...]

§ 1º O início do procedimento exclui a espontaneidade em relação aos atos do sujeito passivo e, independentemente de intimação, dos demais envolvidos nas infrações praticadas.

§ 2º O pagamento do tributo, após iniciado o procedimento, não exime o sujeito passivo da penalidade aplicável.

Oportuno abordar quando a denúncia é tida por espontânea.

O Código Tributário Nacional tratou explicitamente a matéria no parágrafo único do art. 138 quando preceitua que não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.

Assim, se antes de qualquer procedimento, o contribuinte, seja por ter visualizado equívoco anterior, seja mesmo por receio da fiscalização, pode se eximir da responsabilidade por infrações fazendo uma auto-denúncia.

No âmbito da legislação tributária goiana, a espontaneidade é excluída, nos termos dispostos no art. 7º, inc. I, da Lei n.º 16.469/2009, com o início do procedimento fiscal, demarcado por ato expresso, praticado por servidor competente, cientificando o sujeito passivo ou seu preposto de qualquer exigência relacionada à infração praticada, sendo desinfluente, para tal desiderato, a circunstância de o fato gerador ser do conhecimento da Fazenda Pública ou o fato de já ter sido instaurado procedimento administrativo.

É certo que o Colendo Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 360, fixando o entendimento que não cabe a denúncia espontânea nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação.

Eis o teor da aludida Súmula:

“O benefício da denúncia espontânea não se aplica aos tributos sujeitos a lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos a destempo.”

Não se pode olvidar, contudo, que o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCD não se qualifica como tributo sujeito a lançamento por homologação, não se lhe aplicando, pois, o teor do mencionado verbete.

III – CONCLUSÃO

Feitas as considerações acima, respondemos aos questionamentos da consulente nos seguintes termos:

1- Nos termos do art. 7º, inc. I, da Lei n.º 16.469/2009, a espontaneidade somente é excluída com o início do procedimento fiscal, demarcado por ato expresso, praticado por servidor competente, cientificando o sujeito passivo ou seu preposto de qualquer exigência relacionada à infração praticada, sendo desinfluente, para tal desiderato, a circunstância de o fato gerador ser do conhecimento da Fazenda Pública ou o fato de já ter sido instaurado procedimento administrativo. Assim, é possível denúncia espontânea do ITCD já declarado, vencido e não pago (omisso);

2- É incontroversa a possibilidade de se proceder à lavratura de auto de infração espontâneo, visando à constituição de crédito tributário do ITCD não objeto de ação fiscal, como mecanismo apto a viabilizar o parcelamento do débito, haja vista o regramento consignado no art. 2º, inc. III, na Lei n.º 20.966/2021.

É o parecer.

Gabinete do > do (a) SECRETARIA DE ESTADO DA ECONOMIA, aos 25 dias do mês de fevereiro de 2021.

Documento assinado eletronicamente por DENILSON ALVES EVANGELISTA, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 26/02/2021, às 16:29, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.

Documento assinado eletronicamente por ELIZABETH DA SILVA FERNANDES FARIAS, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 26/02/2021, às 16:39, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.