Mensagem de Veto nº 1089 DE 17/04/2012

Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 17 abr 2012

OF/CTL/CC nº 1089/2012 Curitiba, 17 de abril de 2012

 

Senhor Presidente,

 

Tenho a honra de acusar o recebimento do Ofício nº 024/2012-DAP/SA, dessa Presidência, e de levar ao conhecimento de Vossa Excelência que, usando da atribuição conferida pelo art. 87, inciso VII, combinado com o § 1º, do art. 71, ambos da Constituição Estadual, vetei, parcialmente, o Projeto de Lei nº 379/2011, por considerar a parte vetada inconstitucional, pelos motivos a seguir expostos.

 

O Projeto de Lei nº 379/2011, de iniciativa parlamentar, tem por escopo determinar a aplicação prática do conteúdo do § 5º do artigo 150 da Constituição Federal em todo o Estado do Paraná.

 

O mencionado Projeto de Lei determina a obrigatoriedade, em todo o Estado do Paraná, da discriminação na nota fiscal emitida para documentar operações com mercadorias ou prestações de serviço, dos tributos incidentes sobre os produtos e serviços, abrangendo informações sobre o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, o IPI - Imposto Sobre Produtos Industrializados e o ISS - Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, excluindo dessa obrigatoriedade a indicação dos tributos que não incidam na operação ou que não tenham impacto sobre o preço das mercadorias ou serviços.

 

Determina a proposição que caberá à Secretaria de Estado da Fazenda a fiscalização do cumprimento da Lei e que o descumprimento das suas determinações acarretará a aplicação de multa em valor a ser especificado, não inferior a cinco salários mínimos regionais.

 

Justifica a proposição a necessidade de regulamentar dispositivo da Constituição Federal que determina que "a Lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre as mercadorias e serviços".

 

Assim, por meio da inserção na nota fiscal relativa a cada produto ou serviço, tornar-se-ia transparente aos contribuintes o valor dos impostos cobrados.

 

Importante destacar, que a matéria (regulamentação do § 5º do art. 150 da CF) tem sido objeto de proposições de Leis Federais. O art. 150 § 5º vem assim redigido na nossa Carta Magna: "Art. 150 (.....). § 50. A Lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços."

 

Nesta toada, o PLS nº 174/2006, de autoria do Senador RENAN CALHEIROS (iniciado no Senado Federal), dispõe de igual matéria. Tal projeto, na Câmara dos Deputados se transformou no PROJETO DE LEI Nº 1.472, DE 2007 (Apensos os Projetos de Lei nº 3.488, de 1997, 2.544, de 2000; 4.033 e 4.684, de 2004; 4.854, 5.749, 6.013 e 6.057, de 2005; 6.730, 6.732, 7.242, 7.421 e 7.454, de 2006; 338 e 693, de 2007) e continua em tramitação. Nas duas casas, recebeu parecer favorável. Nestes projetos, além da redação similar à proposição estadual, há a alteração de algumas disposições do CDC (Código de Defesa do Consumidor).

 

Na premissa do texto base, surge o projeto de Lei Estadual, que visa, conforme justificativa apresentada, dar também uma regulamentação ao § 5º do art. 150 da CF, trazendo transparência aos consumidores, ao exigir, na emissão das notas fiscais de prestação de serviços e aquisição de mercadorias, a demonstração dos valores dos tributos incidentes sobre estas grandezas tributárias.

 

Nenhum problema em o Estado legislar em paralelo à União, haja vista que a matéria referente ao consumo é matéria de legislação concorrente, nos termos do art. 24, VI da Constituição Federal.

 

Dispondo o projeto apenas e especificamente sobre consumo, criando direitos e obrigações tão somente na relação estabelecimentos fornecedores ou prestadores x consumidores, e órgãos de proteção e defesa do consumidor, o projeto seria constitucional em sua integra.

 

Esta dinâmica estaria presente, contivesse o Projeto apenas a redação dos arts. 1º, art. 2º caput e §§ 1º e 2º e art. 4º.

 

Entretanto, o nobre Deputado inovou em relação ao projeto federal, introduzindo a Secretaria da Fazenda do Estado do Paraná, na relação entre estabelecimentos x consumidores, criando-lhe direitos e obrigações, numa relação em que não poderia figurar, já que a intenção do projeto não é adentrar na seara tributária.

 

A matéria espinhosa, se encontra no art. 3º, caput e parágrafo único do projeto de Lei, a seguir:

 

"Art. 3º Caberá à Secretaria Estadual da Fazenda fiscalizar o cumprimento desta Lei.

 

Parágrafo único. O descumprimento desta Lei acarretará ao infrator a aplicação de multa em valores a serem especificados pelo agente fiscalizador, não podendo ser inferior a 5 (cinco) salários mínimos."

 

Aqui, o projeto transpassa de sua natureza (material) de consumo, para a matéria de natureza tributária.

 

Embora ambas as matérias, no quesito iniciativa de Lei, encontram um denominador comum - o art. 24 da Constituição Federal, que trata da competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal para legislarem sobre I - direito tributário (.....) ou V - produção e consumo, há especificidades constitucionais (federal e estadual) que não permitem essa espécie de inserção quando o assunto é tributo e seus consectários.

 

Da leitura do dispositivo, de se extrair - embora o projeto não tivesse essa intenção - que se criou uma nova obrigação acessória, de natureza tributária, no Estado do Paraná. Tanto é que, os estabelecimentos que descumprirem a obrigação de destacarem os tributos elencados na norma, nas suas notas fiscais, sofrerão fiscalização e penalização pelo órgão tributário/fiscalizatório do Estado - a Secretaria da Fazenda.

 

Em se mantendo essa perspectiva, não se está mais falando de relação de consumo, mas uma relação entre FISCO X ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS E PRESTADORES DE SERVIÇOS.

 

De se ver que o projeto não tinha a intenção de criar uma obrigação acessória de natureza tributária, mas mantida a redação do atual art. 3º, a inconstitucionalidade formal do projeto, ante este dispositivo, resta evidente. O art. 146 da Constituição Federal elenca algumas matérias tributárias que somente poderão ter sua regulamentação por Lei Complementar. É o caso do inciso III, b:

 

"Art. 146 Cabe à Lei Complementar: (.....)

 

III - Estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

 

(.....)

 

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;"

 

Ainda, em face deste mesmo Sistema Tributário Constitucional, cada ente federativo, possui competência própria para instituição de seus tributos e aspectos a eles relacionados. Em respeito ao princípio da legalidade, cada pessoa jurídica apenas pode fazer aquilo que lhe está autorizado por Lei.

 

Decorrência disso, nenhum dos entes federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) pode legislar acerca dos tributos de competência dos demais.

 

Como conclusão, a se entender que o projeto de Lei estaria dispondo sobre matéria tributária, restaria fulminada pela inconstitucionalidade formal em dois momentos. A um, porque a criação de obrigação acessória acerca dos tributos IPI (pertencente à União) e ISS (pertencente ao Município) invadiria a esfera da competência constitucional disposta para estes entes, nos arts. 153 e 156 da Constituição Federal.

 

Num segundo momento, quando matéria reservada à Lei Complementar viria veiculada por Lei Ordinária, ex VI do art. 146, III, b - legislar sobre obrigação tributária.

 

Não fosse apenas pelo aspecto tributário em si, outra inconstitucionalidade se sobressai nas disposições do art. 3º e seu parágrafo único.

 

Como se expôs anteriormente, tais dispositivos determinam que a Secretaria da Fazenda fará a fiscalização da obrigação contida no projeto, bem como caberá a ela a aplicação de multa. Com isto, o projeto adentra em matéria de competência privativa do Governador do Estado.

 

Determina o art. 66, IV da Constituição Estadual que:

 

"Art. 66. Ressalvado o disposto nesta Constituição, são de iniciativa privativa do Governador do Estado as Leis que disponham sobre:

 

IV - criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado e órgãos da administração pública."

 

Se o projeto tem por finalidade regular as relações DE CONSUMO, esta relação reclama unicamente a fiscalização e penalização pelo ÓRGÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - aqui no Paraná, o PROCON. Atente-se ainda ao fato de que a despeito da inexistência de indicação correta do órgão de fiscalização, o projeto de Lei deixa de indicar a destinação dos valores das multas.

 

Se a norma pretende a proteção do consumidor, deve prever corretamente a fiscalização e penalização pelos PROCONS, que exercerão essa atribuição, observando o processo administrativo previsto no Decreto federal nº 2.181/1997. Ainda, os valores das multas devem ser destinados ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor - FECON, criado pela Lei estadual nº 14.975/2005. Tais valores devem estar consentâneos com os índices e indexadores fixados pelo Código de Defesa do Consumidor, não sendo aconselhável a utilização do salário mínimo (mesmo que regional) para mensuração do ato ilegal.

 

Diante de todo o exposto, veto o artigo 3º, caput e o seu parágrafo único, do Projeto de Lei 379/2011, posto que inconstitucionais, por disporem sobre matéria reservada à Lei Complementar (art. 146, III, b da CF) e criarem obrigações tributárias de competência de outros entes da federação (art. 153 e 156 da CF). Ainda, por tratarem de matéria de iniciativa de Lei privativa do Governador do Estado (art. 66, IV da Constituição Estadual).

 

Esses os motivos que me levaram a vetar, parcialmente, o Projeto de Lei em epígrafe, cujas razões submeto a elevada consideração dessa Assembleia Legislativa.

 

Valho-me do ensejo para apresentar a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.

 

CARLOS ALBERTO RICHA

GOVERNADOR DO ESTADO

 

Excelentíssimo Senhor

 

Deputado

 

VALDIR ROSSONI

Presidente da Assembleia Legislativa do Estado

 

N/CAPITAL