Lei nº 6581 DE 28/05/2021

Norma Municipal - Campo Grande - MS - Publicado no DOM em 31 mai 2021

Fica instituído o reconhecimento da prática da atividade física e do exercício físico como essenciais no Município de Campo Grande-MS, e dá outras providências.

Faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu, MARCOS MARCELLO TRAD, Prefeito Municipal de Campo Grande, Capital do Estado de Mato Grosso do Sul, sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Fica reconhecida a prática da atividade física e do exercício físico como essenciais à saúde da população campo-grandense, mesmo em tempos de crise ocasionadas por moléstias contagiosas ou catástrofes naturais.

§ 1º Eventuais limitações e/ou proibições impostas pelo Poder Público ao direito de praticar atividade física e exercício físico em estabelecimentos prestadores de serviços destinados a essa finalidade, nas ocasiões de crise ocasionadas por moléstias contagiosas ou catástrofes naturais, deverão fundar-se em normas sanitárias ou de segurança pública, aplicáveis ao caso concreto e serão precedidas de decisão administrativa, devidamente fundamentada da autoridade competente, a qual deverá obrigatoriamente indicar a extensão, motivos e critérios científicos e técnicos embasadores da(s) medida(s) imposta(s).

§ 2º As mesmas regras e procedimentos previstos no § 1º aplicar-se-ão para as práticas de atividades física e exercício físico em locais públicos do Poder Público, devendo o profissional da área seguir todas as recomendações sanitárias determinadas pela Organização Mundial da Saúde e demais orientações publicadas pelos órgãos municipais e estaduais, no que couber.

Art. 2º A autorização das atividades contidas no caput do Art.1º será fornecida pelos órgãos oficiais competentes.

Art. 3º VETADO.

Art. 4º O Poder Executivo regulamentará esta Lei no que couber.

Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

CAMPO GRANDE-MS, 28 DE MAIO DE 2021.

MARCOS MARCELLO TRAD

Prefeito Municipal

MENSAGEM nº 62, DE 28 DE MAIO DE 2021.

Senhor Presidente,

Com base nas prerrogativas estabelecidas no § 1º do Art. 42 e no inciso VII, do Art. 67, ambos da Lei Orgânica do Município, comunicamos a essa egrégia Câmara, por intermédio de V. Exa., que decidimos vetar parcialmente o Projeto de Lei nº 10.039/2021, que "Fica instituído o reconhecimento da prática da atividade física e do exercício físico como essenciais no Município de Campo Grande-MS, e dá outras providências." pelas razões que, respeitosamente, passamos a expor:

Em consulta à Procuradoria-Geral do Município (PGM), houve manifestação pelo veto parcial, afirmando-se que, no art. 3º, há vício de constitucionalidade formal propriamente dito por violação de regras de iniciativa. Veja-se trecho do parecer exarado:

"2.2 - DA ANÁLISE JURÍDICA

Trata-se de encaminhamento da Secretaria Municipal de Governo e Relações Institucionais, para fins de análise e parecer de projeto de lei, aprovado pela Câmara Municipal, que reconhece a atividade física como essencial no Município de Campo Grande.

Pretende-se classificar algumas atividades essenciais, impossibilitando que essas atividades tenham seu funcionamento restringido por ato do executivo.

Compreendido o contexto em que o Projeto de Lei se coloca, é preciso avaliar sua viabilidade sob a perspectiva jurídico-formal e jurídico-material.

O primeiro aspecto envolve a compatibilidade do projeto com os requisitos formais presentes na Constituição Federal , na Constituição do Estado de Mato Grosso do Sul e na Lei Orgânica municipal. Tal perspectiva se divide em compatibilidade formal orgânica, a observância às regras de competência, e compatibilidade formal propriamente dita,o cumprimento das regras do devido processo legislativo, sobretudo as de iniciativa.

O Município é competente para legislar acerca de assuntos de interesse local (art. 30, II, CF), estando abarcado por essa competência definição de serviços e atividades essenciais.

Desse modo, estando abarcada pela competência suplementar dos municípios, não há nenhum vício formal orgânico de constitucionalidade.

Contudo, vislumbra-se vício propriamente dito formal, no art. 3º, por violação de normas de iniciativa, a definição das atividades essenciais se insere na matéria de poder de polícia administrativa, não podendo o Poder Legislativo iniciar o processo legislativo sobre o tema.

A própria lei Federal 13979/2020 que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública da COVID 19, no seu art. 3º, § 7º, atribui aos gestores locais à competência para a gestão das medidas de enfrentamento.

A formulação e efetivação de políticas públicas é uma prerrogativa do Executivo. Aplica-se ao caso a Doutrina Chenery, de origem Norte Americana, em caso decidido pela Suprema Corte Norte Americana (SEC v. CheneryCorp., 318 U.S. 80, 1943), adotada pelo Superior Tribunal de Justiça. É o Poder Executivo que possui a expertise técnica para a formulação de políticas públicas, não o Legislativo (ou Judiciário). A fixação dos métodos das políticas públicas passa por um critério técnico que não pode ser sindicado pelo Legislativo.

Há a chamada discricionariedade técnica, quando, na lição de Oswaldo Bandeira de Mello (Princípios Gerais de Direito Administrativo, volume I, 1980, pág. 310), se tem: "o Legislativo delega ao Executivo as operações de acertar a existência de fatos e condições para a aplicação da Lei, os pormenores necessários para que as suas normas possam efetivar-se. Ela encontra corpo nas atividades estatais de controle. A lei da habilitação fixa os princípios gerais da ingerência governamental e entrega ao Executivo o encargo de determinar e verificar os fatos e as condições em que os princípios legais devem ter aplicação". Trata-se da Administração explicar técnico-cientificamente os pressupostos de fato previstos em lei, no caso, a Lei Federal 13.979/2020.

O projeto apresentado, em seu art. 3º, retira do Executivo a capacidade de propor medidas restritivas severas no caso de agravamento da Pandemia da Covid 19 bem como em eventuais novas emergências sanitárias.

Analisados os vícios formais, deve-se partir para análise de sua viabilidade jurídico-material, escrutinando-se a conformidade do projeto de lei com a Constituição federal.

O projeto apresentado estabelece algumas atividades econômicas como essenciais, em seu art. 3º.

Ora, vive-se uma situação de calamidade mundial devido à Pandemia da COVID 19, em que há circunstâncias excepcionais que ameaçam populações inteiras, reclamando medidas emergenciais. Nessa situação é possível que seja necessário, como já ocorreu em Campo Grande, que o Executivo Municipal altere o horário de funcionamentos do comércio - ou até mesmo o feche completamente, bem como restrinja a circulação de pessoas nas ruas.

É bom lembrar que recentemente o Supremo Tribunal Federal reafirmou a competência dos municípios para essas ações de saúde e sanitárias:

CONSTITUCIONAL. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19). RESPEITO AO FEDERALISMO. LEI FEDERAL 13.979/2020. MEDIDAS SANITÁRIAS DE CONTENÇÃO À DISSEMINAÇÃO DO VÍRUS. ISOLAMENTO SOCIAL. PROTEÇÃO À SAÚDE, SEGURANÇA SANITÁRIA E EPIDEMIOLÓGICA. COMPETÊNCIAS COMUNS E CONCORRENTES E RESPEITO AO PRINCÍPIO DA PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE (ARTS. 23, II, 24, XII, E 25, § 1º, DA CF). COMPETÊNCIAS DOS ESTADOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DAS MEDIDAS PREVISTAS EM LEI FEDERAL. ARGUIÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE.

(.....)

3. Em relação à saúde e assistência pública, a Constituição Federal consagra a existência de competência administrativa comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23, II e IX, da CF), bem como prevê competência concorrente entre União e Estados/Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde (art. 24, XII, da CF), permitindo aos Municípios suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, desde que haja interesse local (art. 30, II, da CF); e prescrevendo ainda a descentralização político-administrativa do Sistema de Saúde (art. 198, CF, e art. 7º da Lei 8.080/1990 ), com a consequente descentralização da execução de serviços, inclusive no que diz respeito às atividades de vigilância sanitária e epidemiológica (art. 6º , I, da Lei 8.080/1990 ).

(.....)

(STF - ADPF: 672 DF 0089306-90.2020.1.00.0000, Relator: ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 13.10.2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 29.10.2020) (grifos nossos)

Nesse sentido, o presente projeto impede que sejam tomadas medidas sanitárias que envolvem o controle dos horários de funcionamento do comércio de Campo Grande e a circulação de pessoas nas ruas. No caso concreto, há um conflito entre a livre iniciativa e saúde pública.

O Supremo Tribunal Federal consagrou na sua jurisprudência de controle de constitucionalidade, o princípio da proporcionalidade. Uma lei, para ser considerada constitucional deve passar pela proporcionalidade nas suas três dimensões: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Na adequação, a medida que está sendo considerada realmente deve atingir o fim colimado. Pelo subprincípio da necessidade, não deve existir nenhum outro modo menos restritivo de conseguir o mesmo objetivo. Já pelo critério da proporcionalidade em sentido estrito, expressão daquilo que Aristóteles chama de "justa-medida", as vantagens trazidas pela medida que se pretende adotar devem superar as desvantagens que essa restrição a algum direito ou liberdade provoca.

Ora, a presente lei não passa pela proporcionalidade em sentido estrito.

Submete-, ações e políticas estatais de todas as áreas, inclusive aquelas de interesse estritamente humano e social, como a proteção ao trabalho, e normas sanitárias, à livre iniciativa, que tem por objetivo regulatório a proteção exclusiva das liberdades de exercício da atividade econômica. Normas sanitárias de poder de polícia são submetidas aos interesses econômicos.

Se aprovado essa lei, o Município de Campo Grande ficará de mãos atadas caso haja o recrudescimento da pandemia da COVID-19 ou frente a qualquer outra circunstância extraordinária que demande alterar o horário de funcionamento do comércio e a restrição na circulação de pessoas.

Assim, verifica-se, que no sopesamento com a proteção da saúde pública, o art. 3º torna-se desproporcional, havendo inconstitucionalidade material.

3 - CONCLUSÃO

Considerando que, no art. 3º, há vício de constitucionalidade formal propriamente dito por violação de regras de iniciativa.

Considerando que, no art. 3º, há vício material de constitucionalidade por afronta ao princípio da separação de Poderes, insculpido no artigo 2º da Constituição Federal;

Considerando que para a doutrina Chenery (SEC v. CheneryCorp., 318 U.S. 80, 1943), adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, é o poder executivo que possui a expertise técnica para a formulação de políticas públicas, não o legislativo (ou judiciário).

Dessa forma, esta Procuradoria de Consulta e Assessoramento manifesta-se, pelo veto do art. 3º, por apresentar vícios formais e materiais de constitucionalidade.

O presente parecer, para sua validade, fica sujeito a homologação do Procurador-Geral do Município.

Desta forma, embora nobre a pretensão dos vereadores autores do Projeto de Lei em destaque, o veto parcial se faz necessário, diante dos fundamentos legais apontados, bem como por sua inviabilidade técnica.

Assim, não resta outra alternativa que não a do veto parcial, para o qual solicitamos de V. Exa., e dos nobres Pares que compõem esse Poder Legislativo o devido acatamento à sua manutenção.

CAMPO GRANDE-MS, 28 DE MAIO DE 2021.

MARCOS MARCELLO TRAD

Prefeito Municipal