Lei nº 492 de 30/08/1937

Norma Federal - Publicado no DO em 01 set 1937

Regula o penhor rural e a cédula pignoratícia.

O Presidente da República:

Faço saber que o Poder Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte lei:

CAPÍTULO I DO PENHOR RURAL

Art. 1º. Constitui-se o penhor rural pelo vínculo real, resultante do registro, por via do qual agricultores ou criadores sujeitam suas culturas ou animais ao cumprimento de obrigações, ficando como depositários daquelas ou destes.

Parágrafo único. O penhor rural compreende o penhor agrícola e o penhor pecuário, conforme a natureza da coisa dada em garantia.

Art. 2º. Contrata-se o penhor rural por escritura pública ou por escritura particular, transcrita no registro imobiliário da comarca em que estiverem situados os bens ou animais empenhados, para valimento contra terceiros.

§ 1º A escritura particular pode ser feita e assinada ou somente assinada pelos contratantes, sendo subscrita por 2 (duas) testemunhas, observado que as assinaturas poderão ser feitas de forma eletrônica, conforme legislação aplicável. (Redação do parágrafo dada pela Lei Nº 14421 DE 20/07/2022).

Nota: Redação Anterior:
§ 1º. A escritura particular pode ser feita e assinada ou somente assinada pelos contratantes, sendo subscrita por duas testemunhas.

§ 2º. A escritura deve declarar:

I - os nomes, prenomes, estado, nacionalidade, profissão e domicílio dos contratantes;

II - o total da dívida ou sua estimação;

III - o prazo fixo para o pagamento;

IV - a taxa dos juros, se houver;

V - as coisas ou animais dados em garantia, com as suas especificações, de molde a individualizá-los;

VI - a denominação, confrontação e situação da propriedade agrícola onde se encontrem as coisas ou animais empenhados, bem assim a data da escritura de sua aquisição, ou arrendamento, e o número de sua transcrição imobiliária;

VII - as demais estipulações usuais no contrato de mútuo.

Art. 3º. Pode ajustar-se o penhor rural em garantia de obrigações de terceiro, ficando as coisas ou animais em poder do proprietário e sob sua responsabilidade, não lhe sendo lícito, como depositário, dispor das mesmas, senão com o consentimento escrito do credor.

§ 1º. No caso de falecimento do devedor ou do terceiro penhorante, depositário das coisas ou animais empenhados, pode o credor requerer ao juiz competente a sua imediata remoção para o poder do depositário, que nomear.

§ 2º. Assiste ao credor ou endossatário da cédula rural pignoratícia direito para, sempre que lhe convier, verificar o estado das coisas ou animais dados em garantia, inspecionando-os onde se acharem, por si ou por interposta pessoa, e de solicitar a respeito informações escritas do devedor.

§ 3º. A prova da resistência ou recusa deste ou de quem ofereceu a garantia no cumprimento do disposto no parágrafo anterior, importa, se ao credor convier, no vencimento da dívida e sua imediata exigibilidade.

§ 4º. Em caso de abandono das coisas ou animais empenhados, pode o credor, autorizando o juiz competente, encarregar-se de os guardar, administrar e conservar.

Art. 4º. Independe o penhor rural do consentimento do credor hipotecário, mas não lhe prejudica o direito de prelação, nem restringe a extensão da hipoteca, ao ser executada.

§ 1º. Pode o devedor, independentemente de consentimento do credor, constituir novo penhor rural se o valor dos bens ou dos animais exceder ao da dívida anterior, ressalvada para esta a prioridade de pagamento.

§ 2º. Paga uma das dívidas, subsiste a garantia para a outra, em sua totalidade.

§ 3º. As coisas e animais dados em penhor garantem ao credor, em privilégio especial, a importância da dívida, os juros, as despesas e as demais obrigações constantes da escritura.

Art. 5º. Entre os direitos do credor pignoratício especificados na escritura compreendem-se ainda:

I - o valor do seguro dos bens ou dos animais empenhados, no caso de seu perecimento;

II - a indenização a que estiver sujeito o causador da perda ou deterioração dos bens ou animais empenhados, podendo exigir do devedor a satisfação do prejuízo sofrido por vício ou defeito oculto;

III - o preço da desapropriação ou da requisição dos bens ou animais, em caso de utilidade ou necessidade pública.

SEÇÃO I DO PENHOR AGRÍCOLA

Art. 6º. Podem ser objeto de penhor agrícola:

I - colheitas pendentes ou em via de formação, quer resultem de prévia cultura, quer de produção espontânea do solo;

II - frutos armazenados, em ser, ou beneficiados e acondicionados para venda;

III - madeira das matas, preparada para o corte, ou em toras, ou já serrada e lavrada;

IV - lenha cortada ou carvão vegetal

V - máquinas e instrumentos agrícolas.

Art. 7º. O prazo do penhor agrícola não excederá de dois anos, prorrogável por mais dois, devendo ser mencionada, no contrato, a época da colheita da cultura apenhada e, embora vencido, subsiste a garantia enquanto subsistirem os bens que a constituem. (Redação dada ao caput pelo Decreto-lei nº 4.360, de 05.06.1942)

§ 1º. Sendo objeto do penhor agrícola a colheita pendente ou em via de formação, abrange ele a colheita imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se, ou ser insuficiente a dada em garantia. Quando, porém, não quiser ou não puder o credor, notificado em 15 dias de antecedência, financiar a nova safra, fica o devedor com o direito de estabelecer com terceiro novo penhor, em quantia máxima equivalente ao primitivo contrato, considerando-se, qualquer excesso apurado na colheita, apenhado à liquidação da dívida anterior.

§ 2º. Nesse caso, não chegando as partes a ajustá-lo, assiste ao credor o direito de, exibindo a prova do tanto quanto na colheita se lhe consignou, ou se apurou, ou de ter-se frustrado no todo ou em parte, requerer ao juiz competente da situação da propriedade agrícola que faça expedir mandado para a averbação de estender-se o penhor à colheita imediata.

§ 3º. Da decisão do juiz cabe o recurso de agravo de petição para a Corte de Apelação, interposto pelo credor ou pelo devedor.

§ 4º. A prorrogação do prazo de vencimento da dívida garantida por penhor agrícola se efetua por simples escrito, assinado pelas partes e averbado à margem da transcrição respectiva.

Art. 8º. Pode-se estipular, na escritura de penhor agrícola, que os frutos, tanto que colhidos e convenientemente preparados para o transporte, sejam remetidos pelo devedor ao credor, ou para que se torne simples depositário deles, ou para que os venda, por conta e segundo as instruções do devedor ou os usos e costumes da praça, marcando-se os prazos e quantidades das remessas.

Parágrafo único. Nesse caso, o credor, sujeito às obrigações e investido dos direitos de comissário, prestará contas ao devedor, de cada venda que for realizando.

Art. 9º. Não vale o contrato de penhor agrícola celebrado pelo locatário, arrendatário, colono ou qualquer prestador de serviços, sem o consentimento expresso do proprietário agrícola, dado previamente ou no ato da constituição do penhor.

Parágrafo único. Na parceria rural, o penhor somente pode ajustar-se com o consentimento do outro parceiro e recai somente sobre os animais do devedor, salvo estipulação diversa.

SEÇÃO II DO PENHOR PECUÁRIO

Art. 10. Podem ser objeto de penhor pecuniário os animais que se criam pascendo para a indústria pastoril, agrícola ou de laticínios, em qualquer de suas modalidades, ou de que sejam eles simples acessórios ou pertences de sua exploração.

Parágrafo único. Deve a escritura, sob pena de nulidade, designar os animais com a maior precisão, indicando o lugar onde se encontrem e o destino que têm, mencionando de cada um a espécie, denominação comum ou científica, raça, grau de mestiçagem, marca, sinal, nome, se tiver, e todos os característicos por que se identifique.

Art. 11. É o penhor pecuniário ajustável independentemente do penhor agrícola; nada, porém, se opõe a que se celebre conjuntamente com ele, para a garantia da mesma dívida, ficando, neste caso, subordinado à disciplina deste, no qual se integra.

Parágrafo único. Como o agrícola, o penhor pecuário independe de outorga uxória.

Art. 12. Não pode o devedor vender o gado, nem qualquer dos animais empenhados, sem prévio consentimento escrito do credor.

§ 1º. Quando o devedor pretenda vendê-los ou, por negligente, ameace prejudicar ao credor, pode este requerer se depositem os animais sob a guarda de terceiro ou exigir que incontinenti se lhe pague a dívida.

§ 2º. Os animais da mesma espécie, comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados no penhor, que se estende às crias dos empenhados.

§ 3º. Esta substituição presume-se, mas não vale contra terceiros se não constar de menção adicional ao respectivo contrato.

Art. 13. O penhor pecuário não admite prazo maior de três anos, mas pode ser prorrogado por igual período, averbando-se a prorrogação na transcrição respectiva. (Redação dada pela Lei nº 4.360, de 05.06.1942)

Parágrafo único. Vencida a prorrogação, deve o penhor reconstituído, se não executado.

CAPÍTULO II DA CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA

Art. 14. A escritura pública ou particular, de penhor rural deve ser apresentada ao oficial de registro imobiliário da circunscrição ou comarca, em que estiver situada a propriedade agrícola em que se encontram os bens ou animais dados em garantia, a fim de ser transcrito, no livro e pela forma por que se transcreve o penhor agrícola.

Parágrafo único. Quando contraído por escritura particular, dela se tiram tantas vias quantas julgadas convenientes, de modo a ficar uma, com as firmas reconhecidas, arquivada no cartório do registro imobiliário.

Art. 15. Omissis.

Art. 16. Omissis.

Art. 17. Omissis.

Art. 18. Omissis.

Art. 19. Omissis.

Art. 20. Tentando o devedor ou o terceiro, como depositário legal, desviar, no todo ou em parte, ou vender, sem consentimento do credor pignoratício ou do endossatário da cédula rural pignoratícia os bens ou animais empenhados, tem este direito para requerer ao juiz que os remova para o poder do depositário público, se houver, ou particular, que nomear, correndo todas as custas e despesas por conta do devedor.

Parágrafo único. Desviados ou vendidos, com infração do disposto neste artigo, pode o juiz determinar-lhes o seqüestro, cuja concessão importa no vencimento da dívida e sua exigibilidade.

Art. 21. Cancela-se a transcrição do penhor rural:

I - a requerimento do credor e do devedor, conjuntamente, se não expedida a cédula rural pignoratícia;

II - pela apresentação da cédula rural pignoratícia, caso em que o oficial, depois de lançar, no verso da primeira via, no livro-talão, o cancelamento, a devolverá ao apresentante, com anotação idêntica;-

III - pela consignação judicial da importância total da dívida, capital e juros, até ao dia do depósito;

IV - por sentença judicial.

Art. 22. Omissis.

Art. 23. Omissis.

Art. 24. Omissis.

Art. 25. Omissis.

CAPÍTULO III DA EXCUSSÃO PIGNORATÍCIA

Art. 26. Se tiver sido ajustada a venda amigável, esta se fará nos termos convencionados e sempre que possível por corretor oficial.

Parágrafo único. A venda judicial se realizará em leilão público, por leiloeiro, ou, onde não existir, pelo porteiro dos auditórios ou quem suas vezes fizer.

Art. 27. No caso de venda amigável, se o resultado se mostrar insuficiente para o pagamento integral da dívida, assiste ao credor o direito de prosseguir na excussão, penhorando tantos dos bens do devedor, quantos bastarem, seguindo-se como na ação executiva.

§ 1º. Procede-se, nesse caso, ao cancelamento da transcrição, por mandado judicial.

§ 2º. Se a excussão tiver sido de cédula pignoratícia, o endossante prestará, em juízo, contas da execução, citando a todos os coobrigados para a impugnarem se quiserem, por embargos, que serão processados como na ação de prestação de contas.

Art. 28. No caso de venda judicial, o preço será depositado em juízo e levantado pelo exeqüente, depois de efetuado o pagamento:

I - das custas e despesas judiciais;

II - dos impostos devidos.

§ 1º. O saldo, se houver, se restitui ao credor.

§ 2º. Pela importância que faltar para o pagamento integral da dívida, seus juros, despesas, custas, tem o endossatário ação executiva contra o devedor pignoratício e os endossantes, avalistas ou coobrigados, todos solidariamente responsáveis; a ação pode ser proposta contra todos conjuntamente ou contra um ou alguns separadamente, como lhe convier.

§ 3º. Cada endossatário tem direito de reaver do seu endossante, por ação executiva, a importância que pagar.

§ 4º. Se os bens, em leilão público, não encontrarem licitantes, é permitido ao credor requerer-lhes a adjudicação pela avaliação constante do contrato ou pela que, em juízo, se fizer, prosseguindo na ação pelo saldo creditício.

Art. 29. Perde o direito e ação contra os coobrigados no pagamento da cédula rural pignoratícia, por efeito de endosso ou de aval, o endossatário último, se não praticar as diligências do artigo 23 e seguintes, dentro em quinze dias depois de tirado o instrumento do protesto.

Art. 30. Não se suspende a execução do penhor pela morte ou pela falência do devedor, prosseguindo contra os herdeiros e o síndico ou liquidatário.

CAPÍTULO IV DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 31. Aplicam-se ao penhor rural, no que lhe for pertinente, as disposições sobre os direitos reais de garantia e os contratos de sua instituição.

Art. 32. (Revogado pelo Decreto-Lei nº 182, de 05.01.1938)

Art. 33. A garantia subsidiária de penhor para a cédula rural ou título cujo devedor, aceitante ou emitente, exerça a sua atividade na agricultura ou pecuária ou em indústrias derivadas ou conexas, e cujo endossante seja firma bancária idônea, confere-lhe o direito de redesconto, sem outro limite, em importância ou garantia, que o estabelecido pelo Conselho da Carteira de Redescontos para as cooperativas e, em um máximo de 50% dos capitais e fundos de reserva, para cada banco.

Art. 34. Pela transcrição do penhor rural as custas do oficial do registro imobiliário são as do regimento em vigor, em hipótese alguma excedente de 50$00; pela expedição da cédula rural pignoratícia, de 10$; e pela averbação dos endossos, 5$000 cada vez, cabendo-lhe importância igual pelo cancelamento da transcrição.

Parágrafo único. O oficial não pode, sob pena de responsabilidade, recusar ou demorar a transcrição e a expedição da cédula rural pignoratícia.

Art. 35. O devedor, ou o terceiro que der os seus bens ou animais em garantia da dívida, que os desviar, abandonar ou permitir que se depreciem ou venham a perecer, fica sujeito às penas de depositário infiel.

Parágrafo único. Pratica o crime de estelionato e fica sujeito às penas do artigo 338 da Consolidação das Leis Penais aquele que fizer declarações falsas acerca da quantidade, da qualidade e dos característicos dos bens ou animais empenhados ou omitir, na escritura, a declaração de estarem eles já sujeitos ao vínculo de outro penhor.

Art. 36. Entrará esta lei em execução 30 dias depois de publicada no "Diário Oficial" da União, revogadas as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 30 de agosto de 1937, 116º da Independência e 49º da República

GETÚLIO VARGAS

Agamemnon Magalhães

Odilon Braga

José Carlos de Macedo Soares

Arthur de Souza Costa.