Lei nº 17989 DE 24/08/2020

Norma Estadual - Santa Catarina - Publicado no DOE em 25 ago 2020

Dispõe sobre a transferência de recursos da União para auxílio financeiro dos Hospitais Filantrópicos e Clínicas de Hemodiálise devidamente contratualizadas com o Sistema Único de Saúde (SUS) que forem repassados aos Gestores Estadual e Municipal para enfrentamento e combate à COVID-19.

O Governador do Estado de Santa Catarina

Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Os recursos transferidos pela União para o auxílio financeiro aos Hospitais Filantrópicos e Clínicas de Hemodiálise devidamente contratualizadas com o Sistema Único de Saúde (SUS) que forem repassados aos Gestores Estadual e Municipal para enfrentamento e combate à COVID-19 deverão ser disponibilizados em conta bancária da entidade de saúde, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, a contar do recebimento de cada parcela pelo Fundo Estadual de Saúde, nos termos da Portaria Ministerial nº 1.393, de 21 de maio de 2020, do Ministério da Saúde.

§ 1º A Secretaria de Estado da Saúde deverá aditivar o contrato, convênio ou instrumento congênere vigente para fins de pagamento às entidades beneficiadas e somente firmar novo instrumento se a entidade não for contratualizada.

§ 2º O instrumento jurídico previsto no § 1º deste artigo deverá ser disponibilizado em plataforma digital para assinatura digital das entidades beneficiadas no prazo de até 3 (três) dias úteis, a contar do recebimento de cada parcela pelo Fundo Estadual de Saúde.

§ 3º Os documentos necessários para aditivar o contrato, convênio ou instrumento congênere ou novo instrumento poderá ser juntado na plataforma digital em até 15 (quinze) dias úteis do lançamento do instrumento jurídico do § 2º deste artigo, sendo que a não entrega no prazo máximo deverá responsabilizar as entidades às penalidades legais e contratuais.

§ 4º As entidades beneficiadas deverão prestar contas da aplicação dos recursos ao Fundo Estadual de Saúde no prazo contratualizado ou até 31 de dezembro de 2020.

§ 5º (Vetado)

Art. 2º (Vetado)

§ 1º (Vetado)

§ 2º (Vetado)

§ 3º (Vetado)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Florianópolis, 24 de agosto de 2020.

CARLOS MOISÉS DA SILVA

Juliano Batalha Chiodelli

Paulo Eli

André Motta Ribeiro

MENSAGEM Nº 502

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE, SENHORAS E SENHORES DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO

No uso da competência privativa que me é outorgada pelo § 1º do art. 54 da Constituição do Estado, comunico a esse colendo Poder Legislativo que decidi vetar o § 5º do art. 1º e o art. 2º do autógrafo do Projeto de Lei nº 219/2020, que "Dispõe sobre a transferência de recursos da União para o auxílio financeiro dos Hospitais Filantrópicos e Clínicas de Hemodiálise devidamente contratualizadas com o Sistema Único de Saúde (SUS) que forem repassados aos Gestores Estadual e Municipal para enfrentamento e combate à COVID-19", por serem inconstitucionais, com fundamento no Parecer nº 406/2020 e no Despacho do Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica da Procuradoria-Geral do Estado (PGE).

Estabelecem os dispositivos vetados:

§ 5º do art. 1º e art. 2º

"Art. 1º .....

.....

§ 5º O não cumprimento do prazo previsto no caput deste artigo incorrerá em crime de responsabilidade para o Secretário de Estado da Saúde.

Art. 2º O Estado de Santa Catarina deverá ampliar os repasses em R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), até dezembro de 2020, dos recursos financeiros destinados aos hospitais e clínicas de hemodiálise contratualizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), na gestão Estadual e Municipal, e também os hospitais municipais, não enquadrados na política hospitalar catarinense.

§ 1º Fica autorizado a Secretaria de Estado da Fazenda fazer os remanejamentos orçamentários necessários para o cumprimento do caput deste artigo, bem como abrir rubrica orçamentária e subação específica.

§ 2º A Secretaria de Estado da Saúde deverá apresentar para Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, no prazo de 15 (quinze) dias da publicação desta Lei, o cronograma de aplicação e desembolso dos recursos previstos no caput deste artigo.

§ 3º O não cumprimento da obrigação e do prazo previsto no § 2º deste artigo incorrerá em crime de responsabilidade para o Secretário de Estado da Saúde."

Razões do veto

O § 5º do art. 1º e o § 3º do art. 2º do PL nº 219/2020, ao pretenderem estabelecer hipótese de crime de responsabilidade de Secretário de Estado, estão eivados de inconstitucionalidade material, uma vez que a definição desses crimes é objeto de competência legislativa privativa da União, nos termos da Súmula Vinculante nº 46 do Supremo Tribunal Federal (STF).

Já o caput e os §§ 1º e 2º do art. 2º do PL nº 219/2020, ao compelirem o Estado a ampliar o repasse financeiro a hospitais e clínicas na forma que especificam, estão eivados de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, uma vez que compete ao Chefe do Poder Executivo legislar sobre a organização e o funcionamento da Administração Pública, e de inconstitucionalidade material, dado que contrariam o princípio da independência e harmonia dos Poderes, ofendendo, assim, o disposto no art. 32, no inciso VI do § 2º do art. 50 e na alínea "a" do inciso IV do caput do art. 71 da Constituição do Estado.

Nesse sentido, a PGE recomendou vetá-los, manifestando-se nos seguintes termos:

As normas contidas no PL em referência contemplam basicamente as ações de gestão interna de recursos públicos, bem como a criação de encargos para a Secretaria de Estado da Saúde.

As ações governamentais da espécie são planejadas de acordo com as disponibilidades financeiras e orçamentárias, de tal sorte que somente o Poder Executivo, na condição de gestor dos recursos e de executor das ações inerentes as atividades de saúde, tem competência para implementar as medidas cabíveis.

A medida legislativa em referência representa a ingerência do Poder Legislativo no planejamento e execução de serviços afetos ao Poder Executivo, a quem cabe, sob o ponto de vista da organização e funcionamento dos serviços, a adoção dos procedimentos legais adequados para a realização dos seus encargos.

Com efeito, o [art. 2º do] Autógrafo do Projeto de Lei nº 219/2020 cuida de matéria típica de gestão de recursos públicos, sendo da competência privativa dos órgãos do Poder Executivo a execução orçamentária e financeira, que deve ser implementada segundo os princípios da Administração Pública, em especial o da eficiência (art. 37, caput, da CF). Em síntese, nesse caso, há uma nítida interferência do Poder Legislativo na organização e no funcionamento da Administração Pública Estadual, sendo esta atribuição privativa do Governador do Estado. Esta é a exegese que se extrai das disposições do art. 71, inc. IV, alínea "a", da Constituição Estadual [.....].

Daí porque sob a ótica da legislação constitucional, as normas internas de execução financeira e orçamentária são editadas por meio de decreto do Governador do Estado. Aliás, é o que dispõe o art. 140 da Lei Complementar nº 741/2019:

"Art. 140. As normas relativas à execução orçamentária e financeira e à contabilidade serão fixadas por decreto do Governador do Estado e, no que couber, em instruções normativas da SEF, com aplicação aos órgãos da Administração Pública Estadual Direta, aos fundos, às autarquias, às fundações e às empresas estatais dependentes, observados o disposto no art. 39 desta Lei Complementar." [.....]

Ademais, a deliberação do Poder Legislativo sobre matéria afeta exclusivamente ao Poder Executivo, tanto em termos de iniciativa do projeto de lei, quanto na execução das atividades administrativas internas, ofende o princípio da independência e harmonia dos Poderes do Estado, inscrito no art. 2º dos Constituição Federal , reproduzido pelo art. 32 Carta Estadual [.....].

Diante de todo o exposto, conclui-se que a medida legislativa aprovada pela Assembleia Legislativa viola o disposto nos arts. 32, 50, § 2º, inc. VI, e 71, inc. IV, alínea "a", da Constituição Estadual, razão pela qual recomendamos a aposição de veto[.....] às disposições do Autógrafo do Projeto de Lei nº 219/2020.

Em adição ao parecer, o Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica da PGE destacou o seguinte:

[.....] o Supremo Tribunal Federal tem sedimentado, inclusive em sede de repercussão geral, que a iniciativa parlamentar que resulte na interferência em atribuições de órgãos da Administração Pública é formalmente inconstitucional, conforme se lê:

"Lei resultante de iniciativa parlamentar que disponha sobre atribuições de órgãos da Administração Pública é formalmente inconstitucional, porquanto compete privativamente ao chefe do Poder Executivo a iniciativa de tais leis. (Precedentes: ADI nº 2.857, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, Pleno, DJe de 30.11.2007; ADI nº 2.730, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Pleno, DJe de 28.05.2010; ADI nº 2.329, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Pleno, DJe de 25.06.2010; ADI nº 2.417, Relator o Ministro Maurício Corrêa, Pleno, DJ de 05.12.2003; ADI nº 1.275, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe de 08.06.2010; RE nº 393.400, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 17.12.2009; RE nº 573.526, Relator o Ministro Ayres Britto, DJe de 07.12.2011; RE nº 627.255, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 23.08.2010, entre outros)."

Nota: Redação conforme publicação oficial.

Neste sentido, [.....] o art. 2º do PL está eivado de vício de inconstitucionalidade, na justa medida da ausência de pressuposto subjetivo quanto à iniciativa.

De se registrar, por fim, que o § 5º do art. 1º [e § 3º do art. 2º] enuncia crime de responsabilidade ao Secretário de Estado da Saúde, na hipótese de não cumprimento do prazo de 05 (cinco) dias para transferir os recursos federais aos hospitais filantrópicos e clínicas de hemodiálise.

A definição dos crimes de responsabilidade é objeto de competência legislativa privativa da União, nos termos da súmula vinculante nº 46 do STF: "A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da União". Trata-se de precedente vinculante, que impede a promoção legislativa pelos demais Entes Federados, independentemente da iniciativa. Tal verbete vinculante é originário do seguinte precedente representativo:

"A definição das condutas típicas configuradoras do crime de responsabilidade e o estabelecimento de regras que disciplinem o processo e julgamento dos agentes políticos federais, estaduais ou municipais envolvidos são da competência legislativa privativa da União e devem ser tratados em lei nacional especial (art. 85 da Constituição da República)." [ADI 2.220, rel. min. Cármen Lúcia, P, j. 16.11.2011, DJE 232 de 07.12.2011]

Assim, submeto à elevada apreciação o parecer exarado, que apontou inconstitucionalidade formal e, com a minha ratificação, também a presença de inconstitucionalidade material.

Essas, senhores Deputados, são as razões que levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais submeto à elevada apreciação da senhores Membros da Assembleia Legislativa.

Florianópolis, 24 de agosto de 2020.

CARLOS MOISÉS DA SILVA

Governador do Estado