Lei nº 12599 DE 03/04/2023
Norma Estadual - Paraíba - Publicado no DOE em 04 abr 2023
Institui a Política Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas (PEABIO) e o Programa Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas – (PROABIO) no Estado da Paraíba no Estado da Paraíba, e dá ou- tras providências.
O GOVERNADOR DO ESTADO DA PARAÍBA:
Faço saber que o Poder Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Fica instituída a Política Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cul- tivares e Mudas Crioulas (PEABIO) no âmbito do Estado da Paraíba, nos termos da Política Nacional da Agricultura Familiar, legislação federal de Sementes e Cultivares e dispositivos estaduais pertinentes. Parágrafo único. As atribuições e competências de cada uma das entidades responsáveis pela Política Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas (PEA- BIO) serão fixadas por meio de decreto, após a publicação desta Lei.
Art. 2º A PEABIO será integrada e adequada às políticas e aos programas gover- namentais que visam assegurar o direito humano à alimentação adequada, tendo como referência os seguintes marcos regulatórios:
I - Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) — Lei Federal nº 11.346, de 15 de setembro de 2006 —, que instituiu o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN);
II - Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais;
III - Sistema Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional (SESAN), criado pela Lei nº 8.706, de 27 de novembro de 2008, com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada; IV - Lei Federal nº 10.711, de 5 de agosto de 2003, regulamentada pelo Decreto n° 10.586, de 18 de dezembro de 2020, que dispõem sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas;
IV – Portaria nº 51, de 03 de outubro de 2007, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que dispõe sobre o Cadastro Nacional de Cultivares Tradicionais, Locais e Crioulas, no âmbito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF); e,
V – Decreto Federal nº 7.794, de 20 de agosto de 2012, que instituiu a Política Na- cional de Agroecologia e Produção Orgânica.
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
I - Variedade e cultivar local, tradicional, crioula ou “da paixão”: a semente ou muda desenvolvida, adaptada ou produzida em condições in situ, por agricultores familiares, assentado por programa de reforma agrária, quilombola, indígena ou povos e comunidades tradicionais, que apresente características fenotípicas próprias que a diferencie de variedades e cultivares comerciais e que seja assim reconhecida pela comunidade em que é cultivada; e que não seja oriunda de manipulação por engenharia genética nem outros processos de desenvolvimento industrial ou manipulação em laborató- rio, não contenha transgenes e não envolva processos de hibridação que não estejam sob o domínio das comunidades locais;
II - Muda: material de propagação vegetal de qualquer gênero, espécie ou cultivar, proveniente de reprodução sexuada ou assexuada, que tenha finalidade específica de plantio;
III – Banco de Sementes Comunitários: coleção de germoplasmas de cultivares locais, tradicionais ou crioulos, mantida e administrada localmente por Organizações de famílias agricultoras res- ponsáveis pela multiplicação de sementes ou mudas para distribuição, troca ou comercialização entre si;
IV - Agrobiodiversidade: contempla a diversidade genética de espécies cultivadas ou manejadas, a riqueza dos processos funcionais dos agroecossistemas e as interações entre seus compo- nentes, que refletem a interação entre agricultores e ecossistemas locais, que podem ao longo do tempo originar variedades, espécies ou paisagem, adaptadas às condições ecológicas locais;
V - Agroecossistemas: variabilidade de animais, plantas e microrganismos nos níveis genético, de espécies e de ecossistemas, necessários para sustentar as funções-chave dos agroecossiste- mas, suas estruturas e processos;
VI - Cultivar: a variedade de qualquer gênero ou espécie vegetal superior que seja claramente distinguível de outras cultivares conhecidas, por margem mínima de descritores, por sua denominação própria, que seja homogênea e estável quanto aos descritores através de gerações sucessi- vas e seja de espécie passível de uso pelo complexo agroflorestal, descrita em publicação especializada disponível e acessível ao público, bem como a linhagem componente de híbridos;
VII - Área de proteção da agrobiodiversidade: área/terreno/região/território onde há produção de sementes locais, tradicionais ou crioulas, ficando proibido o cultivo de qualquer material genético (sementes transgênicas e híbridas) que venha a ameaçar as características fenotípicas e genotí- picas das sementes locais, tradicionais ou crioulas;
VIII - Agroecologia: ciência ou campo do conhecimento transdisciplinar que estuda os agroecossistemas, fundamentada em conceitos, princípios e metodologias, visando o desenvolvimen- to das relações entre capacidade produtiva, equilíbrio ecológico, equidade social, respeitando os modos de vida, uso e conservação da biodiversidade e dos demais bens naturais por meio da articulação entre conhecimento técnico-cientifico, saberes e fazeres ancestrais e culturas populares e tradicionais, com foco na sustentabilidade;
IX - Produção de base agroecológica: aquela que busca otimizar a integração entre capacidade produtiva, uso e conservação da biodiversidade e dos demais recursos naturais, equilíbrio ecológico, eficiência econômica e justiça social, abrangida ou não pelos mecanismos de controle de que trata a Lei nº 10.831, de 2003, e sua regulamentação;
X - Transição agroecológica: processo gradual de mudança de práticas e de manejo de agroecossistemas tradicionais ou convencionais, por meio da transformação das bases produtivas e sociais do uso da terra e dos recursos naturais, que levem a sistemas de agricultura que incorporem princípios e tecnologias de agroecologia e produção orgânica, conforme decreto 7794/2012;
XI - Produtos da sociobiodiversidade: bens e serviços gerados a partir de recursos da biodiversidade, destinados à formação de cadeias produtivas de interesse dos beneficiários da Lei nº 11.326 , de 24 de julho de 2006, que promovam a manutenção e valorização de suas práticas e saberes, e assegurem os direitos decorrentes, para gerar renda e melhorar sua qualidade de vida e de seu ambiente; XII - Agricultora ou agricultor familiar: é quem pratica a agricultura, extrativismo, pecuária, silvicultura, pesca, aquicultura e outras atividades rurais em consonância com os requisitos da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006;
XII - Povos e comunidades tradicionais: grupos culturalmente diferenciados que se reconhecem como tais, definidos nos termos do inciso 1 do art. 3º do Decreto Federal nº 6.040, de 07 de fevereiro de 2007;
XIII - Sustentabilidade: desenvolvimento que satisfaz as necessidades de bem viver do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessi- dades, e considera de maneira indissociável as dimensões econômica, social, ambiental, cultural, política e ética; e,
XIV - Segurança alimentar e nutricional: consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e ancestral e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.
§ 1º Aplicam-se, também, no que couber e no que não dispuser em contrário a esta Lei, os conceitos constantes na Lei Federal nº 10.711, de 5 de agosto de 2003, no Decreto Presidencial n° 10.586, de 18 de dezembro de 2020, e na Portaria n° 51, de 03 de outubro de 2007, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
§ 2º Pela sua própria natureza e tradição histórica, as cultivares locais, tradicionais, crioulas ou “da Paixão”, constituem patrimônio sociocultural das comunidades, não sendo aplicável patente, propriedade e nenhuma forma de proteção particular para indivíduos, empresas ou entidades.
Art. 4º As atividades de conservação e utilização sustentável da Agrobiodiversidade no Estado de Paraíba são consideradas de interesse social e essenciais para as estratégias de desenvolvimento rural sustentável, de promoção da segurança alimentar e nutricional e de sustentabilidade ambiental no Estado.
Parágrafo único. São atividades de conservação e utilização sustentável da Agrobio- diversidade, entre outras:
I - resgate e utilização de variedades locais, tradicionais ou crioulas, assim como a promoção da expansão do uso de variedade locais, tradicionais ou crioulas;
II - melhoramento participativo descentralizado, realizado em parceria entre as comunidades e instituições públicas de pesquisa; e,
III - fortalecimento da pesquisa que promova e conserve a diversidade biológica.
CAPÍTULO II DO PROGRAMA ESTADUAL DE AGROBIODIVERSIDADE E DE SEMENTES, CULTIVARES E MUDAS CRIOULAS - PROABIO
Art. 5º Fica instituída o Programa Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas (PROABIO), com o objetivo de promover o resgate, conservação e prote- ção das sementes crioulas e da agrobiodiversidade.
Art. 6º O PROABIO será executado objetivando a preservação da agrobiodiver- sidade e o desenvolvimento sustentável e solidário, sempre atuando em sintonia com a legislação de proteção ao meio ambiente.
Art. 7º Constituem objetivos específicos do PROABIO:
I - estimular e fomentar o resgate, a proteção e a conservação de espécies, variedades e cultivares (recurso genético local) produzidos em unidade familiar ou tradicional, visando à sustenta- bilidade dos agroecossistemas familiares;
II - proteger a agrobiodiversidade e promover a manutenção de valores culturais e a preservação de patrimônios naturais;
III - estimular a autonomia da organização comunitária, a capacitação para gerencia- mento de Bancos Comunitários de Sementes e a proteção dos conhecimentos tradicionais;
IV - priorizar a participação das mulheres e de jovens rurais;
V - fortalecer valores culturais e alimentares;
VI - garantir a soberania e segurança alimentar e nutricional;
VII - garantir estoques de sementes;
VIII - incentivar o respeito, a preservação e manutenção do conhecimento, inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e incentivar sua mais ampla aplicação com a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a repartição equitativa dos benefícios oriundos da utilização desse conhecimento, inovações e práticas;
IX - incentivar o mapeamento da Agrobiodiversidade na Paraíba;
X - incentivar a pesquisa agroecológica e tecnológica e processos de diagnóstico par- ticipativo relacionados à sensibilização e ao resgate da agrobiodiversidade junto aos camponeses.
Art. 8º Serão instrumentos do PROABIO:
I - Programa Estadual de Bancos Comunitários de Sementes Crioulas; e,
II - Plano Estadual de Estímulo à Agrobiodiversidade e de Resgate e Proteção das Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas.
Parágrafo único. Ficará a cargo do Poder Executivo designar o órgão da administração direta que será responsável pela coordenação e execução do Programa Estadual de Bancos Comu- nitários de Sementes Crioulas, cabendo-lhe:
I - implantar o Programa Estadual de Bancos Comunitários de Sementes Crioulas;
II - incluir os Bancos já existentes no Estado no programa e ampliar o número de Bancos, conforme disponibilidade orçamentária;
III - planejar as ações de abastecimento, capacitação e funcionamento dos Bancos de Sementes;
IV - manter o controle dos estoques de sementes existentes em cada banco;
V – estimular a construção de Planos Safras Municipais, em parceira com os Municípios, dentre as dinâmicas dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentáveis (CMDR- Ss) em perspectiva de inclusão produtiva e ampliação de produção de alimentos saudáveis;
300,00
Assinatura Digital Semestral. R$ 150,00
Assinatura Impressa Anual. R$ 400,00
Assinatura Impressa Semestral. R$ 200,00
Número Atrasado...............................................................................................R$ 3,00
VI - desenvolver atividades de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) junto às famílias participantes do Programa;e,
VII – Criar o Cadastro Estadual de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas (CESEC), alinhado à Portaria nº 51, de 03 de outubro de 2007, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Art. 9º Para implantação do PROABIO, o poder público estadual deverá buscar:
I - estabelecer parcerias, celebrando convênios ou instrumentos cogêneres, com vistas a desenvolver habilidades locais nos processos de seleção e armazenamento de sementes crioulas, bem como na implantação e gestão dos bancos de sementes, com:
a) organizações sociais com personalidade jurídica, representativas da agricultura fa- miliar, pescadores artesanais, povos e comunidades tradicionais e beneficiários da reforma agrária e crédito fundiário do Estado de Paraíba;
b) entidades de assistência técnica.
II - prever na Lei Orçamentária Anual (LOA) recursos do tesouro estadual, podendo captar recursos externos por meio de participação em editais ou acordos de parceria;
III - a inclusão produtiva, através do desenvolvimento de atividades de organização comunitária, objetivando a capacitação e a interação das comunidades interessadas em implantar Ban- cos de Sementes Comunitários;
IV - a sustentabilidade do programa, através da implementação de um sistema de reposição das sementes e do uso de variedades locais;
V - a melhoria das sementes produzidas e armazenadas através do monitoramento da qualidade das sementes;
VI - a descentralização do programa através de levantamento de demanda de cada banco de sementes;
VII - apoiar a elaboração de projetos, a instalação e o funcionamento de Bancos Co- munitários de Sementes, tradicionais ou crioulas;
VIII - desenvolver sistema de reposição das sementes e estimular o uso de variedades locais, tradicionais ou crioulas;
IX - realizar, em parceria com os Municípios e entidades civis, eventos destinados à troca de experiências e ao intercâmbio de germoplasmas;
X - identificar demandas de cada Bancos Comunitários de Sementes;
XI - identificar e selecionar imóveis públicos e privados aptos à instalação de Bancos Comunitários de Sementes;
XII - patrocinar a instalação e apoiar o funcionamento de Bancos Comunitários de Sementes de cultivares locais e mudas crioulas;
XIII - desenvolver iniciativas para instalação de campos de multiplicação para salva- guarda e reposição das sementes crioulas;
XIV - implantar cadastro de Bancos Comunitários de Sementes de cultivares locais, mudas crioulas e de famílias agricultoras guardiães no Estado da Paraíba, mantendo as informações atualizadas e amplamente disponibilizadas para consulta, por meio virtual;
XV - buscar parcerias com a sociedade civil organizada através de entidades que desenvolvam ações relacionadas a bancos de sementes crioulas; e,
XVI - realizar estudos e pesquisas para monitorar a contaminação das sementes criou- las por genes transgênicos, adotando iniciativas para proteção das sementes crioulas frente à contami- nação através dos referidos genes transgênicos.
Parágrafo único. O Poder Executivo Estadual deverá firmar convênios, acordos ou parcerias com as instituições públicas de ensino superior e centros de pesquisas, que permitam a iden- tificação das sementes crioulas, ensaios comparativos de cultivares crioulas, técnicas de conservação, ampliação do conhecimento técnico e científico relacionado aos cultivares crioulos locais, de forma a fomentar a pesquisa e a qualificação das informações a serem catalogadas, subsidiando tecnicamente a implementação da PEABIO.
Art. 10. O Plano Estadual de Estímulo a Agrobiodiversidade e de Resgate e Prote- ção das Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas constitui-se no principal instrumento de planejamento, gestão e execução do PROABIO.
Parágrafo único. O Plano Estadual de Estímulo a Agrobiodiversidade e de Resgate e Proteção das Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas terá horizonte temporal de 04 (quatro) anos, sendo apresentado anualmente, por ocasião do início de cada safra agrícola, para apreciações e considerações do Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável do Estado da Paraíba.
CAPÍTULO III DOS MECANISMOS DE GESTÃO DO PROABIO-PB
Art. 11. Caberá à Secretaria de Estado da Agricultura Familiar e Desenvolvimento do Semiárido (SEAFDS) a coordenação do Programa Estadual de Agrobiodiversidade e de Sementes, Cultivares e Mudas Crioulas (PROABIO).
Art. 12. O financiamento do PROABIO é de responsabilidade do Poder Executivo estadual e tem as seguintes fontes de custeio:
I - Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza Rural no Estado da Paraíba – FUNCEP/PB;
II - Dotações orçamentárias, destinadas aos diversos setores que compõem o sistema de apoio a agricultura do estado; e,
III - Recursos específicos para gestão e implantação da Política Estadual de Sementes Crioulas e Agrobiodiversidade, consignados nas respectivas leis orçamentárias anuais.
Art. 13. O Poder Executivo regulamentará a presente Lei em todos os aspectos ne- cessários à sua efetiva aplicação no prazo de 90 (noventa) dias.
Art. 14. Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
PALÁCIO DO GOVERNO DO ESTADO DA PARAÍBA, em João Pessoa, 03 de
abril de 2023; 135º da Proclamação da República.