Despacho FUNAI nº 35 de 15/09/2008
Norma Federal - Publicado no DO em 16 set 2008
Aprova as conclusões objeto do citado resumo para afinal, reconhecer os estudos de identificação da Terra Indígena ARARA DO RIO AMONIA de ocupação do grupo tribal Arara, localizada no município de Marechal Thaumaturgo, Estado do Acre.
O PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI, tendo em vista o que consta no Processo FUNAI/BSB/2708/20, e considerando o Resumo do Relatório de Identificação, de autoria do antropólogo LUCIANO ALVES PEQUENO, que acolhe, face às razões e justificativas apresentadas,
Decide:
1. Aprovar as conclusões objeto do citado resumo para afinal, reconhecer os estudos de identificação da Terra Indígena ARARA DO RIO AMONIA de ocupação do grupo tribal Arara, localizada no município de Marechal Thaumaturgo, Estado do Acre.
MÁRCIO AUGUSTO FREITAS DE MEIRA
ANEXORESUMO CIRCUNSTANCIADO DOS RELATÓRIOS DE IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA TERRA INDÍGENA ARARA DO RIO AMÔNIA
Referência: Processo FUNAI/BSB/2708/00. Terra Indígena: Arara do Rio Amônia. Localização: Município de Marechal Thaumaturgo, Estado do Acre. Superfície: 20.764 ha. Perímetro: 80 km. Sociedade Indígena: Arara. Família lingüística: Pano. População: 278 indivíduos (12/2003). Identificação: Grupo Técnico constituído pela Portaria nº 1.054/PRES, de 21 de dezembro de 2001, coordenado pelo antropólogo Walter Alves Coutinho Júnior. Delimitação: Grupo Técnico constituído pela Instrução Executiva nº 165/DAF de 4 de dezembro de 2003, coordenado pelo antropólogo Antonio Pereira Neto.
I - DADOS GERAIS
Os índios Arara de língua Pano (também denominados Xawanáwa ou Shawandáwa) ocupam as terras indígenas Arara do Igarapé Humaitá e Jamináwa/Arara do Rio Bagé, localizadas nos municípios acreanos de Porto Walter e Marechal Thaumaturgo, respectivamente, bem como Arara do Rio Amônia. As famílias indígenas que se reconhecem como Arara no rio Amônia possuem na verdade uma composição étnica múltipla, destacando-se os grupos familiares Arara propriamente falando e os de origem Amawáka, Koníbo, Santa Rosa, Kampa e Kaxinawá. Várias famílias, além disso, possuem influência marcante dos laços de parentesco estabelecidos ao longo do tempo com a população regional não indígena. Os poucos falantes de idiomas nativos ainda existentes entre essa população Arara demonstram proficiência na comunicação por meio de línguas pertencentes à família Pano. Tendo em vista o processo histórico de ocupação do rio Amônia pela sociedade nacional, a área cuja demarcação é reivindicada pelos Arara encontra-se hoje inserida nos limites, por um lado, do Projeto de Assentamento Amônia, sob a jurisdição do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), do Parque Nacional da Serra do Divisor, sob a jurisdição do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e, por outro lado, da Reserva Extrativista do Alto Juruá, também sob a jurisdição do IBAMA. O acesso a essa região desde Brasília é feito por vias aéreas regulares até a cidade de Cruzeiro do Sul-AC, de onde se prossegue até Marechal Thaumaturgo-AC em vôo de aproximadamente 50 minutos feito em aeronave monomotor, ou por meio de deslocamento fluvial, pelo rio Juruá, em motor de centro que dura cerca de três dias. O ingresso na área aqui tratada desde a cidade de Marechal Thaumaturgo é feito exclusivamente por via fluvial, utilizando-se em geral canoas equipadas com motores 'rabeta', com as quais se gasta cerca de duas horas e meia para alcançar a localidade conhecida como Assembléia (aldeia Novo Destino) e outras duas horas desse ponto até o limite sul da área com o limite norte da TI Kampa do Rio Amônia.
Pouco se sabe sobre a história indígena do alto rio Juruá nos primeiros três séculos e meio da conquista colonial, chegando a ser efetivamente visitada essa região por não índios apenas na segunda metade do século XIX. No final do século XVIII, institucionaliza-se a prática das chamadas agarrações de índios no interior do rio Juruá, os quais eram descidos para povoações localizadas à margem do Solimões como Fonte Boa, Nogueira, Caiçara e Ega (Tefé). Em 1857/58, um morador de Ega que tinha sido encarregado dos índios do rio Juruá realizou uma viagem até a foz do Juruá-Mirim, deparando-se com uma maloca dos índios Naua pouco acima da atual cidade de Cruzeiro do Sul. Por volta de 1867, os produtos naturais mais abundantes e procurados ainda eram o cacau, o óleo de copaíba e a salsaparrilha, havendo principiado poucos anos antes o interesse pela borracha. O auge do boom do extrativismo da borracha nessa parte da Amazônia ocorreu no período entre 1890 e 1912, adquirindo a sua maior intensidade na passagem do século, quando a região é tomada por inteiro pelos barracões e tambos das empresas seringalistas (brasileiras) e caucheiras (peruanas). O povoamento, por não índios, do Juruá acreano se daria nessa época, fixando-se os seringueiros em 1891 nos rios Grajaú, Tejo e Amônia e nos igarapés Triunfo, Oriente, São João e Caipora, entre outros. As primeiras referências conhecidas aos Arara (Pano) foram feitas em 1906, quando se encontram cerca de 120 índios liderados pelo tuxaua Tescon nas imediações do igarapé Forquilha, afluente do alto rio Liberdade. Em 1911, os grupos indígenas dessa região foram visitados por um auxiliar da Inspetoria no Amazonas e Território do Acre do então recém-criado Serviço de Proteção aos Índios (SPI), que numa expedição pioneira ao interior do vale do Juruá subiria o rio Liberdade, verificando a presença de grupos Arara e Jamináwa, entre outros.
A presença dos Arara no rio Amônia passa a ser registrada na segunda metade do século XX. Antes disso, esse rio era ocupado por índios Amawáka, também falantes de uma língua da família Pano, que se encontravam igualmente nos rios Breu, Tejo, Cruzeiro do Vale e Valparaíso, e nos igarapés São João e Caipora. Paralelamente à primazia dos Amawáka numa vasta extensão do alto Juruá, também se menciona no princípio do século XX a presença de integrantes de outros grupos indígenas nessa região, como os Kampa e Koníbo, habitantes tradicionais dos rios Ucayali e Urubamba (Peru), trazidos à bacia do Juruá em razão da mobilidade característica na exploração do caucho amazônico. Acompanhando as turmas de caucheiros, tinham esses índios como principais incumbências a obtenção de provisões através da caça e da pesca e a realização das famigeradas correrias contra outros grupos indígenas que pudessem opor alguma dificuldade à atividade extrativista. Alcançado através de importantes varadouros, entre os quais se destacavam os que provinham do rio Tamaya, o rio Amônia logo se tornou uma das passagens obrigatórias para os caucheiros que vinham do Ucayali em demanda dos afluentes do alto Juruá. Os Kampa (cuja autodenominação, dependendo da região de origem, vem a ser Axáninka ou Axéninka) foram um dos grupos mais freqüentemente utilizados por caucheiros e seringueiros para a realização de correrias contra outros grupos indígenas na região do rio Juruá. As informações disponíveis indicam que as primeiras famílias desse grupo a se estabelecerem permanentemente no rio Amônia chegaram pouco antes de 1940, vindas dos rios Tambo, Sheshea e outros afluentes do alto Ucayali. Também se menciona nessa época a presença de índios Chama (Koníbo) e Santa Rosa (Quijo) ocupando as terras do Amônia em conjunto com os Amawáka. É possível que os Chama encontrados no Amônia tivessem sua origem no baixo e médio curso do rio Tamaya, enquanto os chamados Santa Rosa ou Santarosinos vieram provavelmente do alto rio Napo, no Equador. A chegada de contingentes Kampa, Koníbo e Quijo ao rio Amônia em razão das circunstâncias históricas produzidas pela ocupação não indígena na região amazônica implicou um processo complexo de dizimação, deslocamento e incorporação de partes da população indígena até então preponderante naquele curso d'água. A maior parte da população Amawáka originária do Amônia que sobreviveu e resistiu na região passou a realizar no período que se seguiu uma série de casamentos com indivíduos desses outros grupos indígenas.
Por meio desse processo histórico, a população Kampa adventícia tornou-se o grupo indígena mais expressivo a ocupar o rio Amônia na segunda metade do século XX. No entanto, as diferenças existentes na composição social da população indígena ali estabelecida não se apagaram ao longo do tempo, passando a se expressar através de uma nítida distribuição espacial: enquanto os Kampa se estabeleceram preferentemente ao longo do alto curso do Amônia e no rio Amoninha, na área contígua à fronteira internacional com o Peru, os outros 'caboclos', entre os quais se encontravam também famílias Arara emigradas desde a região dos rios Tejo e Bagé, estavam mais próximos da parte baixa, entre a foz do igarapé Taboca e o chamado Remanso. A intensificação da exploração madeireira regional no rio Amônia durante a primeira metade da década de 1980 provocou um afastamento cada vez maior entre os Kampa situados à montante e as demais famílias indígenas que ocupavam o trecho do rio à jusante do igarapé Taboca, estimulando uma forte reação contrária dos primeiros, que solicitaram a demarcação daquela área, ao passo que as famílias indígenas estabelecidas abaixo foram inseridas cada vez mais na rede de apoio necessária ao trabalho das turmas extrativistas. Após a demarcação da TI Kampa do Rio Amônea, homologada em 1992, e da extrusão dos ocupantes não índios, os Kampa começaram a deixar a região do alto Amônia para se concentrar na área próxima ao Remanso, formando a aldeia Apiwtxa entre 1994 e 1996. Essa atitude tinha como intenção declarada contrapor-se à exploração dos recursos naturais de caça e madeira existentes na área demarcada que era promovida por não índios e por alguns integrantes das referidas famílias de outras procedências étnicas. Com efeito, o testemunho dos Arara revela o encadeamento de diversas ações levadas a cabo pela comunidade Kampa no sentido de constrangê-los a abrir mão da atividade extrativa da madeira e da venda de carne de caça como meios de subsistência, reconhecendo ao mesmo tempo uma posição política subordinada. Mencionam-se, nesse sentido, eventuais afrontas pessoais, a matança de animais domésticos, a proibição de novos cultivos e a queima de casas. Em decorrência dessas ações, as famílias indígenas que se reconhecem como Arara do rio Amônia, de origem Arara, Santa Rosa, Amawaka, Konibo, Chama e Kampa, e que conviviam no mesmo espaço territorial com os Kampa, abandonaram seus locais de ocupação na terra indígena recém-demarcada.
Depois de sua saída dos limites demarcados da TI Kampa do Rio Amônea, a maioria dessas famílias passou a se estabelecer no trecho à jusante do limite daquela terra indígena, justamente no território já ocupado por outros 25 indivíduos Arara e Santa Rosa. Todavia, a margem direita do Amônia fora dos limites da terra indígena havia sido totalmente incluída na área da Reserva Extrativista do Alto Juruá, criada em 1990 e mantida sob a administração do IBAMA. Em função disso, grande parte das famílias indígenas oriundas da área Kampa instalou-se na margem oposta do médio Amônia, fato que foi seguido, em 1996, pela criação do Projeto de Assentamento Amônia por parte do INCRA nas terras daquela ribeira.
II - HABITAÇÃO PERMANENTE
A população Arara do Amônia alcança presentemente cerca de 278 indivíduos que habitam o território ora delimitado. A totalidade das casas habitadas pelos Arara no rio Amônia está situada, no presente, em terrenos altos junto às margens desse curso d'água. Em geral, as casas Arara atuais são construídas sobre pilotis, sendo compostas por uma ou mais peças justapostas de forma mais ou menos independente, cada qual possuindo planta baixa retangular (ou quadrada) e telhado de duas águas. Idealmente, a frente da casa está sempre voltada para a margem do rio e os fundos para o roçado ou para a floresta próxima. Para fazer os esteios e pilares são utilizadas madeiras duráveis como maçaranduba, quariquara, itaúba e louro. O assoalho é fabricado ordinariamente a partir do tronco de paxiúba ou paxiubão, e as paredes a partir do tronco de paxiubinha, cujo miolo é retirado e a parte externa batida até se tornar flexível e plana o suficiente para ser estendida. Quando possível, essa matéria-prima habitual para a construção de pisos e paredes é substituída por tábuas de madeira serrada, combinando-se às vezes os dois tipos de material em uma única edificação. O telhado é composto em geral por caibros de envireira que são cobertos com palhas de jaci, ouricuri ou buriti, observando-se uma grande predominância no uso da primeira dessas palmeiras nas residências indígenas do médio Amônia. Anteriormente, a permanência das habitações Arara em um determinado sítio estava determinada pela facilidade de acesso a roçados produtivos e pela disponibilidade de caça no entorno; o seu traslado, por fatores relacionados ao distanciamento em relação a outros grupos étnicos, e pela ocorrência de mortes dos membros da família ou da comunidade. Nos últimos decênios, a escolha, a manutenção e a mudança do local de habitação têm sido determinadas preponderantemente em função dos constrangimentos territoriais impostos pelo contato interétnico com outros grupos indígenas e com os agentes da sociedade nacional.
A localização e a ocupação territorial dos grupos familiares que hoje compõem a comunidade indígena Arara no rio Amônia foram bastante diversas até o último terço do século XX. Tendo em vista a multiplicidade de origens étnicas e as sucessivas mudanças na localização geográfica desses grupos familiares, pode-se dizer que a sua ocupação territorial adquiriu características homogêneas somente ao longo das últimas três décadas. De acordo com a memória indígena, residiam antigamente no alto Amônia, pouco abaixo do marco internacional Brasil/Peru, cinco famílias compostas por índios Amawáka, Koníbo e Kampa que se tornaram ascendentes de várias parentelas identificadas como Arara nesse rio. Outra família extensa que se reconhece no presente como Arara nesse curso d'água foi formada a partir da união entre um índio Santa Rosa proveniente do rio Breu e uma índia Kampa. Por sua vez, a maior parte das famílias Arara, Jamináwa e Kaxinawá que por meio de sucessivos deslocamentos ocupou o Amônia durante a segunda metade do século XX tinham como ponto de origem a bacia do rio Tejo. Os 278 indivíduos que habitam atualmente a terra aqui delimitada, distribuem-se por 42 unidades residenciais, sendo, 29 na margem esquerda do rio Amônia e 13 na margem direita, com uma média de 6,6 habitantes em cada residência.
Para reforçar o esforço conjunto pela regularização de seu território os Arara erigiram em meados de 2002, na colocação Assembléia, um aldeamento, denominado "Novo Destino", construído em semi-círculo, onde mantinham uma escola, uma enfermaria e 14 residências. Este local passou a se tornar uma referência para reuniões políticas, festejos e caiçumadas. Em novembro de 2003, transferiram este aldeamento para a localidade Quieto, na margem direita do rio Amônia, próximo da foz do igarapé Timoteu.
III - ATIVIDADES PRODUTIVAS
As atividades de subsistência desenvolvidas pelas famílias indígenas Arara no rio Amônia permanecem em linhas gerais bastante próximas às praticadas pelos demais grupos Pano que habitam o vale do Juruá acreano. Os principais encargos econômicos estão baseados na agricultura, na caça, na pesca, na coleta, na criação e no comércio, todos praticados em pequena escala. Para a maioria desses ofícios, a atual unidade de produção e consumo é constituída pela família nuclear, perdurando, contudo a família extensa como rede preferencial de distribuição de bens e/ou de cooperação em determinados afazeres. Isto está demonstrado, no passado e atualmente, na forma de localização e uso territorial por grupos familiares de mesma origem étnica. Como outros grupos Pano que habitam a bacia do Juruá, os Arara costumam fazer seus roçados nas ladeiras altas e nos cumes das colinas existentes no seu território. A maior parte dos roçados está situada a pouca ou média distância da margem do rio Amônia, sendo alcançados em geral através de caminhos que partem do fundo das casas em direção à mata circundante. Cultivam macaxeira, banana, milho, batata-doce, inhame, jerimum, ananás, mamão etc. A abertura de um novo roçado inicia-se por volta de maio/junho, no início da estação seca, procedendo-se então a escolha do local adequado e o corte da vegetação mais baixa, dos paus, cipós e árvores mais finas, atividade que se denomina brocar. A broca é seguida pela derrubada das árvores mais grossas, depois da qual se aguarda o período necessário para a secagem da madeira e se realiza a primeira queima. Procede-se em seguida à coivara, que consiste na aglomeração do restante da vegetação que não chegou a ser consumida de forma satisfatória, queimando-a novamente e aumentando desse modo a quantidade de cinza que servirá de adubo. O plantio se realiza a partir de setembro/outubro, coincidindo com o começo do período de chuvas. Algum tempo depois, realizam a primeira limpeza do mato que volta a brotar no roçado. A colheita depende de cada tipo de cultivo, variando entre três meses, por exemplo, como para o milho, até um ano ou mais para algumas espécies de macaxeira. Após três ou quatro anos de uso continuado, o solo do roçado perde grande parte de seus nutrientes, pelo que se torna necessária a escolha e abertura de um novo local para o cultivo agrícola. A coleta de produtos florestais é realizada sem finalidades comerciais, representando importante complemento alimentar e fornecendo matéria-prima para a construção de casas e outros itens da cultura material Arara. Entre os produtos mais freqüentemente coletados estão os frutos comestíveis da floresta que produzem os chamados vinhos, bastante apreciados, a exemplo do açaí, da bacaba, do patauá e do buriti. Outros produtos da floresta, usados para diversas finalidades da cultura material, incluem madeiras como o cedro, o cumarú, a envira, a itaúba, a jacareúba, o louro, a maçaranduba, a quariquara, etc.
A caça é uma atividade produtiva que continua a ser bastante valorizada, sendo realizada atualmente pelos Arara quase sempre com armas de fogo. O emprego do arco e da flecha para tal finalidade caiu quase completamente em desuso, perdurando a confecção dessas peças, no entanto, com finalidade recreativa, comercial (artesanato), ou simplesmente para a auto-afirmação étnica. No presente, além de espingardas também se utiliza de forma esporádica o terçado como arma para a caça ou a captura de embiaras. Entre outras espécies, caçam a anta, o porquinho, a queixada, o veado, a paca, a cutia, o tatu, o jabuti, diversas espécies de macaco e pássaros como o jacamim, mutum, nambu etc. As caçadas são realizadas preferentemente nas terras interiores dos extremos da área delimitada, incluindo a região entre as cabeceiras dos igarapés Timoteu e Coconaia, e a zona entre este último e as nascentes do igarapé Artur. A caça é realizada especialmente no curso superior do igarapé Tetéu e nas cabeceiras dos igarapés Teimoso e Taboca, sendo os dois últimos afluentes do rio Arara. A atividade da pesca - que os Arara do Amônia e todos os habitantes do alto Juruá denominam 'mariscar' - é realizada normalmente no 'verão', quando os rios e igarapés estão baixos e as águas limpas. Entre as técnicas de marisco mais comuns estão o uso da linha e do anzol, o espinhel (série de anzóis presos a bóias de madeiras leves) e, com a tarrafa. Ocasionalmente se emprega a malhadeira (rede ou 'manga'), o mergulho com bicheiro (espécie de anzol encastoado na ponta de um pedaço de madeira e provido de linha com bóia), o facheio com zagaia ou terçado e o arpão. A utilização de substâncias ictiotóxicas para a pesca (como a uáca) parece ser, atualmente, muito restrita entre os Arara do Amônia, visto que os poucos lagos existentes e ínfima dimensão assumida no verão pelos igarapés que cortam a área limitam consideralmente as oportunidades para a utilização dessa técnica. Pescam espécies como matrinxã, pacu, piau, piranha, surubim, traíra, jundiá, jiju, mandim, cará, curimatã etc. O 'marisco' é realizado principalmente ao longo do rio Amônia e nos seus afluentes, especialmente nos igarapés Tetéu e Coconaia, sendo o uso dos poucos lagos existentes na área delimitada prejudicado pelas restrições impostas por ocupantes não índios presentes em suas proximidades.
A criação de animais para consumo próprio ou para o comércio é uma atividade produtiva desenvolvida em pequena escala. Entre os animais domésticos eventualmente criados pelos índios Arara estão galinhas, patos, cabras, ovelhas, porcos e vacas. Também se nota a criação esporádica de animais silvestres (araras, papagaios, macacos e outros) com fins recreativos, para o consumo ocasional ou para obtenção de itens específicos usados na cultura material. A criação de animais domésticos é realizada no quintal (galinhas e patos), em áreas próximas separadas das residências (porcos, cabras), ou áreas formadas com pastagens (gado, ovelhas). A criação de galináceos e suínos, que são os mais comuns, destina-se ao escambo e comércio com os regatões que percorrem a região ou à venda direta na cidade de Marechal Thaumaturgo, enquanto a criação de gado é desenvolvida somente por algumas famílias indígenas.
IV - MEIO AMBIENTE
A área ocupada pelos índios Arara no rio Amônia está inserida numa região de grande importância e diversidade biológica. Por estar localizada com incidência parcial na área sul do Parque Nacional da Serra do Divisor e uma incidência parcial no limite oeste da Reserva Extrativista do Alto Juruá, entre essas duas unidades de conservação, essa área possui um significado particular do ponto de vista etno-ambiental. Ela compõe um mosaico territorial com outras glebas públicas reservadas pelo Governo Federal no alto Juruá (incluindo aí a TI Kampa do Rio Amônea, que lhe é contígua ao sul), possibilitando o alargamento da dimensão espacial da conservação e a multiplicidade de experiências sócio-culturais no uso sustentado da biodiversidade. Com efeito, o equilíbrio na utilização das riquezas naturais existentes no interior da área delimitada e no seu entorno imediato representa uma condição essencial para assegurar a preservação dos recursos ambientais necessários ao bem estar econômico e cultural das famílias indígenas envolvidas. Considerando o fato da população Arara que ocupa presentemente a bacia do rio Amônia residir toda junto às margens deste curso d'água, percebe-se de imediato que a preservação desse afluente do alto Juruá é de vital importância para o bem estar econômico e social das famílias indígenas que ali se encontram. Todavia, o problema ambiental mais grave encontrado nos limites da área delimitada durante os trabalhos de campo foi justamente a grande devastação da cobertura florestal na margem esquerda do Amônia, com o conseqüente desbarrancamento e o assoreamento do leito desse rio. Como pudemos apurar, com a efetiva implantação do Projeto de Assentamento Amônia, as famílias parceleiras foram motivadas a realizarem derrubadas para a formação de pastagens com vistas ao recebimento do respectivo crédito de fomento para atividades agropecuárias.
Existem restrições mais ou menos efetivas por parte da população não indígena ao uso dos lagos existentes na área delimitada pelos integrantes da comunidade Arara. De acordo com a convenção regional, geralmente o acesso e o usufruto destes lagos são controlados pelo respectivo "dono do lote" (no caso da margem abrangida pelo Projeto de Assentamento) ou "morador" (no caso da margem incluída na Reserva Extrativista) onde eles se acham localizados. De todo modo, os lagos denominados Redondo e do Macedo continuam a ser intermitentemente utilizados pelas famílias indígenas, especialmente aquelas que habitam a colocação Assembléia. Por sua vez, a exclusividade na utilização do lago situado acima do igarapé Tetéu é disputada acirradamente pelos não índios residentes na colocação Saboeiro. De qualquer forma, os lagos acima indicados constituem um recurso econômico relevante para os Arara, sendo a sua inclusão uma das referências para o estabelecimento do limite setentrional aqui proposto no curso do rio Amônia. Outro recurso ambiental imprescidível ao bem estar das famílias Arara que ocupam o Amônia é a disponibilidade de animais de caça. Devido à persistente prática de caçadas na bacia deste rio para atender às demandas da cidade de Marechal Thaumaturgo e de turmas madeireiras, há uma nítida rarefação na densidade de animais de caça hoje encontrados na área proposta em relação aos períodos anteriores, embora esteja distante ainda, de uma situação de escassez. De qualquer modo, é de fundamental importância a preservação da região de cabeceiras dos afluentes da margem esquerda do Amônia, tais como os igarapés Timoteu, Coconaia e Artur, bem como, na margem direita, do curso superior dos igarapés Montevidéu, Tetéu e Paxiúba, e também das cabeceiras dos igarapés Teimoso e Taboca, afluentes do rio Arara. Essas regiões são imprescindíveis à reprodução dos animais caçados pelos Arara, funcionando como zona de refúgio para os mesmos.
V - REPRODUÇÃO FÍSICA E CULTURAL
O conjunto de famílias que podemos identificar como constituindo a atual população Arara do rio Amônia possui, na verdade, diversas procedências étnicas. As informações coligidas dão conta de um indiscutível substrato autóctone Amawáka que foi grandemente influenciado pela associação forçosa com os Kampa e os Koníbo da montaña peruana, introduzidos no rio Amônia durante o auge do período da borracha. Essa população-base seria logo acrescida com a chegada dos Quijo (Santa Rosa) vindos do rio Breu, recebendo posteriormente um aporte fundamental de famílias Arara, Jamináwa e Kaxinawá oriundas da bacia do rio Tejo. Além dos grupos indígenas acima nomeados, há também um razoável contingente de não índios vinculados no presente por relações de casamento e afinidade aos Arara do Amônia. Tendo em vista a diversidade étnica de origem e a relativa freqüência de alianças matrimoniais entre indivíduos pertencentes a grupos indígenas distintos, bem como entre estes e não índios, o critério determinante para a consideração de alguém como pertencente à comunidade indígena são os laços de parentesco (consangüíneos e afins) invocados entre um dado indivíduo e os membros das famílias que compõem o núcleo dessa comunidade. Embora tenham vivido uma trajetória histórica muito particular e diferenciada em relação aos demais grupos locais conhecidos como Arara (ou Jamináwa-Arara) estabelecidos no alto Juruá, compreende-se a adoção deste etnônimo (ou Apolima-Arara) pelas famílias indígenas aqui consideradas como analítica e empiricamente: i) facultada pelos laços históricos e sociais que unem de forma direta uma parte dessas famílias aos demais Arara da bacia do Juruá; ii) estimulada pelo seu caráter pouco específico, possibilitando a abrangência das demais identidades indígenas envolvidas; iii) definida pelo pertencimento étnico da liderança reconhecida atualmente pela comunidade indígena; e iv) sustentada pelos laços de parentesco estabelecidos entre as famílias de filiações étnicas antes distintas e pelo projeto social comum que as congrega no presente.
Afora as referências que se encontra em relatórios administrativos da própria FUNAI, pouca atenção recebeu essa população indígena até o momento, não havendo, por exemplo, dados sistematizados disponíveis sobre as taxas de natalidade e mortalidade do grupo. A partir de censo realizado em 2001, corrigido pelas observações feitas durante os trabalhos do GT em 2002 e por novo trabalho de campo em 2003, apurou-se a presença de 278 pessoas que se identificavam e/ou eram identificadas pelos demais como Arara no rio Amônia, e outras 107 pessoas pertencentes ou relacionadas às famílias levantadas que se encontravam temporária ou definitivamente fora do Amônia. Em tese, a população dessa comunidade indígena pode vir a alcançar 385 pessoas, dependendo para tanto, principalmente, da efetividade e/ou aceitação da adscrição étnica. Além daquelas áreas de evidente significado sócio-cultural para as famílias indígenas que reivindicam a demarcação da área, como o cemitério existente nas proximidades da colocação Montevidéu, poder-se-ía afirmar como de valor intrínseco para a identidade do grupo, os locais de ocupação histórica dos seus antigos ascendentes ou membros já idosos. É o caso, por exemplo, da colocação Assembléia e sua área de influência, habitada intermitentemente desde o primeiro terço do século XX pela mesma família indígena que reocupou o local após a sua retirada dos limites da TI Kampa do Rio Amônea e a colocação Montevidéu e sua área de influência, tradicionalmente ocupada por famílias Arara e Santa Rosa, que ainda por lá se mantém atualmente.
VI - LEVANTAMENTO FUNDIÁRIO
A proposta de limites aqui formulada para a demarcação da terra indígena Arara do Rio Amônia apresenta incidência de três glebas sob administração de órgãos federais: a primeira, situada no limite sul do Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), criado pelo IBAMA em 1989; a segunda, no limite oeste da Reserva Extrativista do Alto Juruá (RESEX), também criada pelo IBAMA em 1990, e a terceira do limite sul Projeto de Assentamento Amônia (PA Amônia), implantado pelo INCRA em 1996, abrangendo na margem esquerda deste rio os lotes de número 01 a 56 e, nas terras interiores, os lotes de número 225 a 249, sendo que esses últimos não apresentam ocupação efetiva, e ainda os lotes 01 e 03 (outra Gleba do PA Amônia) à margem direita do igarapé Timoteu. Na área aqui delimitada, 24 lotes do PA Amônia são ocupados por famílias Arara e 34 lotes são ocupados por não índios. Na área de Reserva Extrativista incidente na Terra Indígena ora delimitada, 13 lotes são ocupados por famílias indígenas e 28 são ocupados por famílias de não índios. Na área sul do Parque Nacional da Serra do Divisor, não existem ocupação permanente. Todas as ocupações vistoriadas ou apenas visitadas caracterizam-se por seu cunho essencialmente familiar, voltadas para uma economia de subsistência típica da região amazônica. A maior parte das residências é construída de madeira ou paxiúba, com piso dos mesmos materiais e telhado de palha ou zinco. A grande maioria das demais benfeitorias existentes nessas ocupações é constituída por fruteiras plantadas em pequena escala, cercas de arame ou pau-apique, e áreas restritas formadas com pastagens (existentes apenas, quando encontradas, na margem esquerda do rio Amônia, na área do PA Amônia).
Quadro demonstrativo de ocupantes não índios na TI Arara do Rio Amônia (2003). Nº; NOME DO OCUPANTE; LOCALIZAÇÃO (GLEBAS): 01; Cordélio Cordeiro de Oliveira; PA Amônia/Lote 06 - 02; Luiz Inácio Vieira da Silva; PA Amônia/Lote 06 - 03; Evandro Gomes da Silva; PA Amônia/Lote 07 - 04; Raimundo Ferreira de Souza Lima; PA Amônia/Lote 09 - 05; Lindomar da Silva; PA Amônia/Lote 13 - 06; José Ferreira de Souza; PA Amônia/Lote 13 - 07; Manoel Ferreira Firmino; PA Amônia/Lote 13 - 08; Manoel Firmino Bezerra; PA Amônia/Lote 15 - 09; Eliésio Silva Souza; PA Amônia/Lote 16 - 10; Olien José da Silva; PA Amônia/Lote 17 - 11; Alírio Vieira da Silva; PA Amônia/Lote 17 - 12; Maria Aldenira da Silva Batista; PA Amônia/Lote 18 - 13; José Carlos Nascimento Margarida; PA Amônia/Lote 18 - 14; Davi Vieira da Silva; PA Amônia/Lote 18 - 15; Osmar Vieira dos Santos; PA Amônia/Lote 19 - 16; Raimundo Davi dos Santos; PA Amônia/Lote 19 - 17; Vanderley Félix da Silva; PA Amônia/Lote 20 - 18; Francisco Margarida; PA Amônia/ Lote 20 - 19; Marinete Dias de Souza (Branca); PA Amônia/Lote 21 - 20; Antonio Mauricio C. De Azevedo; PA Amônia/Lote 22 - 21; Océlio Araújo do Vale; PA Amônia/Lote 23 - 22; Manoel Jonas Gomes Firmino; PA Amônia/Lote 24 - 23; Roberval; PA Amônia/Lote 24 - 24; Donizete Rosas e Silva; PA Amônia/Lote 26 - 25; Raimundo de Oliveira e Silva; PA Amônia/Lote 27 - 26; Raimundo Rosas e Silva; PA Amônia/Lote 28 - 27; Antonio Rivaldo Rodrigues Pereira; PA Amônia/Lote 29 - 28; Manoel Firmino Filho da Silva (Neo); PA Amônia/Lote 30 - 29; Agildo Ferreira Lima; PA Amônia/Lote 30 - 30; Francisco Pereira e Moura; PA Amônia/Lote 35 - 31; Antonio Vieira do Nascimento; PA Amônia/Lote 37 - 32; Antonio de Souza Borges; PA Amônia/Lote 38 - 33; José Pereira Lima; PA Amônia/Lote 39 - 34; João Andrade Albuquerque (Chicó); PA Amônia/Lote 40 - 35;
Silvestre de Oliveira Costa; PA Amônia/Lote 41 - 36; Antônio Cândido da Silva (Chicó); PA Amônia/Lote 42 - 37; José de Souza da Conceição (Chico); PA Amônia/Lote 43 - 38; Manoel Araújo de Souza (Chicó); PA Amônia/Lote 44 - 39; Amilton Costa; PA Amônia/Lote 45 - 40; Edmundo da Costa; PA Amônia/Lote 46 - 41; Sebastião Antonio da Conceição; PA Amônia/Lote 47 - 42; Hugo; PA Amônia/Lote 01 - 43; "Côco" (cognome); PA Amônia/Lote 03 - 44; Antonio Pedro Ferreira de Freitas; PA Amônia/Lote s/nº - 45; Adélia Eugênia Moreira Montalvo; RESEX Alto Juruá/Colocação Montevidéo - 46; Antonio da Silva Souza; RESEX Alto Juruá/ Colocação Saboeiro - 47; Antonio Geremias Mapes Oliveira; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 48; Evandro F. Nascimento Margarida; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 49; Leomar José Vieira da Silva; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 50; Sebastião Soares; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 51; Antonio da Silva Souza; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 52; Valter da Silva Souza; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 53; Francisco Ferreira de Souza; RESEX Alto Juruá/ Colocação Montevidéo - 54; Anazildo Ferreira Lima; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 55; José Trindade dos Santos; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 56; Aurélio Rosa e Silva; RESEX Alto Juruá/ Colocação Tetéu - 57; Antonio Lima da Silva; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 58; Franisco (Fran); RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 59; Dosa; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 60; José Maria Ferreira; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 61; Antonio do Mundinho Cardoso; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 62; Valdemar Barreto de Souza; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 63; José do Mundinho Cardoso; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 64; Silvestre de Oliveira Costa; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 65; Antonio Lima da Silva; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 66; Geilson Margarida Moreira; RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto - 67; Maria Margarida Cordeiro Moreira; RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto - 68; Raimundo Cardoso; RESEX Alto Juruá/ Colocação Assembléia - 69; Neguinho da Maritô; RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto - 70; Antonio Jorge F. Borges; RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto - 71; Zezinho (do Baixinho); RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto - 72; Raimundinho (do Baixinho); RESEX Alto Juruá/ Colocação Quieto.
VII - CONCLUSÃO E DELIMITAÇÃO
Os critérios utilizados para justificar a delimitação dessa terra indígena baseiam-se na tradicionalidade da ocupação daquele território pelos índios Arara, especialmente as regiões das colocações Assembléia e Montevidéo e suas áreas de influência, e satifaz os preceitos constitucionais do § 1º do Artigo 231 da Constituição Federal de 1988, sendo assegurada à terra indígena identificada e delimitada ser habitada tradicional e permanente; onde desenvolvem suas atividades produtivas; imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários à seu bem estar e; configura uma terra necessária à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Para a proposição de delimitação, identificamos, portanto, as áreas que: a) são habitadas em caráter permanente - documentos etnohistóricos demonstram que a área aqui delimitada, foi, em tempos imemoriais, e continua no presente, sendo habitada em caráter tradicional e permanente por ascendentes e pelos atuais Arara do rio Amônia, conforme modos indígenas próprios; b) é utilizada para suas atividades produtivas, pois, para uma população atual de 278 indivíduos indígenas, que sobrevivem da agricultura, da pequena pecuária, da caça, da pesca, da coleta e do extrativismo naquele território, a superfície delimitada, configura um espaço mínimo necessário para que continuem a desenvolver as atividades que lhes proporcione a subsistência, além de ser a garantia, no futuro, de suportar um incremento populacional, que advirá com sua regularização; c) a área é imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários ao bem estar dos índios que habitam, pois é tida pelos Arara, como possuidora de recursos ambientais indispensáveis à sua manutenção, à seu desenvolvimento e reestruturação sócio-cultural, assegurando-se a própria dinâmica e manejo dos recursos naturais, tendo como horizonte a preservação dos mesmos e a reprodução física e cultural do grupo; d) a área aqui delimitada é necessária à reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, proporcionando-lhes a continuidade da rede de parentesco e descendência do grupo e a realização de suas atividades econômicas; representando na única possibilidade territorial que lhes resta - de um outrora imenso território - para poderem se reproduzir e se perpetuarem enquanto grupo étnico.
A delimitação da Terra Indígena Arara do Rio Amônia, abrange no seu limite norte/noroeste a região entre o Marco 46 da fronteira Brasil-Peru, toda a extensão da margem direita do igarapé Timoteu, até sua foz no rio Amônia e toda a bacia do igarapé Água Preta. A referida área é imprescindível à comunidade Arara por ser essencial à preservação dos recursos ambientais, particularmente a vegetação e as nascentes dos igarapés Água Preta e Timoteu e seus afluentes, sendo um território indispensável às atividades de caça, pesca e coleta. No limite norte/nordeste região da margem direita do rio Amônia e da margem esquerda do igarapé Paxiúba, de sua nascente até sua foz. A área que margeia o igarapé Paxiúba, é fundamental para os Arara como reserva ambiental, onde existem grandes estoques de pesca e reservas de caça e coleta, sendo utilizada pelos índios que habitam a foz do igarapé Timoteu, e ainda por ser a região escolhida por eles como local de construção de novo aldeamento na localidade Quieto. No limite sudeste, situam-se as cabeceiras dos igarapés Paxiúba, Teimoso e Taboca, região rica em recursos florestais ainda preservados. Esta área, é utilizada pelos Arara que habitam as colocações Assembléia e Palmário, para atividades de caça, pesca e coleta; sendo uma das regiões, da área delimitada, mais preservadas e intactas. Ao Sul fica a margem esquerda do médio rio Arara, abarcando toda a extensão do igarapé Tetéu e a margem direita do igarapé Montevidéo. Nesta região se encontram as colocações Montevidéo e Tetéu. É a única região da terra indígena delimitada onde existem seringais nativos, utilizados economicamente pelos índios. Constituem-se também uma região onde os Arara desenvolvem suas atividades no cultivo de roçados situados, as margens esquerda e direita do rio Amônia, além de ser rica em outros recursos florestais e pesqueiros, a exemplo do lago do Saboeiro. Ao sudoeste, fica o igarapé Artur, local onde desenvolvem cultivo de roças, e utilizam o interior da região para atividades de caça, pesca e coleta, especialmente em toda a bacia do igarapé Coconaia. Esta região que teve seus recursos florestais bastante depredados por não-índios, deve ser objeto de ação de manejo florestal, como os índios reiteram em suas manifestações. A oeste localiza-se a extensão do limite internacional Brasil-Peru. É uma região rica em recursos de caça, pesca e coleta; indispensável às atividades agrícolas e extrativistas das parentelas Arara, Santa Rosa, Kampa e Konibo das colocações Montevidéo, Tetéu, Palmário e Assembléia. Por situar-se na região de fronteira, deverá ser objeto de cuidados especiais, especialmente por causa de inúmeros ilícitos que ali ocorrem destacadamente às explorações de caçadores profissionais, extratores ilegais de madeira e presença de narcotraficantes, principalmente originários do Peru.
A área identificada e delimitada sob a denominação Terra Indígena Arara do rio Amônia, perfaz uma superfície de 20.764 hectares e perímetro de 80 quilômetros. A sua demarcação e regularização é o reconhecimento governamental à garantia de direitos sancionados daqueles índios e um recurso administrativo indispensável à sobrevivência e continuidade enquanto grupo étnico diferenciado daquela sociedade indígena.
LUCIANO ALVES PEQUENO
Antropólogo/CGID/DAF
DESCRIÇÃO DO PERÍMETRO
NORTE: partindo do Marco 46, localizado na fronteira internacional Brasil / Peru, de coordenadas geodésicas 09º03'49,08"S e 72º56'31,42"WGr., conforme ACTA DA 24ª CONFERÊNCIA DA COMISSÃO MIXTA BRASILEIRO/PERUANO DEMARCADORA DE LIMITES DE 12.09.1927 (TRATADO DE 08/SET/1909), segue em linha reta até o Ponto P-01, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º02'55,3"S e 72º55'37,2"WGr., localizado na confluência de um igarapé sem denominação com o Igarapé Timoteu, daí, segue pelo referido igarapé, a jusante, até o Ponto P-02, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º00'21,2"S e 72º52'07,5"WGr., localizado na intersecção do alinhamento dos marcos do INCRA M-396/M-400 com o Igarapé supra citado, daí, segue em linha reta até o Marco M-400 (INCRA), de coordenadas geodésicas 08º59'41,117"S e 72º51'47,093"WGr., daí, segue em linha reta até o Marco M-512(INCRA), de coordenadas geodésicas 08º59'28,034"S e 72º51'30,052"WGr., daí, segue em linha reta até o Marco M-296(INCRA), de coordenadas geodésicas 08º59'59,937" S e 72º50'55,674"WGr., daí, segue em linha reta até o Ponto P-03, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º00'04,1" S e 72º50'50,4" WGr., localizado na margem direita do Rio Amônea, daí, segue pela referida margem do rio, a jusante, até o Ponto P-04, de coordenadas geodésicas aproximadas 08º59'51,1"S e 72º50'06,9 WGr., localizado na sua confluência com o Igarapé Paxiúba, (do Marco 46 ao Ponto P-04 a confrontação se dá com o Parque Nacional da Serra do Divisor); LESTE: do ponto antes descrito, segue pelo referido igarapé, a montante, até o Ponto P-05, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º02'17,2" S e 72º50'32,00" WGr., localizado na sua confluência com um igarapé sem denominação; daí, segue a montante pelo igarapé sem denominação até o Ponto P-06, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º03'03,2"S e 72º50'17,1" WGr., localizado na sua Confluência com outro igarapé sem denominação, daí, segue por uma linha reta até o Ponto P-07, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º04'44,0" S e 72º49'07,0" WGr., localizado na confluência do Igarapé Teimoso com um igarapé sem denominação, daí, segue a montante do igarapé sem denominação até o Ponto P-08, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º05'30,0" S e 72º48'56,0" WGr. localizado na sua cabeceira, daí, segue em linha reta até o Ponto P-09, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º05'39,0" S e 72º48'48,0" WGr. localizado na cabeceira de um igarapé sem denominação, daí, segue por este a jusante até o Ponto P-10, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º06'30,0" S e 72º48'51,0" WGr. localizado na sua confluência com o Igarapé Taboca, daí, segue a jusante pelo Igarapé Taboca até o Ponto P-11, de coordenadas geodésicas aproximadas 09º06'45,0" S e 72º48'06,0" WGr. localizado na sua confluência com o Rio Arara , daí, segue a montante pelo Rio Arara até o Marco MC-06, da demarcação da T. I. Kampa do Rio Amônea, de coordenadas geodésicas 09º10'24,95" S e 72º50'05,35" WGr., localizado na margem esquerda do Rio Arara (do Ponto P-04 ao Marco MC-06 a confrontação se dá com a Reserva Extrativista do Alto Juruá); SUL: do marco antes descrito, segue em linha reta até Marco MC-05 de coordenadas geodésicas 09º10'19,03" S e 72º51'30,37" WGr.; daí segue em linha reta até o Marco MC-04 de coordenadas geodésicas 09º10'14,70" S e 72º52'32,60" WGr.; localizado na margem esquerda do Igarapé Montevidéu de Baixo; daí, segue a jusante do referido igarapé até o Marco MC-03 de coordenadas geodésicas 09º09'26,20" S e 72º54'04,50" WGr., localizado na confluência do referido Igarapé com o Rio Amônia, daí, segue a jusante do referido rio até o Marco MC-02 de coordenadas geodésicas 09º08'45,10" S e 72º54'22,70" WGr., localizado na confluência do referido rio com o Igarapé Artur, daí, segue por este a montante até Marco MC-01 de coordenadas geodésicas 09º07'45,59" S e 72º57'10,41" WGr., localizado na cabeceira do referido igarapé, próximo do limite internacional Brasil/Peru; (do Marco MC-06 ao Marco MC-01 a confrontação se dá com a Terra Indígena Kampa do Rio Amônea); OESTE: do ponto antes descrito, segue acompanhando o limite internacional Brasil/Peru até o Marco 46, de fronteira, início da descrição deste perímetro. OBS: 1 - Base cartográfica utilizada na elaboração deste memorial descritivo: SC.18-X-D-II - 1:100.000 - DSG - 1988. 2 - As coordenadas geodésicas citadas neste memorial descritivo estão referenciadas ao Datum Horizontal SAD-69 Responsável Técnico pela Identificação dos Limites: Jairo Barroso Vertelo, Engenheiro Agrimensor, CREA - MG 64.543/D.