Decreto nº 48165 DE 29/03/2021

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 30 mar 2021

Dispõe sobre a Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais.

O Governador do Estado de Minas Gerais, no uso de atribuição que lhe confere o inciso VII do art. 90 da Constituição do Estado e tendo em vista o disposto na Lei nº 19.420, de 11 de janeiro de 2011,

Decreta:

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Este decreto dispõe sobre a Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais com a finalidade de estabelecer princípios e diretrizes para a preservação de documentos provenientes da Administração Pública do Poder Executivo e de origem privada de interesse público e social, visando à gestão, à preservação e ao acesso aos documentos arquivísticos, conforme os objetivos especificados na Lei nº 19.420, de 11 de janeiro de 2011, que estabelece a Política Estadual de Arquivos.

Art. 2º Para os fins do disposto neste decreto considera-se:

I - armazenamento: guarda de documentos arquivísticos em local apropriado;

II - armazenamento de documento digital: guarda de documentos digitais em dispositivos de memória não volátil;

III - arquivo: conjunto de documentos de qualquer natureza produzidos e recebidos por pessoa natural ou jurídica, qualquer que seja o suporte da informação;

IV - arquivos privados: arquivos cujos documentos tenham sido produzidos ou recebidos por pessoa natural ou jurídica de direito privado;

V - arquivos públicos: arquivos cujos documentos tenham sido produzidos ou recebidos pelos órgãos e pelos Poderes do Estado, bem como pelas entidades por ele constituídas e os conjuntos de documentos produzidos ou recebidos por entidade privada prestadora de serviço público;

VI - autenticidade: credibilidade de um documento enquanto documento; a qualidade de um documento ser o que diz ser e de que está livre de adulteração ou qualquer tipo de corrupção e composta de identidade e integridade;

VII - identidade: conjunto dos atributos de um documento arquivístico que o caracterizam como único e o diferenciam de outros documentos arquivísticos;

VIII - integridade: estado dos documentos que se encontram completos e que não sofreram nenhum tipo de corrupção ou alteração não autorizada nem documentada;

IX - custódia: responsabilidade jurídica de guarda e proteção de arquivos, independentemente de vínculo de propriedade;

X - documento arquivístico: documento produzido, elaborado ou recebido, no curso de uma atividade prática, como instrumento ou resultado de tal atividade e retido para ação ou referência;

XI - documento digital: informação registrada, codificada em dígitos binários, acessível e interpretável por meio de sistema computacional;

XII - documento digitalizado: representante digital do processo de digitalização do documento físico e seus metadados;

XIII - gestão de documentos: conjunto de procedimentos e operações técnicas relativas à produção, à classificação, à tramitação, ao uso, à avaliação e ao arquivamento de documentos, em fase corrente e intermediária, visando a sua eliminação ou o seu recolhimento para guarda permanente;

XIV - fase corrente: documentos que se conservam nas instituições de origem em razão de sua vigência e de seu uso para fins administrativos, legais e fiscais;

XV - fase intermediária: documentos que, originários dos documentos correntes, mantêm valores prescricionais e precaucionais e, por essa razão, aguardam destinação, até que possam ser eliminados ou recolhidos para guarda permanente;

XVI - fase de guarda permanente: os documentos que, originários dos documentos intermediários, são definitivamente preservados devido a seu valor informativo para pesquisa histórica, cultural e científica ou probatório;

XVII - preservação digital: conjunto de ações gerenciais e técnicas exigidas para superar as mudanças tecnológicas e a fragilidade dos suportes, garantindo acesso e interpretação dos documentos digitais pelo tempo que for necessário;

XVIII - preservação física: aplicação de medidas e procedimentos tendentes a prevenir a degradação física dos documentos e a garantir sua segurança contra acidentes e intrusões;

XIX - produtor: pessoa física ou jurídica que produz, recebe ou acumula documentos arquivísticos em função de seu mandato, missão, funções ou atividades;

XX - repositório digital: plataforma tecnológica que apoia o gerenciamento dos materiais digitais, pelo tempo que for necessário, e é formado por elementos de hardware, software e metadados, bem como por uma infraestrutura organizacional e procedimentos normativos e técnicos;

XXI - repositório arquivístico digital: repositório digital que armazena e gerencia documentos arquivísticos, nas fases corrente, intermediária e permanente.

Parágrafo único. Para fins deste decreto, os documentos digitais se equiparam aos documentos físicos para comprovação de qualquer ato de direito público, conforme disposto no inciso X do caput do art. 3º da Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, desde que observados as técnicas e os requisitos para digitalização de documentos públicos e privados estabelecidos pelo Decreto Federal nº 10.278, de 18 de março de 2020.

Art. 3º A Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais será coordenada pela Secretaria de Estado de Cultura e Turismo - Secult em articulação com o Conselho Estadual de Arquivos - CEA.

§ 1º O CEA manifestará à Secult medidas necessárias à persecução dos princípios e das diretrizes da Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais.

§ 2º A Diretoria do Arquivo Público Mineiro da Secult prestará apoio técnico ao CEA para a persecução dos princípios e das diretrizes da Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais.

Art. 4º São princípios da Política de Preservação de Documentos do Estado de Minas Gerais:

I - fortalecer a rede de instituições arquivísticas públicas;

II - assegurar a adequada administração dos documentos públicos;

III - preservar o patrimônio arquivístico público e privado de interesse público e social;

IV - atender às demandas informacionais do Estado para apoiar o processo decisório;

V - assegurar o acesso às informações contidas nos arquivos, observadas as disposições legais;

VI - contribuir para a constituição e a preservação da memória estadual e nacional;

VII - estimular a participação da sociedade na constituição de arquivos públicos e privados de interesse social.

CAPÍTULO II - DAS DIRETRIZES

Seção I - Dos Arquivos Públicos

Art. 5º A preservação física e digital dos documentos arquivísticos nas fases corrente e intermediária é de responsabilidade do produtor.

Parágrafo único. A custódia dos documentos arquivísticos nas fases corrente e intermediária poderá ser feita pelo produtor ou por terceiros, considerando-se neste caso a responsabilidade solidária pela preservação dos documentos entre o produtor e o custodiador, observado, no que couber, o art. 26 do Decreto Federal nº 4.073, de 3 de janeiro de 2002.

Art. 6º A preservação física e digital dos documentos arquivísticos na fase de guarda permanente é de responsabilidade do Arquivo Público Mineiro, instituição arquivística pública do Poder Executivo, após seu recolhimento.

§ 1º O recolhimento de documentos arquivísticos digitais para instituição arquivística pública do Poder Executivo deverá observar a garantia de autenticidade dos documentos, sendo estes submetidos a um Repositório Arquivístico Digital.

§ 2º O Repositório Arquivístico Digital utilizará, preferencialmente, padrões abertos e atenderá aos requisitos de acesso e recuperação integral de seu conteúdo, devendo os documentos nele armazenados serem compreensíveis, independentemente dos sistemas que os produziram.

Art. 7º A destruição ou a adulteração de documento de valor permanente sujeitam o responsável a penalidades administrativas, civis e criminais, nos termos da legislação em vigor.

Art. 8º A preservação física dos documentos arquivísticos públicos nas fases corrente, intermediária e de guarda permanente observará:

I - o controle da movimentação e do traslado dos documentos arquivísticos, com o objetivo de se evitar a dissociação dos conjuntos documentais;

II - o controle ambiental das áreas de guarda dos documentos arquivísticos, quanto às condições climáticas, de ventilação, de limpeza e de vulnerabilidades construtivas;

III - as condições de segurança dos recursos humanos empregados em tarefas afins ao manuseio de acervos arquivísticos, implicando, sempre que necessário, a utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI;

IV - a prevenção e a capacitação dos recursos humanos empregados em tarefas afins à preservação física dos documentos arquivísticos para atuação em sinistros envolvendo fogo;

V - a detecção e a prevenção de ataques biológicos;

VI - a prevenção a furtos e vandalismo.

Art. 9º Materiais de qualidade serão empregados, preferencialmente, para o armazenamento e a preservação física em todas as fases do documento arquivístico, observando o peso, as dimensões e as características do documento, de modo a evitar a sua danificação.

Art. 10. O armazenamento de documentos digitais e digitalizados assegurará:

I - a proteção contra alteração, destruição e, quando cabível, contra o acesso e a reprodução não autorizados;

II - a indexação de metadados que possibilitem:

a) a localização e o gerenciamento do documento;

b) a conferência do processo de digitalização adotado.

Art. 11. Para efeito do disposto no parágrafo único do art. 2º, os documentos físicos poderão ser eliminados após digitalizados, ressalvados aqueles considerados de guarda permanente.

§ 1º Os documentos digitalizados que não são de guarda permanente serão preservados, no mínimo, até o transcurso dos prazos de prescrição ou decadência dos direitos a que se referem.

§ 2º A eliminação dos documentos físicos, digitais e digitalizados da Administração Pública do Poder Executivo após o transcurso do prazo de guarda observará os instrumentos de gestão de documentos aprovados pelo Arquivo Público Mineiro, em conformidade com o art. 11 da Lei nº 19.420, de 2011, e com o Decreto nº 46.398, de 27 de dezembro de 2013.

§ 3º As eliminações resultantes do procedimento de avaliação documental serão realizadas mediante critérios de responsabilidade social e de preservação ambiental.

Art. 12. O CEA constituirá, no prazo de seis meses, canal eletrônico para acolhimento de denúncia de situações de descaso, subtração e comercialização de documentos públicos através de leilões.

Parágrafo único. Compete ao CEA, após acolhimento das denúncias, recomendar providências para a apuração e a reparação de atos lesivos à política estadual de arquivos públicos e arquivos privados de interesse público e social, nos termos do inciso X do art. 3º do Decreto nº 39.504, de 24 de março de 1998.

Seção II - Dos Arquivos Privados de Interesse Público e Social

Art. 13. Arquivos privados podem ser declarados de interesse público e social, no âmbito do Poder Executivo, mediante parecer do CEA aprovado pelo titular da Secult, nos termos do art. 18 da Lei nº 19.420, de 2011.

Parágrafo único. O Arquivo Público Mineiro manterá cadastro atualizado dos arquivos privados de interesse público e social do Estado.

Art. 14. Os arquivos privados de interesse público e social poderão ser depositados, a título revogável, ou doados, a título irrevogável, ao Arquivo Público Mineiro.

Parágrafo único. A declaração de que um arquivo privado é de interesse público e social não implica a transferência do acervo para guarda em instituição arquivística pública nem exclui a responsabilidade por parte de seus detentores pela guarda e pela preservação do acervo, nos termos do art. 20 da Lei nº 19.420, de 2011.

Art. 15. Os arquivos privados identificados como de interesse público e social não poderão ser alienados com dispersão ou perda da unidade documental nem transferidos para o exterior.

Art. 16. O proprietário ou detentor de arquivo privado declarado de interesse público e social deverá comunicar previamente ao CEA e ao Arquivo Público Mineiro a transferência do local de guarda do arquivo ou de quaisquer de seus documentos, dentro do território nacional.

Art. 17. O acesso aos documentos de arquivos privados de interesse público e social dependerá de autorização expressa de seu proprietário ou possuidor.

Art. 18. A perda acidental, total ou parcial, de arquivo privado de interesse público e social será comunicada ao CEA e ao Arquivo Público Mineiro por seu proprietário ou detentor.

Art. 19. A Secult incentivará a preservação dos arquivos privados, mediante:

I - estímulo, observada a legislação vigente, à declaração dos arquivos privados como de interesse público e social;

II - apoio à constituição de centros de documentação e instituições arquivísticas nos municípios do Estado;

III - apoio à organização, à preservação e à divulgação dos arquivos privados de interesse público e social.

Art. 20. A Secult, por intermédio do Arquivo Público Mineiro, poderá firmar acordos de cooperação técnica com entidades privadas sem fins lucrativos proprietárias ou detentoras de arquivos privados de interesse público e social, objetivando o apoio para o desenvolvimento de atividades relacionadas à organização, à preservação e à divulgação do acervo.

Art. 21. A transferência do arquivo privado digital de interesse público e social para o Arquivo Público Mineiro deverá observar a garantia de autenticidade dos documentos, sendo estes submetidos a um Repositório Arquivístico Digital.

Parágrafo único. A digitalização dos arquivos privados observará as técnicas e requisitos estabelecidos pelo Decreto Federal nº 10.278, de 2020, bem como demais normas de organização de arquivos privados de interesse público social aplicáveis, estabelecidas por meio de deliberações do CEA.

Art. 22. O tratamento das informações pessoais dos arquivos privados de interesse público e social deve ser feito de forma transparente e com respeito às liberdades e garantias individuais, à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, observado o disposto no art. 57 do Decreto nº 45.969 , de 24 de maio de 2012.

Art. 23. A transferência emergencial de arquivo privado de interesse público e social para o Arquivo Público Mineiro poderá ocorrer, mediante parecer do CEA, observadas as hipóteses de:

I - risco ao patrimônio documental decorrente de:

a) intempérie climática;

b) sinistros em edificações de guarda de arquivos;

II - recomendação expedida pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais.

Art. 24. A transferência emergencial a que se refere o caput do art. 23 poderá ser requerida pelos seguintes órgãos e entidades:

I - Secult;

II - CEA;

III - Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais - Iepha;

IV - Fundação João Pinheiro - FJP;

V - outros órgãos competentes pela defesa do patrimônio documental.

§ 1º A transferência emergencial não implica a doação do acervo documental ao Arquivo Público Mineiro.

§ 2º A transferência emergencial observará a disponibilidade de espaço físico para armazenamento no Arquivo Público Mineiro.

§ 3º A transferência emergencial será realizada mediante celebração de Termo de Transferência, com vigência de até noventa dias, prorrogável, mediante justificativa, uma única vez por igual período.

§ 4º Findada a vigência do Termo de Transferência, o proprietário ou detentor será acionado por instrumento convocatório a proceder com a retirada do acervo privado do Arquivo Público Mineiro no prazo de até trinta dias.

§ 5º Na hipótese do não atendimento da convocação de que trata o § 4º, haverá nova convocação para a retirada do acervo privado do Arquivo Público Mineiro pelo mesmo prazo e, não sendo atendida, a Secult tomará as medidas cabíveis, podendo o proprietário ou detentor ser judicialmente acionado a fim de se proceder a devolução.

§ 6º O traslado e a retirada do arquivo privado de interesse público e social do Arquivo Público Mineiro são de responsabilidade do proprietário ou detentor, não sendo a Secult responsável por eventuais danos ou dissociações durante o traslado do acervo arquivístico.

CAPÍTULO III - DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 25. O Arquivo Público Mineiro publicará, no prazo de doze meses, seu Plano de Preservação de Documentos, observada a competência do CEA nos termos do inciso VII do art. 3º do Decreto nº 39.504, de 1998.

Art. 26. Normas complementares a fiel execução deste decreto serão editadas por ato próprio do Secretário de Estado de Cultura e Turismo.

Art. 27. Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Belo Horizonte, aos 29 de março de 2021; 233º da Inconfidência Mineira e 200º da Independência do Brasil.

ROMEU ZEMA NETO