Consulta de Contribuinte nº 87 DE 22/06/2023

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 22 jun 2023

ICMS – ENERGIA ELÉTRICA – ALÍQUOTA – BASE DE CÁLCULO – LC Nº 194/2022 – O Estado de Minas Gerais regulamentou o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, por meio do Decreto nº 48.456, de 1º de julho de 2022, e do Decreto nº 48.482, de 3 de agosto de 2022, para dar cumprimento à referida lei complementar, no que concerne, dentre outros, a incidência, alíquota e base de cálculo do imposto nas operações com energia elétrica.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a distribuição de energia elétrica (CNAE 3514-0/00).

Informa que é concessionária de serviço público federal de distribuição de energia elétrica, nos termos de seus estatutos sociais e do Contrato de Concessão nº 40/99-ANEEL firmado com a União, por intermédio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

Diz que em razão de sua atividade econômica de distribuição de energia elétrica, atua como agente auxiliar do Estado na arrecadação de ICMS dos consumidores finais de energia elétrica, cuja competência tributária cabe aos Estados Federativos, conforme dispõe no inciso II, c/c § 3º, ambos do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/1988).

Menciona que sua obrigação tributária decorre da interpretação conjunta do inciso II do art. 9º da Lei Complementar nº 87/1996 e da alínea “e” do inciso I do art. 85 do RICMS/2002, os quais atribuem às empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica a obrigação pelo lançamento e pelo pagamento antecipado do ICMS da operação.

Aduz que, a teor do que dispõe o art. 42 do RICMS/2002, devem ser aplicadas alíquotas que variam de 30% (trinta por cento) a 18% (dezoito por cento), a depender do consumo do destinatário e da finalidade por esta empregada, as quais incidem sobre uma base de cálculo correspondente ao valor da operação, nela incluída a soma de todos os valores e encargos inerentes ao consumo da energia elétrica, tais como serviços de transmissão e distribuição e demais encargos setoriais.

Afirma que observa fielmente essa sistemática de recolhimento, mas, em razão da promulgação da Lei Complementar nº 194, em 23 de junho de 2022, constatou significativa alteração na sistemática de cobrança do ICMS nas operações envolvendo a comercialização de combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo, a qual ocasionou dúvida quanto à imediata aplicabilidade destas disposições em suas operações, especialmente no âmbito deste Estado.

Explica que, embora a competência constitucional para disciplinar e arrecadar o ICMS incidente sobre as operações envolvendo energia elétrica seja dos estados, a referida Lei Complementar nº 194/2022 estipulou duas alterações substanciais relacionadas à alíquota e à base de cálculo (não incidência) das operações com energia elétrica.

Assevera que a primeira das alterações legislativas promovida pela Lei Complementar nº 194/2022 consiste na inclusão do artigo 18-A ao Código Tributário Nacional (CTN), o qual reconhece às operações envolvendo energia elétrica a natureza essencial e indispensável, motivo pelo qual não deveria ser empregado o tratamento dado aos itens supérfluos.

Menciona que, como consequência dessa alteração, a alíquota do ICMS das operações envolvendo energia elétrica deverá ser, no máximo, a mesma da alíquota geral dos Estados, segundo a sua norma interna.

Destaca que, muito embora seja louvável o esforço do Congresso Nacional para reduzir o ICMS nas operações de distribuição de energia elétrica, a Lei Complementar nº 194/2022 ainda não tem aplicabilidade plena para atingir o fim por ela pretendido, notadamente em razão de suas disposições ainda não terem sido internalizadas por instrumento legislativo adequado, no âmbito deste Estado.

Entende que, apesar da alínea “b” do inciso III do art. 146 da CF/1988 possa permitir que a Lei Complementar seja o instrumento próprio e adequado para estabelecer normas gerais em relação a determinada obrigação tributária, o que inclui a fixação de um parâmetro relacionado às alíquotas mínimas e máximas, tal como restou cristalizado no art. 1º da Lei Complementar nº 194/2022, os Estados devem legislar e/ou regulamentar as alíquotas aplicáveis, ainda que respeitado o teto fixado em lei federal, sob pena de ofensa ao pacto federativo.

Concebe que, a despeito de a alínea “b” do inciso III do art. 146 da CF/1988 atribuir à Lei Complementar competência formal para estabelecer as alíquotas mínimas e máximas do ICMS de determinado bem ou serviço, e mesmo tal requisito sendo fielmente observado pela Lei Complementar nº 194/2022, somente após a prévia análise da matéria pela Assembleia Legislativa deste Estado que a pretendida redução de alíquota prevista nessa Lei Complementar terá aplicabilidade em suas operações neste Estado.

Cita que este Estado editou o Decreto nº 48.456/2022, publicado em 1º de julho de 2022, que previu a aplicação retroativa a 23 de junho de 2022, da alíquota de 18% para a energia elétrica destinada para consumo residencial e para consumo da classe comercial, serviços e outras atividades.

Deduz que a internalização da redução de alíquota prevista na LC 194/2022 está perfectibilizada, mas, ainda tem dúvidas se o Decreto nº 48.456/2022 é suficiente para internalizar a redução da alíquota das operações envolvendo energia elétrica no Estado de Minas Gerais.

Argumenta que a base de cálculo do ICMS nas operações envolvendo distribuição de energia elétrica consiste no valor total da operação, assim entendido como o valor da tarifa de energia elétrica, acrescidos dos serviços de transmissão, distribuição e demais encargos setoriais.

Alega que, em que pese o RICMS/2002 delimite expressamente a base de cálculo das operações envolvendo energia elétrica, a qual ainda permanece em vigor sem qualquer alteração, a Lei Complementar nº 194/2022 vedou a inclusão de todo e qualquer custo de transmissão e distribuição e demais encargos setoriais na base de cálculo do ICMS dessas operações.

Ressalta que a vedação proposta pela Lei Complementar nº 194/22 se deu mediante a inclusão do inciso X no artigo 3º da Lei Complementar nº 87/1996.

Julga que a Lei Complementar nº 194/2022, em razão das mudanças promovidas na Lei Complementar nº 87/1996, alterou substancialmente a base de cálculo do ICMS fixando novas hipóteses de não incidência do tributo nas operações envolvendo energia elétrica, excluindo algumas parcelas que originalmente a compunham.

Pondera que até o momento, não houve votação e publicação de norma pelo Poder Legislativo ou edição de ato infralegal ou equivalente por parte do Poder Executivo deste Estado internalizando o dispositivo federal que prevê a não incidência do ICMS aos serviços de transmissão e distribuição e demais encargos setoriais.

Revela que, embora a alínea “a” do inciso III do artigo 146 e as alíneas “b” e “i”, ambas do inciso XII do artigo 155, todos da CF/1988, atribuam à lei complementar a definição da base de cálculo dos tributos nela previstos, assim como regras relacionadas à substituição tributária e, ainda, tais regras tenham sido delineadas na Lei Complementar nº 194/2022, as referidas disposições normativas não foram adequadamente internalizadas, mediante lei formal e/ou ato do executivo, no âmbito deste Estado.

Entende que somente após a internalização na norma estadual as novas hipóteses de não incidência, previstas no artigo 2º da Lei Complementar nº 194/2022, poderão ser cumpridas plenamente, até porque não existe, até o momento, a indicação inequívoca de quais rubricas estariam enquadradas em cada um dos itens indicados na lei complementar: serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais.

Acredita que a aplicação do artigo 2º da Lei Complementar nº 194/2022 ainda esbarra na definição de quais rubricas estariam contidas em cada um dos três itens indicados acima a fim de que a fixação da base de cálculo se dê de maneira correta.

Certifica que o setor de energia é totalmente regulamentado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), autarquia que tem incumbência legal de fixar as tarifas de energia elétrica, detalhando cada uma das suas componentes.

Entende que deverá haver clara regulamentação no âmbito deste Estado, alinhada com o Módulo 7 dos Procedimentos de Regulação Tarifária – PRORET, aprovado pela ANEEL, a fim de que, repita-se, a fixação da base de cálculo se dê de maneira correta.

Observa que o PRORET possui a seguinte estrutura de tarifa, dividido entre Tarifa de Energia (TE) e Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD):

Reconhece que a parcela chamada TE (Tarifa de Energia) apresenta subparcelas com os nomes Energia, Transporte, Perdas e Encargos. No entanto, uma análise mais minuciosa dessas parcelas, no entendimento da Consulente, permite concluir que todas elas têm natureza de energia e, portanto, deveriam compor a base de cálculo do tributo.

Acrescenta que já a parcela TUSD embute os custos de transmissão e distribuição, sob o nome Transporte, e os encargos associados a esses serviços públicos de transmissão e distribuição de energia elétrica. Portanto, no entendimento dessa Consulente, a totalidade da TUSD se enquadraria integralmente na hipótese de não incidência prevista no artigo 2º da Lei Complementar nº 194/2022.

Destaca que as alterações nos sistemas de faturamento necessárias para que as distribuidoras façam suas cobranças, considerando os valores totais de TE e TUSD, sem a abertura de suas componentes, são consideravelmente menores do que aquelas necessárias para uma abertura mais detalhada de suas componentes.

Com dúvida sobre a interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 – Está correto o entendimento de que a não incidência de ICMS sobre esses serviços e encargos não tem aplicabilidade imediata, seja porque precisa ser internalizada por lei ou outro ato normativo estadual, seja porque as rubricas a serem excluídas do campo de incidência do ICMS ainda precisam ser fixadas quer seja pela ANEEL, quer seja pelo próprio Estado?

2 – Sendo positiva a resposta, qual o instrumento normativo deve a Consulente aguardar para, eventualmente, excluir do campo de incidência do ICMS os serviços de transmissão, distribuição e demais encargos setoriais, a fim de garantir-se maior segurança ao Estado, a ela e aos consumidores finais que poderão estar sujeitos a cobranças complementares caso haja a aplicação equivocada dessa desoneração?

3 – Sendo negativa a resposta do primeiro questionamento, isto é, caso este órgão consultivo entenda que a Lei Complementar nº 194/2022 tem eficácia plena e imediata, pede-se a gentileza de confirmar se está correto o entendimento da Consulente no sentido de não incidência sobre toda a TUSD, mantendo-se a incidência sobre toda a TE, com aplicabilidade retroativa a 23/06/2022?

resposta:

Em preliminar, observa-se que o Estado de Minas Gerais regulamentou o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei Complementar Federal nº 194 de 23 de junho de 2022 por meio do Decreto nº 48.456, de 1º de julho de 2022 e do Decreto nº 48.482 de 3 de agosto de 2022,  para dar cumprimento à referida lei complementar, no que concerne, dentre outros, a incidência, alíquota e base de cálculo do imposto nas operações com energia elétrica.

Ressalte-se que pesa sobre a referida lei complementar ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.195 do Distrito Federal (DF), sendo certo que, por se tratar de ação referente ao controle concentrado de constitucionalidade, as decisões proferidas possuem o condão de vincular o Poder Executivo, nos termos do disposto no § 2º do art. 102 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/1988).

Neste sentido, a medida cautelar concedida em 09/02/2023 na ADI nº 7.195, suspendeu os efeitos da LC nº 194/2022 no que tange a inclusão do inciso X ao art. 3º da LC nº 87/1996, ocasionando a revogação por este estado do retromencionado Decreto nº 48.482/2022 pelo Decreto nº 48.572 de 10 de fevereiro de 2023, com efeitos a partir de 10/02/2023.

Cumpre mencionar que a aplicação dos citados decretos estaduais está vinculada à eficácia da Lei Complementar Federal nº 194/2022, conforme expressamente previstos no art. 3º do Decreto 48.456/2022 e no art. 2º do Decreto 48.482/2022, logo, havendo decisões judiciais que afete a aplicação dessas normas poderá ocasionar a necessidade de revisão das orientações prestadas na presente consulta.

Entretanto, em não tendo sido declarado inconstitucional a regulamentação prevista no Decreto nº 48.482/2022 e Decreto nº 48.457/2022, os termos daquela regulamentação devem ser observados enquanto perdurar sua vigência.

Feitos estes esclarecimentos, passa-se a responder os questionamentos formulados.

1 e 2 – Conforme indicado nas preliminares, em vista do disposto no inciso X do art. 3º da Lei Complementar Federal nº 87, de 13 de setembro de 1996, alterado pelo art. 2º da Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, foi publicado o Decreto nº 48.482, de 3 de agosto de 2022, que regulamentou a não incidência do ICMS sobre a parcela do valor relativo aos serviços de transmissão, serviços de distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, dentre outras providências, estabelecendo efeitos retroativos a 23/06/2022, nos termos  do seu art. 4º.

Considerando a medida cautelar concedida na ADI nº 7.195, que suspendeu os efeitos da LC nº 194/2022 no que tange à mencionada inclusão do inciso X ao art. 3º da LC nº 87/1996, bem como a decorrente a publicação, por parte do Estado de Minas Gerais, do Decreto nº 48.572/2023, com efeitos a partir de 10/02/2023, que revogou o retromencionado Decreto nº 48.482/2022, a base de cálculo (BC) do ICMS continua sendo composta por todas as rubricas debitadas do consumidor da energia elétrica, da mesmo forma que era procedida anteriormente à vigência deste decreto.

Entretanto, durante o período compreendido entre 23/06/2022 e 09/02/2023, não comporão a BC do ICMS os valores correspondentes aos serviços de transmissão e distribuição e aos encargos setoriais componentes do valor total cobrado do consumidor final.

Para que se apure tal BC, reproduz-se o entendimento da área técnica especializada desta Secretaria de Estado de Fazenda, que deverá ser observado, conforme abaixo:

(...) a remuneração dos serviços de transmissão está associada ao componente tarifário TUSD FIO A, a remuneração do serviço de distribuição está associada ao componente tarifário TUSD FIO B, a parcela do valor das operações com energia elétrica destinadas ao pagamento de encargos está associada aos componentes tarifários TUSD ENCARGOS e TE ENCARGOS.

Com exceção das componentes de custo TUSD OUTROS e TE OUTROS, que atuam como um fator redutor das tarifas TE e TUSD aplicadas na cobrança do consumidor final, ou seja, reduzem a parcela a ser considerada na base de cálculo do ICMS e, simetricamente, reduzem também a parcela que não irá compor a referida base tributável, as demais parcelas TUSD PERDAS, TE ENERGIA, TE TRANSPORTE e TE PERDAS estão associadas ao pagamento pela energia gerada e consumida no sistema.

Desta forma, para cumprimento do disposto no artigo 3º da Lei Complementar 194/22, deve ser afastada a incidência do ICMS sobre as componentes de custo: TUSD FIO A, TUSD FIO B, TUSD ENCARGOS e TE ENCARGOS, situação que, na prática, produzirá uma alteração na base de cálculo do ICMS. Por sua vez, as componentes de custo: TUSD PERDAS, TE ENERGIA, TE TRANSPORTE e TE PERDAS, serão mantidas na base de cálculo do ICMS.

No caso das componentes de custo TUSD OUTROS e TE OUTROS, como estas componentes afetam o valor total das tarifas, sua exclusão deve ocorrer nas mesmas proporções das demais parcelas a serem excluídas, ou seja, devem reduzir da mesma forma, proporcionalmente, o que compõe e o que não compõe a base de cálculo do ICMS.

3 – Prejudicada.

Caso a Consulente não tenha observado os Decretos nº 48.456/2022 e 48.482/2022 no período de suas vigências, ocasionando incorreções na emissão de seus documentos fiscais de saídas, concernentes à indicação da alíquota ou do valor da base de cálculo, poderá utilizar por analogia, no que couber, o procedimento previsto para a hipótese do inciso I do art. 52-I da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002.

Cumpre informar, ainda, que a Consulente poderá utilizar os procedimentos relativos à denúncia espontânea, observando o disposto nos arts. 207 a 211-A do Decreto nº 44.747, de 3 de março de 2008, que estabeleceu o Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos (RPTA), caso não tenha adotado os procedimentos acima expostos.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 22 de junho de 2023.

Jorge Odecio Bertolin
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação

(*) Consulta reformulada para exclusão de referência a documento interno da SEF/MG.