Consulta de Contribuinte nº 82 DE 22/04/2019
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 22 abr 2019
ICMS - DISTRIBUIDOR HOSPITALAR - ENQUADRAMENTO - As operações de saídas para clientes que tiverem como atividade principal um dos CNAE relacionados na alínea “i” do inciso XVII do art. 222 do RICMS/2002, ou que estejam classificados como órgãos da Administração Pública serão admitidas no cômputo do percentual mínimo estabelecido na alínea “h” do referido inciso XVII, para caracterização do contribuinte como Distribuidor Hospitalar. O contratado ou o parceiro nos Contratos de Gestão ou nos Termos de Parceria não se confunde com o órgão da Administração Pública que o contratou ou é o seu fiscalizador.
EXPOSIÇÃO:
A CONSULENTE apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal, informada no cadastro estadual, o comércio atacadista de medicamentos e drogas de uso humano (CNAE 4644-3/01).
Informa que é distribuidora hospitalar no estado de Minas Gerais, conforme disposto na Portaria SUTRI nº 643, de 7 de abril de 2017.
Transcreve partes do inciso XVII do art. 222 do RICMS/2002.
Observa que para enquadrar-se no conceito de distribuidor hospitalar, a legislação exige que 80% (oitenta por cento) de suas vendas sejam destinadas a hospitais, clínicas, laboratórios, órgãos da Administração Pública ou a operadoras de planos de saúde.
Relata que comercializa parte de suas mercadorias para Organizações Sociais (OS), que são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades são dirigidas à saúde, conforme disposições da Lei federal nº 9.637, de 15 de maio de 1998.
Ressalta que as OS, apesar de privadas, possuem como finalidade o interesse da comunidade na área da saúde, exercendo, assim, verdadeiro serviço público de natureza social.
Esclarece que as OS recebem, por meio de contratos de gestão, delegação do Poder Público para prestarem tais serviços, substituindo, na prática, órgãos e entes da Administração Pública.
Adverte que a execução do contrato de gestão é fiscalizada por órgão ou entidade supervisora da área de atuação correspondente à atividade fomentada, com o objetivo de que os bens ou recursos de origem pública sejam inteiramente voltados à prestação da atividade em prol da comunidade.
Aduz que embora as OS administrem hospitais, o real objeto das mesmas consiste na prestação de serviço de saúde de forma eficaz.
Afirma que a participação deste tipo de OS neste segmento vem se consolidando, sendo certo que, em pouco tempo, a probabilidade é que a saúde pública seja completamente administrada por OS.
Enuncia que as vendas para este tipo de pessoa jurídica já representam boa parte de seu faturamento e que, futuramente, deverão representar a maioria de suas operações.
Manifesta entendimento no sentido de que seria irrazoável que o Estado de Minas Gerais não entendesse pela equiparação das OS às figuras apontadas nas alíneas “h” e “i” do inciso XVII do art. 222 do RICMS/2002, já que a legislação abrange, por exemplo, figuras como operadoras de planos de saúde, que sequer exercem função social, diferentemente do que ocorre com as OS.
Assevera que se as saídas para tais OS não puderem ser computadas para o cálculo do percentual mínimo de 80% (oitenta por cento) apontado na legislação, será obrigada a interromper este tipo de venda, desabastecendo a rede pública de saúde do estado de Minas Gerais, uma vez que não há como se manter em atividade caso esteja submetida ao regime de substituição tributária.
Registra que a valorização do chamado terceiro setor, por meio do qual o Poder Público outorga a uma entidade privada o direito de realização de fins que são originariamente públicos, visando ao interesse da comunidade, é tendência mercadológica.
Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
As OS podem ser equiparadas a hospitais, clínicas, laboratórios ou operadores de planos de saúde cuja atividade esteja prevista na já citada alínea “i” e/ou órgãos da Administração Pública, para fins de enquadramento da CONSULENTE como distribuidora hospitalar?
RESPOSTA:
Preliminarmente, vale ressaltar que os órgãos da Administração Pública não são livremente criados e extintos pela só vontade da Administração. Tanto a criação como a extinção desses órgãos dependem de lei, conforme determinação contida no art. 88 da Constituição da República.
De acordo com o magistério de Hely Lopes Meirelles, “órgãos são centros de competência instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem”. Suas principais características são: (i) não têm personalidade jurídica e, portanto, não são sujeitos de direitos e obrigações em nome próprio; (ii) expressam a vontade da entidade a que pertencem; (iii) são meios ou instrumentos de ação das pessoas jurídicas; e (iv) são dotados de competências ou atribuições específicas.
De acordo com informações da CONSULENTE, boa parte de seus clientes são entes do terceiro setor (OS) voltados à gestão e execução das atividades de saúde, vinculados à Administração Pública por meio de contratos de gestão.
A nível federal,a Lei federal nº 9.637,de 15 de maio de 1998, dispôs sobre a qualificação das entidades como Organizações Sociais (OS), bem como instituiu e disciplinou o Contrato de Gestão, e a Lei federal nº 9.790,de 23 de março de 1999, dispôs sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e instituiu e disciplinou o Termo de Parceria.
Em Minas Gerais, a Lei nº 23.081, de 10 de agosto de 2018, dispôs tanto sobre a qualificação das entidades como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) quanto sobre a qualificação das entidades como Organizações Sociais (OS), bem como instituiu e disciplinou o Termo de Parceria e o Contrato de Gestão.
Em todos os diplomas legais supramencionados, tanto as OSCIP quanto as OS são pessoas jurídicas de direito privado, senão vejamos:
- Lei federal nº 9.637, de 15 de maio de 1998:
Art. 1º - O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei.
(...)
Art. 5º - Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 1º.
- Lei federal nº 9.790, de 23 de março de 1999:
Art. 1º - Podem qualificar-se como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos que tenham sido constituídas e se encontrem em funcionamento regular há, no mínimo, 3 (três) anos, desde que os respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos instituídos por esta Lei.
(...)
Art. 9º - Fica instituído o Termo de Parceria, assim considerado o instrumento passível de ser firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público destinado à formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das atividades de interesse público previstas no art. 3º desta Lei.
- Lei estadual nº 23.081, de 10 de agosto de 2018:
Art. 2º - Para os fins do disposto nesta lei, considera-se:
(...)
IV - termo de parceria o instrumento firmado entre a administração pública estadual e a organização ou entidade qualificada como Oscip, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 5º;
V - contrato de gestão o instrumento firmado entre a administração pública estadual e a entidade qualificada como OS, com vistas à formação de parceria entre as partes, para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 43;
(...)
Art. 5º - O Poder Executivo poderá qualificar como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público - Oscip - pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujos objetivos sociais consistam na promoção de (...).
Art. 43 - O Poder Executivo poderá qualificar como Organização Social - OS - pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e institucional, à proteção e preservação do meio ambiente, à saúde, ao trabalho, à ação social, à cultura, ao desporto e à agropecuária, atendidos os requisitos previstos nesta lei.
Vê-se, portanto, que os institutos da parceria e do contrato de gestão não elevam o parceiro (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP) ou o contratado (Organização Social - OS) à mesma condição do Órgão Público, pois, apenas lhes transfere algumas atribuições inerentes ao Órgão Público. Ambos (OSCIP e OS) são pessoas jurídicas de direito privado, conforme legislação acima transcrita, e permanecem nessa condição, mesmo que executem atividade ou serviço público por conta e ordem da Administração Pública, não sendo possível equiparar a natureza jurídica de uma OSCIP ou de uma OS à natureza jurídica de um Órgão Público.
Donde se conclui que o contratado, nos Contratos de Gestão, ou o parceiro, nos Termos de Parceria, não se confunde com o Órgão da Administração Pública que o contratou ou é o seu fiscalizador.
Com relação à equiparação a hospitais, clínicas, laboratórios ou operadores de planos de saúde, a mesma também não é possível, eis que inexiste previsão legal nesse sentido. Desse modo, somente as operações de saídas para clientes que tiverem como atividade principal um dos CNAE relacionados na alínea “i” do inciso XVII do art. 222 do RICMS/2002 poderão ser admitidas no cômputo do percentual mínimo estabelecido na alínea “h” do referido inciso XVII.
Nesse sentido, ver Consulta de Contribuinte nº 081/2016.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a CONSULENTE tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 22 de abril de 2019.
Alberto Sobrinho Neto
Assessor
Divisão de Orientação Tributária
Marcela Amaral de Almeida
Assessora Revisora
Divisão de Orientação Tributária
Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação