Consulta de Contribuinte nº 58 DE 19/04/2023
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 19 abr 2023
ICMS – REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO – RAÇÃO ANIMAL – Em se tratando da redução da base de cálculo prevista no item 9 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, somente será aplicável se o remetente deduzir do preço da mercadoria o valor equivalente ao imposto dispensado na operação, com indicação expressa no campo “Informações Complementares” da respectiva nota fiscal.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade econômica principal informada no cadastro estadual a fabricação de alimentos para animais (CNAE 1066-0/00).
Informa que se caracteriza como uma empresa de nível global, que atua na transformação de produtos animais, ora desprezados e não comestíveis, em itens valorosos para grupos e cadeias produtivas.
Diz que a isonomia tem seu significado dentro da palavra igualdade e que deve haver igualdade entre os contribuintes, tanto na circunstância de instituição de tributos quanto no cenário de função exercida pelos próprios e, nessa linha de raciocínio, é essencial observar o art. 150, inciso II, da Constituição Federal do Brasil:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
Diz ainda que o princípio da isonomia, claramente prezado pelo ordenamento jurídico brasileiro, dispõe que os iguais sejam tratados com igualdade, sob a ótica da igualdade relativa e que, dessa forma, não cabe ao Estado impulsionar desequilíbrios entre os contribuintes e suas respectivas tributações.
Argumenta que a generalidade e abstração da norma, características presentes no artigo supracitado, trazem consigo o encargo de que esta seja aplicada de maneira geral a todos os contributários, de modo que nenhum fique desfavorecido em relação aos demais.
Argumenta que, apesar de tais garantias legais, existem diversas situações em que o Estado se torna omisso frente à aplicação da lei e a tributação de seus contribuintes e que, nessa lógica, apresenta-se a linha de Roberto Camargo da Silva, em seu livro Não Cumulatividade Constitucional do ICMS, que alega que “na realidade brasileira a complexidade do ordenamento jurídico regulador do sistema tributário possibilita interpretações injustas, com reflexo direto na arrecadação de tributos, onerando excessivamente o contribuinte ou reduzindo ilegalmente o montante de recursos tão necessários para o financiamento das políticas públicas”.
Faz uma digressão sobre o princípio da não cumulatividade do ICMS e seu sistema de compensação de créditos com débitos de ICMS, cita o art. 19 da Lei Complementar nº 87/1996, trazendo uma citação doutrinária que condena interpretações desse princípio que reduzem ou majoram o imposto a pagar.
Explica que os principais insumos utilizados nas suas atividades são altamente perecíveis, sendo eles ossos, sangue, muxibas, gordura, miúdos, sebo, vísceras, dentre outros, de origem animal e que suas unidades estão estrategicamente localizadas próximo a grandes polos de fornecimento de tais matérias-primas para evitar a perda de mercadorias durante o transporte.
Esclarece que, nesse contexto, suas compras são concentradas principalmente em fornecedores localizados no estado de Minas Gerais, onde as aquisições desses insumos são, em sua grande maioria, acobertadas pelo diferimento do ICMS nas operações internas, citando os itens 21 e 34 da Parte 1 do Anexo II do RICMS/2002 como fundamento.
Cita a Consulta de Contribuinte nº 141/2013 trazendo um excerto dela que aduz que o diferimento não é considerado um benefício fiscal e transcreve o inciso I do art. 15 do RICMS/2002.
Entende que a redução da base cálculo é considerada uma isenção parcial e, nesse sentido, em suas saídas com redução da base de cálculo deve recolher o imposto diferido em separado em relação à parcela não tributada.
Conclui que as aquisições por ela realizadas que, em sua maioria, são abarcadas pelo diferimento do ICMS, quando resultarem nas saídas de produtos com isenção, ainda que parcial, serão objeto do encerramento do diferimento do imposto, com recolhimento apartado sem direito ao crédito por parte do Contribuinte.
Entende que o objetivo do encerramento do diferimento é, em respeito ao princípio da não cumulatividade e a ao próprio instituto do diferimento, que tem como objetivo deslocar a tributação para um momento futuro da cadeia, que o tributo ora dispensado em operação anterior com a mercadoria, quando esta ou outro dela resultante forem objeto de saída beneficiada do ICMS, sem manutenção de crédito, que essa transferência seja findada, haja vista a não tributação, ainda que parcial na saída.
Manifesta-se no sentido de que quando há o encerramento do diferimento combinado com a dedução do preço constante na redução da base de cálculo é duplamente onerada.
Discorre no sentido de que, no caso concreto, qual seja, aquisição ao abrigo do diferimento e saída com redução de base de cálculo condicionada à dedução, do preço da mercadoria, do valor equivalente ao imposto dispensado na operação, considerando o princípio da isonomia, resta prejudicada em relação a seus concorrentes.
Elabora, para comprovar sua alegação, quadro comparativo contendo cálculos exemplificativos, por meio dos quais compara valores relativos (1º) a uma entrada e uma saída tributadas normalmente e (2º) a uma entrada diferida e uma saída com redução de base de cálculo condicionada à dedução mencionada. De acordo com seus cálculos, no segundo caso, seu lucro bruto contábil fica reduzido em valor equivalente ao ICMS a recolher, em razão do encerramento do diferimento.
OPERAÇÃO NORMAL 100% TRIBUTADA |
OPERAÇÃO COM DIFERIMENTO NA COMPRA E SAÍDA COM RED. DA BC E DEDUÇÃO DO PREÇO + ENCERRAMENTO DIFERIMENTO |
||
Compra de mercadoria tributada |
Compra de mercadoria diferida |
||
Valor da mercadoria |
1.000,00 |
Valor da mercadoria |
820,00 |
Alíquota ICMS |
18% |
ICMS Diferido |
0% |
ICMS Destacado |
180,00 |
ICMS Destacado |
|
CONTABILIZAÇÃO |
CONTABILIZAÇÃO |
||
D-Estoque (AC) |
820,00 |
D-Estoque (AC) |
820,00 |
D-ICMS a recuperar (AC) |
180,00 |
D-ICMS a recuperar (AC) |
|
C-Fornecedor (PC) |
1.000,00 |
C-Fornecedor (PC) |
820,00 |
Revenda de Mercadoria Tributada |
Revenda de Mercadoria Red. Da BC com abatimento do preço |
||
Valor da mercadoria |
1.500,00 |
Valor da mercadoria |
1.365,00 |
Red. Da BC |
0,00% |
Red. Da BC |
50,00% |
BC ICMS |
1.500,00 |
BC ICMS |
750,00 |
Alíquota ICMS |
18% |
Alíquota ICMS |
18% |
ICMS destacado |
270,00 |
ICMS destacado |
135,00 |
CONTABILIZAÇÃO |
CONTABILIZAÇÃO |
||
D-Cliente (AC) |
1.500,00 |
D-Cliente (AC) |
1.365,00 |
C-Receita (DRE) |
1.500,00 |
C-Receita (DRE) |
1.365,00 |
D-CPV (DRE) |
820,00 |
D-CPV (DRE) |
910,00 |
C-Estoque (AC) |
820,00 |
C-Estoque (AC) |
820,00 |
D-ICMS sobre vendas (DRE) |
270,00 |
D-ICMS sobre vendas (DRE) |
135,00 |
C-ICMS a pagar (PC) |
270,00 |
C-ICMS a pagar (PC) |
135,00 |
DRE |
DRE |
||
C-Receita |
1.500,00 |
C-Receita |
1.365,00 |
D-ICMS sobre vendas (DRE) |
270,00 |
D-ICMS sobre vendas (DRE) |
135,00 |
(=) Receita Líquida |
1.230,00 |
(=) Receita Líquida |
1.230,00 |
D - CPV (DRE) |
820,00 |
D - CPV (DRE) |
910,00 |
(=) Lucro Bruto |
410,00 |
(=) Lucro Bruto |
320,00 |
ICMS OP a recolher |
90,00 |
ICMS a recolher |
135,00 |
Encerramento Diferimento |
Encerramento Diferimento |
90,00 |
|
ICMS Total Pago |
90,00 |
ICMS Total Pago |
225,00 |
CAIXA |
CAIXA |
||
(+) Cliente venda |
1.500,00 |
(+) Cliente venda |
1.365,00 |
(-) Fornecedor compra |
1.000,00 |
(-) Fornecedor compra |
820,00 |
(-) ICMS total a pagar |
90,00 |
(-) ICMS total a pagar |
225,00 |
(=) Saldo de caixa |
410,00 |
(=) Saldo de caixa |
320,00 |
Diferença Lucro Bruto................................................................................................. 90,00 |
|||
Diferença Caixa............................................................................................................ 90,00 |
Reflete acerca da obrigatoriedade da aplicação da redução de base de cálculo prevista no subitem 9.4, alínea “b”, da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, em razão de o texto desse dispositivo utilizar a partícula “se”, entendendo que, não sendo obrigatória a aplicação, caso o contribuinte opte por tributar integralmente suas operações, não mais será obrigado a deduzir do preço da mercadoria o valor correspondente ao ICMS dispensado em razão do benefício fiscal. Contudo, mesmo não reduzindo a base de cálculo, recolheria o ICMS diferido, permanecendo, de qualquer modo, onerando a cadeia produtiva em que está inserido.
Com dúvida sobre a interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 – Nas suas operações, está correto o entendimento relativo à tributação do ICMS conforme o cenário exposto, em que é preciso realizar o encerramento do diferimento e, além disso, deduzir o imposto relativo à redução da base de cálculo, conforme o subitem 9.4, alínea “b”, da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002?
2 – Dada a dedução do ICMS dispensado na saída do valor da mercadoria no momento de sua comercialização, conforme o subitem 9.4, alínea “b”, supracitado, pode-se dizer que este é suficiente para o encerramento do diferimento na operação?
3 – O encerramento do diferimento pelas entradas sem direito a manutenção do crédito, combinado com a redução da base de cálculo com dedução do preço, não fere o princípio da isonomia ao passo que torna a tributação do ICMS fator de desequilíbrio nas operações da Consulente?
4 – A adoção da redução de base de cálculo prevista no item 9 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002 é obrigatória? Caso não seja, está correto o entendimento de que aplicar a redução da base de cálculo é facultativa, tendo em vista a condição “se o remetente deduzir do preço”?
RESPOSTA:
Preliminarmente, esclarece-se que as saídas dos produtos fabricados pela Consulente, podem se dar sob diferimento ou redução de base de cálculo, desde que atendidas todas as condições para tal tratamento, aplicando-se o tratamento normal de incidência de ICMS em caso de não atendimento das condições previstas para isenção, diferimento ou redução de base de cálculo.
Feitos esses esclarecimentos, passa-se à RESPOSTA aos questionamentos formulados.
1 a 3 – A saída interna de ração animal balanceada, produzida no Estado, observado o disposto nas subalíneas “a.1” a “a.5” do item 5 da Parte 1 do Anexo I, desde que específica para uso na pecuária, aquicultura, cunicultura ou ranicultura, está amparada por diferimento do ICMS de que trata o item 26 da Parte 1 do Anexo II do RICMS/2002, desde que sejam atendidas as seguintes condições dispostas no subitem 26.1 do referido item:
a) a ração esteja registrada nos órgãos competentes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e o número do registro seja indicado no documento fiscal, quando exigido;
b) a ração tenha rótulo ou etiqueta de identificação;
c) a saída tenha sido acobertada com documento fiscal no qual conste a expressão: “Mercadoria de produção mineira - ICMS diferido - Item 26 da Parte 1 do Anexo II do RICMS”.
Cabe salientar que o referido diferimento prevalece sobre a redução de base de cálculo de que trata o item 9 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, desde que todas as condições tenham sido cumpridas para aplicação do diferimento, nos termos do subitem 9.4 do referido item.
Na hipótese de não cumprimento das referidas condições, se aplica, em relação a tais saídas, a redução de base de cálculo de que trata o item 9 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, que também possui condições específicas, quais sejam: a ração animal deve ser destinada exclusivamente ao uso na pecuária, fabricada pela respectiva indústria devidamente registrada no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, desde que observado o disposto nas subalíneas “a.1” a “a.5” do item 5 da Parte 1 do Anexo I e desde que a referida ração esteja identificada por rótulo ou etiqueta e registrada no órgão competente do mencionado Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e o número de registro seja indicado no documento fiscal, quando exigido e, também, o remetente deverá deduzir do preço da mercadoria o valor equivalente ao imposto dispensado na operação, com indicação expressa no campo “Informações Complementares” da respectiva nota fiscal.
Caso não sejam atendidas também as condições relativas à redução de base de cálculo de que trata o item 9 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/2002, prevalece o tratamento normal do imposto, ou seja, sem qualquer benefício.
Assim, em relação à redução da base de cálculo, desatendida uma das condições, ainda que seja somente a dedução do preço da mercadoria do valor equivalente ao imposto dispensado na operação, desde que não tenham sido atendidas as condições para o diferimento, prevalece o tratamento normal do imposto, ou seja, sem qualquer benefício.
Neste sentido, vide Consulta de Contribuinte nº 177/2021.
4 – Como já explanado nas questões anteriores, as saídas da Consulente, atendidas as condições, estão sujeitas ao diferimento e, desatendidas as condições para tal benefício, estarão sujeitas à redução de base de cálculo e, uma vez não atendidas todas as condições para a redução de base de cálculo, terão o tratamento normal de incidência do ICMS.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da RESPOSTA, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente à protocolização desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 19 de abril de 2023.
Alípio Pereira da Silva Filho |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso |
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação