Consulta de Contribuinte nº 163 DE 13/08/2020

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 13 ago 2020

ICMS - SIMPLES NACIONAL - DESENQUADRAMENTO RETROATIVO - Nos termos do art. 80-G do RICMS/2002, nas hipóteses em que os efeitos da exclusão do Simples Nacional ou do impedimento de recolher o ICMS na forma do referido regime sejam retroativos, o contribuinte deverá recompor a escrituração fiscal a partir da data de início dos efeitos da exclusão, recolher a diferença do ICMS devido e seus acréscimos, conforme o regime normal de apuração, bem como cumprir todas as obrigações acessórias relativas ao ICMS.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a de serrarias sem desdobramento de madeira em bruto - resserragem (CNAE 1610-2/04).

Informa que foi autuada por dar saída desacobertada de documentação fiscal (período fiscalizado 01/04/2016 a 30/11/2018), mas que tal ação fiscal já está encerrada e que o crédito tributário apurado pelo Auto de Infração foi reconhecido e resolvido pela via do parcelamento. Ressalta que a empresa era optante pelo regime de tributação do Simples Nacional (SN) em parte do período fiscalizado (2016).

Adiciona que, não mais se encontrando sob ação fiscal, deliberou por, espontaneamente, recompor sua conta gráfica e apurar o ICMS devido e relativo ao período em que havia sido optante pelo SN, em procedimento de desenquadramento retroativo. Ressalta que permaneceu enquadrada no SN até 31/12/2016.

Relata que, para fins de cálculo do imposto devido por conta do novo enquadramento, fez a apuração de todas as saídas havidas, declaradas em PGDAS e tributadas originalmente pelo regime do SN, encontrando assim a base de cálculo a ser utilizada para a apuração do ICMS pelo regime regular do débito e crédito, sobre a qual aplicou a alíquota cabível, encontrando assim o total do ICMS devido.

Posteriormente fez o levantamento de todas as suas aquisições de matérias-primas, produtos intermediários e embalagens, apurando o valor do ICMS destacado nas notas fiscais e debitado originalmente por cada um dos fornecedores, promovendo a apropriação integral de tais créditos, consoante estabelecido sem ressalvas nos art. 66, inciso V, c/c art. 68 do RICMS/2002.

Informa ainda que o Fisco local manifestou posicionamento no sentido de que a Consulente não poderia se apropriar do crédito de forma integral, com o entendimento de que os créditos pelas entradas devam ser apropriados proporcionalmente as saídas regularmente acobertadas por notas fiscais. Como resultado, o crédito proporcional às saídas desacobertadas, apuradas em auto de infração já parcelado, somente seria passível de aproveitamento à medida que as parcelas deste parcelamento (auto de infração) fossem quitadas, entendimento não compartilhado pela Consulente.

Retoma o cálculo do imposto devido dizendo que apurou, demonstrou e efetuou a dedução das parcelas relativas ao ICMS recolhidas originalmente, por ocasião da apuração do movimento de saídas (notas fiscais regularmente emitidas) em PGDAS, e alcançou a parcela mensal do ICMS a ser recolhida em razão do desenquadramento.

Segue o raciocínio dizendo que efetuou a reapuração relativa aos recolhimentos do SN em 2016, apurando uma diferença a ser recolhida a título de ICMS (contida no valor total da apuração do SN) no valor de R$ 155.065,34.

Continua a explanação informando que o referido valor foi regularmente declarado (auto lançado) em PGDAS. Como essa parcela não foi efetivamente paga à época, constituindo-se em situação de omissão de recolhimento, foi devidamente sanada/regularizada pela via do parcelamento, incluindo multa e juros, em conjunto com os demais tributos, junto à Receita Federal do Brasil. Tal parcelamento se encontra regular e em curso, com a maior parte das parcelas ainda por vencer.

Explica que, diante do inequívoco reconhecimento e parcelamento do montante acima referido, relativo a ICMS apurado em razão de saídas em operações regularmente acobertadas por notas fiscais (mesmas operações objeto do levantamento), adotou o procedimento de deduzir do atual levantamento de desenquadramento os valores relativos às parcelas objeto do parcelamento ainda não quitadas.

Entende que, caso essa dedução não fosse realizada, ocorreria um bis in idem, posto que estaria pagando o imposto relativo ao mesmo fato gerador na atual apuração decorrente do desenquadramento e também na apuração regular via PGDAS do SN, em contrariedade ao art. 150, § 3o, do Código Tributário Nacional (CTN), lembrando que a referida parcela será carreada para os cofres do Estado por ocasião da repartição da receita.

Informa também que em julho de 2017 apresentou Termo de Autodenúncia e parcelou (60 parcelas) o ICMS devido por entradas e em razão das antecipações do imposto devido nas aquisições de fora do Estado (Simples Nacional).

Adiciona que o levantamento da época compreendeu o período de 06/2012 a 12/2016. Esse parcelamento, cujo crédito tributário total contempla principal, multa de mora e juros, encontra-se atualmente em curso, sendo que 29 parcelas já foram quitadas (29/60).

Acredita que o ICMS diferencial de alíquotas apurado e objeto de parcelamento referente ao ano de 2016 deixou de ser devido, tendo em vista que hoje a Consulente está regularizando sua situação e promovendo o desenquadramento retroativo, realizando, por conseguinte, nova apuração do período com tributação integral pelo regime do débito e crédito.

Salienta que por ter natureza declaratória e reconhecer uma situação pré-existente, o desenquadramento possui efeitos retroativos, o que tornou indevido o pagamento de ICMS, multa e juros.

Por isso acredita que há necessidade de se deduzir do levantamento atual não só o ICMS, mas também os valores relativos a multa e juros, já que o recolhimento do ICMS relativo à antecipação do Simples Nacional nunca foi devido em razão dos efeitos retroativos do desenquadramento.

Com dúvida sobre a correta interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 - Está correto o entendimento da Consulente de que o art. 150, § 3o, do CTN determina que após a apuração do saldo devedor do contribuinte sejam deduzidos do montante devido todos os pagamentos realizados (atos anteriores à homologação)?

2 - Está correto o procedimento adotado de deduzir integralmente do imposto ao final apurado como devido na recomposição da conta gráfica em razão do desenquadramento (D/C) a importância relativa à parcela do ICMS apurado em razão das notas fiscais de saídas regularmente emitidas, declaradas em PGDAS, posteriormente objeto de parcelamento de natureza específica junto à Receita Federal do Brasil e ainda não recolhida? Nesse caso, as parcelas relativas a multas e juros pagas no parcelamento também comporiam o valor a ser deduzido?

3 - Tendo em vista o desenquadramento do Simples Nacional retroativo a 2016, é correto entender que as parcelas correspondentes ao principal, juros e multas constantes do parcelamento em curso (60 parcelas), derivadas da rubrica antecipação de alíquotas por entradas, deixaram de ser devidas e podem e devem ser integralmente deduzidas na presente apuração vinculada ao desenquadramento?

4 - Está correto o entendimento da Consulente de que pode apropriar a integralidade do crédito de ICMS destacado nas notas fiscais de aquisição e que tal apropriação é condizente com o princípio geral da não cumulatividade posto na Constituição Federal?

5 - Está correto o entendimento da Consulente no sentido de que o creditamento acima poderá ser integralmente realizado, independentemente de uma proporcionalidade entre as saídas acobertadas por notas fiscais à época das operações? Em caso negativo, existe algum regramento legal no sentido de que tal apropriação dos créditos pelas entradas deva ser proporcional ao percentual das saídas regularmente acobertadas por notas fiscais, excluindo-se dessa apropriação o percentual relativo às saídas desacobertadas e apuradas em auto de infração objeto de parcelamento? Em caso afirmativo, tal apropriação complementar seria possível à medida que as parcelas deste parcelamento (auto de infração) sejam quitadas?

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre observar que, conforme art. 80-G do RICMS/2002:

Art. 80-G - Nas hipóteses em que os efeitos da exclusão do Simples Nacional ou do impedimento de recolher o ICMS na forma do referido regime sejam retroativos, o contribuinte deverá recompor a escrituração fiscal a partir da data de início dos efeitos da exclusão, recolher a diferença do ICMS devido e seus acréscimos, conforme o regime normal de apuração, bem como cumprir todas as obrigações acessórias relativas ao ICMS.

Isso posto, responde-se aos questionamentos formulados.

1 - Em consonância com o § 3o do art. 150 do CTN, que trata dos impostos com lançamento por homologação, caberá ao Fisco considerar, na apuração do saldo devido e na imposição de penalidade, os pagamentos realizados pelo obrigado, desde que vinculados à respectiva obrigação tributária objeto da apuração.

2 - Não. Uma vez desenquadrada do regime do Simples Nacional a Consulente deverá sujeitar-se a todas as regras aplicáveis aos contribuintes enquadrados no regime normal de apuração do ICMS, desde a data do desenquadramento, ainda que retroativo, inclusive regras sobre parcelamento do crédito tributário.

Portanto, o valor do ICMS objeto de parcelamento efetuado junto à Receita Federal do Brasil não poderá ser considerado para abatimento do saldo devedor apurado após a recomposição da escrituração da Consulente.

Nesse caso, poderá a Consulente, após a quitação das parcelas, solicitar a restituição desses valores.

Nos termos do § 5o do art. 21 da Lei Complementar no 123/2006, os valores recolhidos por esse regime, se indevidos, devem ser objeto de procedimento de restituição regulado pelo Conselho Gestor do Simples Nacional (CGSN).

Por seu turno, a Resolução CGSN no 140/2018, em seu art. 130, estabelece que o contribuinte fará o pedido de restituição diretamente ao ente federado e obedecerá às normas estaduais.

Sendo assim, o pedido de restituição será feito conforme as regras dos arts. 28 a 36 do RPTA , estabelecido pelo Decreto no 44.747/2008.

3 - Depreende-se do relato que a Consulente está referindo-se ao ICMS recolhido a título de antecipação do imposto, de que trata o § 14 do art. 42 do RICMS/2002.

Tal antecipação é devida nas aquisições interestaduais, por contribuinte enquadrado como microempresa ou empresa de pequeno porte, de mercadoria para industrialização, beneficiamento ou acondicionamento não industriais complementares à produção primária, comercialização ou utilização na prestação de serviço.

Contribuintes que apuram o ICMS por débito e crédito não estão obrigados ao recolhimento da referida antecipação, de modo que, uma vez realizado o desenquadramento retroativo da Consulente, valores recolhidos ou objeto de parcelamento a esse título, deixaram de ser devidos.

Porém, não poderá a Consulente deduzir tais valores do saldo devedor apurado em razão do desenquadramento retroativo do Simples Nacional, pois o saldo devedor em questão decorre de obrigações relacionadas com as saídas promovidas pela Consulente, enquanto a obrigação da antecipação decorreu das entradas por ela promovidas.

Nesse caso, tratando-se de valores que se tornaram indevidos em razão do desenquadramento, a Consulente poderá pleitear a sua restituição na forma dos arts. 28 a 36 do RPTA, estabelecido pelo Decreto no 44.747/2008, bem como o cancelamento do parcelamento em curso.

Vale mencionar que, de acordo com o § 3o do referido art. 92 c/c art. 166 do Código Tributário Nacional, a restituição do imposto somente será feita a quem provar haver assumido o respectivo encargo financeiro ou, no caso de o ter transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.

O art. 4o da Instrução Normativa SUTRI no 001, de 6 de maio de 2016, por sua vez, determina que não será objeto de restituição o valor indevidamente recolhido a título de antecipação do imposto de que trata o § 14 do art. 42 do RICMS pelo contribuinte enquadrado no Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), instituído pela Lei Complementar Federal no 123, de 14 de dezembro de 2006, salvo se comprovado pelo requerente que a mercadoria se encontrava em estoque no estabelecimento na data do pedido de restituição.

No entanto, tais normas não representam impedimento a que a Consulente seja restituída dos valores levantados em Termo de Autodenúncia, objeto de parcelamento, tendo em vista que, nesse caso, como as saídas das mercadorias ocorreram antes da apuração/declaração/pagamento do ICMS, não se verifica o repasse do imposto aos adquirentes.

4 e 5 - Em regra, é vedada a compensação de créditos de ICMS com imposto vencido, exceto nas hipóteses do Anexo VIII deste Regulamento, em respeito ao art. 89-A do RICMS/2002.

Porém, na hipótese de desenquadramento com efeitos retroativos do Simples Nacional, o art. 80-G do RICMS/2002, acima transcrito, expressamente permite a recomposição da escrituração fiscal e, por consequência, o aproveitamento dos créditos vinculados às entradas.

Não há na legislação impedimento para que a Consulente aproprie a integralidade dos créditos a que fizer jus pelas entradas, não sendo necessário aguardar a quitação do parcelamento relativo ao Auto de Infração lavrado pelas saídas desacobertadas.

Ressalte-se que a apropriação dos créditos deverá ser feita com observância das normas previstas no Título II da Parte Geral do RICMS/2002.

Na hipótese de a consulente ter efetuado procedimentos em desacordo com o exposto, poderá, mediante denúncia espontânea, procurar a repartição fazendária de sua circunscrição para comunicar falha, sanar irregularidade ou recolher tributo não pago na época própria, observado o disposto no Capítulo XV do Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos - RPTA, aprovado pelo Decreto no 44.747/08.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, o mesmo poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 13 de agosto de 2020.

Malu Maria de Lourdes Mendes Pereira
Assessora
Divisão de Orientação Tributária

Marcela Amaral de Almeida
Assessora Revisora
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação