Consulta de Contribuinte nº 158 DE 09/08/2019
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 09 ago 2019
ICMS - BASE DE CÁLCULO - FALTA DO VALOR DA OPERAÇÃO - PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA - Havendo recolhimento tempestivo do imposto nos termos da legislação tributária e, em especial, respeitado o prazo estabelecido no § 2º do art. 14 da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002 para a emissão de nota fiscal complementar, com o respectivo destaque do ICMS, na hipótese de reajustamento do preço, não há que se falar em cobrança de juros e multa de mora.
EXPOSIÇÃO:
O CONSULENTE inscrito no cadastro estadual de produtor rural pessoa física tem como atividade principal informada no cadastro estadual o cultivo de amendoim (CNAE 0116-4/01).
Informa que se dedica, principalmente, ao cultivo de amendoim e de cana-de-açúcar em diversas fazendas situadas neste Estado.
Diz que, para fins de comercializar a sua produção, se associou à Coplana - Cooperativa Agroindustrial, entidade sem fins lucrativos, formada por produtores de culturas em rotação com cana-de-açúcar, amendoim e soja, além de outras culturas de menor escala.
Aduz que, dentre outros serviços, a Coplana se incumbe de recepcionar e beneficiar o amendoim produzido por seus cooperados, que consiste basicamente na limpeza, separação e classificação do produto, sendo que toda a produção é enviada à Coplana entre os meses de fevereiro a abril de cada ano, enquanto a respectiva revenda é realizada até abril do ano seguinte.
Afirma que a remessa de sua produção para a Coplana, situada na cidade de Jaboticabal/SP, é normalmente tributada pelo ICMS, visto tratar-se de operação interestadual destinada a pessoa não inscrita em Minas Gerais, cuja legislação prevê, neste caso, o encerramento do diferimento consoante inciso III do art. 12 do RICMS/2002.
Explica que, após recepcionar e classificar o amendoim, a Coplana e seus cooperados (incluindo o CONSULENTE) fixam, de comum acordo, o preço do referido produto, considerando a realidade do mercado no momento da operação, de forma que a entrega da produção para a Coplana é tributada pelo ICMS, com base no valor da operação, conforme previsto na alínea “a” do inciso IV do art. 43 do mesmo regulamento.
Argumenta que, após a entrega da produção à Coplana, com a respectiva fixação e recebimento do preço, o valor de mercado do produto sofre oscilações positivas ou negativas, tanto em razão de alterações na oferta e na procura quanto por força da variação na cotação do dólar, visto que, em média, 60% (sessenta por cento) da produção é vendida para o exterior.
Alega que o regimento interno da Coplana permite o reajuste do preço pago na aquisição do amendoim, caso esta cooperativa venda a mercadoria por um valor que supere os custos e as despesas da operação, nos seguintes termos:
REGIMENTO INTERNO - COPLANA
TÍTULO IX - SISTEMA DE COMERCIALIZAÇÃO DO AMENDOIM
93. O preço do amendoim será o resultado líquido obtido da dedução de todos os custos e despesas da receita bruta, de forma a garantir à COPLANA resultado líquido final conforme orçamento aprovado pelo Conselho de Administração anualmente e variará de acordo com o nível de fidelidade do cooperado e a política de fidelidade a ser definida pela Diretoria Executiva.
94. No mês de maio subsequente ao término da safra a COPLANA fará o primeiro pagamento pelo amendoim entregue resultado da previsão de receita decorrente da comercialização da produção recebida no período de 1º de maio a 30 de abril do ano subsequente, podendo ou não fazer pagamentos a título de complemento de preço, observado o disposto no artigo 93. (grifos acrescidos).
Ressalta que o eventual reajuste do preço depende não apenas da variação positiva do valor de mercado do amendoim, mas, principalmente, de mútuo acordo entre os cooperados e a Coplana.
Desse modo, complementa que o reajuste dos preços é evento totalmente imprevisível, não sendo possível determinar de antemão se o reajuste realmente irá ocorrer e, se ocorrer, quando será e em qual proporção.
Declara que em cada reajuste de preço é oferecido o valor do acréscimo à tributação do ICMS devido a este Estado no período em que se conclui o acordo pelo ajuste de preços, procedendo à emissão das respectivas notas fiscais no prazo regulamentar, de acordo com o §2º e inciso II, ambos do art. 14 do Anexo V do RICMS/2002.
Menciona ter notícias de que outros cooperados foram intimados para recolher juros e multa de mora sobre o ICMS referente aos reajustes de preço, por ter interpretado que o reajuste de preço seria, na verdade, uma regularização de “diferença de preço” em atraso.
Entende que os reajustes de preços pactuados com a Coplana se caracterizam como “reajustamento de preço”, principalmente porque decorrem de efetivo aumento no valor da mercadoria, acordado em momento posterior à fixação inicial do preço.
Reforça que, a remessa do amendoim com a respectiva fixação inicial do preço acordado entre a Coplana e seus cooperados somente poderia ser modificado se houvesse novo acordo entre as partes, fato totalmente imprevisível naquele momento.
Arrazoa que a venda do amendoim pela Coplana a terceiros por preço superior ao pago aos cooperados não implica na obrigação de distribuir os valores aos cooperados, considerando-se que no sistema cooperativista, apesar de não visar ao lucro, os eventuais resultados positivos constituem “sobras” cuja destinação é deliberada pelos cooperados, podendo ou não ser distribuída entre esses, e relação direta com o preço pago pela produção vendida.
Explica que, no momento da entrega da mercadoria à Coplana, ocorre a fixação do preço da mercadoria e o ato cooperativo se aperfeiçoa, inclusive para fins tributários, visto que não fica pendente de nenhum tipo de condição suspensiva ou resolutiva, sendo que a eventual alteração futura no referido preço, assim como em qualquer outro negócio jurídico de comercialização de mercadorias, depende de acordo entre as partes.
Resume que o reajuste de preço acordado entre os cooperados e a Coplana estabelece ocorrência de novo fato gerador do ICMS, na data do acordo.
Transcreve trecho do Acórdão nº 15.383/02/3ª do Conselho de Contribuintes do Estado de Minas Gerais que justificaria tal entendimento:
(...)A perfeita compreensão da matéria requer a observância das disposições contidas nos arts. 21, § 9.º, c/c 150, II, do RICMS/84, e 64 c/c 176, II, do RICMS/91. O exercício exegético desses dispositivos leva à necessidade de emissão de documento fiscal em razão do reajustamento de preço, e do recolhimento do imposto sobre tal parcela incidente. Em nenhum momento, todavia, pressupõem que o imposto obtido retroaja à operação originária. Assim, ocorrendo o posterior reajustamento de preço deve ser procedida a emissão da nota fiscal, e o imposto nela destacado, levado a débito na conta-gráfica naquele período de apuração.(...)
(grifou-se)
Observa que, de acordo com os novos códigos CFOP instituídos pelo Ajuste SINIEF nº 18/2017, a partir de 2018, a remessa do seu produto à Coplana deve ser feita sob o CFOP 6.131 “remessa com posterior fixação de preço”, sendo que, após a classificação das mercadorias, a fixação do preço a ser pago por Kg do referido produto é registrada no CFOP 6.132 “fixação de preço referente a saída anterior”, aperfeiçoando-se, nesse momento, o ato jurídico, não cabendo exigência fiscal caso seja comprovado recolhimento do ICMS sobre a operação.
Defende que na hipótese dos cooperados e da cooperativa acordarem posteriormente um reajuste do preço fixado inicialmente, devem ser emitidos novos documentos fiscais, com nova incidência do ICMS, uma vez que este imposto passa a ser devido somente quando é realizado o acordo sobre o reajuste de preço, ou seja, antes da existência desse acordo, não se pode falar na exigência do imposto.
Arremata que se o ICMS sobre o reajuste de preço não pode ser exigido antes do reajuste, não há atraso no recolhimento do ICMS sobre tal acréscimo (pois não era devido antes) e, logicamente, não se pode falar em juros e multa de mora sobre tal parcela.
Pondera que se o reajuste de preços sob análise pudesse ser considerado “diferença de preços” para fins do inciso III do art. 14 do Anexo V do RICMS/2002, significaria dizer que, na data da entrega de seus produtos, a fiscalização poderia até mesmo lançar de ofício a suposta “diferença” de ICMS.
Alega ser evidente que tal lançamento seria impossível, pois, antes das partes entrarem em acordo sobre o reajuste de preços, só existia o preço efetivamente pago pela produção do cooperado, consequentemente, nesse momento, não é possível sequer apontar qual seria a “diferença de preços” tributável pelo ICMS.
Estabelece entendimento que o ICMS devido sobre os reajustes de preços do amendoim entregue à Coplana, acordados em períodos diferentes daquele em que as mercadorias saíram do seu estabelecimento, consistem no “reajustamento do preço” previsto no inciso II do art. 14 do Anexo V do RICMS/2002, que não impõe o recolhimento do ICMS com juros e multa de mora e que, portanto, não podem ser alegadas “inconsistências em relação aos prazos de pagamento do ICMS incidente nas operações de regularização em virtude de diferença de quantidade ou preço de mercadorias comercializadas”.
Em resposta à diligência, esclarece que não há fixação de preço do amendoim antes da entrega da produção à Coplana, que ocorre nos meses de fevereiro, março e abril de cada ano.
Complementa que a Coplana recebe e classifica a mercadoria e posteriormente, por meio de reunião do ato cooperativo, ocorrida no mês de maio de cada ano, define o preço de compra da produção, autorizando a emissão de nota fiscal decorrente da fixação do preço, com tributação do ICMS.
Acrescenta que não é celebrado contrato individual de compra e venda entre a Coplana e os cooperados, uma vez que os preços são definidos na referida reunião acima mencionada.
Com dúvidas quanto à aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 - O reajuste de preço do amendoim pactuado entre o CONSULENTE e a Coplana se caracteriza como “reajustamento de preço” para fins do inciso II do art. 14 do Anexo V do RICMS/2002?
2 - O ICMS devido sobre o acréscimo decorrente do reajuste de preço deve ser lançado para fins de recolhimento na apuração normal do imposto?
3 - Incidem juros e multa de mora sobre o ICMS devido em razão do reajuste de preço?
RESPOSTA:
Preliminarmente, esclareça-se que o diferimento previsto no item 1 da Parte 1 do Anexo II do RICMS/2002 aplica-se somente às operações internas.
Portanto, no caso em comento não ocorre o encerramento do diferimento, mas sim a impossibilidade de aplicá-lo à operação interestadual, conforme previsto no §§ 1º e 2º do art. 7º do RICMS/2002.
Esclareça-se também que o CONSULENTE deverá emitir nota fiscal sempre que promover a saída de mercadoria, em face da determinação contida no § 1° do art. 39 da Lei n° 6.763/1975 c/c inciso I do art. 1° da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002.
Vale observar que, não obstante a instituição pelos Ajustes SINIEF 18/2017 e 11/2018 de códigos que retratam especificamente as operações entre cooperado e cooperativa no que tange à ulterior fixação de preço, não há previsão legal de tratamento tributário que suspenda ou postergue o pagamento do ICMS nessa hipótese.
Com efeito, as remessas de mercadoria com destino à cooperativa deverão ser normalmente tributadas, observada a alíquota interestadual de 12% (doze por cento), prevista na alínea “c” do inciso II do art. 42 do RICMS/2002.
Por seu turno, a base de cálculo do imposto relativamente a saída de mercadoria, em operação interestadual, promovida pelo CONSULENTE com destino à cooperativa, na falta do valor da operação, deverá ser o preço corrente da mercadoria ou de sua similar no mercado atacadista local ou regional, na forma prevista na subalínea “a.1” da alínea “a” do inciso IV do art. 43 do RICMS/2002.
Feitos esses esclarecimentos, passa-se à resposta dos questionamentos formulados.
1 - Havendo reajustamentos de preço apurados após a entrega da mercadoria no estabelecimento da cooperativa situada no estado de São Paulo, do qual decorra a majoração do valor dessa mercadoria, o CONSULENTE deverá, no prazo de 3 (três) dias, contados de tal reajuste, emitir nota fiscal complementar nos termos do inciso II do art. 14 da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002, para que seja efetuado o recolhimento do imposto respectivo em favor de Minas Gerais.
Do contrário, se for fixado valor menor para a mercadoria, a cooperativa deverá emitir nota fiscal de devolução simbólica de valores ao CONSULENTE, conforme previsto no inciso III c/c § 3º c/c inciso II do § 5º, todos do art. 14 da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002.
2 - Não. Na condição de produtor inscrito no Cadastro de Produtor Rural Pessoa Física, a CONSULENTE deverá observar em suas operações o tratamento tributário diferenciado e simplificado estabelecido no Capítulo LXII da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002 c/c § 3º do art. 14 da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002.
A diferença do imposto devido deverá ser recolhida em documento de arrecadação distinto, com as especificações necessárias à regularização, e na nota fiscal deverão constar essa circunstância e o número e data do documento de arrecadação, abatendo-se do valor do imposto debitadoo percentual de 20% (vinte por cento), a título de crédito, conforme previsto no inciso III do art. 460 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002.
3 - Havendo recolhimento tempestivo do imposto nos termos da legislação tributária e, em especial, respeitado o prazo estabelecido no § 2º do art. 14 da Parte 1 do Anexo V do RICMS/2002 para a emissão de nota fiscal complementar, com o respectivo destaque do ICMS, na hipótese de reajustamento do preço, não há que se falar em cobrança de juros e multa de mora.
Na hipótese de o CONSULENTE ter efetuado procedimentos em desacordo com o exposto, poderá, mediante denúncia espontânea, procurar a repartição fazendária de sua circunscrição para comunicar falha, sanar irregularidade ou recolher tributo não pago na época própria, observado o disposto no Capítulo XV do Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos - RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.
Por fim, se da solução dada à presente Consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que o CONSULENTE tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 9 de agosto de 2019.
Jorge Odecio Bertolin
Assessor
Divisão de Orientação Tributária
Nilson Moreira
Assessor Revisor
Divisão de Orientação Tributária
Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação