Consulta de Contribuinte SEFAZ nº 128 DE 25/08/1999

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 26 ago 1999

DIFERIMENTO CRÉDITO DE ICMS - VEDAÇÃO - MERCADORIAS INUTILIZADAS

DIFERIMENTO - Inexistindo pagamento de ICMS na operação anterior, de entrada do produto "in natura" na indústria de laticínio, não se há de falar em valor a ser creditado.

CRÉDITO DE ICMS - VEDAÇÃO - MERCADORIAS INUTILIZADAS - Nos termos do art. 70, XI, Parte Geral do RICMS/96 fica vedada ao estabelecimento adquirente a apropriação, a título de crédito, do imposto incidente sobre a operação de aquisição de mercadoria, quando não ocorrer, por qualquer motivo, operação posterior com a mesma mercadoria ou outra dela resultante, cabendo o estorno do valor porventura creditado em atenção ao disposto no art. 71, V do mesmo diploma legal.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente, fabricante de produtos de laticínio em geral, recolhe o ICMS pelo regime de débito e crédito, comprovando suas saídas pela emissão de notas fiscais.

Informa que adquire leite "in natura" diretamente de produtor rural, amparado pelo diferimento do ICMS, ficando o recolhimento do imposto (diferido) sob sua responsabilidade, sem direito à manutenção do crédito.

Esclarece que sua produção destina-se, exclusivamente, a um único cliente situado em São Paulo-SP. E que, este cliente, com certa freqüência, devolve mercadorias por estar com o prazo de validade vencido para o consumo humano, que é de, aproximadamente, 10 (dez) dias contados da data de fabricação.

Ocorre, entretanto, que por força de acordo comercial, essa devolução acontece apenas simbolicamente, uma vez que os produtos "vencidos"são inutilizados pelo cliente paulista.

Expõe, contudo, que vinha se creditando do valor do ICMS destacado nas notas fiscais de devolução. Mas, foi intimado, pela repartição fazendária, a estornar todos os créditos relativos a essas devoluções , com a alegação de que "tais créditos não estão previstos na legislação".

Diante do exposto, formula a seguinte

CONSULTA:

1 - Por que não se pode creditar do ICMS relativo ao leite "in natura"adquirido dos produtores, haja vista o processo de produção representar apenas uma das diversas etapas de circulação da mercadoria?

2 - Qual o tratamento fiscal/tributário previsto para os produtos alimentícios, derivados de leite, impróprios para o consumo humano em função do prazo de validade vencido?

3 - A Consulente assume o ônus da perda do produto que não foi comercializado, sem direito a abater o valor do imposto pago como crédito? Qual o dispositivo legal?

RESPOSTA:

1 - É importante observar, inicialmente, que, no que concerne às operações realizadas com diferimento, é vedado o posterior crédito, por parte do adquirente das mercadorias, à luz da tranquila jurisprudência de que o diferimento não ofende a não-cumulatividade, tendo o STJ, recentemente, decidido o seguinte:

"A técnica do diferimento não ofende ao princípio da não-cumulatividade, por ser o ICMS imposto indireto, cujo custo integra o preço da mercadoria, conseqüentemente, sendo repassado ao contribuinte de fato, nem constitui instrumento de fraude à imunidade ou à isenção e tampouco gera direito a creditamento.

Inexistindo pagamento de ICMS na operação anterior, de entrada do produto "in natura", não se há de falar em valor a ser creditado. Entendimento prevalecente após o advento da Emenda Constitucional nº 23/83"(Resp nº 33.101-1/SP - 93.0007239-0 - 1ª T. - Rel. Min. Demócrito Reinaldo - j. 11.10.95 - D.J.U. 16.11.95, p. 37539).

Diante disso, cumpre ressaltar que o pagamento do imposto incidente sobre a operação de saída de leite "in natura", realizada por produtor rural, com destino a indústria de laticínio situada no Estado, fica diferido para o momento em que ocorrer a saída do novo produto resultante do processo industrial, em conformidade com o art. 219, IV, Anexo IX do RICMS/96.

Por oportuno, resta frisar que, a remessa do leite "in natura" do produtor para a Consulente ocorre ao abrigo do diferimento. Quando da saída do estabelecimento da Consulente para o cliente paulista encerra-se a fase do diferimento. Nesse caso, a Sul Mineira efetuará o pagamento do imposto que se encontrava postergado (diferido), juntamente com aquele incidente sobre a operação de saída de seus produtos para o cliente paulista, dispensada a utilização de guia de arrecadação distinta (art. 14, § único, Parte Geral do RICMS/96).

2 e 3 - Preliminarmente, cabe alertar que, não compete a esta Diretoria pronunciar a respeito do procedimento adotado nas operações promovidas pelo estabelecimento paulista, e, nesse particular, a Consulente deverá dirigir-se ao fisco daquele Estado, para as informações que julgar necessárias.

Frise-se que a questão ora levantada encontra-se inserida no contexto de uma devolução simbólica de produto inutilizado (prazo de validade vencido). Vale dizer, trata-se de um acordo comercial celebrado entre a Consulente e seu cliente exclusivo, segundo o qual esse deve inutilizar os produtos recebidos que, por algum motivo, não possam ser objeto de comercialização normal.

Nesse ponto e na linha do que esta Diretoria tem-se manifestado, vale citar o art. 117 do CTN que prevê a possibilidade de fatos geradores que expressem negócios jurídicos (atos jurídicos bilaterais) sujeitos a condições suspensivas ou resolutivas. Diz a cabeça do artigo que os "negócios" jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados, sendo suspensiva a condição, desde o momento do seu implemento. Ao revés, sendo resolutória a condição, desde o momento da prática ou da celebração do negócio.

Verifica-se, do exposto, que o acordo comercial celebrado entre as partes (Sul Mineira e seu cliente paulista), enquadra-se na condição resolutória, o negócio ocorre, e, com ele, o fato gerador. Mais tarde, ocorrente a condição, o negócio se resolve, se desfaz. Mas, para que ocorra o desfazimento, é necessário ter sido feito o negócio. O desfazimento é irrelevante para o direito tributário. A condição resolutória, por não impedir o negócio jurídico, não impede, de igual forma, o fato gerador nele substanciado.

Esclareça-se, ainda, que o ICMS, por expressa determinação constitucional "será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestações de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal". Pela regra da não-cumulatividade, o montante de ICMS recolhido em cada operação ou prestação transforma-se em crédito fiscal que será deduzido do valor a ser recolhido quando da realização de novas operações mercantis ou prestações de serviços, por novos comerciantes ou industriais. Deduz-se, então, que a apropriação do valor pago, a título de crédito, pressupõe a realização de novas operações com a mesma mercadoria ou outra dela resultante.

Assim sendo, o procedimento pretendido pela Consulente em se creditar do imposto incidente sobre a devolução simbólica de produto "vencido" não encontra respaldo na legislação vigente. Nem poderia ser de outra maneira, pois o disposto no art. 71, V, Parte Geral do RICMS/96 determina expressamente o estorno do crédito na situação em que a mercadoria entrada no estabelecimento vier a ser objeto de perecimento, deterioração, inutilização, extravio, furto, roubo ou perda, por qualquer motivo.

Ademais, a disposição contida no art. 70, XI do mesmo RICMS/96 veda o crédito de imposto na hipótese em que não ocorrer, por qualquer motivo, operação posterior com a mesma mercadoria ou outra dela resultante.

Dessa maneira, podemos concluir que não cabe à Consulente o crédito enfocado em razão dos dispositivos retrocitados, devendo a mesma providenciar o estorno do valor porventura apropriado, no prazo de quinze dias a contar da data de ciência desta resposta, nos termos dos §§ 3º e 4º do art. 21 da CLTA/MG, aprovada pelo Decreto 23.780/84.

DOET/SLT/SEF, 25 de agosto de 1999.

Soraya de Castro Cabral Ferreira Santos - Assessor

Edvaldo Ferreira - Coordenador