Consulta de Contribuinte nº 105 DE 20/06/2023

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 20 jun 2023

ICMS – INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA – ESTABELECIMENTOS DE MESMO TITULAR – IMPOSSIBILIDADE – Os procedimentos previstos na legislação tributária mineira relativos à industrialização por encomenda, dispostos nos art. 300 a 303, Anexo IX do RICMS/2002, não se aplicam às operações entre estabelecimentos de mesma titularidade.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de laminados planos e tubulares de material plástico (CNAE 2221-8/00).

Informa que pretende exercer a atividade de fabricação de móveis com predominância de madeira (CNAE 3101-2/00) e que devido à possível falta de espaço físico em seu estabelecimento matriz pretende abrir uma filial localizada no mesmo município, para que uma parte do seu processo industrial seja realizada nesta filial.

Menciona que toda compra de matéria-prima e insumos utilizados para a fabricação dos produtos acabados, bem como as operações comerciais desses produtos acabados (CFOP 5.101 e 6.101), serão realizadas pela matriz.

Afirma que os produtos beneficiados na filial retornarão para a empresa matriz para integrar ao processo produtivo.

Aduz que os produtos a serem fabricados no processo produtivo da filial constituem em embalagens de papelão, kits (parafusos, porcas, cavilhas, pregos, dobradiças) e espelho.

Participa que efetuará transferência da matéria-prima e insumos para sua filial com o CFOP 5.152, onde será realizado os seguintes processos industriais:

 I - a chapa de papelão passará pelo processo de corte e dobra, transformando em caixas que serão usadas no processo de embalagem dos produtos acabados;

 II - os parafusos, porcas, cavilhas, pregos e dobradiças são acondicionados em uma única caixa com as quantidades de cada item necessário para a montagem do produto acabado pelo consumidor final. Considera este processo de acondicionamento com kits, que retornará para a matriz como insumos, devendo ser transportados na mesma embalagem com o produto acabado; e

III - a chapa de espelho passará pelo processo de corte, lapidação e será embalada adequadamente para o transporte, transformando-se em uma parte do produto acabado.

Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 – A utilização dos CFOPs 5.152 e 5.151 nas operações descritas acima entre matriz e filial está correta?

2 – Poderá utilizar nas operações de transferência de mercadorias da matriz para a filial e vice-versa, o CST 41 (operação não tributada pelo ICMS), uma vez que a operação não configura mudança de posse, ou seja, não há mudança de titularidade das mercadorias, conforme Súmula nº 166 do Superior Tribunal de Justiça?

3 – Os produtos chapa de papelão (transformado em caixas para embalagens), parafusos, porcas, cavilhas, pregos e dobradiças (com a finalidade de serem acondicionamentos em kits) são transferidos para a filial com o mesmo NCM mencionado na nota fiscal de compra, após o processo de transformação dos mesmos com a finalidade para kit e caixa para embalagem, a NF-e emitida pela filial com o CFOP 5.151 deverá trazer as mesmas informações, produto e NCM, contidas na NF-e emitida pela matriz com CFOP 5.152? Qual procedimento correto?

4 – O produto, chapa de espelho, com a finalidade de ser transformado em uma parte do produto acabado, é transferido para filial com o mesmo NCM mencionado na nota fiscal de compra, após o processo de transformação para parte do produto acabado, a NF-e emitida pela filial com o CFOP 5.151 deverá trazer as mesmas informações, produto e NCM, contidas na NF-e emitida pela matriz com CFOP 5.152? Ou retornará como parte de móveis de madeira e o mesmo NCM do produto acabado comercializada pela matriz?

5 – Poderá fazer aquisição de mercadoria pela matriz com a remessa diretamente pelo vendedor à filial, aplicando analogicamente, o procedimento de venda à ordem? Se positivo, a operação correta seria:

a) venda tributada do fabricante para a matriz, com CFOP 5.101 ou 6.101 e destaque do imposto;

b) entrega por conta e ordem para o estabelecimento filial, com CFOP 5.923 ou 6.923 e sem destaque do imposto; e

c) transferência simbólica para a matriz, com CFOP 5.152 e com destaque do imposto.

6 – Poderá fazer a operação de industrialização por encomenda entre estabelecimentos matriz e filial, estabelecidos na legislação tributária nos arts. 300 a 302 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2022? Se positivo, a operação correta seria a descrita a seguir?

a) venda tributada do fabricante para a matriz, com CFOP 5.101 ou 6.101 e destaque do imposto;

b) remessa para industrialização por conta e ordem do adquirente, do estabelecimento fabricante para o estabelecimento filial, com CFOP 5.924 ou 6.924 e sem destaque do imposto;

c) remessa para industrialização por encomenda, do estabelecimento matriz para o estabelecimento filial, com CFOP 5.901 e sem destaque do imposto previsto no item 1 do Anexo III;

d) retorno simbólico de mercadoria recebida para industrialização, do estabelecimento filial para o estabelecimento matriz, com CFOP 5.925 e com suspensão do imposto;

e) industrialização efetuada, do estabelecimento filial para o estabelecimento matriz, com CFOP 5.125 e sem destaque do imposto.

RESPOSTA:

Em preliminar, observa-se que, por expressa disposição constitucional, somente os julgados em Controle Concentrado de Constitucionalidade (Ação Declaratória de Constitucionalidade/ADC e Ação Direta de Inconstitucionalidade/ADI - § 2º do art. 102 da Constituição da República Federativa do Brasil - CR/1988) e as Súmulas Vinculantes (art. 103-A da CR/1988) são de observância obrigatória pela Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.

Desse modo, as decisões proferidas em sede de recurso extraordinário, ainda que em regime de repercussão geral, ou em sede de recurso especial, ainda que em regime de recursos repetitivos, e as súmulas, editadas tanto pelo STF quanto pelo STJ, não geram efeitos vinculantes aptos a ensejar sua observância pelo Estado de Minas Gerais, quando este não for parte na ação.

Vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em 19/04/2023, em julgamento dos embargos de declaração interpostos na ADC nº 49, concluindo sobre a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, inciso II do § 3º do art. 11 da Lei Complementar nº 87/1996, excluindo do seu âmbito de incidência apenas a hipótese de cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular, com modulação de seus efeitos para que tenha eficácia pró-futuro, a partir do exercício financeiro de 2024.

Cabe salientar que operações entre estabelecimentos de mesma titularidade não caracteriza industrialização por encomenda. Não há encomenda de industrialização na hipótese de uma unidade da mesma empresa remeter mercadorias para outra industrializar.

Infere-se da exposição dos fatos que a Consulente (matriz) irá adquirir mercadorias de terceiros transferindo-os como insumos para sua filial mineira realizar determinado processo industrial que, na sequência, irá retornar em transferência os produtos resultantes para a matriz, os quais serão utilizados como insumo na produção de móveis.  

Feitos estes esclarecimentos, passa-se a responder os questionamentos formulados.

1 e 2 – A princípio observa-se que, na presente data, continua vigente, o inciso I do art. 12 da Lei Complementar nº 87/1996, publicada posteriormente à Súmula nº 166 do STJ, que determina a ocorrência do fato gerador do imposto no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, cujo teor consta na legislação tributária mineira no inciso VI do art. 6º da Lei 6.763/1975 , regulamentado no inciso VI do art. 2º do RICMS/2002.

Portanto, a operação de remessa de mercadoria entre matriz e filial se caracteriza como transferência, e será tributada normalmente pelo ICMS, nos termos do disposto no inciso VI do art. 2º do RICMS/2002.

Nas operações internas de transferência entre a matriz e sua filial que destinem mercadorias adquiridas ou recebido de terceiros que não tenham sido objeto de qualquer processo industrial no estabelecimento, deverão ser acobertadas por nota fiscal que indique, dentre outras formalidades, o CFOP 5.152 - “transferência de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros” e o Código de Situação Tributária – CST que represente a operação tributada pelo ICMS.

Ocorrida a industrialização no estabelecimento da filial as mercadorias devem ser transferidas para o estabelecimento matriz com emissão de nota fiscal que indique o CFOP 5.151 – “Transferência de produção do estabelecimento” e o Código de Situação Tributária – CST que represente a operação tributada pelo ICMS, além dos demais requisitos previstos na legislação tributária.

3 e 4 – A correta classificação e o enquadramento dos seus produtos na codificação da NBM/SH são de exclusiva responsabilidade do contribuinte. No caso de dúvida quanto às classificações, cabe à Consulente dirigir-se à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, que é o órgão competente para dirimir dúvidas sobre classificações que tenham por origem normas federais.

No caso em questão, se a industrialização exercida na chapa de papelão pela filial resultar em caixa de papelão com enquadramento em código NBM/SH diverso, devem ser indicados nos documentos fiscais de transferências seus respectivos códigos da NBM/SH.

Seguindo esse mesmo raciocínio, a industrialização da chapa de espelho de vidro que resulte espelho lapidado, não emoldurado sem incorporação de outros elementos, aparentemente, não determina a classificação em códigos NBM/SH diversos, conforme consta das descrições, referentes à posição 7009 da NBM/SH, contidas nas Notas Explicativas do Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias (Nesh):

70.09 - Espelhos de vidro, mesmo emoldurados, incluindo os espelhos retrovisores.

7009.10 - Espelhos retrovisores para veículos

 7009.9 - Outros:

7009.91 -- Não emoldurados

7009.92 – Emoldurados

(,,,)

Deve notar-se, todavia, que os espelhos (ou vidros) incorporados noutros elementos e transformados, assim, em partes de móveis do Capítulo 94 (uma porta de espelho de um guarda-vestidos, por exemplo) seguem o regime dos móveis correspondentes.

São, entre outros, excluídos da presente posição:

 a) Os espelhos manifestamente transformados, por junção de outras matérias, em artigos incluídos em posições mais específicas, tais como certas bandejas com asas, alças (pegas), suportes, etc. (posição 70.13). Pelo contrário, os centros de mesa constituídos por um simples espelho são classificados aqui.

b) Os espelhos cujas molduras ou armações incorporem quer metais preciosos ou metais chapeados ou folheados de metais preciosos (plaquê), mesmo com pérolas naturais ou cultivadas, diamantes ou outras pedras preciosas ou semipreciosas, pedras sintéticas ou reconstituídas, exceto os que constituam simples guarnições ou acessórios de pequena importância (posição 71.14), quer pérolas naturais ou cultivadas, pedras preciosas ou semipreciosas, pedras sintéticas ou reconstituídas (posição 71.16).

c) Os espelhos de vidro, trabalhados opticamente (Capítulo 90) (Ver as Notas Explicativas correspondentes).

d) Os espelhos combinados com outros elementos que constituam jogos, brinquedos, artigos para caça (espelhos para cotovias (calhandras), por exemplo) (Capítulo 95).

e) Os espelhos com mais de 100 anos de idade (posição 97.06).

(...) (destacou-se)

Cabe salientar que os referidos Kits (parafusos, porcas, cavilhas, pregos e dobradiças acondicionados em caixa), não reúne as condições do processo industrial de montagem ou transformação, estabelecidas nas alíneas “a” ou “c” do inciso II do art. 222 da Parte Geral do RICMS/2002, pois não podem ser definidos como produtos novos ou espécies novas, uma vez que os itens que o compõem possuem características específicas, que não se modificam quando agrupados.

Com efeito, esses itens deverão ser individualmente considerados na emissão da nota fiscal de transferência entre filial e matriz, aplicando-se o tratamento tributário previsto para cada um deles, inclusive, se for o caso, no que tange ao regime de substituição tributária, considerando-se a correta classificação fiscal de cada um deles. Para determinação da alíquota interna aplicável às operações com o kit, a Consulente deverá observar o disposto nos §§ 16 e 17 do art. 42 do RICMS/2002, conforme orientação contida nas Consultas de Contribuinte nº 099/2019 e 019/2015.

5 – A princípio, observa-se que não há previsão expressa na legislação que autorize a transferência simbólica de mercadorias, salvo em hipóteses tais como a entrega de mercadoria a depósito fechado, nos termos do art. 71 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002 ou naquelas previstas na Instrução Normativa DLT/SRE nº 02/1998.

Dessa forma, tem-se entendido como possível a transferência simbólica nos casos em que o local de ocorrência do fato gerador do ICMS seja definido nos termos da alínea “c” do inciso I do art. 11 da Lei Complementar nº 87/1996. Neste caso, considera-se como local da operação o do estabelecimento que pratique o negócio jurídico do qual resulte a transmissão da propriedade da mercadoria, na hipótese em que esta não tenha por ele transitado.

Diante disso, o emprego da analogia é aceitável como mecanismo de integração da legislação tributária, nos termos do inciso I do art. 108 do Código Tributário Nacional (CTN), conforme entendimento já manifestado por esta Superintendência de Tributação em diversas RESPOSTAs de Consultas de Contribuinte, tais como as de nºs 093/2019, 329/2014, 289/2014, 024/2004 e 077/2001.

A aplicação analógica dos procedimentos da venda à ordem só seria possível nos casos de filial e matriz estarem localizadas em um mesmo Estado, como é o caso da Consulente. Do contrário, poderia o contribuinte, conforme sua conveniência, alterar elementos da obrigação tributária, o que não se pode admitir. Nesse sentido, vide Consultas de Contribuinte nos 174/2014 e 093/2019.

Todavia, caso a Consulente adquira mercadorias de fornecedor estabelecido em outra unidade da Federação, em função da regra da territorialidade, a unidade da Federação de origem da mercadoria deverá ser consultada sobre os procedimentos a serem adotados na presente situação.

Assim, conforme o caso em questão, a Consulente (adquirente originário) deverá emitir uma nota fiscal, de forma análoga ao disposto no inciso I do supramencionado art. 304, em nome de seu estabelecimento filial (destinatário da mercadoria) em transferência simbólica, com destaque do imposto, se devido, indicando-se, além dos requisitos exigidos, o nome, o endereço e os números de inscrição, estadual e no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), do estabelecimento que irá promover a remessa da mercadoria (vendedor remetente), e, ainda, o CFOP 5.949.

Por sua vez, o fornecedor da mercadoria (vendedor remetente) deverá emitir duas notas fiscais, de forma análoga ao disposto no inciso II do sobredito art. 304:

(I) a primeira nota fiscal em nome do destinatário (filial), para acobertar o trânsito da mercadoria, sem destaque do imposto, indicando-se, além dos requisitos exigidos, como natureza da operação, a seguinte expressão: “Remessa por conta e ordem de terceiros”, o número, a série e a data da nota fiscal emitida pela Consulente, bem como o nome, o endereço e os números de inscrição, estadual e no CNPJ da Consulente, e, ainda, o CFOP 5.923.

(II) a segunda nota fiscal em nome da Consulente, com destaque do imposto, se devido, indicando-se, como natureza da operação: “Remessa simbólica – venda à ordem”, e o número, a série e a data da primeira nota fiscal emitida pelo fornecedor, e, ainda, o CFOP 5.118, caso a mercadoria tenha sido produzida pelo fornecedor, ou o CFOP 5.119, caso a mercadoria não tenha sido produzida pelo fornecedor.

Ocorrida a industrialização no estabelecimento da filial as transferências de mercadorias para o estabelecimento matriz deverão ser acobertadas por nota fiscal que indique a tributação normal do imposto, o CFOP 5.151 – “Transferência de produção do estabelecimento”, além dos demais requisitos previstos na legislação.

6 – O instituto da industrialização por encomenda, previsto na legislação tributária mineira por meio dos art. 300 ao 303 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002, consiste em um negócio jurídico a ser realizado entre duas pessoas jurídicas distintas, no qual um dos contratantes se obriga a industrializar a matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem fornecido pelo outro contratante que, por sua vez, encontra-se jungido ao pagamento do preço acordado pela industrialização.

Ocorre que, pelo fato de não ser possível a celebração de um contrato com apenas uma parte contratante, imperioso concluir que as regras relativas à industrialização por encomenda são inaplicáveis à operação que envolva estabelecimentos de uma mesma empresa.

No mesmo sentido, foram proferidas, dentre outras, as Consultas de Contribuinte nº 289/2014, 018/2011, 028/2009, 049/2008, 081/2007.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da RESPOSTA, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 20 de junho de 2023.

Jorge Odecio Bertolin
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação