Consulta COPAT nº 81 DE 11/11/2019

Norma Estadual - Santa Catarina - Publicado no DOE em 12 nov 2019

ICMS. Impossibilidade de aproveitamento de crédito de ICMS sobre combustível utilizado para abastecer máquinas em operação de extração de areia, enquanto não implementado plenamente o regime dos créditos financeiros. Postergação dos efeitos do artigo 20 da Lei Complementar nº 87/1996 , para 1º de janeiro de 2020.

Nº Processo: 1970000020347

DA CONSULTA

A consulente é regularmente inscrita neste estado e tem como atividade principal a extração de areia, cascalho ou pedregulho e beneficiamento associado, CNAE 810006.

Questiona sobre a possibilidade de aproveitamento de crédito de ICMS relativo ao combustível consumido no processo de extração de areia. Alega que se trata de insumo indispensável no processo e que a saída posterior da areia é tributada pelo ICMS. Argumenta que a resposta à Consulta 80/96, se posicionou de forma favorável ao aproveitamento do crédito. Também destaca entendimento de Minas Gerais e São Paulo nesse sentido, externadas nesse mesmo período.

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

LEGISLAÇÃO

Lei Complementar 87 , de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), art. 33, inciso I.

FUNDAMENTAÇÃO

A CF de 1988 prevê que o ICMS será não cumulativo, compensandose o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas operações/prestações anteriores (art. 155, § 2º, inciso I).

Portanto, embora se trate de um tributo plurifásico, por incidir em cada etapa da operação ou prestação, ele é não cumulativo, de forma que o valor a recolher corresponda à diferença entre o imposto que incidiu na operação e o que incide nas operações anteriores. Esse imposto dedutível é o que chamamos de crédito fiscal.

Trata-se do crédito físico, previsto na Constituição Federal (art. 155, § 2º, I, proveniente da Emenda Constitucional nº 3/1993 ), que é aquele em que só o imposto relativo à entrada de bens que são comercializados pelo estabelecimento, ou que integrem fisicamente o produto industrializado a ser vendido, resultará em crédito a ser compensado com o imposto devido na saída desses bens.

De qualquer forma, o princípio da não cumulatividade é muito mais amplo e abrangente que isso, já que, todas as mercadorias e bens adquiridos por um estabelecimento, prestam-se ao cumprimento de seu objeto social, independentemente de serem, ou não, consumidos em sua atividade principal. Ciente disso, o legislador complementar inseriu no ordenamento jurídico brasileiro, por intermédio da LC 87 , de 13.09.1996, o regime de créditos financeiros, em substituição ao de créditos físicos. É um regime de nãocumulatividade que leva em conta o elemento financeiro, por isso mesmo regime denominado de crédito financeiro.

Nestes termos, importante transcrever Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 143), quanto ao novo regime introduzido pela lei complementar: "Pelo regime de crédito financeiro é assegurado o crédito do imposto pago em todas as operações circulação de bens, e em todas as prestações de serviços, que constituam custo do estabelecimento. Não importa se o bem, ou serviço, compõe o bem a ser vendido. Importa, é que o bem vendido teve como custo aquele bem, ou aquele serviço, já tributado anteriormente."

O regime de créditos financeiros introduzido pela LC 87, entretanto, não entrou plenamente em vigor. No caso dos bens de uso e consumo, terá de ser observado o disposto em seu art. 33, I, que postergou a permissão destes créditos para janeiro de 2020 (LC 138/2010 ).

Já com relação aos produtos intermediários, necessários e consumidos no processo produtivo, muito embora não se incorporem ao produto final, os Tribunais vêm decidindo que o crédito só será possível em relação aos materiais que se integrarem fisicamente ao produto ou que venham a ser integralmente consumidos no processo produtivo (Nesse sentido: STJ, Recurso Especial 799.724, RJ, 2007 e STJ, AgRg no Recurso Especial 738.905, RJ, 2008).

Conforme o entendimento acima, o crédito relativo aos produtos intermediários requer que estes se integrem fisicamente a um produto ou que sejam totalmente consumidos no processo produtivo, então só poderemos admiti-lo nos limites de uma atividade industrial.

No presente caso, estamos tratando de atividade extrativista, relacionada setor primário- extração de areia. Não há como confundir extrativismo com atividade industrial.

Com certa frequência esta Comissão tem recorrido à legislação federal para definir atividade industrial. O Decreto nº 7.212 , de 15 de junho de 2010 (Regulamento do IPI), assim se apresenta:

"Art. 3º Produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida neste Regulamento como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária (Lei nº 5.172 , de 25 de outubro de 1966, art. 46 , parágrafo único, e Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º).

Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como ((Lei nº 5.172 , de 25 de outubro de 1966, art. 46 , parágrafo único, e Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º).

I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);

II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);

III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);

IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento);

V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).

Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados.

Observemos que, nos termos da legislação, não existe a menor possibilidade de considerarmos uma atividade, como por exemplo, o extrativismo (setor primário), como pertencente ao setor secundário da economia, ou seja, como uma atividade industrial. Extrativismo não é industrialização. No presente caso, estamos tratando de atividade extrativista, relacionada setor primário - extração de areia. Não há como confundir extrativismo com atividade industrial.

O combustível consumido pelos equipamentos utilizados na extração de areia não pode ser confundido com produtos intermediários consumidos na industrialização. A areia obtida pela extração continua sendo areia é assim como o grão de soja, a necessidade da utilização de máquinas e equipamentos que possibilitem a sua colheita, não altera a sua essência, continua se tratando de produto primário.

Não resta dúvida de que o combustível questionado é material de uso ou consumo, com crédito vedado pela Lei Kandir. Esta Comissão se manifestou recentemente sobre o tema nos seguintes termos:

"CONSULTA 08/2018".

ICMS. IMPOSSIBILIDADE DE APROVEITAMENTO DE CRÉDITO DE ICMS SOBRE COMBUSTÍVEL UTILIZADO PARA ABASTECER MÁQUINAS EM OPERAÇÃO DE EXTRAÇÃO DE BRITA E AREIA. NÃO É POSSÍVEL APROVEITAR O CRÉDITO DO ICMS SOBRE MATERIAL DE USO E CONSUMO. VEDAÇÃO TRAZIDA PELA LEI KANDIR.

Diante do exposto, não é possível aproveitar crédito de ICMS do combustível consumido no processo de extração de areia, pelo mesmo motivo: o combustível é utilizado como material de uso ou consumo, com crédito de ICMS vedado pelo art. 20 da Lei Complementar 87/1996 , enquanto não entrar plenamente em vigor o regime dos créditos financeiros - lei esta, posterior à Copat 80/1996, citada pela consulente.

RESPOSTA

Por tudo o que foi exposto, responda-se à consulente que as aquisições de óleo diesel consumido nas máquinas e equipamentos utilizados para extração de areia não dão direito a crédito enquanto não entrar plenamente em vigor o regime de créditos financeiros introduzidos pela Lei complementar 87/96

À superior consideração da Comissão.

NELIO SAVOLDI

AFRE IV - Matrícula: 3012778

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 17.10.2019.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586 , de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Responsáveis

ROGERIO DE MELLO MACEDO DA SILVA

Presidente COPAT

CAMILA CEREZER SEGATTO

Secretário(a) Executivo(a)