Consulta nº 76 DE 14/10/2010
Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 14 out 2010
ICMS. INDUSTRIALIZAÇÃO EM ESTABELECIMENTO DA MESMA EMPRESA. TRANSFERÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DAS REGRAS DE VENDA À ORDEM.
A Consulente informa atuar no comércio atacadista de grãos oleaginosos e no comércio e processamento industrial de fertilizantes, tanto para terceiros quanto para outros estabelecimentos do grupo.
Para industrialização de fertilizantes para os estabelecimentos ADM - Catalão, ADM - Rondonópolis e ADM - Campo Grande, expõe que recebe deles os produtos a serem industrializados com suspensão ou diferimento do ICMS, processa e, ao final, devolve simbolicamente as matérias-primas e cobra pelo serviço e material aplicado, cujo valor oferecido à base de cálculo do ICMS, normalmente, estaria de acordo com o artigo 103 do RICMS/2008.
Observa, ainda, que em se tratando de industrialização à empresa ADM - Paranaguá, a mercadoria seria da própria Consulente.
Aduz que, por vezes, o estabelecimento encomendante solicita à Consulente entregar diretamente os produtos resultantes da industrialização por encomenda para seus clientes finais. Para isso, o encomendante emitiria nota fiscal de venda a esses clientes, informando que a entrega seria por sua conta e ordem diretamente pela Consulente (CFOP 5.118/6.118). A emissão dessa nota fiscal seria comunicada à Consulente para ciência e prova do faturamento realizado.
Entende a Consulente que, nos termos da alínea “b” do Inciso II do artigo 305 do RICMS/2008, para documentar o retorno dessas mercadorias deve-se emitir, ao menos, 02 (duas) notas fiscais, quais sejam: (a) nota fiscal de retorno simbólico para estabelecimento remetente (CFOP 5.902/6.902) e (b) uma ou mais notas fiscais de remessa por conta e ordem do industrializador/remetente, com destino aos clientes, sob CFOP 5.923/6.923.
Diante do exposto indaga:
a) está correto o entendimento da Consulente quanto ao procedimento a ser adotado por ocasião da entrega das mercadorias diretamente aos clientes finais determinados pelo remetente industrializador?
b) Está correto o entendimento da Consulente quanto ao procedimento a ser adotado por ocasião do retorno das mercadorias recebidas para industrialização?
RESPOSTA
Incorreto o entendimento da Consulente.
A matéria relatada refere-se a fatos vinculados a remessa para industrialização à Consulente (ADM – Paranaguá) promovidas por estabelecimentos da mesma empresa (ADM - Catalão, ADM - Rondonópolis e ADM - Campo Grande) sediados em outras unidades federadas.
Nessa situação, destaca-se duas circunstâncias que devem ser observadas:
a) uma vez que a mercadoria não deve retornar fisicamente ao estabelecimento que a enviou para ser industrializada, inexiste remessa de mercadoria para industrialização, ocorrendo apenas a transferência de mercadorias entre estabelecimentos.
Esse entendimento está consubstanciado na resposta a Consulta n. 148, de 14 de setembro de 2006, que se transcreve excertos:
“CONSULTA Nº: 148, 14 de setembro de 2006
...
SÚMULA: ICMS. INDUSTRIALIZAÇÃO EM ESTABELECIMENTO FILIAL. REMESSA POR CONTA E ORDEM.
...
A consulente informa que tem como atividade a compra e processamento de erva-mate in natura e que pretende industrializar esse produto na filial localizada em outra unidade federada. Expõe os procedimentos que pretende adotar, os quais, sucintamente, são os seguintes:
1. remeterá a erva-mate cancheada para o estabelecimento filial localizado no Estado do Rio Grande do Sul com suspensão do pagamento do imposto, em razão do disposto no inciso I do art. 272 do RICMS/01;
2. enviará o material de embalagem, observando as disposições que tratam das operações de venda à ordem, na qual o fornecedor da mercadoria fará a entrega ao destinatário por conta e ordem do adquirente, utilizando-se dos CFOP 6.118 ou 5.118 para a venda e 6.923 ou 5.923 para a entrega;
3. após a industrialização do produto e em condições de ser exportado, a unidade filial localizada no Rio Grande do Sul fará a devolução simbólica da mercadoria para o estabelecimento da consulente com CFOP 6.902 e emitirá nota fiscal para acompanhar a mercadoria até o porto de embarque naquela unidade federada, com o CFOP 7.949;
4. para efetivar a exportação a consulente emitirá a correspondente nota fiscal de exportação com o CFOP 7.101;
5. no final do mês, a filial gaúcha emitirá nota fiscal referente aos serviços de industrialização e materiais utilizados, com o devido destaque do imposto.
Posto isso, questiona se está correto o seu entendimento.
RESPOSTA
Para melhor análise da matéria transcreve-se excertos do art. 272 do RICMS/01:
Art. 272. É suspenso o pagamento do imposto na saída promovida por estabelecimento de contribuinte (Convênio AE 15/74; Convênios ICM 01/75 e 35/82 e Convênios ICMS 34/90 e 80/91):
I - em operações internas ou interestaduais, para conserto ou industrialização, sob a condição de retorno real ou simbólico ao estabelecimento remetente, no prazo de até 180 dias, contados da data da saída, ressalvadas as hipóteses previstas no § 1º;
II - em operações internas, no posterior retorno, real ou simbólico, em devolução realizada no prazo referido no inciso anterior, pelo estabelecimento industrializador com destino ao estabelecimento do contribuinte autor da encomenda referente à industrialização.
(...)
§ 1º O inciso I não se aplica:
a) às saídas, em operações interestaduais, de sucatas e de produto primário de origem animal, vegetal ou mineral, salvo se a remessa e o retorno real ou simbólico se fizerem nos termos de protocolo celebrado entre o Estado do Paraná e outros Estados interessados;
b) quando a operação interna de retorno real ou simbólico da mercadoria objeto da industrialização estiver ainda sujeita às normas relativas ao diferimento;
c) nas saídas, em operações internas, em que o objeto seja gado bovino, bubalino, suíno, ovino e caprino ou aves;
d) na saída de produto primário para fins de beneficiamento.
O artigo antes transcrito prevê a suspensão do pagamento do ICMS na saída promovida por contribuinte em operações internas ou interestaduais, para conserto ou industrialização, sob a condição de retorno real ou simbólico ao estabelecimento remetente, no prazo de até 180 dias contados da data da saída. Excetuam-se dessa regra, as saídas de mercadorias nas hipóteses relacionadas no seu § 1º.
........
Ressalte-se, entretanto, que na hipótese de a mercadoria não retornar fisicamente ao estabelecimento da consulente não há o que se falar em remessa de mercadoria para industrialização, mas sim trata-se de transferência. Inteligência dos arts. 11 e 12 da Lei Complementar n. 87/96.
Essa conclusão já foi exarada por este Setor na Consulta n. 042, de 2 de setembro de 1997, da qual se transcreve:
A Consulente, com sede em Marília e filiais no Estado do Paraná, atuando no ramo de comércio atacadista de produtos e resíduos de origem vegetal e animal, produção de fios de seda, importação e exportação, informa que, através de sua filial de Goioerê, adquire casulos de bicho-da-seda, in natura, da filial de Nova Esperança e solicita a esta que remeta a mercadoria para industrialização, por sua conta e ordem, para a matriz, localizada no Estado de São Paulo.
A matriz, após efetuar a industrialização, devolve a matéria-prima original (casulos de bicho-da-seda) simbolicamente para a filial de Goioerê. Em relação ao valor agregado pela industrialização, a matriz emite outra nota fiscal, também simbólica, com débito do imposto.
O produto resultante (fios de seda) é, simbolicamente, transferido para o Estado do Paraná, que será exportado pela filial localizada em Goioerê, cuja nota fiscal, emitida pela filial, conterá a informação de que a mercadoria sairá diretamente da sua matriz para o Porto de Santos-SP.
(...) RESPOSTA (...)
Quanto às operações simbólicas descritas pela consulente, apenas objetivam ilegalmente o retorno do crédito do imposto do estabelecimento paulista para o estabelecimento paranaense, sem que ocorra o fato gerador.
Vale lembrar que a Lei Complementar 87/96, em seu art. 12 considera ocorrido o fato gerador do imposto nos seguintes momentos:
I - saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
II - fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias por qualquer estabelecimento;
III - transmissão a terceiro de mercadoria depositada em armazém geral ou em depósito fechado, no Estado do transmitente;
IV - transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente;
. . .
Como se vê, somente ocorre o fato gerador na saída da mercadoria, na transmissão a terceiro ou na transmissão de propriedade. Assim, não ocorrendo o fato gerador não há na legislação do ICMS qualquer dispositivo que ampare a pretendida operação.
Convém lembrar que entre estabelecimento da mesma empresa não há operação de aquisição, apenas operação de transferência. A aquisição é operação onerosa com transmissão de propriedade entre pessoas diferentes. Uma titular da obrigação e outra do direito (art. 200, n. 4 do Código Comercial).
A transferência entre estabelecimentos da mesma empresa é operação de ordem administrativa, sem transmissão a terceiro ou transmissão de propriedade, em razão de o titular de ambos os estabelecimentos ser a mesma pessoa.
Portanto, em face da ausência do fato gerador não há que se falar em transferência simbólica.
Desta feita, quando o estabelecimento localizado em Nova Esperança, promover saída de mercadoria com destino a Marília-SP, deve emitir a nota fiscal que reflita a operação realizada, ou seja, consignar no documento o Código Fiscal de Operação e Prestação - CFOP: 6.22 - Natureza da Operação: Transferência, e não o descrito (CFOP 6.99 - Remessa para industrialização por conta e ordem de terceiros).
Isto porque quem realmente está enviando a mercadoria é o estabelecimento de Nova Esperança, não o estabelecimento de Goioerê.
Lembramos que não há impedimento na legislação para que um estabelecimento efetue remessa para outro estabelecimento da mesma empresa, para fins de industrialização. Contudo, é inerente em relação a operação descrita o retorno da mercadoria ao estabelecimento de remetente da mercadoria, no caso, o estabelecimento situado em Nova Esperança.
Assim, em face de mercadoria ter efetivamente saído do Estado do Paraná com destino a Matriz localizado no Estado de São Paulo e lá sofrer um processo de industrialização agregando valores para posteriormente ser impulsionada para o exterior está incorreto o procedimento pretendido pela consulente.
Quanto à segunda indagação, importante destacar que o inciso IV do art. 12 da Lei Complementar 87/96, que se encontra reproduzido no inciso IV do art. 5º da Lei n. 11.580/96, estabelece que ocorre o fato gerador do imposto no momento da “transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente”.
Essa regra alberga a operação de venda a ordem prevista no § 4º do art. 266 do RICMS/01 e está em consonância com a alínea “c” do inciso I do art. 22 da Lei do ICMS, o qual dispõe que o local da operação ou da prestação, para efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável é o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha transitado:
Art. 266. Na venda à ordem ou para entrega futura, poderá ser emitida nota fiscal, para simples faturamento, vedado o destaque do ICMS (Convênio SINIEF, de 15.12.70, art. 40; Ajustes SINIEF 01/87 e 01/91).
(...)
§ 4º No caso de venda à ordem, por ocasião da entrega global ou parcial da mercadoria a terceiros, deverá ser emitida nota fiscal:
a) pelo adquirente original, com destaque do ICMS, quando devido, em nome do destinatário, consignando-se, além dos requisitos exigidos, o nome, o endereço e os números de inscrição, estadual e no CNPJ, do estabelecimento que irá promover a remessa da mercadoria;
b) pelo vendedor remetente:
1. em nome do destinatário, para acompanhar o transporte da mercadoria, sem destaque do imposto, na qual, além dos requisitos exigidos, constarão, como natureza da operação, “Remessa por conta e ordem de terceiros”, o número, a série, sendo o caso, e a data da emissão da nota fiscal de que trata a alínea anterior, bem como o nome, o endereço e os números de inscrição, estadual e no CNPJ, do seu emitente;
2. em nome do adquirente original, com destaque do valor do imposto, quando devido, na qual, além dos requisitos exigidos, constarão, como natureza da operação, “Remessa simbólica - Venda à ordem”, o número, a série, sendo o caso, e a data da emissão da nota fiscal prevista no item anterior.
Art. 22. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de bem ou mercadoria: (...)
c) o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha transitado;
A sistemática que a consulente pretende adotar não se enquadra na disciplina de venda à ordem uma vez que esta pressupõe que cada um dos estabelecimentos envolvidos (vendedor-remetente, adquirente original e destinatário) pertençam a três titulares distintos.
Na situação exposta, a consulente estabelecida no Paraná (adquirente original) e o estabelecimento filial localizado em outra unidade federada (que seria, apenas para fins de argumentação, o destinatário) constituem uma única pessoa jurídica. Assim, no caso exposto, há somente uma pessoa jurídica nos polos adquirente original e destinatário.
Entende-se, portanto, que não está correto o procedimento exposto.
No que diz respeito à terceira e quinta dúvida, não se responde por não ser competência deste Setor manifestar-se a respeito de emissão de notas fiscais de contribuinte estabelecido em outra unidade federada.
Quanto à quarta questão, a mesma resta prejudicada.
No que estiver procedendo de forma diversa tem a consulente o prazo de 15 dias a partir da ciência desta consulta para adequar o seu procedimento ao que ora sendo orientado, nos termos do art. 591 do RICMS.” (grifos nossos)
b) Não se aplicam regras que traduzem venda à ordem, nas circunstâncias em que a mercadoria industrializada é entregue diretamente ao cliente do estabelecimento encomendante, porquanto não estão envolvidos titulares distintos nas operações, visto ser imperioso, para aplicação do disposto no § 4º do artigo 293 do RICMS/2008, que a ordem de remessa emane de terceiros.
Inexiste venda à ordem no âmbito de uma mesma pessoa jurídica e, no caso analisado, não só se confunde a figura do vendedor remetente com o industrializador, assim como, a mercadoria industrializada pertence a mesma pessoa jurídica.
Diante das explicações pode-se afirmar que a mercadoria destinada à Consulente será remetida a título de transferência e as saídas que promover, de produtos resultantes da industrialização, estão sujeitas à incidência do imposto estadual, porquanto constatado que o fato gerador, definido no artigo 5º, I, da Lei n. 11.580/1996, ocorre no estabelecimento da consulente, que é o local da operação estabelecido no artigo 22, I, “a”, do mesmo diploma legal, que se transcrevem:
“Art. 5º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
....
Art. 22. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é
I - tratando-se de bem ou mercadoria:
a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador;”
Quanto ao CFOP (Códigos Fiscais de Operações e Prestações) a ser indicado na nota fiscal emitida pela Consulente será:
“5.101 6.101
Venda de produção do estabelecimento
Classificam-se neste código as vendas de produtos industrializados ou produzidos pelo próprio estabelecimento.
Também serão classificadas neste código as vendas de mercadorias por estabelecimento industrial ou produtor rural de cooperativa destinadas a seus cooperados ou a estabelecimento de outra cooperativa.”
Assim, caso a Consulente esteja procedendo diferentemente do manifestado na presente, tem prazo de até quinze dias para adequar os procedimentos eventualmente realizados, a partir da data da ciência desta, observado o disposto no § 1º do art. 654 do RICMS/2008, independente de qualquer interpelação ou notificação fiscal.