Consulta nº 60 DE 23/06/2009
Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 23 jun 2009
ICMS. ENERGIA ELÉTRICA E VAPOR PRODUZIDOS A PARTIR DO BAGAÇO DA CANA. OPERAÇÕES COM EMPRESAS COLIGADA E DE TERCEIROS. OBRIGAÇÕES PRINCIPAL E ACESSÓRIA.
A Consulente, tendo como principal atividade a industrialização da cana-de-açúcar para produção de álcool e açúcar, incluindo todas as demais atividades provenientes ou que tenham correlação com tal industrialização, firmou contrato de fornecimento do produto “Açúcares Redutores Totais” – ART (extraído do processamento da cana-de-açúcar) com a empresa Biotecnologia do Paraná S/A, que se encontra instalada no parque industrial da Consulente, dedicando-se à produção e comercialização de derivados de levedura, para o que se faz necessária a aquisição de ART.
Consta do contrato, como objeto acessório, a disponibilização, por parte da Consulente, de energia elétrica de produção própria e vapor, na medida de sua disponibilidade e a necessidade da adquirente, proporcionalmente às aquisições de ART, já incluso no preço fixado pelo fornecimento desse produto.
Informa que também firmou contrato de fornecimento de matéria-prima e insumos com a empresa ALLTECH DO BRASIL AGROINDUSTRIAL LTDA, igualmente com unidade fabril dentro da área de industrialização da Consulente, para o fornecimento de matéria seca contida em creme de levedura, que se trata de resíduo do processamento de cana-de-açúcar, fornecendo, igualmente, energia elétrica e vapor, diretamente, cujo preço foi incluso no preço cobrado pela matéria-prima.
Aduz que em determinado período a ALLTECH deixou de adquirir o creme de levedura, mas que continuou a transferir energia elétrica e vapor, deixando de faturar o preço pactuado, tendo em vista o carácter experimental na produção de energia.
Explica acerca da produção da energia elétrica e vapor, informando que se produz de forma simultânea e seqüenciada ao processo produtivo do açúcar e álcool, a partir da mesma matéria-prima, qual seja, a cana-de-açúcar, e que ao queimar o seu bagaço produz-se o vapor para mover as turbinas que geram energia elétrica, tratando-se de tecnologia totalmente limpa e de forma renovável, exaltando os benefícios pela preservação ambiental.
Ressalta, ainda, da impossibilidade de armazenamento do vapor e da energia elétrica gerados em excesso, sendo a única forma de aproveitamento a transferência para terceiros.
Informa, ainda, que quando da emissão da nota fiscal pela Consulente, discriminou-se apenas a venda dos produtos ART, com destaque do ICMS, e o creme de levedura, com diferimento, sendo agregado ao preço destes produtos o valor cobrado pela transferência de energia elétrica e vapor, conforme contrato.
Diz carecer esclarecimentos quanto às questões fiscais incidentes nas operações com energia elétrica e vapor, sendo que, até agora, aplicou o diferimento previsto no art. 87, item 26.1 do RICMS/01, por se tratar de transferência de energia da usina geradora para o estabelecimento consumidor.
Isto posto, faz as seguintes indagações:
1 – A operação de transferência de energia elétrica e vapor da empresa Consulente para a sua coligada Biotecnologia do Paraná S/A é abrangida pelo diferimento do ICMS?
2 - A operação de transferência de energia elétrica e vapor da empresa Consulente para a empresa
ALLTECH é abrangida pelo diferimento do ICMS?
3 – Se negativa a resposta, qual a tributação aplicável?
4 – Considerando que o preço pactuado da energia elétrica e vapor para as empresas mencionadas encontra-se incluso nos preços cobrados pelo fornecimento de matéria-prima e insumos e, portanto, não sendo discriminado em nota fiscal a transferência de energia elétrica e vapor, quais são as providências que a Consulente precisa adotar para regularizar sua situação fiscal e documental?
5 – Considerando que no preço faturado está incluso o preço da energia elétrica e vapor, de que forma poderá ser deduzido do débito este valor já recolhido?
RESPOSTA
Inicialmente, destaque-se que a consulente é autoprodutora de energia elétrica devidamente autorizada pela ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, conforme Resolução Autorizativa 1.198, de 15/01/2008, para produção de energia elétrica para consumo próprio e comercialização do excedente, nos termos da Lei n. 9.427/1996 e Decreto n. 2.003/1996, verbis:
Lei n. 9.427/1996
Art. 26. Cabe ao Poder Concedente, diretamente ou mediante delegação da ANEEL, autorizar:
IV – a comercialização, eventual e temporária, pelos autoprodutores, de seus excedentes de energia elétrica.
Decreto n. 2.003/1996
Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:
II – Autoprodutor de Energia Elétrica, a pessoa física ou jurídica ou empresas reunidas em consórcio que recebam concessão ou autorização para produzir energia elétrica destinada ao seu uso exclusivo.
A consulente pretende aplicar o diferimento nas operações retratadas, com base no art. 95, item 27
e subitem 27.1 do atual Regulamento – RICMS/08, verbis:
Art. 95. Sem prejuízo das disposições específicas previstas neste Regulamento, são abrangidas pelo diferimento as seguintes mercadorias:
....
27. energia elétrica:
27.1. na transferência da usina geradora para o estabelecimento consumidor;
27.2. destinada às cooperativas rurais redistribuidoras desta mercadoria;
27.3. no fornecimento da usina geradora para estabelecimentos redistribuidores;
27.4. destinada a consumo no setor agropecuário, conforme o inciso VIII do art. 101;
Todavia, não se aplica ao caso o item 27.1 antes transcrito, por não se tratar de transferência e sim de venda de energia elétrica e vapor. A transferência a que se refere este dispositivo legal tem pertinência às classificáveis nos CFOP 1.153, 2.153, 5.153 e 6.153.
Destaque-se, ainda, que as operações com as empresas mencionadas pela Consulente recebem o mesmo tratamento tributário, por serem empresas independentes.
Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento “da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular” (art. 5º, inciso I, da Lei 11.580/96).
Desta forma, e, considerando que a matéria trazida pela consulente retrata uma operação de venda de energia elétrica para empresas independentes, não preenchendo o requisito de que trata o subitem 27.1 do art.95 do RICMS/08, responde-se negativamente às questões n. 1 e 2. Quanto ao produto vapor, no caso exposto, não há previsão legal para diferimento.
Quanto a questão n. 3, a alíquota aplicável para as operações com energia elétrica é de 29%, conforme art. 14, inciso V, alínea “a” (a partir de 1/4/2009 em face da Lei 16.016/2008), enquanto que para o vapor aplica-se a regra geral, de 18%, prevista no inciso VI do mesmo dispositivo legal, todos da Lei n. 11.580/96:
Art. 14. As alíquotas internas são, conforme o caso e de acordo com a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) ou a Nomenclatura Brasileira de Mercadorias - Sistema Harmonizado (NBM/SH), assim distribuídas:
...
V - alíquota de vinte e nove por cento (29%) nas prestações de serviço de comunicação e nas operações com:
a) energia elétrica, exceto a destinada à eletrificação rural;
VI - alíquota de dezoito por cento (18%) nas operações com os demais bens e mercadorias.
(Redação anterior do Art. 14. As alíquotas internas são seletivas em função da essencialidade dos produtos ou serviços, assim distribuídas:
...
VI - alíquota de 27% (vinte e sete por cento) para operações e prestações com:
a) energia elétrica, exceto a destinada à eletrificação rural;)
Em relação a questão n. 4, incorreto o procedimento da Consulente, pois deve emitir nota fiscal discriminando cada mercadoria comercializada, nos termos do art. 138, inciso IV, do RICMS/2008:
Art. 138. A nota fiscal conterá, nos quadros e campos próprios, observada a disposição gráfica dos modelos 1 e 1-A, as seguintes disposições (Convênio SINIEF s/n, de 15.12.70, Ajustes SINIEF 07/71, 16/89 e 03/94):
...
IV - no quadro "Dados do Produtos":
a) o código adotado pelo estabelecimento para identificação do produto;
b) a descrição dos produtos, compreendendo: nome, marca, tipo, modelo, série, espécie, qualidade e demais elementos que permitam sua perfeita identificação;
c) a classificação fiscal dos produtos, quando exigida pela legislação do imposto sobre produtos industrializados;
d) o Código de Situação Tributária - CST;
e) a unidade de medida utilizada para a quantificação dos produtos;
f) a quantidade dos produtos;
g) o valor unitário dos produtos;
h) o valor total dos produtos;
i) a alíquota do ICMS;
j) a alíquota do IPI, quando for o caso;
l) o valor do IPI, quando for o caso;
Portanto, cabe à Consulente apurar o valor da operação para cada produto comercializado,
observando a alíquota correspondente, e quando for o caso, o estabelecido no art. 8º da Lei n. 11.580/96.
Para regularizar o crédito tributário deve emitir nota fiscal complementar e recolher com os acréscimos legais o valor deixado de pagar em época devida, conforme art. 204, III, § 2º do RICMS/08:
Art. 204. Os documentos fiscais serão também emitidos nos seguintes casos (art. 21 do Convênio SINIEF s/n, de 15.12.70; arts. 4º e 89 do Convênio SINIEF 06/89; Ajuste SINIEF 01/89):
...
III - para lançamento do imposto não pago na época própria em virtude de erro de cálculo ou outro, quando a regularização ocorrer no período de apuração do imposto em que tenha sido emitido o documento fiscal original;
...
§ 2º Nas hipóteses dos incisos II e III, se a regularização não se efetuar dentro dos prazos mencionados, o documento fiscal também será emitido, sendo que as diferenças, com os acréscimos legais, serão recolhidas por ocasião de sua emissão, devendo ser indicado, na via fixa, o código do agente arrecadador e a data da guia de recolhimento.
Quanto à questão n. 5, resta esclarecido pela resposta dada à questão n. 4.
No mais, frisa-se que, a partir da ciência desta, terá a consulente, em observância ao artigo 659 do Regulamento do ICMS, o prazo de 15 quinze dias para adequar os seus procedimentos eventualmente já realizados em conformidade com o que foi aqui esclarecido, no caso de que os tenha praticado diversamente.