Consulta nº 46 DE 19/07/2023

Norma Estadual - Rio de Janeiro - Publicado no DOE em 19 jul 2023

Manutenção de Crédito Acumulado. Reestruturação Operacional. Estabelecimento Comercial em Estabelecimento Industrial.

RELATÓRIO

A empresa acima qualificada, pessoa jurídica de direito privado, sociedade anônima privada, atuando sob o regime normal de tributação, com atividade principal de comércio atacadista de instrumentos e materiais para uso médico, cirúrgico, hospitalar e de laboratórios (CNAE 4645101), vem apresentar consulta tributária a respeito de manutenção do saldo credor acumulado após reestruturação operacional, que incluirá novas atividades econômicas industriais ao estabelecimento, com manutenção das numerações do CNPJ e da Inscrição Estadual.

O processo foi gerado em 01/06/23 no SEFAZ/DIVAC, encaminhado em 02/03/2023 para a AFE-06 e em 20/06/2023 remetido à SUT.

A Auditoria Fiscal Especializada de Substituição Tributária, AFE – 06, repartição de jurisdição da consulente, em sua manifestação (doc. 54099834), informou que foi recolhida a TSE, o consulente não se encontra sob ação fiscal e não existe auto de infração pendente de julgamento em recurso administrativo que envolva a matéria da consulta.

O processo encontra-se instruído com: a petição da consulta (doc. 47843245), ato constitutivo da empresa (doc.47843246), documento de procuração (doc. 47843247) e comprovação do pagamento da TSE (doc.47843248).

A consulente, em sua petição, informou, em síntese, que:

i) O estabelecimento até então figura como Centro de Distribuição, realizando atividades econômicas de comércio atacadista, e acumulou saldo credor de ICMS através dessas atividades.

ii) Pretende reestruturar e expandir as suas operações, adicionando atividades industriais (produção e recondicionamento de bombas de infusão) a esse estabelecimento, e adotará as providências necessárias para a inclusão das novas atividades econômicas no CNPJ e no CAD-ICMS.

iii) Informa que em relação aos estabelecimentos industriais, as normas do Livro III do RICMS e do Anexo XX da Resolução SEFAZ 720/14 contêm dispositivos específicos quanto às hipóteses de apuração, cálculo, e modalidades de aproveitamento dos saldos credores de ICMS.

iv) É entendimento da consulente que o saldo credor de ICMS atualmente existente, regularmente apurado pelo estabelecimento comercial atacadista no curso de suas operações enquanto Centro de Distribuição, poderá ser mantido e aproveitado pela consulente, nos termos da legislação.

v) Relativamente ao saldo credor de ICMS já acumulado, inexiste impacto decorrente da transformação de Centro de Distribuição para Estabelecimento Industrial, em razão de ausência de previsão legal nesse sentido.

Isto posto, requer a Consulente que esta Consultoria Tributária esclareça se está correto seu entendimento no sentido de que:

(i) O estabelecimento de Guaxindiba, a partir da implementação da reestruturação operacional pretendida, que contemplará a realização de operações de fabricação e recondicionamento de bombas de infusão, passará a estar sujeito às normas específicas de apuração, cálculo, e de aproveitamento dos Saldos Credores de ICMS dirigidas aos Estabelecimentos Industriais; e

(ii) O Saldo Credor de ICMS atualmente existente, regularmente apurado pelo estabelecimento de Guaxindiba no curso de suas operações enquanto Centro de Distribuição, poderá ser mantido e aproveitado pela Consulente, nos termos da legislação, inexistindo impacto decorrente da conversão da unidade de Centro de Distribuição para Estabelecimento Industrial.

ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente, cumpre ressaltar que, conforme disposto no Regimento Interno da SEFAZ, aprovado pela Resolução SEFAZ nº 414/2022, a competência da Superintendência de Tributação, bem como da Coordenadoria de Consultas Jurídico-Tributárias (CCJT), abrange a interpretação da legislação tributária fluminense em tese, cabendo verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora.

Ademais, esclarecemos que o objetivo das soluções de consulta tributária é elucidar questões objetivas formuladas pelos consulentes acerca da interpretação de dispositivos específicos da legislação tributária no âmbito da Secretaria de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, presumindo-se corretas as informações e documentos apresentados pela consulente, assim como as informações e verificações de competência da autoridade fiscal. Vale enfatizar que a verificação quanto a veracidade e completude dos dados apresentados pela consulente não é objeto desta consulta, motivo pelo qual este instrumento será respondido considerando as informações prestadas.

Passemos então para a análise da matéria objeto da consulta.

A empresa da consulente possui 01 (um) estabelecimento principal e 04 (quatro) estabelecimentos filiais.

A reestruturação operacional não será promovida por meio de fusão, cisão, incorporação, transformação ou aquisição, mas pela adição de atividades industriais ao estabelecimento comercial atacadista, sem baixa e alteração da numeração da Inscrição Estadual do estabelecimento no CAD-ICMS.

A consulente não informou se seu saldo credor acumulado decorreu de operações ou prestações destinadas ao exterior. Desse modo, partiremos do pressuposto de que só realiza operação interna ou interestadual nesse estabelecimento.

Também não foi informado se o estabelecimento atacadista possuía algum benefício fiscal. Assim, a análise será feita a partir do entendimento de que o estabelecimento não tinha qualquer regime distinto de apuração do ICMS, sendo aplicáveis as normas tributárias gerais do Estado do Rio de Janeiro.

Caso o estabelecimento, após reestruturação operacional, opte pela adesão a algum tratamento tributário diferenciado, deverá guiar a utilização do saldo credor acumulado pela norma a que estará subordinado.

O regime de apuração normal do ICMS, utilizado pela consulente, consiste no confronto periódico entre débitos e créditos, referentes a cada período de apuração, nos termos do artigo 26 do Livro I do RICMS-RJ/00:

"Art. 26 - O imposto devido resulta da diferença a maior entre os débitos e os créditos escriturais referentes a cada período de apuração.

§ 1º - Os débitos são constituídos pelos valores resultantes da aplicação das alíquotas cabíveis sobre as bases de cálculo das operações ou prestações tributadas.

§ 2º - Os créditos do período são constituídos pelos valores do imposto relativo a operações ou prestações de que decorrerem as entradas de mercadorias no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, observadas as restrições previstas na legislação".

Sobre a utilização dos saldos credores acumulados de ICMS, as disposições gerais estão previstas no Livro III do Regulamento do ICMS/RJ (RICMS/00 - Decreto nº 27.427/00), enquanto o Anexo XX da Resolução SEFAZ 720/2014 regulamenta o tema, dispondo sobre os procedimentos para compensação, utilização e transferência desse saldo credor.

Não há legislação específica prevendo a utilização de saldo credor acumulado após conversão de estabelecimento com atividade econômica comercial em industrial.

Entretanto, os regramentos supracitados estabelecem as normas gerais de aplicação do saldo credor, e nortearão as respostas desta consulta tributária.

O §1º do artigo 1° do Livro III do RICMS lista as formas de aproveitamento do saldo credor acumulado, podendo ser objeto de compensação, utilização ou transferência.

i) compensação: quando seu valor é destinado a compensar saldos devedores com saldos credores entre estabelecimentos da mesma empresa, localizados no Estado do Rio de Janeiro;

ii) utilização: quando seu valor é destinado ao pagamento de ICMS devido em operação de importação ou de entrada de sucata, de parcelamento, de auto de infração, de nota de lançamento ou de nota de débito, inscritos ou não em dívida ativa, pelo próprio estabelecimento detentor ou por estabelecimento da mesma empresa localizado no Estado do Rio de Janeiro;

iii) transferência: quando destinado a estabelecimento de outra empresa localizada no Estado do Rio de Janeiro como pagamento na aquisição de insumos, mercadorias ou ativo permanente.

Por seu turno, o inciso I do § 2º do artigo 1° determina que o aproveitamento dos créditos acumulados nas formas de utilização ou transferência somente poderá ser usufruído quando decorrente de atividade de exportação ou acumulado por estabelecimento industrial, nas condições e nos limites dispostos no Livro III.

O crédito acumulado pelo estabelecimento da consulente, até o momento, formou-se através de atividade comercial atacadista, e não por atividade industrial ou de exportação, como determinado acima, para aproveitamento através de utilização ou transferência. Portanto, não pode ser utilizado para esses fins Complementando a utilização de saldos credores de ICMS, o artigo 2° do Livro III do RICMS estabelece a seguinte ordem de prioridade:

1°) compensação;

2°) utilização pelo próprio estabelecimento detentor;

3°) utilização por demais estabelecimentos da mesma empresa e

4°) transferência para estabelecimento de terceiros.

Assim, em relação aos estabelecimentos comerciais, a legislação tributária fluminense não prevê o aproveitamento do saldo credor acumulado através do procedimento de utilização ou transferência, mas somente na forma de compensação, quando seu valor é destinado a compensar saldos devedores com saldos credores entre estabelecimentos da mesma empresa, localizados no Estado do Rio de Janeiro.

Além disso, o aproveitamento dos saldos credores acumulados pelos estabelecimentos industriais deve ser realizado na proporção que esses representem do total das operações ou prestações realizadas pelo estabelecimento, conforme cálculo estabelecido no artigo 6° do Livro III do RICMS, e até o momento não ocorreram operações industriais.

Portanto, não encontraria amparo legal o aproveitamento integral dos créditos acumulados, através de atividade comercial, por seu estabelecimento transformado em industrial, já que mesmo os industriais somente utilizam seus créditos para utilização e transferência na proporção que representem do total das operações ou prestações realizadas pelo estabelecimento.

RESPOSTA

(i) Nos termos do inciso IV do artigo 3° do Livro XVII do RICMS/00, industrial é o estabelecimento que realiza operação que modifica a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade de produto, ou o aperfeiçoa para o consumo ou para o uso como matéria-prima por outro industrial.

Segundo o Regulamento do IPI/2010 (Decreto 7.212/2010 – RIPI/2010), estabelecimento industrial é aquele onde é executada qualquer das operações consideradas de industrialização (transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento/reacondicionamento e renovação/recondiciamento), de que resulte produto tributado, ainda que de alíquota zero ou isento.

Após a reestruturação operacional, tornado o estabelecimento comercial atacadista em estabelecimento industrial, este estará sujeito às normas específicas de apuração, cálculo, e de aproveitamento dos saldos credores de ICMS dirigidas aos estabelecimentos industriais, nos termos do Livro III do RICMS e Anexo XX da Resolução SEFAZ 720/2014.

(ii) O atual saldo credor acumulado pelo estabelecimento da consulente formou-se ao longo do tempo através de atividade comercial atacadista. Assim, poderá ser objeto de compensação, prevista no inciso I do §1º do artigo 1° do Livro III do RICMS, não podendo ser objeto de utilização ou transferência, pois esses, mesmo para estabelecimentos industriais, devem seguir o cálculo estabelecido no artigo 6° do Livro III do RICMS, na proporção que esses representem do total das operações ou prestações realizadas pelo estabelecimento.

Assim, somente os novos saldos credores acumulados após a reestruturação operacional citada estarão sujeitos às normas dirigidas aos estabelecimentos industriais, enquanto os atuais poderão ser aproveitados como objeto de compensação.

Reforçamos que somente os saldos credores gerados pela atividade industrial, na proporção que esses representem do total das operações ou prestações realizadas pelo estabelecimento, poderão ser objeto de utilização ou transferência.

O cálculo do valor relativo ao saldo credor do período, para estabelecimentos industriais, está indicado no artigo 6º do Livro III.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa e seus respectivos efeitos:

1. Em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, editada norma superveniente dispondo de forma contrária;

2. Caso sejam verificadas que as informações prestadas pela consulente neste processo não correspondam aos fatos ou foram prestadas de maneira incompleta, levando a um entendimento equivocado desta coordenadoria.

Nos termos do Art. 155 do Decreto nº 2.473/1997, da solução dada à presente consulta, cabe recurso voluntário, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da notificação de consulente.

Conforme determinação do §2º do Art. 37 da Resolução SEFAZ 37/2022 “as decisões emanadas no âmbito da Superintendência de Tributação, que causem grande impacto e repercussão geral, deverão ser previamente apreciadas pela Subsecretaria de Estado de Receita antes da produção de efetivos efeitos”.

Desta maneira, sugiro a submissão deste parecer ao Sr. Superintendente de Tributação para decisão de encaminhamento à Subsecretaria de Estado de Receita.

Ainda, se for o caso de concordância e anuência do Sr. Subsecretário de Receita com a resposta dada nesta consulta, sugiro o encaminhamento posterior do p.p. à Auditoria-Fiscal Especializada de Substituição Tributária, AFE 06, para que tome conhecimento da resposta, cientifique o consulente, assim como tome as providências cabíveis.

Encaminhamos o Parecer sobre Pedido de Consulta Tributária 55987785 cujo teor manifestamos concordância.

Submetemos à vossa senhoria para decisão de encaminhamento à Subsecretaria de Estado de Receita , tendo em vista o disposto no §2º do artigo 37 do Anexo à Resolução n.º 414/22[1]

Em seguida, caso aplicável e com apreciação favorável ao parecer por parte do Sr. Subsecretário da Receita, sugerimos o encaminhamento à repartição fiscal de circunscrição do estabelecimento requerente, para dar ciência ao interessado, na forma preconizada pelo Art. 154[2] do Decreto nº 2473/1979.

[1] 2º As decisões emanadas no âmbito da Superintendência de Tributação, que causem grande impacto e repercussão geral, deverão ser previamente apreciadas pela Subsecretaria de Estado de Receita antes da produção de efetivos efeitos.

[2] Art. 154. Respondida a consulta, o processo será devolvido à repartição de origem, para que esta cientifique o consulente, intimando-o, quando for o caso, a adotar o entendimento da administração e recolher o tributo porventura devido em prazo não inferior a 15 (quinze) dias.