Consulta nº 3 DE 08/01/2016
Norma Estadual - Rio de Janeiro - Publicado no DOE em 08 jan 2016
Transferência de créditos de ICMS, para estabelecimento de terceiros.
I - RELATÓRIO
Empresa concessionária de serviço público de transporte ferroviário de cargas informa que acumula saldo credor decorrente da compra de óleo diesel e da aquisição de bens para o ativo imobilizado uma vez que o imposto debitado nas prestações de serviço é insuficiente para compensação integral dos créditos, visto que realiza operações de transporte de mercadorias destinadas à exportação.
Relata que não possui créditos tributários de ICMS nem outro estabelecimento no Estado que viabilize a utilização do saldo credor acumulado. Desejando transferir créditos de ICMS para estabelecimento de terceiros, expõe seu entendimento a respeito da legislação que regulamenta a matéria:
- a operação de transporte de mercadorias de terceiros para armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro, com o fim de exportação, se equipara a operação destinada ao exterior, sendo o saldo credor acumulado em decorrência dessas operações passível de transferência para terceiros;
- em se tratando de saldo credor acumulado em razão de operação ou prestação destinada ao exterior, a legislação prevê, em termos genéricos, a possibilidade de transferência dos créditos originários de mercadorias e serviços entrados no estabelecimento. Assim, a consulente entende que os créditos originários de aquisição de diesel para abastecimento de suas locomotivas estão contemplados pelo Regulamento do ICMS, na qualidade de insumos indispensáveis à execução de sua atividade de transporte;
- não há óbice à transferência de créditos originários de parcelas do Controle de Crédito de ICMS do Ativo Permanente (CIAP), visto que a Resolução SEF n° 2.790/97, art. 1°, parágrafo único, inciso II, alínea ‘a’, prevê essa possibilidade;
- interpretando-se o RICMS/00 à luz da Lei Complementar n° 87/96, os créditos oriundos da aquisição de óleo diesel e das parcelas do CIAP podem ser transferidos a estabelecimentos de terceiros.
O processo encontra-se instruído com cópia do Estatuto Social e Atas de Assembleia da empresa (fls.9/34), bem como com cópia de procuração e documento do procurador (fls. 36/38) e DARJ referente ao recolhimento da taxa de serviços Estaduais (fls. 42/44).
A IFE 01 - Barreiras Fiscais informou a existência de autos de infração para o CNPJ em questão cujos créditos tributários estão definitivamente constituídos (fls. 45/46) e que a consulente não se encontrava sob ação fiscal na data da protocolização da presente consulta (fl. 46).
ISTO POSTO, CONSULTA:
1) Está correto o entendimento da consulente no sentido de que a operação de transporte de mercadorias de terceiros para armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro, com o fim de exportação, se equipara à operação destinada ao exterior, com base no art. 3°, caput e § 2° do Título II do Livro III do RICMS/00, podendo o saldo credor acumulado em decorrência dessas operações ser transferido a estabelecimento de terceiros?
2) “O acúmulo de créditos de ICMS em apurações de meses imediatamente anteriores, nas quais o ICMS gerado nas prestações de serviço foi insuficiente para compensação integral do crédito poderá ser transferido para terceiros pela consulente?”
3) Interpretando o art. 3°, caput e § 1° do Título II do Livro III do RICMS/00 e art. 1°, caput e parágrafo único da Resolução SEF n° 2.790/97, à luz do art. 25 da Lei Complementar n° 87/96, se pode concluir que os créditos da consulente, oriundos de aquisição de óleo diesel e CIAP, podem ser transferidos a terceiros?
4) Nos termos da legislação em vigor, que disciplina a utilização e transferência de saldos credores acumulados, em relação à hipótese de recolhimento do imposto devido na importação de mercadorias, pode a consulente fazer uso de seu saldo credor para aquisição, no mercado externo, de trilhos ferroviários, equipamentos e máquinas para uso próprio destinados à manutenção e ampliação da via férrea?
5) Tendo por base a legislação que permite a transferência de saldos credores para estabelecimento de terceiros mediante aquisição de insumos, pode a consulente utilizar seus créditos para adquirir lubrificantes e combustíveis no mercado interno para utilização em suas máquinas e locomotivas?
6) A previsão de transferência de saldos credores acumulados para estabelecimento de terceiros na aquisição de máquinas e equipamentos utilizados em processo industrial pode ser aplicada às empresas de transporte na aquisição de máquinas para manutenção e ampliação da via férrea com o objetivo de expandir a capacidade de transporte?
II - ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO
A questão principal na presente consulta, da qual derivam as demais, está relacionada a possibilidade de aplicação do § 2° do art. 40 da Lei n° 2.657/96 à prestação de serviço de transporte. O mencionado dispositivo, cuja origem remonta ao parágrafo único do art. 3° da Lei Complementar n° 87/96, equipara à exportação a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; e armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
Circulação de mercadoria e prestação de serviço de transporte são atividades distintas e dessa forma são tratadas pela legislação tributária, como se verifica na Lei n° 2.657/96 ao estabelecer as hipóteses de incidência e o fato gerador do imposto, bem como ao definir o estabelecimento responsável para efeito de cobrança do imposto, ex vi dos artigos 2°, incisos I e II, 3°, incisos I, IX e X e 30, incisos I e II, item 1:
“Art. 2.° O imposto incide sobre:
I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;
II - prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;
[...]
Art. 3.° O fato gerador do imposto ocorre:
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, do estabelecimento do contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
[...]
IX - no início de execução do serviço de transporte interestadual e intermunicipal de qualquer natureza;
X - no ato final de transporte iniciado no exterior;
[...]
Art. 30. Para efeito de cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, considera-se:
I - local da operação:
[...]
II - local da prestação:
1 - tratando-se de prestação de serviço de transporte:” (grifos nossos)
O mesmo se aplica aos casos de não incidência do imposto. O caput do art. 40 e o inciso II preveem a não incidência do imposto em operação e prestação que destinem mercadoria ou serviço ao exterior, englobando, nesse caso, tanto a operação de circulação de mercadoria quanto a prestação de serviço.
“Art. 40. O imposto não incide sobre operação e prestação:
[...]
II - que destine ao exterior mercadoria ou serviço;”
Todavia, o mesmo não ocorre com o § 2° do art. 40, a menção “...às operações de que trata o inciso II...”, existente no § 2°, tem por objetivo estabelecer que a equiparação ocorre em relação à operação de exportação e alcança apenas a saída de mercadoria, conforme expressamente previsto, não havendo qualquer menção à prestação de serviço a ela relacionada.
“Art. 40................................................................................................................................
[...]
§ 2.° Equipara-se às operações de que trata o inciso II deste artigo a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a:
I - empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; e
II - armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.” (grifos nossos)
Acresça-se a isso a existência de Códigos Fiscais de Operações e de Prestações (CFOP) próprios para a saída de mercadorias remetidas com fim específico de exportação a trading company, empresa comercial exportadora ou outro estabelecimento do remetente (grupos 5.500 e 6.500), o mesmo não ocorrendo com a prestação de serviço de transporte em que há previsão de um único código para exportação direta, “7.358 - Prestação de serviço de transporte (Classificam-se neste código as prestações de serviços de transporte destinado a estabelecimento no exterior).”
III - RESPOSTA
Feitos os esclarecimentos acima, passamos a responder objetivamente ao questionamento apresentado:
1) Não está correto o entendimento da consulente. A equiparação à exportação prevista no § 2° do art. 40 da Lei n° 2.657/96, reproduzida no § 2° do art. 3° do Livro III do Decreto n° 27.427, de 17 de novembro de 2000 (RICMS/00), aplica-se apenas às operações de circulação de mercadorias não alcançando a prestação de serviço de transporte. Dessa forma, a prestação de serviço de transporte de mercadorias remetidas com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; e armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro é normalmente tributada. O saldo credor porventura apurado e que esteja relacionado a essas operações não é considerado como saldo credor decorrente de operações de exportação, não podendo ser utilizado ou transferido conforme as disposições do Título II do Livro III do RICMS/00.
2) A pergunta não está clara. Os saldos credores passíveis de utilização e transferência são os decorrentes de operações ou prestações destinadas ao exterior, na prestação de serviço de transporte somente quando se tratar de exportação direta, de acordo com o Título II do Livro III do RICMS/00 e o saldo credor acumulado por estabelecimento industrial em decorrência das operações ou prestações relacionadas no art. 13 do Título III do mesmo livro.
3) Não. Esse entendimento seria válido apenas se a consulente acumulasse créditos em decorrência da prestação de serviço de transporte destinado a estabelecimento no exterior, não se lhe aplicando a equiparação prevista originalmente no parágrafo único do art. 3° da Lei Complementar n° 87/96 e reproduzida no § 2° do art. 40 da Lei n° 2.657/96 e no § 2° do art. 3° do Livro III do RICMS/00. Portanto, qualquer acúmulo de créditos em decorrência da prestação de serviço de transporte de mercadorias remetidas com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; e armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro não poderá ser objeto de utilização ou transferência conforme o Livro III do RICMS/00. É importante frisar que o caput do art. 25 da LC 87/96 trata da compensação de saldos credores e devedores entre os diversos estabelecimentos de um mesmo sujeito passivo no Estado. O § 1° do citado artigo se refere ao saldo credor acumulado de exportação, regulamentado pelo Título II do Livro III do RICMS/00, o § 2° atribui à lei estadual a possibilidade de legislar sobre os demais saldos credores e posteriormente a Lei n° 2.657/96, art. 38, § 2°, delegou essa competência ao Poder Executivo, o que resultou no Título III do Livro III do RICMS/00, que dispõe sobre o saldo credor acumulado por estabelecimento industrial em decorrência das hipóteses elencadas no art. 13 do mencionado título.
4) Não. A Resolução SEF n° 6.474/2002, que fixa normas para a utilização de saldos credores
acumulados para compensação com o ICMS devido em operações de importação, se aplica ao saldo credor acumulado de exportação e ao saldo credor acumulado por estabelecimento industrial, ambos previstos nos Títulos II e III do RICMS/00. Reforçando o que já foi dito nos itens anteriores, na prestação de serviço de transporte não há equiparação à exportação quando a prestação do serviço não for destinada a estabelecimento no exterior, sendo o serviço tributado normalmente.
5) Não. Os saldos credores que têm regulamentada sua utilização e transferência são os decorrentes de operações de exportação e os acumulados em estabelecimento industrial, nas hipóteses previstas na legislação, de acordo com os Títulos II e III do RICMS/00. Como já afirmado anteriormente, a operação de transporte de mercadorias de terceiros para armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro, com o fim de exportação, não se equipara à exportação, que é normalmente tributada. Sendo a consulente concessionária de serviço público de transporte ferroviário de cargas, por óbvio, tb não pode se valer das disposições do Título III do mesmo livro, que dispõe a respeito do saldo credor acumulado por estabelecimento industrial.
6) Não. Ainda que o saldo credor acumulado estivesse inserido entre os regulamentados pelo Livro III do RICMS/00, a consulente presta serviço de transporte ferroviária não se inserindo na definição de estabelecimento industrial constante do inciso IV do art. 3° do Livro XVII do RICMS/00[1].
[1] Art. 3.° Para os efeitos do disposto neste regulamento, considera-se:........IV - industrial, o estabelecimento que realize operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade de produto, ou o aperfeiçoe para o consumo ou para o uso como matéria-prima por outro industrial;
Por todo o exposto, é entendimento desta Superintendência de Tributação que a prestação de serviço de transporte de mercadorias de terceiros para armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro, com o fim de exportação não se equipara à operação de exportação, não estando abrangida pelas disposições do § 2° do art. 40 da Lei n° 2.657/96 e, portanto, o saldo credor acumulado em decorrência dessas prestações não pode ser objeto de utilização ou transferência conforme regulamentado no Livro III do RICMS/00.
Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária ou seja editada norma superveniente dispondo de forma contrária.
CCJT, em 8 de janeiro de 2016