Consulta nº 16 DE 07/04/2022
Norma Estadual - Rio de Janeiro - Publicado no DOE em 07 abr 2022
Lei nº 6.979/15. Obrigatoriedade de recolhimento do ICMS nas operações de remessa em consignação industrial.
RELATÓRIO
Senhora Coordenadora:
A empresa acima qualificada, tendo por atividades econômicas fabricação de embalagens de material plástico (CNAE principal 22.22-6/00) e fabricação de artefatos de material plástico para usos industriais e fabricação de tecidos especiais, inclusive artefatos (CNAE secundárias 22.29-3/02 e 13.54-5/00, respectivamente), vem solicitar esclarecimentos desta Superintendência de Tributação acerca dos efeitos sobre o uso dos benefícios fiscais da Lei n.º 6.979/2015, conforme expõe, na sua petição inicial (29708281), em síntese, o que segue:
A consulente, em 21 de dezembro 2022, iniciou operações de consignação industrial e a cada remessa de produto em consignação passou a emitir notas fiscais no CFOP 6917 (Remessa de mercadoria em consignação mercantil ou industrial), embasado na instrução do artigo 61 da Seção II da parte II da Resolução SEFAZ 720/20214
Na apuração fiscal dos meses 12/2021 e 01/2022, por falta de regra específica na Lei 6.979/2015, a indústria recolheu o ICMS destacado nas notas fiscais com CFOP 6917 (Remessa de mercadoria em consignação mercantil ou industrial), em separado da apuração fiscal estabelecida no artigo 5º da referida Lei.
A empresa entende “que não haverá necessidade de recolhimento do ICMS nas remessas em consignação industrial, uma vez que, o imposto será recolhido no momento da efetiva venda, fato esse acobertado pela emissão da nota fiscal com CFOP 6111(Venda de produção do estabelecimento remetida anteriormente em consignação industrial), gerando nesse momento, o fato gerador do imposto, em conformidade com o que determina o artigo 5º da lei 6979/2015.”
Destaca, ainda, “que ao recolher o ICMS destacado nas notas fiscais com CFOP 6917 incorrerá em duplicidade de recolhimento sobre a operação de venda em consignação industrial, uma vez que recolherá o ICMS sobre o CFOP 6111 pela regra estabelecida artigo 5º da Lei 6979/2015.”
Ressalta que recolheu o ICMS destacado nas NF-e de remessa em consignação industrial por falta de regulamentação na Lei 6979/2015.
Argumenta que, de acordo com artigo 61 da Seção II da parte II da Resolução SEFAZ 720/20214, o fato gerador do ICMS ocorre na remessa em consignação industrial, contudo, a indústria é habilitada na Lei 6.979/2015, e por esse motivo, em substituição à sistemática normal de apuração de créditos e débitos fiscais, o imposto a ser recolhido é calculado sobre valor das operações de saída interna e interestadual, por transferência e por venda, deduzidas as devoluções, sendo vedado o aproveitamento de qualquer crédito fiscal.
Acrescenta que o artigo 7º da Lei, estabelece que as operações fiscais de venda de resíduo ou matériaprima inaproveitável em processo industrial, bem como, a revenda de mercadoria e/ou industrialização por encomenda de outros contribuintes serão tributadas pela alíquota normal do imposto e terão o recolhimento de ICMS em separado da apuração fiscal referida no artigo 5º da Lei, não estabelecendo nenhuma regra para operações em consignação industrial.
Por fim, informa que na competência 12/2021 a indústria apurou e recolheu ICMS, em separado, referente as notas fiscais de remessas em consignação, conforme Notas Fiscais relacionadas na petição Isto posto, Consulta:
1) Está correto o entendimento do consulente sobre estar desobrigado ao recolhimento do ICMS destacado nas notas fiscais de remessa de consignação (CFOP 6917) pelo motivo da indústria ser habilitada na lei 6979/2015?
2) Estando correto o entendimento do consulente, na apuração fiscal no Registro E111 deverá somente estornar o débito fiscal correspondente ao CFOP 6917, consolidando-o no ajuste fiscal RJ038003 - Estornos de Débitos - Estorno de débito em função de norma relacionada no manual de que trata o Decreto 27.815/2001?
3) Estando correto o entendimento do consulente, qual o procedimento para ressarcimento dos valores de impostos já pagos sobre as remessas em consignação industrial do período de apuração 12/2021 e 01/2022?
Preliminarmente:
O processo encontra-se instruído com comprovantes para pagamento da TSE (29708282); com cópias da documentação da empresa e documento pessoal (29708283 e 29708285) do representante legal da consulente.
Consta, ainda, o despacho SEFAZ/CHEFE 06 30374604, de 23 de maço de 2022, informando o que segue transcrito:
“Informamos que, nos termos dos incisos I e II, do art. 3°, da Resolução n° 109/76, foi consultado o Sistema PLAFIS, no qual constatou-se que a consulente não se encontrava sob ação fiscal na data da protocolização da presente consulta. Outrossim que, de acordo com pesquisa realizada junto ao AIC, não existem débitos pendentes de julgamento relacionados à matéria sob consulta.”
Análise e Resposta
Preliminarmente, a título de facilitar a argumentação, é recomendável lembrar que a operação de consignação industrial se caracteriza como aquela na qual um estabelecimento industrial, ou comercial, remete a um estabelecimento industrial insumos, com a finalidade de integração ou consumo em processo de industrialização, com preços fixados, sendo que o faturamento dar-se-á quando da utilização dessa mercadoria pelo destinatário,
As operações de consignação mercantil ou industrial estão disciplinadas no Capítulo XV do Anexo XIII da Parte II da Resolução SEFAZ nº 720/2014, tendo por fundamento o Ajuste SINIEF 2/93 (Art. 55/60) e o Protocolo ICMS 52/00 (Art. 61/64), respectivamente.
Neste ponto, é importante destacar que na Lei 6.979/2015 não há, expressas, normas específicas para as operações de consignação industrial ou mercantil. Contudo, na mesma lei há uma relevante atenção para as operações realizadas com insumos pelos estabelecimentos industriais signatários do dispositivo legal. Neste sentido, podemos citar os dispositivos que seguem transcritos, com destaques nossos:
Art. 3º Fica concedido aos estabelecimentos de que trata o artigo 2º desta Lei diferimento do ICMS nas seguintes operações: [...]
IV - importação de matéria-prima e outros insumos destinados ao seu processo industrial, exceto material de embalagem, sem similar produzido no Estado do Rio de Janeiro;
V - aquisição interna de matéria-prima, outros insumos e material de embalagem destinados ao seu processo industrial, exceto energia, água e materiais secundários, observado o disposto no artigo 4º desta Lei.
[...]
§ 4º Caso a matéria-prima e outros insumos adquiridos nos termos dos incisos IV e V do caput deste artigo sejam remetidos para industrialização em estabelecimento diverso do enquadrado no tratamento tributário especial de que trata essa lei, ficará o estabelecimento enquadrado responsável pelo recolhimento do imposto diferido, o qual será exigível com base na data da respectiva entrada da mercadoria, com os acréscimos cabíveis, a ser calculado pela aplicação da alíquota normal do imposto sobre o valor da operação de entrada das matérias-primas e outros insumos, vedado o aproveitamento de qualquer crédito fiscal.
§ 5º O pagamento do imposto a que se refere o § 4º deste artigo deve ser feito em documento de arrecadação em separado.
Art. 4º Não se aplica o diferimento previsto nos incisos IV e V do caput do artigo 3º, às operações de aquisição de aço e seus produtos destinados ao processo produtivo do estabelecimento enquadrado, ficando concedido, às operações de aquisição interna dos mesmos, o benefício da isenção.
[...]
§ 2º Caso a matéria-prima e outros insumos adquiridos com isenção de que trata o caput deste artigo, sejam remetidos para industrialização em estabelecimento diverso do enquadrado no tratamento tributário especial de que trata essa lei, ficará o estabelecimento enquadrado responsável pelo recolhimento do imposto não debitado em decorrência da referida isenção, o qual será exigível com base na data da respectiva entrada da mercadoria, com os acréscimos cabíveis, a ser calculado através da aplicação da alíquota normal do imposto sobre o valor da operação de entrada das matérias-primas e outros insumos, vedado o aproveitamento de qualquer crédito fiscal.
§ 3º O pagamento do imposto a que se refere o § 3º deste artigo deve ser feito em documento de arrecadação em separado.
Da leitura dos dispositivos acima, fica claro que os benefícios (diferimento e isenção) concedidos pela lei em referência, na aquisição de insumos e matérias-primas, são destinados ao processo industrial da própria empresa beneficiada, não se aplicando, os mesmos os benefícios, para o caso de remessa destes insumos para industrialização em estabelecimento diverso do enquadrado na lei. Nestes casos, o ICMS deve ser pago em documento de arrecadação em separado, com a aplicação da alíquota normal do imposto.
Por seu turno, é importante ressaltar o que dispõe os Art. 5º e 7.º da mesma Lei 6.979/2015, utilizados pelo consulente na sua argumentação/fundamentação, conforme transcrição a seguir, também com destaques nossos:
Art. 5º Para o estabelecimento industrial enquadrado no tratamento tributário especial de que trata esta Lei, em substituição à sistemática normal de apuração de créditos e débitos fiscais, o imposto a ser recolhido corresponde à aplicação de 2% (dois por cento) sobre o valor das operações de saída interna e interestadual, por transferência e por venda, deduzidas as devoluções, vedado o aproveitamento de qualquer crédito fiscal.
§ 1º O valor do ICMS próprio destacado nas notas fiscais referentes às saídas beneficiadas na forma do caput deste artigo deve ser calculado pela aplicação da alíquota normal de destino da mercadoria, observado o disposto no § 2º deste artigo.
§ 2º Nas saídas internas de aço beneficiado, argamassa, vidro temperado e produto plástico fabricado a partir de resinas petroquímicas, o valor do ICMS próprio destacado nas notas fiscais referentes às saídas desses produtos deve ser calculado pela aplicação da alíquota de 12% (doze por cento).
[..]
Art. 7º As operações de venda de resíduo ou matéria-prima inaproveitável em processo industrial do estabelecimento enquadrado no tratamento tributário especial de que trata esta Lei, ainda que por razões de escala de produção (sobras), será tributada pela alíquota normal do imposto, tendo como base de cálculo o valor da referida operação, sem aproveitamento de qualquer crédito fiscal.
§ 1º O pagamento do imposto a que se refere o caput deste artigo deve ser feito em documento de arrecadação em separado. [...]
Neste ponto, é de extrema relevância a leitura cuidadosa do caput do Art. 5º, acima transcrito. Nele há determinação, expressa/literal, que a aplicação da alíquota de 2% (dois por cento) ocorre, apenas, para as “operações de saída interna e interestadual, por transferência e por venda.”
No mesmo dispositivo legal, não há menção a qualquer operação de consignação e está claro que o benefício é de aplicação exclusiva para operações de saída por transferência e por venda.
Cabe registrar que a concessão de benefícios fiscais deve ser interpretada de forma literal e restritiva, nos termos do artigo 111 do CTN- Lei nº 5.172/1966 [1].
Adicionalmente, é notável o destaque que os dispositivos, imediatamente acima transcritos, dão às operações com mercadorias consideradas como insumos/matéria-prima, afastando, nestes casos, a aplicação do benefício previsto no caput do Art. 5º; conforme dispõem o seu § 2º º e o caput do Art. 7º.
Desta forma, também é importante destacar o Art. 108[2] do mesmo CTN, que dispõe sobre interpretação da legislação tributária. O mencionado artigo determina que, na ausência de disposição expressa para aplicar a legislação tributária, deve-se utilizar, sucessivamente, entre outras técnicas, a analogia e os princípios gerais do direito tributário. Neste sentido, reiteramos que, quando se trata de operações com insumos ou matérias-primas, todos os dispositivos da Lei nº 6.970/2015 afastam a aplicação dos benefícios nela previstos (Art. 3.º, §§ 4.º e 5º - Art. 4°, §§ 2.º e 3.º - Art. 5.º, § 2.º e - Art. 7º caput e § 1.º).
Pelo exposto, respondendo, em bloco, os questionamentos feitos pela consulente, concluímos que não está correto seu entendimento, no sentido de que está desobrigada ao recolhimento do ICMS destacado nas NF- e de remessa de insumos em consignação industrial; uma vez que a indústria é habilitada na Lei nº 6.979/2015.
Inversamente neste caso, a operação é tributada, normalmente, pelo ICMS; devendo o consignante (e o consignatário) atender as disposições dos artigos 61 a 64 do Anexo XIII da Parte II da Resolução SEFAZ 720/14, que trata da Consignação Industrial, com base no Protocolo ICMS 52/00.
Por fim, fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária ou seja editada norma superveniente dispondo de forma contrária.
CCJT, em 12 de abril de 2022.
[1] Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;
II - outorga de isenção;
III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias
[2] Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:
I - a analogia;
II - os princípios gerais de direito tributário;
III - os princípios gerais de direito público;
IV - a eqüidade.
§ 1° O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.