Consulta SEFAZ nº 157 DE 19/04/1996
Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 25 abr 1996
Água Natural - Isenção - Água Natural Não Canalizada
Senhor Secretário:
O servidor acima nominado, cumprindo Ordem de Serviço para levantamento em profundidade no estabelecimento do contribuinte ..., inscrição estadual n° ...., CAE 4.14.04 (OS n° ....), deparou-se com os fatos que expõe, adiante resumidos, que geram as dúvidas para as quais busca esclarecimentos:
1 - em que pese o CAE do estabelecimento (4.14.04 – comércio atacadista de água minerais, refrigerantes e outras bebidas não alcoólicas), a empresa atua exclusivamente no transporte e venda de água natural, tanto para o setor público como privado;
2 - para acobertar a operação, emite Nota Fiscal, destacando a palavra isento no campo destinado ao ICMS;
3 - em seu endereço, possui poço artesiano próprio, de onde retira a água natural, armazenando-a em caixa d'água;
4 - nos termos do artigo 28 das Disposições Transitórias do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n°1.944, de 06 de outubro de 1989, as operações com água natural canalizada são isenta do ICMS;
5 - o benefício encontra amparado nas disposições do Convênio ICMS 96/89 que autoriza às unidades federadas concedê-lo, "nas hipóteses previstas na legislação estadual";
6 - já, o RICMS paulista assevera:
"Artigo 7° - O imposto não incide sobre (Lei n° 6.374/89, art. 4°):
(...)
V – a saída ou o fornecimento de água natural proveniente de serviços públicos de captação, tratamento e distribuição para redes domiciliares, efetuada por órgão da Administração Pública, centralizada ou descentralizada, inclusive por empresa concessionária ou permissionária;
(...)."
(grifos do interessado);
7 – o legislador paulista substitui a palavra canalizada por proveniente de serviços públicos de captação, mas o mato-grossense manteve o texto convenial, sem proceder o ajuste às hipóteses previstas;
8 – indaga então:
a) as empresas particulares quando transportam e vendem água natural através de caminhão-pipa estão sujeitas ao ICMS?
b) a água natural que retiram de suas caixas d'água é considerada canalizada ou canalizada é apenas a proveniente de empresa de serviço público de captação, no caso, da SANEMAT?
É a consulta.
De plano, incumbe noticiar que o comando do estatuto regulamentar paulista não se presta a comparação com o dispositivo mato-grossense, pois coloca as operações com água natural fora do campo de incidência do ICMS.
O preceito inserto na legislação deste estado, porém, é hipótese de isenção.
Antes que se adentre no mérito da consulta, não é demais trazer à colação preleção de IVES GANDRA MARTINS, que, discorrendo sobre a imunidade, a contrapõe aos dois institutos, além da alíquota zero, evidenciando com clareza as diferenças entre os mesmos: "A imunidade é o mais relevante dos institutos desonerativos. Corresponde a vedação total ao poder de tributar. A imunidade cria área colocada, constitucionalmente, fora do alcance impositivo, por intenção do constituinte, área necessariamente de salvaguarda absoluta para os contribuintes nela hospedados. A relevância é de tal ordem que a seus comandos legais, sendo obrigatoriamente, a exegese de seus dispositivos ampla.
(...)
Na imunidade, não há nem o nascimento da obrigação fiscal, nem do conseqüente crédito, em face de sua substância fática estar colocada fora do campo de atuação dos poderes tributantes, por imposição constitucional. Independente, portanto, das vontades legislativas das competências outorgadas pela Lei Maior.
A não-incidência, materialmente, se reveste da mesma estrutura. Não há nem nascimento da obrigação tributária, nem do crédito respectivo, em face de que as pessoas ou situações postas fora da imposição não geram, por seus atos ou ocorrências fáticas, nem obrigação, nos termos dos artigos 113 e 114 do CTN, nem crédito correspondente (arts. 139 e 142), que é o ingresso para o universo administrativo, em nível de conhecimento e ação, do vinculado fato gerador.
A diferença reside, todavia, na origem do instituto. Na hipótese de não-incidência impede-se o surgimento da obrigação e do crédito, porque o Poder Tributante, que pode, não deseja poder. Tem a faculdade constitucional de impor mas abdica do exercício de sua capacidade. Na imunidade, o Poder tributante não tem qualquer poder. Não abdica do exercício de nenhum direito, porque não tem nenhum direito à imposição.
(...)
Embora com conseqüência semelhantes, no concernente aos efeitos sobre o sujeito passivo da relação tributária, a isenção difere das duas outras figuras legislativas. É que na isenção nasce a obrigação tributária, sendo apenas excluído o crédito correspondente.;
Tal colocação decorre do art. 175 do CTN, assim redigido: "Art. 175. Excluem o crédito tributário: I – a isenção; II – a anistia. Parágrafo único – A exclusão do crédito tributário não dispensa o cumprimento das obrigações acessórias, dependentes da obrigação principal cujo crédito tributário seja excluídos, ou dela conseqüente".
(...)
(...) A última forma desonerativa de expressão é a que diz respeito à alíquota zero. Nesta forma, nascem obrigação tributária e crédito fiscal, mas tanto uma quanto o outro estão reduzidos a sua nenhuma expressão.
(...)." (1)
Deflui-se dos ensinamentos do insigne tributarista que o Estado de São Paulo que podia tributar, nos limites que delineou, renunciou a este poder.
O tratamento paulista, contudo, vem reforçar o entendimento aqui esposado, e que se passa a fundamentar, de que o fornecimento de água natural não canalizada, no território mato-grossense, é tributado pelo ICMS.
Vale transcrever o disposto no artigo 2°, inciso V, do RICMS: "Art. 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
(...)
V – nas saídas de mercadoria, a qualquer título, do estabelecimento do contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo títular;
(...)."
Ora, a regra geral é a tributação na saída da mercadoria. Se não estabeleceu tratamento, diferenciado é porque não quis a Entidade tributante excepcioná-lo.
Poderia deixá-lo fora do campo da incidência, renunciando à tributação, como expressamente fez o legislador paulista. Assim não procedeu.
Para a concessão de isenção, todavia, necessita o Estado da previsão ou autorização convenial, ex vi do disposto no artigo 155, § 8°, do Ato das Disposições constitucionais transitórias e com o artigo 1° da Lei Complementar n° 24, de 7 de janeiro de 1975.
A autorização, contudo, é restrita às operações com água natural canalizada, consoante o citado Convênio ICMS 98/89, que ensejo à isenção encartada no artigo 28 das Disposições transitórias do RICMS mato-grossense.
Convém ressalvar que ao não especificar as hipóteses favorecidas com o benefício, conforme o permisso convenial, a regra estadual o conferiu a todas desde que seja a operação vinculada à água natural canalizada.
Portanto, ao contrário da legislação paulista, que restringe a não-incidência às saídas ou fornecimento proveniente de serviço público, se a água natural extraída em poço artesiano de particular fosse levada aos consumidores através de sua canalização, persistiria a isenção.
In casu, a água é natural, mas não canalizada, fornecida mediante o transporte em caminhões-pipa. O fato de ser extraída em poço artesiano, permanecendo antes armazenada em caixa dá água, não modifica a modalidade pela qual é colocada ao alcance do consumidor.
Diante do exposto, conclui-se positiva a resposta à primeira indagação.
Quando à Segunda, quer-se crer já esclarecimento que se a distribuição de água natural for através de sua canalização, é irrelevante para a configuração do benefício a condição do fornecedor.
É a informação, S.M.J.
Cuiabá-MT, 19 de abril de 1996.
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
De acordo: Mailsa Silva de Jesus
Assessora Tributária
(1) Apud. MARTINS, Ivens Gandra. Sistema Tributário Nacional na Constituição de 1988.3. ed., aum. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 152-3 (notas de rodapé, sem os destaques no original).