Consulta SEFAZ nº 144 DE 11/04/1996
Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 22 abr 1996
IPVA - Imunidade - Entidade Sindical
Senhor Secretário:A entidade acima nominada, invocando o disposto no artigo 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição Federal, requer ao Departamento Estadual de Trânsito que seja reconhecida a isenção do IPVA pertinente a veículo de sua propriedade (fl. 02).
Instruem o pedido os documentos de fls. 03 a 05, comprobatórios da transferência da titularidade do bem ao requerente.
Por solicitação da Assessoria Jurídica daquele Departamento, que se manifestou favorável ao pleito (fl. 06), foi o processo encaminhado à Secretaria de Fazenda (fl. 07).
É o relatório.
O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores foi instituído, neste Estado, através da Lei n° 4.963, de 23 de dezembro de 1985, que hoje vigora com as alterações introduzidas pela Lei n° 4.972, de 08 de abril de 1986.
Vale a reprodução dos artigos 6° e 7° do Diploma Legal invocado:"Art. 6° - O imposto de que trata esta lei não será cobrado:
I - da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios;
II - dos partidos políticos;
III - das instituições de educação ou de assistência social, observados os seguintes requesitos:
a) não distribuir qualquer parcela do seu patrimônio ou de suas rendas, a título de lucro ou participação no seu resultado nem restringir a prestação de serviço a associação e contribuintes;
b) aplicar integralmente no país, os seus recursos na manutenção de seus objetivos institucionais;
c) manter escrituração de suas receitas e despesas em livro revestido de formalidades capazes de assegurar sua exatidão." (Negrito apostos).
"Art. 7° - São isentos do pagamento do imposto:
I - os turistas estrangeiros, portadores de certificados internacionais de circular e conduzir', pelo prazo estabelecido nesses certificados, mas nunca superior a 1 (um) ano, relativamente aos veículos de sua propriedade ou posse, não registrados no Estado;
II - as Representações consulares, os Agentes Consulares e funcionários de carreira do serviço consular e desde que o país de origem adote medida recíproca para com os veículos do Brasil;
III - os proprietários de máquinas agrícolas e de terraplanagem, desde que não circulem em vias públicas;
IV - os proprietários de ambulâncias;
V - os proprietários de qualquer veículos de aluguel, dotados ou não de taxímetro, destinados ao transporte público de pessoas, desde que autorizados a operar como Taxi pelos municípios;
VI - os proprietários de ônibus, exclusivamente empregados em linhas de transporte urbano e metropolitano;
VII - os veículos adaptados para usuários deficientes físicos mediante vistoria e homologação prévia do Departamento Estadual de Trânsito." (Foi destacado). Sem dúvida, o requerente não se enquadra em qualquer das hipóteses arroladas, seja entre aquelas contempladas com não-incidência, seja com isenção.
A carta Magna de 1988, porém, estabeleceu, entre as limitações do poder de tributar:"Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir imposto sobre:
(...)
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidas os requisitos da lei;
(...)." (Sem os destaques no original).
O preceito transcrito prevê, entre outras hipóteses, a imunidade das entidades sindicais.
ALIOMAR BALEEIRO entende as imunidades como "vedações absolutas ao poder de tributar certas pessoas (subjetivas) ou certos bens (objetivas) e, às vezes, uns e outros." (1)
E prossegue o ínclito tributarista diferenciando imunidade de isenção. Textualmente:
"Imunidades tornam inconstitucionais as leis ordinárias que as desafiam. Não se confundem com isenções derivadas da lei ordinárias ou da complementar (C.F. art. 19, § 2°) * que, decretando o tributo, exclui expressamente certos casos, pessoas ou bens, por motivos de política fiscal. A violação do dispositivo onde se contém a isenção importa em ilegalidade e não em inconstitucionalidade. (...).'' (2) Também o notório IVES GANDRA MARTINS exaustivamente comenta o alcance jurídico dos dois institutos, bem como da não -incidência e alíquota zero, em notas de rodapé insertas a obra Sistema Tributário na Constituição de 1988. Não é demais a sua transcrição:
"A imunidade é o mais relevante dos institutos desonerativos. Corresponde a vedação total ao poder de tributar. A imunidade cria área colocada, constitucionalmente, fora do alcance impositivo, por intenção do constituinte, área necessariamente de salvaguarda absoluta para os contribuintes nela hospedados. A relevância é de tal ordem que a jurisprudência tem entendido ser impossível a adoção de interpretação restritiva a seus comandos legais, sendo, obrigatoriamente, a exegese de seus dispositivos ampla. (...)
Na imunidade, não há nem o nascimento da obrigação fiscal, nem do conseqüente crédito, em face de sua substância fática estar colocada fora do campo de atuação dos poderes tributantes, por imposição constitucional. Independe, portanto, das vontades legislativas das competências outorgadas pela Lei Maior.
A não-incidência, materialmente, se reveste da mesma estrutura. Não há nem nascimento da obrigação tributária, nem do crédito respectivo, em face de que as pessoas ou situações postas fora da imposição não geram, por seus atos ou ocorrências fáticas, nem obrigação, nos termos do artigo 113 e 114 do CTN, nem crédito correspondente (arts. 139 e 142), que é o ingresso para o universo administrativo, em nível de conhecimento e ação, do vinculado fato gerador.
A diferença reside, todavia, na origem do instituto. Na hipótese de não-incidência impede-se o surgimento da obrigação e do crédito, porque o Poder Tributante, que pode, não deseja poder. Tem a faculdade constitucional de impor, mas abdica do exercício de sua capacidade. Na imunidade, o Poder tributante não tem qualquer poder. Não abdica do exercício de nenhum direito, porque não tem nenhum direito à imposição.
(...)
Embora com consegüências semelhantes, no concernente aos efeitos sobre o sujeito passivo da relação tributária, a isenção difere das duas outras figuras legislativas. É que na isenção nasce a obrigação tributária, sendo apenas excluído o crédito correspondente. Tal colocação decorre do art. 175 do CTN, assim redigido:"Art. 175. Excluem o crédito tributário:
I - a isenção;
II - a anistia.
Parágrafo único - A exclusão do crédito tributário não dispensa o cumprimento das obrigações acessórias, dependentes da obrigação principal cujo crédito tributário seja excluído, ou dela consegüente".
(...)
(...) A última forma desonerativa de expressão é a que diz respeito à alíquota zero. Nesta forma, nascem obrigaçõão tributária e crédito fiscal, mas tanto uma quanto o outro estão reduzidos a sua nenhuma expressão.
(...)." (3)
Das preleções aqui carreadas, pode-se concluir que os institutos não se confundem, sobrepondo-se a imunidade, consagrada constitucionalmente, à legislação ordinária.
Por outro lado, o Alto das Disposições Constitucionais Transitórias determinou:"Art. 34 - O sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda n. 1 de 1969 e pelas posteriores.
§ 1° - Entrarão em vigor com a promulgação da Constituição os artigos ... 150, ... revogadas as disposições em contrário da Constituição de 1967 e das Emendas que a modificaram, especialmente de seu art. 25, III.
(...)
§ 5° - Vigente o novo sistema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida nos §§ 3° e 4°.
(...)." (Foi destacado).
Por conseguinte, em que pese a ausência de dispositivo na Lei estadual cuidando da desoneração em tela, a imunidade não pode ser olvida, sob pena de flagrante violação ao Texto Constitucional.
No caso em exame, porém, não há provas da regular constituição da requerente, demonstrando ser a mesma enquadrada como entidade sindical e, portanto, favorecida com o tratamento privilegiado.
Contudo, a competência para pronunciar-se sobre imunidade, no que afeta ao IPVA, é do Departamento Estadual de Trânsito, de acordo com o disposto no artigo 21, alínea "c", do Decreto n° 2.432, de 21 de janeiro de 1987, que consolida o Regulamento da Lei n° 4.963/85. Resta, então, devolver os autos àquele Orgão para decisão final e providências decorrentes.
É a informação, S.M.J.
Cuiabá-MT, 11 de abril de 1996.
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
De acordo:
Mailsa Silva de Jesus
Assessora Tributária
(1) BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. rev. e atualizada por Flávio Bauer Novelli, Rio d Janeiro, Forense, 1991. p. 84
(2) Idem, ibidem.
(3) Apud. MARTINS, Ives Gandra. Sistema Tributário Nacional na Constituição de 1988. 3. ed., aum. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 152-3 (notas de rodapé).
* Nota: capitulação cf. CF anterior.