Resolução CFM nº 1.955 de 12/08/2010

Norma Federal - Publicado no DO em 03 set 2010

Dispõe sobre a cirurgia de transgenitalismo e revoga a Resolução CFM nº 1.652/2002. (Publicada no Diário Oficial da União; Poder Executivo, Brasília-DF, nº 232, 02.dez.2002. Seção 1, p.80/81).

O Conselho Federal de Medicina, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e

Considerando a competência normativa conferida pelo art. 2º da Resolução CFM nº 1.246/1988, publicada no DOU de 26 de janeiro de 1998, combinado ao art. 2º da Lei nº 3.268/1957, que tratam, respectivamente, da expedição de resoluções que complementem o Código de Ética Médica e do zelo pertinente à fiscalização e disciplina do ato médico;

Considerando ser o paciente transexual portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou autoextermínio;

Considerando que a cirurgia de transformação plástico-reconstrutiva da genitália externa, interna e caracteres sexuais secundários não constitui crime de mutilação previsto no art. 129 do Código Penal brasileiro, haja vista que tem o propósito terapêutico específico de adequar a genitália ao sexo psíquico;

Considerando a viabilidade técnica para as cirurgias de neocolpovulvoplastia e/ou neofaloplastia;

Considerando o que dispõe o § 4º do art. 199 da Constituição Federal, que trata da remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como o fato de que a transformação da genitália constitui a etapa mais importante no tratamento de pacientes com transexualismo;

Considerando que o art. 14 do Código de Ética Médica veda os procedimentos médicos proibidos em lei, e o fato de não haver lei que defina a transformação terapêutica da genitália in anima nobili como crime;

Considerando que o espírito de licitude ética pretendido visa fomentar o aperfeiçoamento de novas técnicas, bem como estimular a pesquisa cirúrgica de transformação da genitália e aprimorar os critérios de seleção;

Considerando o que dispõe a Resolução CNS nº 196/1996, publicada no DOU de 16 de outubro de 1996;

Considerando o estágio atual dos procedimentos de seleção e tratamento dos casos de transexualismo, com evolução decorrente dos critérios estabelecidos na Resolução CFM nº 1.652/2002 e do trabalho das instituições ali previstas;

Considerando o bom resultado cirúrgico, tanto do ponto de vista estético como funcional, das neocolpovulvoplastias nos casos com indicação precisa de transformação do fenótipo masculino para feminino;

Considerando as dificuldades técnicas ainda presentes para a obtenção de bom resultado tanto no aspecto estético como funcional das neofaloplastias, mesmo nos casos com boa indicação de transformação do fenótipo feminino para masculino;

Considerando que o diagnóstico, a indicação, as terapêuticas prévias, as cirurgias e o prolongado acompanhamento pós-operatório são atos médicos em sua essência;

Considerando o Parecer CFM nº 20/2010, aprovado em 12 de agosto de 2010;

Considerando, finalmente, o decidido na sessão plenária de 12 de agosto de 2010,

Resolve:

Art. 1º Autorizar a cirurgia de transgenitalização do tipo neocolpovulvoplastia e/ou procedimentos complementares sobre gônadas e caracteres sexuais secundários como tratamento dos casos de transexualismo.

Art. 2º Autorizar, ainda a título experimental, a realização de cirurgia do tipo neofaloplastia.

Art. 3º Que a definição de transexualismo obedecerá, no mínimo, aos critérios abaixo enumerados:

1) Desconforto com o sexo anatômico natural;

2) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto;

3) Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos;

4) Ausência de outros transtornos mentais.

Art. 4º Que a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social, obedecendo os critérios a seguir definidos, após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto:

1) Diagnóstico médico de transgenitalismo;

2) Maior de 21 (vinte e um) anos;

3) Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia.

Art. 5º O tratamento do transgenitalismo deve ser realizado apenas em estabelecimentos que contemplem integralmente os pré-requisitos estabelecidos nesta resolução, bem como a equipe multidisciplinar estabelecida no art. 4º.

§ 1º O corpo clínico destes hospitais, devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina, deve ter em sua constituição os profissionais previstos na equipe citada no art. 4º, aos quais caberá o diagnóstico e a indicação terapêutica.

§ 2º As equipes devem ser previstas no regimento interno dos hospitais, inclusive contando com chefe, obedecendo aos critérios regimentais para a ocupação do cargo.

§ 3º Em qualquer ocasião, a falta de um dos membros da equipe ensejará a paralisação de permissão para a execução dos tratamentos.

§ 4º Os hospitais deverão ter comissão ética constituída e funcionando dentro do previsto na legislação pertinente.

Art. 6º Deve ser praticado o consentimento livre e esclarecido.

Art. 7º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se a Resolução CFM nº 1.652/2002.

ROBERTO LUIZ D'AVILA

Presidente

HENRIQUE BATISTA E SILVA

Secretário-Geral