Consulta de Contribuinte nº 310 DE 20/10/2015

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 20 out 2015

ICMS - PERDAS NO PROCESSO PRODUTIVO - ESTORNO DE CRÉDITO - DIFERIMENTO -Sendo possível a realização de operação de circulação de mercadoria, cujo objeto seja o produto que restou do processo produtivo, há de se reconhecer a continuidade da cadeia de circulação da mercadoria, caracterizando-a como resíduo (ou sucata) ou subproduto, conforme o caso.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente, com regime de recolhimento por débito e crédito, é fabricante de conservas de frutas (CNAE 1031-7/00), de palmito (CNAE 1032-5/01) e de legumes e outros vegetais (CNAE 1032-5/99).

Informa que é beneficiária do Regime Especial de Tributação (RET) nº 45.000003806-44 e destaca sua atuação no contexto social da região onde encontra-se instalada.

Relata os procedimentos que adota na importação direta do exterior de azeitonas (NBM/SH 2005.70.00), principalmente, aqueles relativos ao diferimento autorizado no regime especial acima citado.

Discorre sobre o processo produtivo a que é submetida a referida mercadoria, desde a sua chegada ao pátio da empresa, passando pela lavagem e seleção, pelo aquecimento e balança, até o fechamento das tampas por vácuo e, finalmente, sua embalagem (encaixotamento) para encaminhamento ao setor de expedição.

Afirma que durante esse processo produtivo ocorre, em média, perdas entre 7 e 10% (sete a dez por cento), que é apurada em seus controles internos por meio de Ordens de Produção (OP) de cada lote levado à industrialização.

Diz que nas vendas da produção aplica a alíquota de 2% (dois por cento), conforme disposto no art. 18 do referido Regime Especial.

Alega, ainda, que somente após a industrialização do produto é possível conhecer o percentual e a quantidade de perda e deterioração no processo produtivo.

Menciona que, segundo o art. 31 de seu Regime Especial, encerra-se o diferimento somente quando ocorrer uma das situações previstas no art. 12 do RICMS/2002, de modo que a perda e a deterioração no processo produtivo não estão entre as hipóteses de encerramento do diferimento prevista no referido artigo.

Com dúvidas sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 - Considerando que não há previsão no Regime Especial, acima citado, de encerramento do diferimento em caso de perdas ou deterioração no processo produtivo das azeitonas, há necessidade de efetuar algum procedimento fiscal, como a emissão de nota fiscal com CFOP 5.927 - lançamento efetuado a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração, somente para fins de baixa de estoque, sem destaque do ICMS?

2 - No caso de a Consulente ter efetuado recolhimento de ICMS relativo às notas fiscais emitidas com CFOP 5.927, aplicando sobre a base de cálculo a alíquota de 2% (dois por cento), há o direito ao creditamento, uma vez que a operação foi tributada sem que ocorresse as hipóteses de encerramento de diferimento, de acordo com o Regime Especial, o qual remete somente ao art. 12 do RICMS/2002?

3 - As mercadorias consideradas perdidas e/ou deterioradas em razão do processo de industrialização que não são utilizadas para consumo humano podem ser vendidas para fins de adubo orgânico, aplicando-se a alíquota de 2% (dois por cento), conforme Regime Especial?

RESPOSTA:

Preliminarmente, é importante considerar, inicialmente, o que se concebe como perda em um processo industrial.

Eliseu Martins assim se refere sobre as perdas:

Precisamos aqui, primeiramente diferenciar Perdas Normais de Perdas Anormais. As Perdas Normais são inerentes ao próprio processo de fabricação; são previsíveis e já fazem parte da expectativa da empresa, constituindo-se num sacrifício que ela sabe que precisa suportar para obter o produto. As perdas anormais ocorrem de forma involuntária e não representam sacrifício premeditado. (...)

As Perdas Normais podem ocorrer por problemas de corte, tratamento térmico, reações químicas, evaporação etc., e, por serem inerentes à tecnologia da produção, fazem parte do custo do produto elaborado. (...)

Por sua vez, as Perdas Anormais não sofrem o mesmo tratamento; por serem aleatórias e involuntárias, deixam de fazer parte do Custo de Produção e são tratadas como Perdas do período, indo diretamente para o Resultado. (...)[1]

Sob a ótica apresentada caminhou o art. 15 do RICMS/2002, ao estabelecer em seu inciso II a necessidade do recolhimento do imposto diferido, no caso de ocorrência da perda da mercadoria adquirida com esse tratamento, ou outra dela resultante.

Note-se que sendo o diferimento a postergação do ICMS incidente em determinada etapa da cadeia de circulação para ser recolhido em etapa subsequente, a inocorrência desta impõe o recolhimento do tributo relativo ao fato gerador ocorrido, qual seja, a circulação da mercadoria na etapa alcançada pelo diferimento.

Faz-se necessário, ainda, se observar que a legislação tributária mineira dá tratamento aos resíduos diverso daquele atinente aos subprodutos.

Feitas essas considerações, passa-se à resposta aos questionamentos.

1 - Caso as mercadorias em questão sejam objeto de descarte ao longo do processo produtivo, receberão, na saída do estabelecimento da Consulente, o tratamento dispensado ao subproduto ou resíduo, conforme sua classificação, não havendo que se falar em recolhimento do imposto diferido.

De outro lado, se forem inaproveitáveis ou resultantes de perdas anormais, aplicar-se-á o disposto no citado inciso II do art. 15 do RICMS/2002 e no art. 33 de seu RET (na redação atualmente vigente), sendo vedado o aproveitamento do valor recolhido como crédito de ICMS, em atenção ao disposto no inciso V do art. 71 do referido Regulamento.

Vale lembrar que para apuração do imposto a recolher será aplicada a tributação normal relativa à importação da mercadoria em questão e não a tributação relativa às operações de saída da mercadoria, prevista no Regime Especial da Consulente.

Por fim, na hipótese das perdas, para regularização do estoque existente, a Consulente deverá emitir nota fiscal correspondente à baixa, adotando o CFOP 5.927 - lançamento efetuado a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração.

2 - Considerando a resposta anterior, o eventual valor de ICMS recolhido pela Consulente em decorrência de perdas anormais não gera direito a crédito e não deve ser calculado conforme o tratamento dado no Capítulo III de seu Regime Especial de Tributação.

Assim sendo, restando tributo a recolher, deve o contribuinte fazê-lo nos termos do art. 30 do RET.

3 - Relembre-se que as perdas consideradas normais, que sejam objeto de operações de saída que constitua fato gerador do ICMS, se enquadrarão nos conceitos de subprodutos ousucata/aparas/resíduos/fragmentos relativos aos insumos utilizados no processo industrial.

Para efeitos tributários, considera-se, como dito, sucata, apara, resíduo ou fragmento a mercadoria ou parcela dela que não se preste para a mesma finalidade para a qual foi produzida, nos termos do disposto no art. 219 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002.

Por outro lado, entende-se por “subproduto” o fruto da transformação promovida em uma ou mais matérias-primas, a partir das quais é obtido, junto com o produto final desejado, resultante dessa transformação, um novo produto, vale dizer, uma espécie nova que não se prestou ainda para qualquer finalidade.

No caso em análise, as azeitonas descartadas no curso do processo de sua industrialização e impróprias para o consumo humano receberão o tratamento determinado pelo RICMS/2002 para as operações com resíduo.

Destacam-se, no citado tratamento tributário, as disposições dos itens 22, 42 ou 74 da Parte 1 do Anexo II do RICMS/2002, que preveem que tais operações se deem com diferimento do imposto.

Caso a operação de comercialização desses produtos não se adéque às condições estabelecidas pelos dispositivos apontados, deverá ser aplicada a elas a tributação normal. Logo, é inaplicável às saídas de tais produtos o tratamento tributário autorizado no Capitulo III do Regime Especial (crédito presumido), que abrangem apenas os produtos finais por ela industrializados ou por terceiros neste Estado, relacionados no Anexo II do regime.

Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, aprovado pelo Decreto nº 44.747/2008.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 20 de outubro de 2015.

Nilson Moreira
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação

(*) Consulta reformulada para melhor elucidação da matéria nela tratada.

[1]MARTINS, Eliseu. Contabilidade de Custos. 4ª Ed. rev. – São Paulo: Atlas, 1990. Pg. 101